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Processo nº 905/2009
Data do Acórdão: 22MAR2012


Assuntos:

contrato de trabalho
irrenunciabilidade do direito
descansos semanais
descansos anuais
feriados obrigatórios
compensações do trabalho prestado em dias de descansos semanais e anuais e de feriados obrigatórios
gorjetas
salário justo
salário diário
salário mensal



SUMÁRIO

1. São elementos essenciais de uma relação de trabalho a prestação do trabalhador, a retribuição e a subordinação jurídica.

2. mesmo que houvesse acordo entre o trabalhador e a entidade patronal, nos termos do qual aquele renunciou o direito de gozo a aos descansos e feriados obrigatórios, o certo é que, por força da natureza imperativa das normas que confere ao trabalhador direito a compensações e nos termos do disposto no artº 6º da Lei nº 101/84/M e no artº 6º do Decreto-Lei nº 24/89/M, a um tal acordo da natureza convencional nunca poderia ser reconhecida qualquer validade legal, dado que resulta nitidamente um regime menos favorável para o trabalhador.

3. Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.



O relator


Lai Kin Hong

Processo nº 905/2009


Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I

A, devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Judicial de Base acção de processo comum do trabalho, contra a SOCIEDADE DE TURISMO E DIVERSÕES DE MACAU, devidamente identificada nos autos, doravante abreviadamente designada STDM.

Citada a Ré, contestou deduzindo excepção de prescrição e pugnando pela improcedência da acção.

Proferido o despacho saneador, pelo qual foi julgada parcialmente procedente a invocada excepção da prescrição, nos termos seguintes:

1. Julgar prescritos os créditos do Autor resultante da violação do direito ao descanso semanal e feriados obrigatórios vencidos em data anterior a 29MAIO1987; e
2. Julgar prescritos os créditos resultantes da violação do direito ao descanso semanal anual referente aos anos de 1984 e 1985.

Continuando a marcha processual na sua tramitação normal, veio a final a acção julgada parcialmente procedente e condenada a Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$73,80 e HKD$8.950,00, acrescida de juros vencidos e vincendos, a contar nos termos consignados na página 13 da sentença (fls. 239 dos autos).

Inconformado com a decisão final, recorreu o Autor alegando em síntese que:

