Processo n.º 20/2012 Data do acórdão: 2012-3-8 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– prevenção geral do crime de roubo
– art.o 66.o, n.o 1, do Código Penal
– atenuação especial da pena
– art.o 390.o, n.o 1, alínea f), do Código de Processo Penal
– art.o 73.o da Lei de Bases da Organização Judiciária
– execução da pena de prisão
– despacho de prisão preventiva
– não conhecimento da impugnação da prisão preventiva
S U M Á R I O
1. Atentas as elevadas necessidades de prevenção geral, em Macau, do tipo legal de roubo do art.o 204.o, n.o 1, do CP, há efectiva necessidade da medida da pena dentro da respectiva moldura normal de um a oito anos de prisão, pelo que, à luz do critério imposto na parte final do n.o 1 do art.o 66.o do vigente Código Penal, o Tribunal de Segunda Instância não pode fazer atenuação especial da pena de um ano e quatro meses de prisão efectiva aplicada ao arguido recorrente pelo Tribunal a quo, apesar de ser de reduzir, a seu pedido subsidiário, a duração dessa pena a um ano e dois meses, tendo em conta que ele era ainda delinquente primário à data dos factos.
2. Não se podendo, devido à norma do art.o 390.o, n.o 1, alínea f), do vigente Código de Processo Penal, na redacção dada pelo art.o 73.o da actual Lei de Bases da Organização Judiciária (Lei n.o 9/1999), interpor recurso ordinário do presente acórdão de recurso, deixa de haver agora qualquer possibilidade jurídica de fazer suspender a execução da pena de prisão do arguido, pelo que o Tribunal de Segunda Instância não precisa de conhecer da impugnação, dele, do despacho do relator que lhe aplicou a prisão preventiva no decurso da presente lide recursória.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 20/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: B (B)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Em 14 de Outubro de 2011, foi proferido acórdão em primeira instância no âmbito do Processo Comum Colectivo n.° CR2-10-0047-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, por força do qual o arguido B, aí já melhor identificado, ficou condenado como autor material de um crime consumado de roubo, p. e p. pelo art.o 204.o, n.o 1, do vigente Código Penal de Macau (CP), na pena de um ano e quatro meses de prisão efectiva (cfr. o teor desse acórdão, a fls. 161 a 166v dos presentes autos correspondentes).
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando concreta e materialmente ao Tribunal a quo o excesso na medida da pena, para rogar a atenuação especial, ou pelo menos, a redução da sua pena de prisão, tendo em conta que ele já tinha confessado de modo integral e sem reservas os factos, que o benefício pecuniário resultante da prática do roubo era tão só de seiscentas patacas, que era ainda estudante do 2.o ano do ensino secundário e que desejava prestar a indemnização pecuniária (cfr. a motivação de recurso de fls. 172 a 174 dos autos).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 177 a 178), opinando sobretudo que o Tribunal recorrido não teria atendido à circunstância atenuante muito importante de que o arguido, à data dos factos, tinha apenas 17 anos de idade.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 193 a 194v), pugnando pela improcedência da argumentação do recorrente.
Entrementes, sob promoção da mesma Digna Procuradora-Adjunta, foi aplicada a prisão preventiva ao arguido, por despacho do relator de 10 de Fevereiro de 2012.
Concluído subsequentemente o exame preliminar e corridos os vistos legais, foi designada a data para a audiência de julgamento neste TSI.
Ulteriormente, veio o arguido interpor recurso do despacho de imposição de prisão preventiva para o Venerando Tribunal de Última Instância (TUI), cuja petição (constante de fls. 229 a 236) foi convolada pelo ora relator em petitório de reclamação para a conferência, a ser decidido a final, por considerar que não admitindo o mérito da subjacente acção penal o terceiro grau de jurisdição, não poderia a impugnação do referido despacho (despacho que teve em mira as exigências cautelares na mesma acção penal) ser conhecida, por maioria da razão, pelo Venerando TUI.
Corridos depois os vistos legais quanto ao processado de impugnação do despacho de prisão preventiva, procedeu-se à audiência em julgamento neste TSI.
Cumpre, pois, decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como ponto de partida para o trabalho, é de relembrar aqui todos os factos já dados como provados pelo Tribunal a quo, descritos no texto do acórdão recorrido e não impugnados pelo arguido (pois até confessou ele integralmente e sem reservas esses factos), os quais se dão por aqui integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, de acordo com os quais, e na sua essência:
– em 21 de Dezembro de 2008, cerca das 17:30, o ofendido menor foi abordado pelo arguido na entrada de um edifício sito no n.o … da Avenida de Horta e Costa, e por este foi levado, contra a vontade, para a escada do 1.o andar de um edifício sito na Rua do Coronel Mesquita, onde o arguido pediu ao ofendido que lhe entregasse um telemóvel (que valia cerca de duas mil patacas), sob pena de ser agredido, e devido ao receio de ser agredido, o ofendido entregou o telemóvel ao arguido;
– pelas 22:50 do mesmo dia, o arguido pediu a um seu amigo para empenhar o referido telemóvel numa casa de penhor, tendo obtido assim seiscentas patacas.
