Processo n.º 171/2012 Data do acórdão: 2012-4-19 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– processo contravencional
– condução com excesso de velocidade
– juízo técnico
– art.o 149.o, n.o 1, do Código de Processo Penal
– tolerância na medição da velocidade por radar
– erro notório na apreciação da prova
S U M Á R I O
Embora o art.o 149.o, n.o 1, do vigente Código de Processo Penal (aplicável também ao processo contravencional por força do art.o 380.o do mesmo Código) determine, nomeadamente, que o juízo técnico inerente à prova pericial se presume subtraído à livre apreciação do julgador, não se pode considerar que no caso dos autos, o juiz a quo tenha errado manifestamente na apreciação da prova, ao ter julgado como provada a velocidade de 113 quilómetros por hora então imputada à arguida ora recorrente, já que a existência de uma margem de tolerância máxima de “+/- 3kph” na medição da velocidade por radar não implica necessariamente que a velocidade em que circulou então o automóvel ligeiro conduzido pela arguida não possa ter sido de 113 km/h em concreto.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 171/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com a sentença constante de fls. 53 a 53v dos autos de Processo Contravencional n.° CR2-10-0606-PCT do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que a condenou como autora material de uma contravenção mormente prevista e punível pelo art.o 98.o, n.o 6, alínea 2), da vigente Lei n.o 3/2007, de 7 de Maio (Lei do Trânsito Rodoviário, doravante abreviada como LTR), na multa de quatro mil e quinhentas patacas (convertível em seis dias de prisão nos termos do art.o 47.o, n.o 1, do vigente Código Penal) e na inibição de condução pelo período de seis meses, veio a arguida A, aí já melhor identificada, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, para – além de pedir, como questão prévia, a concessão de um prazo adicional de dez dias para complementar a motivação do recurso, com fundamento no justo impedimento na obtenção da cópia ou certidão da sentença – assacar a essa decisão judicial o vício de erro notório na apreciação da prova (no tocante à acusada velocidade de “113 km/h” em que teria circulado o veículo automóvel então conduzido por ela na Ponte de Sai Van), devido à alegada inobservância, por esse Tribunal, sobretudo do valor da prova pericial vinculada (porquanto defendia ela nuclearmente que “Conjugando os relatórios juntos aos autos, é lícito concluir que a margem de erro na medição de velocidade por parte do radar móvel em questão é superior a 3 km/h, sendo, por certo, que essa margem não é inferior a 4 km/h”), e, com isso, pedir que passasse a ser condenada apenas nos termos do art.o 98.o, n.o 6, alínea 1), da LTR, em multa não superior a três mil patacas (cfr., com mais detalhes, a motivação de fls. 77 a 94 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 96 a 100), finalmente no sentido de improcedência da argumentação da recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 110 a 111), preconizando também a improcedência do recurso.
Concluído o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado em conferência por manifestamente improcedente) e corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Fluem do exame dos autos os seguintes elementos, pertinentes à decisão:
– Na motivação do recurso da arguida, esta pediu, como questão prévia, a concessão de um prazo adicional de dez dias para complementar essa motivação, com fundamento no alegado justo impedimento na obtenção da cópia ou certidão da sentença (cfr. o teor de fls. 78 a 79 dos autos);
– Pretensão essa que foi indeferida pelo M.mo Juiz a quo (cfr. o despacho de fls. 104 a 105), sem qualquer impugnação pela própria arguida (cfr. o processado de fls. 112 a 114);
– Na acta da audiência de julgamento realizada em primeira instância em 5 de Dezembro de 2011 (lavrada a fls. 52 a 54), consta o texto da sentença condenatória ora recorrida, segundo o qual:
– a arguida cometeu uma contravenção sobretudo prevista pelo art.o 98.o, n.o 6, alínea 2), da LTR, por ter conduzido um automóvel ligeiro na Ponte de Sai Van com a velocidade de 113 km/h;
– o M.mo Juiz autor da sentença formou a sua convicção com base na prova documental produzida através do exame, na audiência, de documentos juntos aos autos, e na confissão da arguida;
– Conforme a mesma acta de audiência de julgamento, a arguida confessou de forma espontânea, integral e sem reservas os factos imputados (cfr. o primeiro parágrafo do teor da fl. 53);
– De acordo com o teor do documento (ora a fl. 44) anexado ao ofício apresentado no dia 1 de Agosto de 2011 pelo Corpo de Polícia de Segurança Pública ao Tribunal Judicial de Base como resposta à questão do grau de precisão do sistema de controlo de velocidade por radar montando em veículo de patrulha em circulação: “To the worse case, there might be a +/- 3 kph tolerance between target and patrol speeds”;
– À arguida foi imputada pela Polícia de Segurança Pública a condução de um automóvel ligeiro na Ponte de Sai Van à velocidade concreta de 113 km/h (cfr. a imagem extraída do sistema de controlo de velocidade por radar, com indicação expressa dessa velocidade – fl. 4).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre observar que a questão prévia de justo impedimento colocada pela arguida na parte inicial da sua motivação do recurso já deixou de ser uma questão, porquanto nem a própria arguida chegou a impugnar o despacho judicial de indeferimento do seu pedido de concessão de prazo adicional para complemento da motivação com fundamento no alegado justo impedimento.
Quanto ao mérito do recurso em si, é patente que o M.mo Juiz a quo não errou minimamente na apreciação da prova no tocante à investigação da velocidade concreta em que teria circulado então o automóvel ligeiro conduzido pela arguida na Ponte de Sai Van.
De facto, embora o art.o 149.o, n.o 1, do vigente Código de Processo Penal (aplicável também ao processo contravencional por força do art.o 380.o do mesmo Código) determine, nomeadamente, que o juízo técnico inerente à prova pericial se presume subtraído à livre apreciação do julgador, não se pode considerar que no caso concretos dos autos, o M.mo Juiz a quo tenha divergido do juízo técnico constante da informação de fl. 44, ao ter julgado como provada a velocidade concreta de 113 km/h então imputada à arguida, já que a existência de uma margem de tolerância máxima de “+/- 3 kph” na medição da velocidade por radar não implica necessariamente que a velocidade em que circulou então o automóvel ligeiro conduzido pela arguida na Ponte de Sai Van não possa ter sido de 113 km/h em concreto, velocidade essa que aliás foi confessada sem reserva pela própria arguida na audiência de julgamento (sendo de verificar que a tese posta na motivação do recurso, no sentido de que a margem de erro na medição de velocidade por parte do radar móvel em questão é superior a 3 km/h e não é inferior a 4 km/h, é que divergiu realmente do juízo técnico da dita informação de fl. 44).
Dest’arte, e de modo evidente, não padece a sentença condenatória ora recorrida do vício de erro notório na apreciação da prova esgrimido pela arguida, sendo, pois, de rejeitar o recurso em conferência, por manifestamente improcedente (art.os 410.o, n.o 1, e 409.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal).
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em rejeitar o recurso, por ser manifestamente improcedente.
Custas pela arguida, com três UC de taxa de justiça e três UC de sanção pecuniária (referida no art.o 410.o, n.o 4, do Código de Processo Penal).
Macau, 19 de Abril de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
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