l-O recorrente não se conforma com esta sentença uma vez que considera que a mesma enferma de violação de lei, ao considerar que as gorjetas não integravam o salário do recorrente na sua componente variável e, por esse motivo, não as contabilizar a título de compensação por descanso semanal, anual e feriados obrigatórios não gozados;
2-Ora, ficou provado que a quase totalidade da remuneração do recorrente era paga pela Ré a título de rendimento variável, (quesitos 6°, 7°, 8°, 9° e 11° dos factos dados como provados e ora transcritos nas presentes alegações);
3-O legislador de Macau recortou o conceito técnico-jurídico de salário nos artigos 7° alínea b), 25º nº 1 e 2 e 27° nº 2 do RJRL;
4-É o salário tal como se encontra definido nesses artigos que seve de base de cálculo de inúmeros direitos dos trabalhadores, nomeadamente, do montante de acréscimo salarial devido pelos trabalho prestado nos períodos de descanso obrigatório;
5-A doutrina portuguesa invocada a douta sentença recorrida não serve de referência no caso em apreço, por ter subjacente diplomas (inexistentes em Macau) que estabelecem o salário mínimo, e definem as regras de distribuição pelos empregados das salas de jogos tradicionais dos casinos das gorjetas recebidas dos clientes;
6-Em Portugal quem paga as gorjetas aos trabalhadores dos casinos que a elas têm direito, não é a própria concessionária, que nunca tem a disponibilidade do valor percebido a título de gorjetas, mas as Comissões de distribuição das gratificações, as quais, sendo distintas e autónomas da empresa concessionária são moldadas como entidades equiparáveis a pessoas colectivas, sujeitas a registo, com sede em cada um dos casinos;
7-Ao contrário, em Macau, quem paga aos trabalhadores a quota-parte a que eles têm direito sobre o valor das gorjetas é a própria concessionária que o faz seu, e não a comissão responsável pela sua recolha e contabilização;
8-O primitivo carácter de liberalidade das gorjetas diluiu-se no momento e na medida em que as gorjetas dadas pelos clientes não revertem directamente para os trabalhadores mas, ao invés, eram reunidas, contabilizadas e distribuídas segundo critérios estabelecidos pela Ré a todos os trabalhadores desta e não apenas por aqueles que contactavam com os clientes;
9-As gorjetas que agora se discutem não pertencem aos trabalhadores mas sim à Ré que com elas faz o que entende.
10-A Ré tinha o dever jurídico de pagar ao recorrente quer a parte fixa, quer a parte variável da remuneração do trabalho (quesito 6°, 7° e 9° dos factos dados como provados e ora transcritos nas presentes alegações);
11-O pagamento da parte variável da retribuição do recorrente -que correspondia à quase totalidade da contrapartida do seu trabalho - traduzia-se numa prestação regular, periódica, não arbitrária e que sempre existiu durante todo o período da relação laboral e contribuiu para o seu orçamento pessoal e familiar;
12-Assim, e nos termos do disposto nos artigos 7 ° alínea b) e 25° nº 1 e 2 do RJRL, a parte variável da retribuição do recorrente terá que ser considerada como salário para efeitos do cômputo da indemnização a pagar relativamente aos dias de trabalho prestados nos períodos de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios;
13-Como vem referido em vários acordãos proferidos pelo Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.,"As gorjetas dos trabalhadores dos Casinos e, em especial as auferidas pela A. durante todo o período da sua relação laboral com a Ré, em última ratio devem ser vistas como "rendimento de trabalho", porquanto devidas em função, por causa e por ocasião da prestação de trabalho, ainda que não necessariamente como correspectivo dessa mesma prestação de trabalho, mas que o passam a ser a partir do momento em que pela prática habitual, montantes e forma de distribuição, com eles o trabalhador passa a contar, sendo que sem essa componente o trabalhador não se sujeitaria a trabalhar com um saleario que, na sua base, é um salário insuficiente para prover às necessidades básicas resultantes do próprio trabalho."
14-A sentença recorrida fez uma errada interpretação do disposto nos artigos 5°, 27°, 28°, 29° nº 2 e 36° todos do Decreto-Lei nº 101/84/M de 25 de Agosto e, bem assim, uma interpretação incorrecta do consagrado nos artigos 5°, 7° nº 1 al. b), 25°, 26° e nº 27° todos do Decreto-Lei nº 24/89/M de 3 de Abril, pelo que deverá ser alterada com todas as legais consequências, nomeadamente no que diz respeito à contabilização das indemnizações devidas ao recorrente pelo trabalho prestado nos períodos de descanso e feriados obrigatórios;
15-O descanso semanal deverá ser contabilizado por aplicação da fórmula salário médio diário x 2 (artº 17° nº 6 do Decreto-Lei nº 24/89/M);
16-O descanso anual deverá ser contabilizado até à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 24/89/M pela fórmula salário diário x 6 dias de descanso anual vencidos mas não gozados x 1 e, depois da entrada em vigor desse Diploma legal, pela fórmula salário diário x 6 dias de descanso anual vencidos mas não gozados x 3;
17-Os seis feriados obrigatórios deverão ser contabilizados, a partir de 3 de Abril de 1989, com a fórmula de cálculo seguinte: salário diário x número de feriados obrigatórios (6) x 3.
Termos em que, nos melhores de Direito e sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Exas, deve a sentença recorrida ser anulada, na parte a que o presente recurso se circunscreve alterando-se a decisão por outra nos termos acima melhor assinalados.

Ao que respondeu a Ré pugnando pela improcedência do recurso.

