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Processo n.º 158/2012 Data do acórdão: 2012-4-26 (Autos de recurso penal)
  Assuntos:
– furto
– medida da pena
– art.o 64.o do Código Penal
– art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do Código Penal
– art.o 65.o do Código Penal
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal
– suspensão da pena
– condenações anteriores
S U M Á R I O
1. Atendendo sobretudo ao facto de o arguido recorrente já ter chegado a cumprir um ano e seis meses de prisão efectiva num processo anterior pelo crime de roubo e ao facto de ele já ter sido condenado num outro processo anterior em pena de prisão (suspensa na sua execução) por um crime de furto, andou bem o tribunal a quo ao aplicar-lhe nesta vez a pena de prisão, e não a de multa, pela prática de um crime de furto, já que realmente não se pode dar por verificado o critério material exigido na parte final do art.o 64.o do Código Penal para efeitos de prevalência da pena de multa.
2. Em relação à justeza da medida da pena de prisão, não se vislumbra que a pena de prisão do crime de furto agora em questão possa ser atenuada especialmente em termos do art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do Código Penal ou reduzida nos termos do art.o 65.o do mesmo Código, uma vez que as condenações anteriores do recorrente por delitos da mesma natureza ditam claramente a necessidade da dose concreta de sete meses de prisão achada na sentença ora recorrida, mesmo que ele tenha agora profundo arrependimento na prática do crime, pretenda tirar a sua toxicodependência, e o preço total das coisas furtadas não seja grande.
3. Por fim, no tangente à desejada suspensão da execução da pena, se a experiência anterior dele de cumprimento da pena efectiva de prisão por cometimento do crime de roubo não o conseguiu prevenir da prática do furto ora em causa, é impensável que a suspensão da execução da pena de prisão nesta vez já consiga realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, mormente em sede de prevenção especial (cfr. o critério material exigido na parte final do art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal).
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 158/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 188 a 191v dos autos de Processo Comum Singular n.° CR4-10-0323-PCS do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de um crime consumado de furto, p. e p. pelo art.o 197.o, n.o 1, do vigente Código Penal (CP), em sete meses de prisão efectiva, veio o arguido A, aí já melhor identificado, e depois de notificado pessoalmente dessa condenação, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para assacar à mesma sentença sobretudo o erro de aplicação do art.o 65.o do CP na medida da pena, pena por ele considerada como exagerada, a fim de pedir a aplicação da pena de multa em detrimento da pena de prisão, ou a suspensão da execução da prisão, com fundamento no já profundo arrependimento dele na prática do crime, na sua vontade de estar já sujeito presentemente ao tratamento da sua toxicodependência, e no facto de o dano patrimonial concretamente causado pelo seu crime não ser grande (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 219 a 221 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 227 a 232) no sentido de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 244 a 245v), preconizando a manutenção da decisão recorrida.
Feito subsequentemente o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado em conferência por manifestamente improcedente) e corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada nas páginas 2 a 4 do texto da sentença da Primeira Instância (ora a fls. 188v a 189v), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal.
