Processo n.º 190/2012 Data do acórdão: 2012-4-12 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– burla em valor consideravelmente elevado
– art.o 211.o, n.o 4, alínea a), do Código Penal
– prevenção geral do crime
– pena suspensa
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal
S U M Á R I O
Há grandes necessidades de prevenção geral do crime de burla em valor consideravelmente elevado do art.o 211.o, n.o 4, alínea a), do Código Penal, necessidades essas que não podem ser cabalmente satisfeitas com a simples censura dos factos e a ameaça da prisão, pelo que não se pode suspender a execução da pena de prisão do agente deste crime (cfr. o critério material do art.o 48.o, n.o 1, parte final, do Código Penal).
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 190/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A (A)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 385 a 392 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR1-10-0135-PCC do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor imediato de um crime consumado de burla em valor consideravelmente elevado, p. e p. pelos art.os 211.o, n.o 4, alínea a), e 196.o, alínea b), do vigente Código Penal (CP), na pena de dois anos e três meses de prisão efectiva, e na obrigação de pagar à ofendida quinhentos e dez mil dólares de Hong Kong de indemnização de danos patrimoniais, arbitrada oficiosamente, com juros legais contados da data dessa decisão até integral e efectivo pagamento, veio o arguido A recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, para rogar a suspensão da execução da prisão, com fundamento na sua colaboração sincera com as autoridades policiais, na sua confissão franca dos factos na audiência de julgamento (com excepção dos respeitantes aos montantes de dinheiro), no seu sincero arrependimento mostrado na audiência, e na sua vontade de pagar indemnização à ofendida, e na sua compreensível dificuldade de, como um homem com cinquenta anos de idade, arranjar emprego no futuro se tivesse que cumprir realmente a pena de prisão (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 402 a 402v dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 405 a 408) no sentido de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 421 a 422), pugnando também pela improcedência do recurso.
Feito o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado em conferência por manifestamente improcedente) e corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada nas páginas 6 a 12 do texto do acórdão da Primeira Instância (ora a fls. 397v a 390v), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal, segundo a qual e na parte que ora interessa à solução do recurso:
– o arguido, um residente de Macau, concebeu, em finais de 2008, um plano de burla através de publicação de anúncio de oferta de casamento em jornal de Hong Kong, destinado a enganar dinheiro de senhoras solteiras ou divorciadas de Hong Kong;
– na sequência disso, a ofendida dos autos conheceu o arguido em Janeiro de 2009, tendo o arguido a enganado mediante um conjunto de pretextos manhosos (para fazer com que ela lhe tenha entregue diversos montantes de dinheiro), e provocado assim nela, e ao total, quinhentos e dez mil dólares de Hong Kong de prejuízo patrimonial;
– o arguido é condutor de veículo de transporte de mercadorias, com nove mil patacas de vencimento mensal, é solteiro e precisa de sustentar uma irmã, e é delinquente primário.
Outrossim, segundo a fundamentação do acórdão ora recorrido, o arguido confessou parcialmente os factos.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
No tocante à questão de não execução imediata da pena de prisão, unicamente posta no recurso do arguido, mostra-se patente que ante todos os elementos pertinentes já referidos na parte II do presente acórdão de recurso, não se pode formular qualquer juízo de prognose favorável à suspensão da pena de prisão dele nos termos do art.o 48.o, n.o 1, do CP, ainda que ele seja delinquente primário.
Na verdade, e desde já, se ele próprio nem confessou integralmente os factos em audiência, como é possível considerar judicialmente que ele já tenha mostrado sincero arrependimento?
E independentemente disso, há grandes necessidades de prevenção geral do crime de burla em valor consideravelmente elevado, necessidades essas que in casu não podem ser cabalmente satisfeitas com a simples censura dos factos e a ameaça da prisão (cfr. o critério material para decisão da suspensão da execução da prisão plasmado na parte final do n.o 1 do art.o 48.o do CP).
Naufraga, assim claramente, o recurso, sem mais indagação por ociosa.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso, por este ser manifestamente improcedente.
Custas pelo arguido recorrente, com duas UC de taxa de justiça, três UC de sanção pecuniária, e mil e seiscentas patacas de honorários a favor do seu Exm.o Defensor Oficioso, honorários estes a adiantar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Comunique o presente acórdão (com cópia também do acórdão recorrido) à ofendida.
Macau, 12 de Abril de 2012.
_______________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
_______________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
_______________________
José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
Processo n.º 190/2012 Pág. 1/6