Foram colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

A fim de nos habilitar a apreciar as questões levantadas nos recursos, passam-se a transcrever infra os factos que ficaram provados na primeira instância:

1. A ré tem por objecto social a exploração de jogos de fortuna ou azar, e a indústria hoteleira, de turismo, transportes aéreos, marítimos e terrestres, construção civil, operações em títulos públicos e acções nacionais e estrangeiros, comércio de importação e exportação.
2. A Ré foi titular, até meados de Março de 2002, de um Contrato de Cessação de Exploração, em regime de exclusividade, do jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casinos.
3. Em 1 de Julho de 1962 o Autor e a Ré iniciaram uma relação contratual que se prolongou até 10 de Outubro de 1998.
4. O Autor começou por dar assistência técnica aos clientes da Ré e, depois, passou a exercer as funções de croupier e, depois, de “superviser” até ao final do contrato.
5. O horário de trabalho do Autor foi sempre fixado pela Ré, em função das suas necessidades, por turnos diários, em ciclos de três dias, num total de 8 horas, alteradas de 4 em 4 horas, existindo o período de descanso de 8 horas diária durante dois dias e um período de 16 horas de descanso no terceiro dia.
6. A Ré entregava ao Autor um montante composto por várias prestações, a título fixo e variável.
7. A parte variável da aludida quantia era proveniente das gorjetas recebidas dos clientes da Ré.
8. No âmbito da relação contratual entre o Autor e a Ré esteve auferia um salário fixo diário de MOP$4,10 desde o início até 30.06.1989, de HKD$10,00 desde 1.07.1989 até 30.4.1995; e de HKD$15,00 a partir de 1.05.1995 e até ao fim da relação contratual.
9. As gorjetas dadas a cada um dos trabalhadores pelos clientes da Ré eram diariamente reunidas, contabilizadas e, em cada dez dias, distribuídas por todos os trabalhadores dos casinos que a Ré explorou.
10. Todos os dias de descanso que o Autor poderia usufruir ao longo da sua relação contratual com a Ré não eram remunerados.
11. O Autor auferiu as seguintes rendimentos diários médios:
- em 1984 MOP$191,79
- em 1985 MOP$216,55
- em 1986 MOP$244,78
- em 1987 MOP$293,07
- em 1988 MOP$348,46
- em 1989 MOP$348,89
- em 1990 MOP$329,61
- em 1991 MOP$315,67
- em 1992 MOP$302,26
- em 1993 MOP$364,74
- em 1994 MOP$302,26
- em 1995 MOP$364,74
- em 1996 MOP$366,61
- em 1997 MOP$367,17
- em 1998 MOP$ 44,30
12. O Autor apenas gozou os dias de descanso que solicitou à Ré para não trabalhar e esta deferiu tal pedido.
13. O Autor apenas recebeu as quantias referidas nas alíneas F), G) e H) dos factos assentes pelos dias em que trabalhou, sem outros acréscimos e que nada recebeu pelos dias em que não trabalhou.
14. As gorjetas eram reunidas, contabilizadas e distribuídas segundo critérios estabelecidos pela Ré e aceites pelo Autor.
15. A Ré acordou com o Autor que este nada receberia pelos dias em que não trabalhasse efectivamente e gozasse de descanso.
16. As gorjetas dadas pelos clientes da Ré eram reunidas e contabilizadas por um conjunto de pessoas composto, entre outros, por um funcionário do Departamento de Jogos do Governo de Macau, um membro da tesouraria da Ré e um ou mais trabalhadores da Ré.

II

De acordo com o alegado nas conclusões do recurso, as questões levantadas que delimitam o thema decidendum na presente lide recursória são a de saber se as chamadas gorjetas são ou não parte integrante do salário para efeitos de compensações ora reclamadas pelo Autor e os multiplicadores para o cálculo da compensação do trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios remunerados.

