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Processo nº 192/2012 Data: 29.03.2012
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de furto qualificado.
Atenuação especial.
Suspensão da execução da pena.



SUMÁRIO

1. A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

2. O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 192/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A (XXX) e B (XX), arguidos com os sinais dos autos, responderam, em audiência colectiva no T.J.B., vindo, a final, a ser condenados como co-autores de 1 crime de “furto qualificado” p. e p. pelo art. 198°, n.° 2, al. e) do C.P.M., na pena individual de 2 anos e 3 meses de prisão; (cfr., fls. 186-v a 187).

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Inconformados (tão só) com a pena que lhes foi imposta, os arguidos recorreram; (cfr., fls. 204 a 216 e 218 a 222).

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Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela rejeição dos recursos; (cfr., fls. 225 a 236).

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Admitidos os recursos e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na sua Motivação (cfr. fls. 209 a 216 dos autos), o recorrente/arguido B solicitou sucessivamente: a)- a atenuação especial da pena aplicada ao limite máximo de 6 meses de prisão e a imediata libertação dele; b)- a redução da pena aplicada aos 2 anos de prisão, com a suspensão da exe-cução no período não superior a 3 anos; c)- suspensão da execução da pena aplicada no período não superior a 3 anos.
Fundamentando seus pedidos, invocou ele a confissão espontânea e sem reserva dos factos, o arrependimento sincero, a não verificação do prejuízo efectivo do ofendido, a sua boa conduta durante a prisão preventiva, sendo delinquente primário, a sua situação familiar.
De seu lado, o recorrente/arguido A pediu apenas a suspensão da execução da pena aplicada, invocando ser primário, ter encargos familiares, profissão e vida familiar harmoniosa, sem premeditação, sem prejuízo efectivo ao ofendido, a confissão espontânea e sem reserva durante a audiência do julgamento, o arrependimento.
Note-se que nenhum dos recorrentes/arguidos criticou a subsunção operada no douto Acórdão recorrido. Quer dizer, ambos reconhecem que tinham cometido, na co-autoria material e na forma consumada, o crime condenado pelo Tribunal a quo - o de furto qualificado, p.p. pela e) do n.°2 do art.198.° do CPM.
Sem prejuízo do respeito pela opinião diferente, entendemos que não merece provimento nenhum dos recursos.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do nosso Exmo. Colega nas Respostas (efr. fls.225 a 228 verso e 229 a 236 dos autos), nada temos, de relevante, a acrescentar-lhes.
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Nos autos, militam-se, com efeito, várias circunstância favorável a ambos os recorrentes/arguidos, designadamente a confissão espontânea e sem reserva, e a delinquência primária. E o Acórdão recorrido enuncia expressamente «5. 在本案中, 雖然兩名嫌犯爲初犯及毫無保留地承認全部被指控之事實,……, 判處各兩年三個月徒刑最爲適合».
O que toma claro que estas circunstâncias favoráveis foram tidas em consideração pelo Tribunal a quo ao graduar a pena aplicada na de 2 anos e 3 meses de prisão, apesar de não lhes reconhecerem a virtude de atenuação especial.
Importa ter presente que sendo irmãos germanos, os dois arguidos entraram em Macau no mesmo dia de 26/07/2011 e, antes da prática dos factos ilícitos, tinham preparado os instrumentos descritos nos 2 Autos de Apreensão (cfr. fls. 4 a 10 dos autos). Tudo isto demonstra seguramente que se verifica a premeditação dos mesmos.
Para além da premeditação, não se deve perder da vista que cometeram o facto ilícito na co-autoria, e na madrugada de cerca de 5h00 do dia 29/07/2011, com intromissão em casa do ofendido e, para tal finalidade, abrindo três fechaduras.
Ora, todas estas circunstâncias fazem consistentemente crer que a conduta dos recorrentes/arguidos perigaram a paz e tranquilidade social, e revelam, de forma concludente, o elevado grau e gravidade da ilicitude e a intensidade da culpa.
Interessa aqui recordar que (Acórdão do TSI no Processo n.°153/2010):
A Jurisprudência tem entendido que o número das circunstâncias atenuantes nunca implica necessariamente a atenuação especial, sendo preciso demonstrar-se a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena. Ou seja, só depois de valorizar todas as circunstâncias verificadas no caso concreto e se do imagem global do facto resulta a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena é que se deve utilizar a atenuação especial da pena.
No aresto decretado no Processo n.°636/2010, inculca o TSI:
1. São elevadas as necessidades de prevenção sobretudo geral do crime de furto qualificado previsto no art.198.°, n. °2, alínea g), do Código Penal de Macau, especialmente quando praticado por pessoas não locais, pelo que não é de suspender a execução da pena de prisão aplicada.
2. A confissão dos factos, por si só, não basta, no caso, fazer accionar o mecanismo de atenuação especial da pena a que alude o art.66.° do Código Penal, uma vez que não consegue diminuir por forma acentuada, e pelo menos, a necessidade da pena para o tipo de crime em questão, quando praticado por pessoas não locais.
Em sintonia com estas jurisprudências, podemos temos por certo que ao graduar a pena aplicada, o Tribunal a quo ponderou equilibradamente todas as circunstâncias, tanto as apontadas favoráveis (atenuantes) como as desfavoráveis (agravantes).
Daí decorre que o douto Acórdão recorrido não ofende as alíneas c e d) do n.°2 do art.66° do CPM, nem o art.65° deste diploma legal e, e consequência disso, tomam-se manifestamente infundados os 1° e 2° pedidos do recorrente/arguido B.
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Quanto à suspensão da execução da pena aplicada de 2 anos e 3 meses de prisão - pretendidas por ambos os recorrentes, de entre as ricas doutrinas e jurisprudências, importa por ora recordar a posição tomada pelo venerando TSI no Acórdão proferido no Processo n.°203/2011:
1. Sendo muito prementes as necessidades de prevenção geral do crime de furto de valor elevado praticado por pessoas estrangeiras em Macau em co-autoria, não é de dar preferência à pena de multa em detrimento da pena de prisão, embora esse tipo legal de furto qualificado seja punível nos termos do art.198.°, n.°1, alínea a), do Código Penal de Macau (CP) com multa ou prisão.
……
4. Não é de suspender a execução da pena aplicada ao crime de furto qualificado referido, cometido por pessoas estrangeiras em co-autoria.
Por maioria da razão, não podem deixar de ser improcedentes os pedidos, formulados individualmente por eles, de suspensão da execução da pena aplicada a cada um dos dois recorrentes.
Por todo o expendido, pugnamos pelo não provimentos dos dois recursos em apreço”; (cfr., fls. 247 a 249).

