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Processo nº 199/2012 Data: 19.04.2012
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Liberdade condicional.




SUMÁRIO

A liberdade condicional é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social.



O relator,

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José Maria Dias Azedo



Processo nº 199/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A (A), com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Macau (E.P.M.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no artº 56º do C.P.M.; (cfr., fls. 74 a 78 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).

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Em resposta, pugna o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 80 a 84).

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Em sede de vista, e em douto Parecer, considera também o Exm° Procurador-Adjunto que se deve julgar improcedente o recurso; (cfr. fls. 123 a 124).

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Corridos os vistos legais dos Mmºs Juízes-Adjuntos, e nada obstando, vieram os autos à conferência.

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Passa-se a decidir.
Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):

– por Acórdão do T.J.B. de 09.02.2010, foi, A, ora recorrente, condenado na pena única de 4 anos e 10 meses de prisão, pela prática, em concurso real, de 1 crime de “tráfico de estupefacientes” e 1 outro de “consumo ilícito de estupefacientes”;
– o mesmo recorrente deu entrada no E.P.M. como preso preventivamente em 28.11.2008, e em 16.02.2012, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 27.09.2013;
– durante a reclusão frequentou um curso de língua japonesa, obtendo bons resultados, dedica-se à formação profissional, tendo também participado no curso de “Dança de Leão” e nas actividades do “Dia da Criança”, assim como numa conferência com visitantes do E.P.M., tendo-se libertado da toxicodependência;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá voltar a viver com a sua família em Macau, possuindo perspectivas de emprego numa empresa de investimento imobiliário.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Vejamos.

Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
   “1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
   
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.

3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
   
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).

“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 28.11.2008, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.

Na verdade, e na esteira do decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 20.01.2011, Proc. nº 30/2011 e o de 27.01.2011, Proc. nº 25/2011).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Cremos que de sentido positivo deve ser a resposta.

De facto, tendo presente o comportamento prisional do ora recorrente, e visto que possui apoio familiar e perspectivas de emprego, mostra-se-nos viável o necessário juízo de prognose favorável, no sentido de que, em liberdade, irá conduzir a sua vida de modo honesto e socialmente responsável.

Por sua vez, e ainda que em relação ao crime de “tráfico” fortes sejam as razões de prevenção geral, afigura-se-nos que, no caso, ponderando no período de reclusão, na conduta prisional do recorrente e no período de pena que falta cumprir, viável é uma decisão que conceda a pretendida liberdade condicional, desde que acompanhada de obrigações por parte do ora recorrente.

Assim, em face das expostas considerações, há que revogar a decisão recorrida, concedendo-se a pretendida liberdade condicional e fixando-se ao recorrente as obrigações seguintes:

- demonstrar, nos autos, e no prazo de 1 mês, o exercício de uma profissão;
- apresentar-se, mensalmente, e até ao términus da pena na P.J..
- efectuar o pagamento das custas do processo no prazo de 60 dias.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam conceder provimento ao recurso.

Sem tributação.

Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$1.000.00.

Macau, aos 19 de Abril de 2012
(Relator)
José Maria Dias Azedo

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng

(Segunda Juiz-Adjunta)
Tam Hio Wa
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