Da materialidade fáctica assente resulta que:

* o trabalhador recebia uma quantia fixa (MOP$4,10, HKD$10,00 e HKD$15,00), desde o início até à cessação da relação de trabalho estabelecida com a entidade patronal STDM;

* recebia uma quantia variável proveniente das gorjetas dadas pelos clientes, as quais são contabilizados e distribuídas segundo um critério fixado pela entidade patronal STDM de acordo com a categoria dos beneficiários;
1. Natureza das “gorjetas” e do salário justo e adequado;

Tanto o Decreto-Lei nº 101/84/M como o Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei impõe que o salário seja justo.

Diz o artº 27º do Decreto-Lei nº 101/84/M que “pela prestação dos seus serviços/actividade laboral, os trabalhadores têm direito a um salário justo”.

Ao passo que o D. L. nº 24/89/M de 03ABR estabelece no seu artº 7º, como um dos deveres do empregador, que o empregador deve, a título da retribuição ao trabalho prestado pelo trabalhador, paga-lhe um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.

A este dever da entidade patronal, o mesmo decreto faz corresponder simetricamente o direito do trabalhador de auferir um salário justo – artº 25º do mesmo decreto.

A retribuição pode ser certa, variável ou mista consoante seja calculada em função do tempo, do resultado ou daquele e deste (artº 26º do Decreto-Lei nº 24/89/M). E pode ser paga em dinheiro e, ou, em espécie (artº 25º, nº 3, do Decreto-Lei nº 24/89/M); mas apenas pode ser constituída em espécie até ao limite de metade do montante total da retribuição, sendo a restante metade paga em dinheiro (idem, artº 25º, nº3) – vide Augusto Teixeira Garcia, in Lições de Direito do Trabalho ao alunos do 3º ano da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, 1991/1992, Capítulo III, ponto 1 e 2.

In casu, o trabalhador era remunerado em dinheiro.

Se levássemos em conta apenas a quantia fixa que o trabalhador recebia da entidade patronal STDM, esta quantia “tão diminuta” (no valor de MOP$4,10, HKD$10,00 e HKD$15,00) ser-nos-ia obviamente muito aquém do critério imperativamente fixado na lei que impõe o dever ao empregador de pagar ao trabalhador um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.

Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.

Na esteira desse entendimento, a parte da quantia fixa do rendimento que o trabalhadora auferia está muito longe de ser capaz de prover o trabalhador das suas necessidades mínimas, muito menos garantir-lhe a subsistência com dignidade ou permitir-lhe assumir compromissos financeiros.

Só não será assim se o salário do trabalhador estiver composto por essa parte fixa e por uma outra parte variável que consiste nas quantias denominadas “gorjetas”, que tendo embora a sua origem nas gratificações dadas pelos clientes, eram primeiro colectadas e depois distribuídas periodicamente pela entidade patronal ao trabalhador, segundo os critérios por aquele unilateralmente definidos, nomeadamente de acordo com a categoria e a antiguidade do trabalhador.

Ora, para qualquer homem médio, se o salário não fosse o assim composto, ninguém estaria disposto a aceitar apenas a quantia fixa tão diminuta como seu verdadeiro e único salário, para trabalhar por conta da entidade patronal STDM, que como se sabe, pela natureza das suas actividades e pela forma do seu funcionamento exige aos seus trabalhadores, nomeadamente os afectados a seus casinos, a trabalhar por turnos, diurnos e nocturnos.

Pelo que, as denominadas gorjetas não podem deixar de ser consideradas parte integrante do salário, pois de outro modo, a entidade patronal STDM violava o seu dever legal de pagar ao trabalhador um salário justo e adequado.

2. Os factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

Pelo que vimos, fica decidida a inclusão das “gorjetas” no conceito do salário, cremos que é altura para apurar os factores de multiplicação para efeitos de cálculos das quantias devidas pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

a) compensação do trabalho em descansos anuais

Antes da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 101/84/M em 01SET1984, vigorava plenamente o princípio da liberdade contratual e da autonomia privada, sem quaisquer condicionalismos garantísticos legais, não havia lugar a quaisquer compensações senão as contratualmente convencionadas.

