Processo nº 107/2012 Data: 26.04.2012
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “usura para jogo”.
Insuficiência da matéria de facto provada para a decisão.
Erro notório na apreciação da prova.
SUMÁRIO
1. O vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão apenas existe quando o Tribunal não emite pronúncia sobre matéria objecto do processo.
2. O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.
O relator,
______________________
José Maria Dias Azedo
Processo nº 107/2012
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Por sentença do Mmo Juiz do T.J.B. decidiu-se condenar A e B, 2° e 3° arguidos com os sinais dos autos, como co-autores da prática de 1 crime de “usura para jogo”, p. e p. pelo art. 13°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M e art. 219°, n.° 1 do C.P.M na pena de 9 meses e 10 meses de prisão, respectivamente, suspendendo-se-lhes a execução de tais penas por 2 anos, e na pena acessória de proibição de entrada nos casinos da R.A.E.M. por 2 anos e 6 meses; (cfr., fls. 354-v a 356 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
*
Inconformados os ditos arguidos recorreram.
Em sede de conclusões, afirmam o que se segue:
“1- Imputam os ora recorrentes à sentença condenatória recorrida os vícios de violação de lei, e erro notório na apreciação da prova e de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previstos no artigo 400.°, n.° 2, do CPPM.
2- Nos termos da sentença recorrida, a convicção do Tribunal “a quo” baseia-se, inter alia, nas declarações anteriormente prestadas nos autos pelo 1° arguido C.
3- No entanto, o 1° arguido C sempre negou os factos, tais como estes vêm referidos na acusação pública e na pronúncia.
4- C refere em seu depoimento que não participou no empréstimo de dinheiro ao ofendido, nem participou nas conversações prévias sobre os termos e condições do empréstimo, já que estas negociações ocorreram com os intervenientes a discutirem o assunto no dialecto cantonense, língua essa que ele não domina.
5- Daí emerge o primeiro erro: Ou se dá por credível o depoimento de C e então este não deveria ter sido apontado como co-autor, ou, então, considera-se falível o depoimento de C, e então a sentença quando constrói a sua convicção com base no seu depoimento, entra em manifesta contradição.
6- O arguido C refere em depoimento que não soube das negociações já que não dominava o cantonense. Jamais se viu um criminoso que participa na execução do crime de usura para o jogo a desinteressar-se completamente quer pelo montante emprestado, quer pelas condições dos juros e forma de pagamento_ quer na conussão percentual que iria obter pelo negócio usurário. Uma postura de tamanho desinteresse é diametralmente oposta àquela a que nos habituou e ensinou a experiência da vida.
7- É estranho que C nem sequer pudesse fornecer a identificação dos seus “patrões” que emprestaram dinheiro ao ofendido, já que com eles trabalha.
8- Mesmo que se admita por boa a tese de que C não sabia a identificação completa dos seus “patrões”, apenas conhecendo-os por “XX” e “XX”, o certo é que é assaz estranho e lamentável que no depoimento que prestara no Ministério Público não tenha sido perguntado para descrever fisicamente as características dessas duas pessoas, nem tão pouco foi feito qualquer reconhecimento fotográfico das pessoas identificadas na Polícia que estivessem dalguma forma envolvido em usura nos casino de Macau. Semelhante falha verifica-se nos depoimentos prestados pelo ofendido no MP e no JIC.
9- Assim, é forçoso concluir que o 1° arguido C não afirmou nem identificou nos autos que os seus “patrões” eram os arguidos ora recorrentes.
10- Por Sua vez, nos depoimentos prestados no MP e depois confirmados no JIC, e no JIC propriamente dito em declarações para memória futura, o ofendido D não identificou os ora recorrentes como sendo as pessoas que participaram no empréstimo de dinheiro feito.
11- A Polícia e as autoridades judiciárias competentes em cada fase não solicitaram ao ofendido que descrevesse fisicamente características das pessoas que lhe emprestou dinheiro.
