Processo nº 707/2008
Data do Acórdão: 01MAR2012
Assuntos:
prescrição
contrato de trabalho
irrenunciabilidade do direito
descansos semanais
descansos anuais
feriados obrigatórios
compensações do trabalho prestado em dias de descansos semanais e anuais e de feriados obrigatórios
gorjetas
salário justo
salário diário
salário mensal
SUMÁRIO
1. São elementos essenciais de uma relação de trabalho a prestação do trabalhador, a retribuição e a subordinação jurídica.
2. mesmo que houvesse acordo entre o trabalhador e a entidade patronal, nos termos do qual aquele renunciou o direito de gozo a aos descansos e feriados obrigatórios, o certo é que, por força da natureza imperativa das normas que confere ao trabalhador direito a compensações e nos termos do disposto no artº 6º da Lei nº 101/84/M e no artº 6º do Decreto-Lei nº 24/89/M, a um tal acordo da natureza convencional nunca poderia ser reconhecida qualquer validade legal, dado que resulta nitidamente um regime menos favorável para o trabalhador.
3. Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 707/2008
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I
A, devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Judicial de Base acção de processo comum do trabalho, contra a SOCIEDADE DE TURISMO E DIVERSÕES DE MACAU, devidamente identificada nos autos, doravante abreviadamente designada STDM.
Citada a Ré, contestou deduzindo excepção de prescrição e pugnando pela improcedência da acção.
Proferido o despacho saneador, pelo qual foi julgada parcialmente procedente a invocada excepção da prescrição.
Não se conformando com o mesmo segmento do despacho saneador em que foi decidida a excepção da prescrição, dele interpôs o recurso interlocutório o Autor, defendendo em síntese que por aplicação analógica do artº 318º/e) do Código Civil de 1966, o prazo de prescrição dos créditos emergentes nas relação laboral entre ele e a Ré só começou a correr a partir da cessação do contrato de trabalho.
Ao que não respondeu a Ré.
Admitido o recurso e fixado a ele o regime de subida diferida, continuou a marcha processual na sua tramitação normal, e veio a final a acção julgada parcialmente procedente e condenada a Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$4.696,72, acrescida de juros vencidos e vincendos, a contar do trânsito em julgado da sentença até integral pagamento.
Inconformado com a decisão final, recorreu o Autor alegando em síntese que
A - Ao abrigo do disposto no art. 25° do RJRT, as gorjetas são parte integrante do salário do recorrente, sob pena de, não o sendo, o salário não ser justo;
B - A Sentença recorrida viola do o Princípio da Igualdade, pois os direitos dos trabalhadores nas mesma circunstâncias do recorrente têm vindo a ser acauteladas pelos Tribunais da RA.E.M., existindo sobre a questão Jurisprudência Assente e que considera serem as gorjetas parte integrante dos salário dos trabalhadores da recorrida.
C - Ao não considerar as gorjetas parte integrante do salário do recorrente, a Sentença proferida viola o constante do art. 25° do RJRT, o art. 23°, nº 3 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o art. 7º do Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, entre outros, com a consequente abertura de portas à violação do direito a uma existência decente e minimanente digna, sujeitando os trabalhadores a uma subsistência miserável, indigna, semelhante a uma possível "escravatura moderna" .
D - Tendo considerado provados os art. 6°, 7º e 9ºº da Base Instrutória e as alíneas C e H) da matéria assente, em que ficou epresso que o salário do recorrente inclui as gorjetas recebidas e distribuidas aos trabalhadores pela recorrida, não pode vir o MMo Juiz ad quo, a posteriori e em sede de Sentença, decidir que, afinal, tais montantes não integram o seu salário.
E - Inexiste qualquer identidade ou paralelismo entre a situação dos trabalhadores dos casinos em Portugal e os de Macau, porque aqueles recebem, desde logo, da entidade patronal um salário justo, i.e., que permite a sua normal subsistência, nunca inferior ao salário mínimo Nacional, sendo que caso as gorjetas não fizessem parte integrante do salário dos trabalhadores de Macau, seria o seu salário miserável e incapaz de prover à sua alimentação, quanto mais às restantes necessidades do ser humano.
F - Também, em Portugal, situação analizada na Douta Sentença proferida, as gorjetas não são recebidas e distribuídas ao belo prazer da entidade patronal, segundo regras e critérios desconhecidos dos. trabalhadores, sendo a questão clara e transparentemente regulada por Lei.