De acordo com essa fundamentação fáctica da decisão recorrida:
– em 12 de Janeiro de 2010, cerca das 21h45m, o arguido tirou duas garrafas, com preço total de duzentas e noventa e três patacas e oitenta avos, de óleo de milho numa prateleira de um supermercado, passou pela caixa do supermercado sem ter pago o preço, e deixou depois o supermercado e apropriou-se dessas garrafas de óleo, tendo o arguido agido livre, consciente e intencionalmente, apesar de saber que a sua conduta não era permitida por lei e como tal era punível;
– conforme o certificado de registo criminal, o arguido não é delinquente primário:
– por decisão judicial de 6 de Dezembro de 1995, transitada em julgado em 11 de Junho de 1996, foi condenado pela prática do crime de detenção ilícita de droga para consumo pessoal, em mil patacas de multa, paga nesse mesmo dia 11 de Junho;
– em 16 de Agosto de 1995, foi condenado pela prática de um crime de furto tentado, na pena de quatro meses de prisão e na multa de um mês, com execução suspensa por dois anos, tendo a pena sido declarada extinta em 10 de Novembro de 1997;
– por decisão judicial de 28 de Setembro de 1998, transitada em julgado em 26 de Junho de 2000, foi condenado pela prática de um crime de traficante-consumidor, na pena de seis meses de prisão (suspensa na execução por dois anos) e na multa de cinco mil patacas, já paga por prestações, tendo a pena de prisão sido declarada extinta em 16 de Julho de 2002;
– por decisão judicial de 30 de Abril de 2004, transitada em julgado em 10 de Maio de 2004, foi condenado pela prática do crime de roubo, na pena de um ano e seis meses de prisão efectiva, já cumprida;
– por decisão judicial de 3 de Abril de 2006, transitada em julgado em 11 de Setembro de 2006, foi condenado pela prática de um crime de furto, na pena de sete meses de prisão, suspensa na execução por um ano, tendo a pena sido declarada extinta em 24 de Outubro de 2008;
– por decisão judicial de 16 de Julho de 2010, ainda não transitada em julgado, foi condenado pela prática de dois crimes de furto, na pena de seis meses de prisão por cada, e, em cúmulo, na pena única de nove meses de prisão;
– por decisão judicial de 17 de Dezembro de 2010, ainda não transitada em julgado, foi condenado pela prática de um crime de detenção indevida de utensilagem para consumo de droga e de um crime de detenção de droga para consumo pessoal, na pena de dois meses de prisão por cada, e, em cúmulo, na pena única de três meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com a condição de prestar, no prazo de um mês, duas mil e quinhentas patacas de contribuição a favor da Região Administrativa Especial de Macau;
– além disso, o arguido tem um outro processo em que se encontra acusado pela prática de dois crimes de furto.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
São, pois, apenas as seguintes questões a apreciar: o assacado exagero na medida da pena com especial incidência na alegada devida prevalência da multa à prisão, e a subsidiariamente pretendida suspensão da execução da pena de prisão.
In casu, atendendo aos elementos fácticos já acima referidos na parte II do presente acórdão, sobretudo ao facto de o recorrente já ter chegado a cumprir um ano e seis meses de prisão efectiva num processo anterior pelo crime de roubo (cfr. a respectiva decisão judicial transitada em julgado em 10 de Maio de 2004) e ao facto de ele já ter sido condenado, em 2006, em pena de prisão (suspensa na sua execução) por um crime de furto, andou manifestamente bem o Tribunal a quo ao aplicar-lhe nesta vez a pena de prisão, e não a de multa, já que, independentemente de mais indagação por ociosa, realmente não se pode dar por verificado o critério material (de a pena não privativa de liberdade conseguir realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição) exigido na parte final do art.o 64.o do CP.
E em relação à justeza da medida da pena de prisão, não se vislumbra que a pena de prisão do crime de furto agora em causa possa ser atenuada especialmente em termos do art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do Código Penal ou reduzida nos termos do art.o 65.o do mesmo Código, uma vez que as três condenações anteriores do recorrente por delitos da mesma natureza (i.e., por um crime de furto tentado na decisão judicial de Agosto de 1995, pelo crime de roubo na decisão judicial transitada em julgado em 10 de Maio de 2004, e por um crime de furto na decisão judicial transitada em julgado em 11 de Setembro de 2006) ditam claramente a necessidade da dose concreta de sete meses de prisão achada na sentença ora recorrida, mesmo que ele tenha agora profundo arrependimento na prática do crime, pretenda tirar a sua toxicodependência, e o preço total das duas garrafas de óleo em questão não seja grande.
Por fim, no tangente à desejada suspensão da execução da pena, não deixa de naufragar patentemente também a pretensão do recorrente, porquanto se a experiência anterior dele de cumprimento da pena efectiva de prisão por cometimento do crime de roubo (cfr. a já referida decisão judicial transitada em 10 de Maio de 2004) não o conseguiu prevenir da prática do crime de furto ora em questão nos autos, é evidentemente impensável que a suspensão da execução da pena de prisão nesta vez já consiga realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, mormente em sede de prevenção especial (cfr. o critério material exigido na parte final do art.o 48.o, n.o 1, do CP).
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso, por ser manifestamente improcedente.
Custas pelo arguido, com três UC de taxa de justiça e três UC de sanção pecuniária (referida no art.o 410.o, n.o 4, do Código de Processo Penal).
Passe mandados de detenção contra o arguido, para efeitos de cumprimento da pena de prisão aplicada na sentença recorrida.
Macau, 26 de Abril de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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