12- A Polícia não procedeu através do ofendido ao reconhecimento dos arguidos através de álbuns fotográficos existentes na polícia.
13- O arguido C refere em seu depoimento que conhece o ofendido há mais de 3 anos.
14- O ofendido em seu depoimento prestado no MP, a fls. 59, refere que foi o arguido C quem o abeirou e tomou a iniciativa de lhe sugerir um empréstimo para o jogo, ocultando a amizade existente entre eles.
15- Posteriormente, confrontado, nas declarações por si prestadas para memória futura perante o Excelentíssimo Juiz de Instrução Criminal, o ofendido admite a amizade com C.
16- Em nosso modesto entendimento, os depoimentos prestados pelo dito ofendido são contraditórios entre si num aspecto de grande importância.
17- A testemunha E, em seu depoimento prestado nos autos, a fls. 57, refere, na parte final, que “... o “XX” pediu-lhe para seguir/acompanhar o arguido C e o ofendido D, pois receava que o C e o ofendido iriam burlar-lhe o montante emprestado”.
18- Este depoimento reforça a versão dos factos sustentada em audiência de julgamento pelos ora recorrentes que sempre negaram qualquer empréstimo feito ao ofendido, mas sim ao 10 arguido C e que este último com o dinheiro assim obtido emprestou-o ao ofendido, em sua exclusiva iniciativa e risco.
19- Segundo a sentença recorrida, a testemunha F, em audiência, relatou basicamento os factos (“基本上講述了案件發生的經過”). No entanto, não foi isso o que aconteceu em audiência.
20- A testemunha F, em audiência, basicamente, nada disse, nada se lembrando sobre os factos que lhe foram”
perguntados insistentemente. Pelo que, não podia a sentença recorrida construir a sua convicção fáctica e condenatória com base nesse depoimento vazio em que nada disse.
21- O guarda policial n.° XXX, G, que orientou a investigação subsequente às detenções bem como a instrução do inquérito prestou depoimento em audiência, tendo aí afirmado que após a conclusão das investigações, tinha dúvidas e reservas sobre se os 2° e 3° arguidos estavam ou não envolvidos no empréstimo. Afirmou, ainda, que mais lhe parecia que havia um " esquema" entre o 1° arguido C e o dito ofendido D.
22 - Os depoimentos acima referidos, maioritariamente incongruentes e discrepantes entre si, não permitiam ao Tribunal "a quo" construir a convicção fáctica e condenatória pela prática do crime de usura para o jogo relativamente aos ora recorrentes.
23 - Decidindo diversamente, eivou a sentença recorrida dos vícios de erro notório na apreciação da prova e de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previstos no artigo 400.°, n.° 2, do CPPM.
24 - As penas principais e acessória a que os recorrentes foram condenados pecam por severidade em demasia. Considerando a primo delinquência dos recorrentes neste tipo de ilícito criminal, o quadro de circunstâncialismo fáctico envolvente, bem como o período de tempo entretando decorrido, a pena principal aplicável a cada um dos recorrentes não deveria ultrapassar os 6 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 anos, e pena acessória de proibição de frequência dos casinos da RAEM não deveria ultrapassar o período de 2 anos.
25- Agindo diversamente, a sentença recorrida, nessa parte, violou as normas contidas no artigo 65.°, n.° 1, e n.° 2, alineas a), b) e d), do Código Penal de Macau; (cfr., fls. 398 a 411).
*
Respondendo, diz o Exmo. Magistrado do Ministério Pública:
“1. Dos autos e da sentença recorrida, resulta que o Tribunal a quo já investigou e apreciou o objecto integral de acção, dando como provados os factos sem qualquer omissão.
2. Os factos indicados pelos recorrentes e a sua motivação (entendem que existem vários contraditórios e obscuridades) são apenas “a convicção formada por si próprio”. Não se pode pretender negar com isso “a convicção do Tribunal”, o qual viola “o princípio da livre apreciação da prova” previsto pelo art. 114º do CPP.