G - Na exclusiva parte recorrida, é a Douta Sentença proferida nula, de acordo com todo o exposto e o contido no art. 571°, nº 1, alíneas b) e c) do C.P.C..
Termos em que, e nos melhores de Direito, sempre com o mui Douto suprimento de V.Exªs, Venerando Juízes, deverá ser declarada nula a Sentença proferida quanto à não integração das gorjetas no salário do recorrente, com as legais consequências, , assim se fazendo a esperada
JUSTIÇA!
Ao que respondeu a Ré pugnando pela improcedência do recurso.
Foram colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
A fim de nos habilitar a apreciar as questões levantadas nos recursos, passam-se a transcrever infra os factos que ficaram provados na primeira instância:
O A. iniciou a relação contratual com a R. em 21 de Junho de 1984. (A)
O A. cessou a relação contratual com a R. em 12 de Dezembro de 1994. (B)
O A. foi admitido como empregado de casino (娛樂場樓面), recebendo de dez em dez dias da R., desde o início da relação contratual até à data da sua cessação, duas quantias, uma fixa, no valor de MOP$4,10 por dia, desde o seu início até 30 de Junho de 1989, e de HKD$10,00 por dia, desde 1 de Julho de 1989 até à data da cessação da relação contratual, e ainda outra parte variável, em função do dinheiro recebido dos clientes de casinos vulgarmente designado por gorjetas. (C)
As gorjetas eram distribuídas por todos os empregados de casinos da R., e não apenas aos que têm "contacto directo" com clientes nas salas de jogo. (D)
Os empregados que não trabalhavam directamente nas mesas ou os que não lidavam com clientes tinham também direito a receber quota-parte das gorjetas distribuídas. (E)
As gorjetas eram provenientes do dinheiro recebido dos clientes de casinos. (F)
Dependentes, pois, do espírito de generosidade desses mesmos clientes. (G)
Pelo que o rendimento dos trabalhadores da R. tinha uma componente quantitativamente incerta. (H)
O A. como empregado de casino, foi expressamente avisado pela R. que era proibido guardar com quaisquer gorjetas entregues pelos clientes de casinos. (I)
O A. prestou serviços em turnos, conforme os horários fixados pela R. (J)
O A. tinha direito a pedir dias de dispensa ao serviço, mas não eram pagos, quer com rendimento diário fixo, quer com gorjetas correspondentes. (K)
As gorjetas oferecidas a cada um dos seus trabalhadores pelos seus clientes eram reunidas e contabilizadas diariamente pelos seguintes indivíduos: um funcionário do Departamento de Inspecção de Jogos de Fortuna ou Azar, um membro do departamento de tesouraria da R., um "floor manager" (gerente do andar) e trabalhadores das mesas de jogo da R., e depois distribuídas, de dez em dez dias, por todos os trabalhadores dos casinos da R. (L)
A composição do rendimento a que se alude na alínea C) da matéria de facto assente foi acordada através de acordo verbal celebrado entre A. e R. (M)
As gorjetas eram geridas pela R., segundo os critérios adoptados por esta. (3°)
Durante o período em que prestava serviço à R., o A. recebeu nos anos de 1984 a 1994 (Doe. n.º 1 junto com a p.i.), os seguintes rendimentos: (6°)
a) 1984 = 19,879.00;
b) 1985 = 36,565.00;
c) 1986 = 59,190.00;
d) 1987 = 92,094.00;
e) 1988 = 108,132.00;
f) 1989 = 142,929.00;
g) 1990 = 187,752.00;
h) 1991 = 174,719.00;
i) 1992 = 177,079.00;
j) 1993 = 191,021.00;
k) 1994 = 183,376.00.