Já na vigência do Decreto-Lei nº 101/84/M, ou seja, no período compreendido entre 01SET1984 e 02ABR1989, já foram estabelecidas algumas garantias aos trabalhadores, nomeadamente a compensação obrigatória pelo trabalho prestado em dias do descanso anual – artºs 24º/2 e 23º/1 (que são 6 dias).

Acerca do descanso anual, os artºs 23º e 24º prescrevem:
Artigo 23.º (Aquisição do direito a descanso anual)
1. O trabalhador permanente tem direito a seis dias de descanso anual, sem perda de salário, para além dos períodos de descanso semanal e dos feriados obrigatórios.
2. Nos casos em que a duração da relação de trabalho for inferior a 12 meses, mas superior a 3 meses, o período de descanso anual a que o trabalhador tem direito é o proporcional, na medida de 1/2 dia por cada mês ou fracção de duração da relação de trabalho.
3. Para os efeitos do disposto no número anterior, cada mês considerar-se-á completo às 24 horas do correspondente dia do mês seguinte; mas se no último mês não existir dia correspondente ao inicial, o prazo finda no último dia desse mês.
Artigo 24.º (Marcação do período do descanso anual)
1. O período ou períodos de descanso anual a gozar por cada trabalhador será fixado pelo empregador, de acordo com as exigências de funcionamento da empresa.
2. No momento da cessação da relação de trabalho, se o trabalhador não tiver ainda gozado o respectivo período de descanso anual, ser-lhe-á pago o salário correspondente a esse período.
Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 101/84/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual vencidos mas não gozados, a fórmula é:

1 X o salário diário médio X número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados.

Nos termos do disposto no artº 21º/1 do Decreto-Lei nº 24/89/M, os trabalhadores têm direito a seis dias úteis de descanso anual, sem perda de salário, em cada ano civil.

Nos termos do disposto no artº 24º do mesmo diploma, o empregador que impedir o trabalhador de gozar o período de descanso anual pagará ao trabalhador, a título de indemnização, o triplo da retribuição correspondente ao tempo de descanso que deixou de gozar.

In casu, não resulta da matéria de facto provada que o trabalhador foi impedido pela entidade patronal de gozar os seus descansos anuais, não se deve aplicar assim a forma de multiplicação a que se refere o citado artº 24º.

E na falta de norma expressa para compensar o trabalhador pelo não gozo de dias de descanso anual mas sem impedimento por parte da entidade patronal, afigura-se-nos correcto aplicar por analogia o regime previsto para a situação análoga no caso de descanso semanal, prevista no artº 17º/5 e 6.

Isto é, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de descanso anual, sem constrangimento da entidade patronal, deve dar analogicamente ao trabalhador o direito de ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual, vencidos mas não gozados, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados, caso o trabalhador não tenha sido impedido pela entidade patronal de os gozar.

b) compensação do trabalho em descanso semanal

Como vimos supra, na vigência do Decreto-Lei nº 101/84/M, não há lugar à compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.

Ao passo que no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei já regula as condições do trabalho prestado em dias de descanso semanal e as diferentes formas de compensações desse trabalho consoante as variadas circunstâncias que o justificam.

Diz o artº 17º deste diploma que:

1. Todos os trabalhadores têm direito a gozar, em cada período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º.
2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
a) Quando os empregadores estejam em eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.