3. Por isso, feita a análise objectiva na convicção (cfr. a fls. 352v), o Tribunal a quo determinou acreditar no depoimento da testemunha D e identificou que “XX” e “XX” eram respectivamente os 2º e 3º arguidos do presente caso, o qual não viola qualquer princípio de limitação de valor probatório ou regras da experiência comum.
4. Com base nisso, a decisão recorrida não incorre nos vícios do art. 400º, n.º 2, alíneas a) e c) do CPP.
5. Os art.s 40º e 65º do CP estabelecem os factores que se devem considerar na medida da pena e o critério da medida.
6. Na determinação da medida da pena, o Tribunal a quo já considerou as circunstâncias da intensidade do dolo e da gravidade das consequências, e também atendeu a que um arguido era delinquente primário e o outro não, as quais já foram incluídas na parte da “medida concreta” da decisão recorrida. (cfr. a fls. 354)
7. De facto, como uma famosa cidade de turismo e de jogos no mundo, um ambiente positivo de jogos é essencial para a imagem internacional de Macau. Os recorrentes pretende que seja reduzida a pena aplicada aos dois arguidos na “pena principal de prisão inferior a seis meses com suspensão de execução por um período não superior a dois anos, pena acessória de proibição de frequentar a casinos não superior a dois anos”, o qual não é suficiente para a prevenção criminal e é inferior ao grau da culpa dos agentes, considerando o desafio a um determinado grau levado pela conduta dos dois arguidos à ordem jurídica de Macau e a grande influência negativa à imagem internacional de Macau. Pelo contrário, é adequada a medida concreta (pena principal e acessória) aplicada pelo Tribunal a quo respectivamente aos dois arguidos”.
Pede a rejeição dos recursos; (cfr., fls. 414 a 417).
*
Admitido o recurso , e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando também pela confirmação da decisão recorrida; (cfr., fls. 461 a 463).
Cumpre decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos seguintes:
“Aos 12 de Maio de 2006 pelas 22h30, no Casino Lisboa, sabendo da necessidade do D de empréstimo para jogar em casino, o arguido C disse que podia oferecer o empréstimo. Depois da aceitação do D, o arguido C notificou disso o arguido A e o arguido B.
Depois, o arguido C dirigiu o D a uma cantina no Casino Lisboa, a fim de encontrar o arguido A e o arguido B e discutir sobre o empréstimo.
O arguido C, acompanhado pelo arguido A e pelo arguido B, e o D chegaram a um acordo que, emprestaram ao D uma quantia de HKD 300.000,00, sob a condição de que eles iam primeiro deduzir uma quantia de HKD 30.000,00 do dinheiro emprestado como juros, e depois de jogar ainda iam tirar 20% da quantia ganhada como juros.
Depois disso, na sala VIP Chi Chuen do Casino Lisboa, o arguido B dou as fichas de jogo no valor de HKD 270.000,00 ao D para este jogar.
Quando o D estava a apostar com o empréstimo supracitado, os arguidos B e C estavam a acompanhá-lo.
Os arguidos C, A e B agiram livre, voluntaria e conscientemente ao praticarem com dolo as condutas acima referidas.
Eles ofereceram o empréstimo ao D, com intenção de alcançar vantagem pecuniária ilegítima.
Bem sabendo que as sua condutas eram proibidas e punidas por lei.
(…)
O 2º arguido é taxista, auferindo cerca de MOP 16.000,00 mensais. Solteiro, tem duas filhas menores a seu cargo.
Tem como a sua habilitação literária o 2º ano do ensino secundário geral.
Negou os factos acusados.
De acordo com o CRC, é delinquente primário.
O 3º arguido é condutor privado do casino, auferindo cerca de HKD 9.000,00 mensais.
Solteiro, tem a mãe e uma filha menor a seu cargo.