Ficou ainda acordado que o A. tinha direito a receber gorjetas conforme o método vigente adoptado pela R. (7º)
Aquando do início da relação contratual, o A. aceitou o rendimento fixo como o rendimento garantido pela sua entidade patronal ora R. dado que o A. tinha a perspectiva que as gorjetas também faziam parte do seu rendimento. (8°)
Tanto a R., como o A., tinham perfeita consciência que quer a parte fixa quer a parte variável faziam parte do seu rendimento. (9°)
O pagamento do rendimento variável foi regular e periodicamente cumprido pela R. e o A. sempre teve a expectativa do seu recebimento. (10°)
Os trabalhadores (incluindo o A.) recebiam quantitativo diferente de gorjetas, consoante o respectivo cargo profissional e fixado previamente pela R. (11°)
Durante a vigência da relação contratual, nunca o A. foi dispensado pela R. de um dia de descanso por cada semana de serviço prestado. (12°)
A R. não pagou ao A. qualquer compensação pecuniária adicional pelo serviço prestado nesses dias. (13°)
Nem lhe concedeu outro dia de descanso. (14°)
Durante a vigência da relação contratual, nunca o A. foi dispensado pela R. de seis dias de descanso por cada ano de serviço prestado. (15°)
A R. não pagou ao A. qualquer compensação pecuniária adicional pelo serviço prestado nesses dias. (16°)
Durante a vigência da relação contratual, nunca o A. foi dispensado pela R. de dias de descanso correspondentes aos feriados obrigatórios, quer remunerados quer não remunerados. (17°)
A R. não pagou ao A. qualquer compensação pecuniária adicional pelo serviço prestado nesses dias. (18°)
Até ao momento, a R. ainda não procedeu ao pagamento das quantias em dívida ao A. referentes aos dias de descanso semanal, descanso anual e feriados obrigatórios não gozados. (19°)
Antes da entrada do A. ao serviço da R., aquele foi informado pela R. que as gorjetas entregues pelos clientes aos trabalhadores não eram para seu benefício exclusivo, mas para todos os que naquela organização prestavam serviço. (20° e 21°)
Aquando da contratação do A. pela R., aquele foi informado pela R., o seguinte:
1. O rendimento seria pago à razão diária, mas apenas pelos dias em que fosse efectivamente prestado trabalho;
2. Caso pretendesse gozar dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios, tal não lhe era negado, simplesmente esses dias não seriam pagos. (22°)
O A. era livre de pedir o gozo de dias de descanso sempre que assim o entendesse, desde que tal gozo não pusesse em causa o funcionamento da empresa da R. e que fosse autorizado pela mesma. (24°)
II
Recurso interlocutório do Autor.
Na óptica do Autor, existindo o ponto comum ou zona de intersecção entre o trabalho subordinado e o trabalho doméstico, a que se refere o artº 318º/-f) do CC de 1966, pois em ambas as situações está presente uma inibição do exercício do direito por parte do trabalhador decorrente da situação de subordinação jurídica em que se encontra e do receio de suscitar conflito com a entidade patronal que pode colocar, inclusivamente, em risco o seu emprego, defende portanto a aplicação analógica ao trabalho subordinado do disposto no citado artº 318º/-f), nos termos do qual a prescrição não começa nem corre entre quem presta o trabalho doméstico e o respectivo patrão, enquanto o contrato durar.
Como se sabe, nos termos do disposto no artº 9º/1 do CC, o julgador deverá aplicar por analogia aos casos omissos as normas que directamente contemplem casos análogos.
Defende agora o Autor que se está perante uma lacuna da lei por falta de norma legal que prevê o prazo de prescrição dos créditos emergentes do trabalho subordinado e por isso deverá recorrer por analogia a norma que regula a situação análoga, que é justamente o trabalho doméstico.
Salta à vista que tanto as normas invocadas do artº 318º do CC de 1966, como o seu correspondente no artº 311º do CC de 1999, apresentam-se como normas excepcionais.
Pois com a leitura do preceituado nessas normas, afigura-se-nos que o legislador quis mesmo reservar o especial regime de imprescritibilidade aos casos ai expressamente especificados.
Ora, por força da proibição expressa no artº 10º do CC de 1999, as normas excepcionais não comportam aplicação analógica, mas admitem interpretações extensivas.
É de improceder a tese defendida pelo Autor.
Nem se diga que, mesmo assim, por via de interpretação extensiva, nos termos permitidos pela parte final do artº 10º do CC de 1999, se possa chegar à conclusão a que se chegou a tese do Autor.
Ora, a propósito da interpretação extensiva, o Prof. Baptista Machado ensina que é um resultado do trabalho de interpretação de uma norma jurídica quando o intérprete chega à conclusão de que a letra do texto fica aquém do espírito da lei, que a fórmula verbal adoptada peca por defeito, pois diz menos do que aquilo que se pretendia dizer. Alarga ou estende então o texto dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo, isto é, fazendo corresponder a letra da lei ao espírito da lei. Não se tratará de uma lacuna da lei, porque os casos não directamente abrangidos pela letra da lei. Da própria ratio legis decorre, p. ex., que o legislador se quer referir a um género; mas, porventura fechado numa perspectiva casuística, apenas se referiu a uma especie desse género.