E o Tribunal recorrido afirmou no mesmo texto decisório que:
– o arguido confessou os factos integralmente e sem reservas e mostra-se arrependido;
– o arguido é estudante, tem como habilitações literárias o 2.o ano do ensino secundário e não tem ninguém a seu cargo;
– conforme o certificado de registo criminal, o arguido não é primário;
– no âmbito dos autos com o n.o CR2-09-0134-PCC (com a conexão dos autos com o n.o CR2-09-0052-PCC), o arguido foi condenado por acórdão de 13 de Novembro de 2009, por prática de sete crimes de roubo e um crime de burla, na pena única de três anos de prisão;
– no âmbito dos autos com o n.o CR2-10-0080-PCC, consta uma outra acusação contra o arguido, com data para julgamento já designada, por prática, em 3 de Janeiro de 2009, de dois crimes de roubo do art.o 204.o, n.o 1, do CP, e de dois crimes de coacção do art.o 148.o, n.o 1, do CP.
Do exame dos elementos constantes dos autos, mormente do certificado de registo criminal do arguido, sabe-se que:
– o arguido nasceu em Outubro de 1991;
– o arguido já terminou, no dia 1 de Fevereiro de 2012, o cumprimento da pena de prisão por que foi condenado no âmbito do referido Processo n.o CR2-09-0134-PCC;
– os factos dos crimes em questão nos Processos n.os CR2-09-0134-PCC e CR2-10-0080-PCC datam de Janeiro de 2009.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Como uma questão de método, é de decidir primeiro do recurso interposto do acórdão condenatório da Primeira Instância.
E a este respeito, com pertinência à abordagem da questão da medida da pena, cabe observar que aquando da prática dos factos ora em causa no presente processo penal, o arguido era ainda delinquente primário e tinha um pouco mais de 17 anos de idade.
Agora, no tangente à principalmente pretendida atenuação especial da pena, não assiste razão ao recorrente, porquanto atentas as elevadas necessidades de prevenção geral, em Macau, do tipo legal de roubo do art.o 204.o, n.o 1, do CP, há efectiva necessidade da medida da pena dentro da respectiva moldura normal de um a oito anos de prisão (cfr. o critério material imposto na parte final do n.o 1 do art.o 66.o do CP, para efeitos de activação do mecanismo de atenuação especial da pena).
E no tocante à subsidiariamente almejada redução da pena nos termos gerais, e considerando que, diversamente do afirmado pelo Tribunal recorrido, o recorrente era ainda delinquente primário à data dos factos em questão no presente processo, já se entende possível – na subsistência de outras circunstâncias fácticas já vertidas na fundamentação do acórdão impugnado – reduzir o período da pena de prisão efectiva determinada nesse aresto a um ano e dois meses, sob a égide dos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o, n.os 1 e 2, do CP.
Assim sendo, procede o recurso sub judice na presente parte.
E como do acima concluído decorre que o recorrente tem que cumprir um ano de dois meses de prisão pela autoria material de um crime de roubo por que vinha condenado no acórdão recorrido, já não se torna necessário o conhecimento da impugnação, por ele, do despacho judicial que lhe aplicou a prisão preventiva no decurso da presente lide recursória. Na verdade, não se podendo – devido à norma do art.o 390.o, n.o 1, alínea f), do vigente Código de Processo Penal, na redacção dada pelo art.o 73.o da actual Lei de Bases da Organização Judiciária (Lei n.o 9/1999) – interpor recurso ordinário da presente decisão de recurso, deixa de haver agora qualquer possibilidade jurídica de fazer suspender a execução da pena de prisão do arguido.
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em:
– julgar parcialmente provido o recurso do arguido B, reduzindo-lhe a duração da pena de prisão efectiva aplicada no acórdão recorrido a um ano e dois meses;
– e não conhecer da impugnação dele do despacho judicial de 10 de Fevereiro de 2012 que lhe aplicou a prisão preventiva.
Pagará o arguido a metade das custas do recurso e duas UC de taxa de justiça.
Sem custas pelo processado de impugnação do despacho de prisão preventiva.
Fixam em duas mil patacas os honorários totais da Exm.a Defensora Oficiosa do arguido (pelo trabalho feito na motivação do recurso e da impugnação do despacho de prisão preventiva), ora a adiantar em todo o montante pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância, se bem que o arguido tenha que suportar seiscentas e cinquenta patacas desses honorários.
Comunique o presente acórdão ao Processo n.o CR2-10-0080-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base.
Macau, 8 de Março de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
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