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Nada obstando, cumpre decidir.

Fundamentação
Dos factos

2. Estão provados os factos elencados no Acórdão recorrido, (fls. 185 a 186), que não vem impugnados nem se mostram de alterar e que aqui se dão como integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

Do direito

3. Vem os arguidos recorrer do Acórdão proferido pelo T.J.B. que os condenou como co-autores de 1 crime de “furto qualificado” p. e p. pelo art. 198°, n.° 2, al. e) do C.P.M., na pena individual de 2 anos e 3 meses de prisão.

E, como se colhe do até aqui relatado, vem apenas os ora recorrentes manifestar o seu inconformismo em relação à pena que lhes foi imposta.

Porém, e como se deixou consignado em sede de exame preliminar, cremos que não se podem acolher as pretensões apresentadas, sendo antes de subscrever na íntegra o entendimento exposto na Resposta e Parecer do Ministério Público, que aqui se dá (também) como reproduzido, mostrando-se pois de rejeitar os recursos dada a sua manifesta improcedência; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).

Vejamos.

Pretende o recorrente B a atenuação especial da pena ou a sua redução, rogando, ambos os recorrentes, a suspensão da execução da pena.

Pois bem, no que toca à atenuação especial, constitui entendimento firme deste T.S.I. que “a atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 14.04.2011, Proc. n°130/2011 e de 19.01.2012, Proc. n° 795/2011).

No caso, é verdade que provado está que “os arguidos confessaram os factos”.
Todavia, há que ter em conta que os arguidos foram detidos em “flagrante delito”, o que não deixa de reduzir o efeito da sua confissão.

Por sua vez, sendo o recorrente B nascido em 1982, também não é de dar grande relevo à sua “primodelinquência”.

Assim, e ponderando que o crime foi “premeditado”, sendo intenso o dolo (directo), e ponderado na forma de cometimento do crime, em “comparticipação”, e desta forma, com acentuada ilicitude, mais não é preciso dizer para se constatar que totalmente inviável é a pretendida atenuação especial. De facto, não se está numa “situação excepcional”, com acentuada diminuição da ilicitude do facto, da culpa ou da necessidade da pena, ociosas se mostrando mais alongadas considerações sobre a questão.

No que toca à medida da pena, evidente é também que inexiste margem para qualquer redução, pois que o crime em questão é punido com a pena de 2 a 10 anos de prisão, e a pena aplicada é apenas 3 meses acima do seu limite mínimo, óbvio sendo que ponderadas foram todas as circunstâncias favoráveis.

Quanto à suspensão da execução da pena, sobre a questão, tem este T.S.I. entendido que:

“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., Ac. de 01.03.2011, Proc. n° 837/2011, do ora relator).

Sendo de manter o assim entendido, face ao tipo de crime, e modo do seu cometimento, em relação ao qual se tem vindo a registar um aumento nos últimos tempos, evidente é que fortes e prementes são as razões de prevenção geral.

Nesta conformidade, e independentemente do demais, patente é que inviável é a pretendida suspensão da execução da pena aos recorrentes fixadas.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar os recursos; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o arguido B a taxa de justiça de 5 UCs, e o arguido A a de 3 UCs, e, como sanção pela rejeição dos seus recursos, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Honorários aos Exm°s Defensores no montante de MOP$1.000,00.

Macau, aos 29 de Março de 2012
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa



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