A interpretação extensiva assume normalmente a forma de extensão teleológica: a própria razão de ser da lei postula aplicação a casos que não são directamente abrangidos pela letra da lei mas são abrangidos pela finalidade da mesma.
Os argumentos usados pelo jurista para fundamentar a interpretação extensiva são o argumento de identidade de razão (arg. a pari) e o argumento de maioria de razão (arg. a fortiori). Segundo o primeiro, onde a razão de decidir seja a mesma, a explicitamente contempla certas situações, para que estabelece dado regime, há de forçosamente pretender abranger também outra ou outras que, com mais fortes motivos, exigem ou justificam aquele regime. – in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 1995, pág. 185 e 186.
In casu, não está indiciado que o legislador diz no citado artº 318º/-f) do CC de 1966 menos do que pretendia dizer, pois para nós, pelo contrário o legislador teve o cuidado de enumerar todas as situações que merecem o tratamento especial de imprescritibilidade.
Além disso, não vale o argumento de identidade de razão, muito menos de maioria de razão, dado que em comparação com o trabalho doméstico, são bem mais suaves a chama inibição do exercício do direito por parte de um trabalhador subordinado normal, decorrente da situação de subordinação jurídica em que se encontra e o dito receio de suscitar conflito com a entidade patronal que pode colocar, inclusivamente, em risco o seu emprego.
Não procede assim a tese do Autor, ora recorrente.
III
Recurso da sentença final
De acordo com o globalmente alegado nas conclusões do recurso, a única questão levantada que delimita o thema decidendum na presente lide recursória é a de saber se as chamadas gorjetas são ou não parte integrante do salário para efeitos de compensações ora reclamadas pelo Autor.
Da materialidade fáctica assente resulta que:
* o trabalhador recebia uma quantia fixa, desde o início até à cessação da relação de trabalho estabelecida com a entidade patronal STDM;
* recebia uma quantia variável proveniente das gorjetas dadas pelos clientes, as quais são contabilizados e distribuídas segundo um critério fixado pela entidade patronal STDM de acordo com a categoria dos beneficiários;
Tanto o Decreto-Lei nº 101/84/M como o Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei impõe que o salário seja justo.
Diz o artº 27º do Decreto-Lei nº 101/84/M que “pela prestação dos seus serviços/actividade laboral, os trabalhadores têm direito a um salário justo”.
Ao passo que o D. L. nº 24/89/M de 03ABR estabelece no seu artº 7º, como um dos deveres do empregador, que o empregador deve, a título da retribuição ao trabalho prestado pelo trabalhador, paga-lhe um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.
A este dever da entidade patronal, o mesmo decreto faz corresponder simetricamente o direito do trabalhador de auferir um salário justo – artº 25º do mesmo decreto.
A retribuição pode ser certa, variável ou mista consoante seja calculada em função do tempo, do resultado ou daquele e deste (artº 26º do Decreto-Lei nº 24/89/M). E pode ser paga em dinheiro e, ou, em espécie (artº 25º, nº 3, do Decreto-Lei nº 24/89/M); mas apenas pode ser constituída em espécie até ao limite de metade do montante total da retribuição, sendo a restante metade paga em dinheiro (idem, artº 25º, nº3) – vide Augusto Teixeira Garcia, in Lições de Direito do Trabalho ao alunos do 3º ano da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, 1991/1992, Capítulo III, ponto 1 e 2.
In casu, o trabalhador era remunerado em dinheiro.
Se levássemos em conta apenas a quantia fixa que o trabalhador recebia da entidade patronal STDM, esta quantia “tão diminuta” (no valor de MOP$4,10 e HKD$10,00) ser-nos-ia obviamente muito aquém do critério imperativamente fixado na lei que impõe o dever ao empregador de pagar ao trabalhador um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.
Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.
Na esteira desse entendimento, a parte da quantia fixa do rendimento que o trabalhadora auferia está muito longe de ser capaz de prover o trabalhador das suas necessidades mínimas, muito menos garantir-lhe a subsistência com dignidade ou permitir-lhe assumir compromissos financeiros.