4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dias de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
6. O trabalho prestado nos termos do número anterior dá ao trabalhador o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Em face dos factos que ficaram provados nos presentes autos, não se mostrando que o trabalho em dias de descanso semanal foi prestado em qualquer das situações previstas no nº 3 e na falta de outros elementos fácticos, a compensação deve processar-se nos termos consagrados no nº 6, isto é, o trabalhador tem direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso semanal, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em descanso semanal, fora das situações previstas no artº 17º/3, nem para tal constrangido pela entidade patronal.

c) compensação do trabalho em feriado obrigatório

Tal como vimos supra, na vigência do Decreto-Lei nº 101/84/M, só é de compensar o trabalho prestado naqueles três dias de feriados obrigatórios remunerados (o dia 1 de Janeiro, o dia 1 de Maio e o dia 1 de Outubro), mas apenas nas situações previstas no artº 21º/1-b), já não também na hipótese prevista no artº 21º/1-c), que é justamente a situação dos presentes autos, ou seja, a prestação do trabalho seja indispensável para garantir a continuidade do funcionamento da entidade patronal.

Portanto, in casu, como a entidade patronal, enquanto concessionária da exploração dos jogos, obrigava-se por lei e pelos termos do contrato de concessão a manter em funcionamento contínuo, não há lugar a compensações do trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios na vigência da Lei nº 101/84/M.

No âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, o trabalho em feriados obrigatórios e a forma das suas compensações encontram-se regulados no artº 20º que prescreve:

1. O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, referidos no nº 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal e só pode ser executado:
a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a um acréscimo de trabalho não previsível;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável para garantia a continuidade do funcionamento da empresa, nos casos em que, de acordo com os usos e costumes, esse funcionamento deva ocorrer nos dias de feriados.
2. Nos casos de prestação de trabalho em dia feriado obrigatório não remunerado, ao abrigo da alínea b) do nº 1, o trabalhador que tenha concluído o período experimental tem direito a um acréscimo de salário nunca inferior a 50% do salário normal, a fixar por acordo entre as partes.

Nos termos do disposto no artº 19º/3, os trabalhadores têm direito à retribuição nos seis dias de feriado obrigatório (1 de Janeiro, os primeiros 3 dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro).

Perante a materialidade fáctica assente, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de feriados obrigatório integra-se justamente na circunstância prevista no artº 20º/1-c), pois o trabalhador estava afectado aos casinos explorados pela entidade patronal, que como vimos supra, se obrigava legalmente a manter os seus casinos em funcionamento contínuo.

Assim, ao abrigo do disposto no artº20º/1, o trabalhador tem direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal.

A propósito da interpretação da expressão “acréscimo salarial”, ensina o Dr. Augusto Teixeira Garcia que “......A prestação de trabalho nestes dias dá o direito aos trabalhadores de receberem um acréscimo de retribuição nunca inferior ao dobro da retribuição normal (artº 20º, nº1). Assim, se um trabalhador aufere como remuneração diária a quantia de MOP$100, por trabalho prestado num dia feriado obrigatório e remunerado ele terá o direito de auferir MOP$300, ou seja, MOP$100 que corresponde ao dia de trabalho mais MOP$200, correspondente ao acréscimo salarial por trabalho prestado em dia feriado.” – vide, op. cit., Capítulo V, ponto 9.2.

Cremos que essa é única interpretação correcta da expressão “acréscimo salarial”.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, a fórmula é:

3 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em feriado obrigatório remunerado, nas situações previstas no artº 20º/1-c).

Foram fixados na sentença recorrida os multiplicadores X 1, X 3 e X 2 para o cálculo das compensações do trabalho prestado nos dias de descanso semanal, de descanso anual e de feriado obrigatório remunerado, respectivamente.

Não tendo sido objecto de impugnação o multiplicador referente ao descanso anual por via de recurso, é de adoptar infra o multiplicador X 3 para efeitos do cálculo da compensação do trabalho prestado nos dias de descanso anual .