Tem como a sua habilitação literária o 2º ano do ensino secundário complementar.
Negou os factos acusados.
De acordo com o CRC, não é delinquente primário.
Foi condenado, no processo n.º CR3-11-0071-PCS em 15/07/2011, pelo cometimento do crime de desobediência p. e p. pelo art. 121º, n.º 7 da Lei do Trânsito Rodoviário, conjugado com o art. 312º, n.º 1, alínea a) do Código Penal, na pena de multa de 30 dias, cujo montante total foi de MOP 3000, calculado à taxa de MOP 100 diários, convertível em 20 dias de prisão se não pagar a multa nem a substituir por trabalho”.
*
Seguidamente, (após se identificar os factos não provados), consignou-se também na sentença recorrida o que segue:
“A convicção do Tribunal baseou-se em:
Nos termos do art. 338º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal, realizou-se na audiência a leitura da declaração (constante a fls. 52 a 53) feita no MP pelo 1º arguido C, na qual o arguido negou os factos acusados e relatou o decurso concreto da causa, alegando que introduziu o D ao “XX” (2º arguido) e ao “XX” (3º arguido) no sentido de oferecer empréstimos a este para jogar, sem saber a condição do empréstimo, ele próprio apenas acompanhou o D para jogar e levou-o ao hotel para descansar.
O 2º arguido prestou a sua declaração na audiência, relatou o decurso da causa e negou os factos acusados, alegando que apenas emprestou com o 3º arguido as fichas supracitadas no valor de HKD 300.000,00 ao 1º arguido para dar a outros, nunca encontrou o D, deslocou-se da Sala VIP Chi Chuen depois de assinar para levantar as fichas com o 3º arguido e não emprestou directamente dinheiro ou fichas ao D ou recebeu juros por isso.
O 3º arguido prestou a sua declaração na audiência, relatou o decurso da causa e negou os factos acusados, alegando que apenas emprestou com o 2º arguido as fichas supracitadas no valor de HKD 300.000,00 ao 1º arguido para dar a outros, sentou-se ao lado do D por um instante quando o posterior estava a jogar, ficou mais tarde a saber que a quantia tinha sida emprestada ao D para jogar, não emprestou com o 2º arguido dinheiro ou fichas ao D ou recebeu juros por isso.
Nos termos do art. 337º, n.º 2, alínea a) do CPP, realizou-se a leitura da declaração para memória futura (constante a fls. 78 a 79, incluindo o teor relativo na fls. 58 a 59) feita no Juízo de Instauração Criminal pela testemunha D, na qual a testemunha relatou objectiva e explicitamente o decurso concreto da causa, designadamente como e sob quais condições os arguidos emprestou dinheiro a este para jogar, tirar juros e reclamar mais tarde a dívida.
A testemunha F prestou na audiência a sua declaração, relatando geralmente o decurso da causa, a sua situação de trabalho nessa altura e a relação com os três arguidos.
Duas guardas do CPSP prestaram na audiência as suas declarações, relatando objectiva e explicitamente o decurso concreto que chegaram ao local de ocorrência após a recebida da queixa e descobriram o 1º arguido, o D e demais indivíduos e o decurso da investigação do presente caso.
Os vídeos cassetes apreendidos, as fotos gravadas nas cassetes e o auto de visionamento, constantes a fls. 16.
O telemóvel apreendido constante a fls. 8.
As fotos constantes a fls. 22 a 29.