Só não será assim se o salário do trabalhador estiver composto por essa parte fixa e por uma outra parte variável que consiste nas quantias denominadas “gorjetas”, que tendo embora a sua origem nas gratificações dadas pelos clientes, eram primeiro colectadas e depois distribuídas periodicamente pela entidade patronal ao trabalhador, segundo os critérios por aquele unilateralmente definidos, nomeadamente de acordo com a categoria e a antiguidade do trabalhador.
Ora, para qualquer homem médio, se o salário não fosse o assim composto, ninguém estaria disposto a aceitar apenas a quantia fixa tão diminuta como seu verdadeiro e único salário, para trabalhar por conta da entidade patronal STDM, que como se sabe, pela natureza das suas actividades e pela forma do seu funcionamento exige aos seus trabalhadores, nomeadamente os afectados a seus casinos, a trabalhar por turnos, diurnos e nocturnos.
Pelo que, as denominadas gorjetas não podem deixar de ser consideradas parte integrante do salário, pois de outro modo, a entidade patronal STDM violava o seu dever legal de pagar ao trabalhador um salário justo e adequado.
Em face do acima concluído, há que revogar a sentença recorrida na parte que diz respeito aos quantitativos do salário diário médio para efeitos do cálculo da compensação do trabalho prestado pelo Autor nos dias de descansos semanal e anual e de feriado obrigatório remunerado, e passar a condenar a Ré no pagamento da compensação ao Autor conforme os mapas infra:
Trabalho em descanso semanal
Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
1989
MOP397.03
39
397.03 x 39 x 1
MOP15,484.17
1990
MOP521.53
52
521.53 x 52 x 1
MOP27,119.56
1991
MOP485.33
52
485.33 x 52 x 1
MOP25,237.16
1992
MOP491.89
52
491.89 x 52 x 1
MOP25,578.28
1993
MOP530.61
52
530.61 x 52 x 1
MOP27,591.72
1/1/1994 - 12/12/1994
MOP529.99
49
529.99 x 49 x 1
MOP25,969.51
TOTAL:
MOP146,980.40
Trabalho em descansos anuais
Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
30/10/1987 - 31/12/1987
MOP255.82
1.5
255.82 x 1.5 x 1
MOP383.73
1988
MOP300.37
6
300.37 x 6 x 1
MOP1,802.22
01/01/1989 - 02/04/1989
MOP397.03
1.5
397.03 x 1.5 x 1
MOP595.55
TOTAL:
MOP2,781.50
Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
03/04/1989- 31/12/1989
MOP397.03
4.5
397.03 x 4.5 x 3
MOP5,359.91
1990
MOP521.53
6
521.53 x 6 x 3
MOP9,387.54
1991
MOP485.33
6
485.33 x 6 x 3
MOP8,735.94
1992
MOP491.89
6
491.89 x 6 x 3
MOP8,854.02
1993
MOP530.61
6
530.61 x 6 x 3
MOP9,550.98
1/1/1994 - 12/12/1994
MOP529.99
6
529.99 x 6 x 3
MOP9,539.82
TOTAL:
MOP51,428.21
Trabalho em feriado obrigatório
Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
03/04/1989- 31/12/1989
MOP397.03
2
397.03 x 2 x 2
MOP1,588.12
1990
MOP521.53
6
521.53 x 6 x 2
MOP6,258.36
1991
MOP485.33
6
485.33 x 6 x 2
MOP5,823.96
1992
MOP491.89
6
491.89 x 6 x 2
MOP5,902.68
1993
MOP530.61
6
530.61 x 6 x 2
MOP6,367.32
1/1/1994 - 12/12/1994
MOP529.99
6
529.99 x 6 x 2
MOP6,359.88
TOTAL:
MOP32,300.32
III
Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso interlocutório mantendo-se na íntegra o despacho saneador na parte que julgou parcialmente procedente a excepção de prescrição e julgar procedente o recurso da sentença final, passando a condenar a Ré no pagamento ao Autor do somatório das quantias apuradas nos mapas supra, com juros às taxas legais desde o trânsito em julgado da presente condenação até ao efectivo pagamento integral.
Custas pelo Autor pelo decaimento do recurso interlocutório e por ambas as partes na proporção de decaimento no recurso da sentença final.
RAEM, 01MAR2012
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira (Subscreve a decisão da parte que não está em disconformidade com a posição assumida após o acórdão proferido no p. n.º 780/2006)
Choi Mou Pan