E em face do acima concluído e do decidido no saneador na parte que diz respeito à prescrição da parte dos créditos reclamados pelo Autor, há que revogar a sentença recorrida na parte que diz respeito aos quantitativos do salário diário médio para efeitos do cálculo da compensação do trabalho prestado pelo Autor nos dias de descansos semanal e anual e de feriado obrigatório remunerado, assim como os multiplicadores para o cálculo da compensação do trabalho prestado pelo Autor nos dias de descansos semanal e de feriado obrigatório, e passar a condenar a Ré no pagamento da compensação ao Autor conforme os mapas infra:

Trabalho em descanso semanal


Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
1989
MOP348.89
52
348.89 x 52 x 2
MOP36,284.56
1990
MOP329.61
52
329.61 x 52 x 2
MOP34,279.44
1991
MOP315.67
52
315.67 x 52 x 2
MOP32,829.68
1992
MOP302.26
52
302.26 x 52 x 2
MOP31,435.04
1993
MOP364.74
52
364.74 x 52 x 2
MOP37,932.96
1994
MOP302.26
52
302.26 x 52 x 2
MOP31,435.04
1995
MOP364.74
52
364.74. x 52 x 2
MOP37,932.96
1996
MOP366.61
52
366.61 x 52 x 2
MOP38,127.44
1997
MOP367.17
52
367.17 x 52 x 2
MOP38,185.68
1/1/1998-
10/10/1998
MOP44.30
41
44.3 x 41 x 2
MOP3,632.60



TOTAL:
MOP322,075.40





Trabalho em descansos anuais


Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
29/5/1987-
31/12/1987
MOP293.07
3.5
293.07 x 3.5 x 1
MOP1,025.75
1988
MOP348.46
6
348.46 x 6 x 1
MOP2,090.76
1/1/1989-
2/4/1989
MOP348.89
1.5
348.89 x 1.5 x 1
MOP523.34



TOTAL:
MOP3,639.85





Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
3/4/1989-
31/12/1989
MOP348.89
4.5
348.89 x 4.5 x 3
MOP4,710.02
1990
MOP329.61
6
329.61 x 6 x 3
MOP5,932.98
1991
MOP315.67
6
315.67 x 6 x 3
MOP5,682.06
1992
MOP302.26
6
302.26 x 6 x 3
MOP5,440.68
1993
MOP364.74
6
364.74 x 6 x 3
MOP6,565.32
1994
MOP302.26
6
302.26 x 6 x 3
MOP5,440.68
1995
MOP364.74
6
364.74 x 6 x 3
MOP6,565.32
1996
MOP366.61
6
366.61 x 6 x 3
MOP6,598.98
1997
MOP367.17
6
367.17 x 6 x 3
MOP6,609.06
1/1/1998-
10/10/1998
MOP44.30
5
44.30 x 5 x 3
MOP664.50



TOTAL:
MOP54,209.60





Trabalho em feriado obrigatório


Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
3/4/1989-
31/12/1989
MOP348.89
4.5
185.34 x 4.5 x 3
MOP4,710.02
1990
MOP329.61
6
329.61 x 6 x 3
MOP5,932.98
1991
MOP315.67
6
315.67 x 6 x 3
MOP5,682.06
1992
MOP302.26
6
302.26 x 6 x 3
MOP5,440.68
1993
MOP364.74
6
364.74 x 6 x 3
MOP6,565.32
1994
MOP302.26
6
302.26 x 6 x 3
MOP5,440.68
1995
MOP364.74
6
364.74. x 6 x 3
MOP6,565.32
1996
MOP366.61
6
366.61 x 6 x 3
MOP6,598.98
1997
MOP367.17
6
367.17 x 6 x 3
MOP6,609.06
1/1/1998-
10/10/1998
MOP44.30
5
44.3 x 5 x 3
MOP664.50



TOTAL:
MOP54,209.60

III

Pelo exposto, acordam em julgar procedente o recurso da sentença final, passando a condenar a Ré no pagamento ao Autor do somatório das quantias apuradas nos mapas supra, com juros às taxas legais nos exactos termos consignados na página 13 (fls. 239 dos autos), que não foi objecto da impugnação.

Custas pelas partes na proporção de decaimento em ambas as instâncias no recurso da sentença final.

RAEM, 22MAR2012
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Choi Mou Pan
Subscreve a decisão da parte que não está em desconformidade com a nova posição assumida após o acórdão proferido no p. n° 780/2007