Analisando objectiva e sinteticamente as declarações lidas na audiência e prestadas pelos três arguidos e as testemunhas, conjugado com os apreendidos, fotos e prova documental, bem como outras provas, este Tribunal formou a convicção. Apesar de que os três arguidos negaram a acusação, mas o depoimento explícito do ofendido D, indicando as circunstâncias em que o 1º arguido, E, “XX” e “XX” discutiram com o ofendido sobre as condições de empréstimo e “XX” deslocou-se depois de “XX” dar as fichas ao ofendido, conjugado com a identidade indicada de emprestador do 1º arguido e uma parte do teor das declarações dos 2º e 3º arguidos, expressa que o “XX” e o “XX” são exactamente os 2º e 3º arguidos. Ao mesmo tempo, com base na relação estreita de companhia entre os 2º e 3º arguidos ao emprestarem dinheiro a outros para jogar, nas circunstâncias em que o 3º arguido acompanhou o ofendido a jogar e levou este ao hotel, e na comunicação por telemóvel entre os três arguidos e outros intervenientes, conjugado com regras da experiência comum, entende o Tribunal que o depoimento da testemunha D é mais razoável e confiável em comparação com os depoimentos dos arguidos em que negaram os factos acusados, por isso, é suficiente concluir que os três arguidos praticaram os factos imputados”; (cfr., fls. 351 a 352-v).
Do direito
3. Vem A e B (2° e 3°) arguidos dos autos, recorrer da decisão que os condeou como co-autores da prática de 1 crime de “usura para jogo”, p. e p. pelo art. 13°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M e art. 219°, n.° 1 do C.P.M na pena de 9 meses e 10 meses de prisão, respectivamente, suspendendo-se-lhes a execução de tais penas por 2 anos, e na pena acessória de proibição de entrada nos casinos de R.A.E.M. por 2 anos e 6 meses.
Assacam à decisão recorrida os vícios de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” e “erro notório na apreciação da prova”, considerando também “excessivas as penas principal e acessória”.
Cremos porém que nenhuma razão tem os recorrentes, apresentando-se os recursos de rejeitar, dada a sua manifesta improcedência; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).
Vejamos.
–– Quanto à “insuficiência”, é patente que a mesma inexiste, pois que tal vício só ocorre quando o Tribunal omite pronúncia sobre matéria objecto do processo, (cfr. v.g., Ac. de 01.03.2012, Proc. n.° 62/2012), e, no caso, nenhuma omissão houve.
Com efeito, o Tribunal elencou a factualidade provada, identificou a que não se provou, e fundamentou adequadamente a sua decisão.
Aliás, os recorrentes nem sequer justificam porque é que consideram existir tal vício.
–– Quanto ao “erro notório”, idêntica é a solução.
Na verdade, repetidamente tem este T.S.I. afirmado que “o erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 07.12.2011, Proc. n.° 656/2011 do ora relator).
E, no caso, basta uma leitura à “exposição de motivos” da decisão recorrida atrás transcrita para se ver que nenhum erro – muito menos “notório” – ocorreu, sendo de se constatar que limitam-se os recorrentes a tentar impor a sua versão dos factos, afrontando a livre convicção do Tribunal formada em conformidade com princípio enunciado no art. 114° do C.P.P.M..
–– Por fim, quanto às “penas”.
Foram os recorrentes condenados na pena de 9 e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos, e na pena acessória de proibição de entrada nos casinos por 2 anos e 6 meses.
E, inconformados, pedem uma pena não superior a 6 meses, com idêntico período – 2 anos – de suspensão quanto à sua execução, e uma pena acessória de “interdição” por período não superior a 2 anos; (cfr., concl. 24ª).
Ora, pouco há a dizer.
De facto, atentas as molduras penais em causa – prisão até 3 anos, e interdição de 2 a 10 anos – o dolo directo e intenso, a elevada ilicitude, dada a forma de cometimento do crime, em “comparticipação”, e as necessidades de prevenção criminal, evidente é a falta de razão dos recorrentes, afigurando-se mesmo benevolentes as penas fixadas.
Dest’arte, e sendo os recursos manifestamente improcedentes, imperativa é a sua rejeição; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar os recursos; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).
Pagarão os recorrentes a taxa individual de justiça de 6 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso, o equivalente a 4 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).
Macau, aos 26 de Abril de 2012
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 107/2012 Pág. 22
Proc. 107/2012 Pág. 1