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Processo n.º 389/2012
(Suspensão de Eficácia de Acto Administrativo)

Data : 7/Junho/2012

ASSUNTOS:
- Suspensão de eficácia de acto
- Actos definitivos
- Resolução final
- Anulação do concurso; efeitos; manutenção da adjudicatária


SUMÁRIO:
    1. A suspensão dessa eficácia depende assim da verificação dos três requisitos das alíneas a), b) e c) do n.º 1 artigo 121º do C.P.A.C.: previsível prejuízo de difícil reparação para o requerente, inexistência de grave lesão de interesse público pelo facto da suspensão e o não resultarem do processo fortes indícios da ilegalidade do recurso.


   2. Se numa situação em que as requerentes, candidatas ao concurso em causa dele foram excluídas, se reagiram contenciosamente e acabaram por ter sucesso nos tribunais que lhe deram razão, anulando o acto e procedimento concursal, se, posteriormente, dando execução ao decidido a Administração anuiu e deu corpo e expressão jurídica ao parecer tendente à execução do acórdão, empreendeu a conduta proposta naquele despacho, admitindo as requerentes ao concurso a propondo-se proceder a uma nova reavaliação, não obstante se manter a adjudicatária a operar, independentemente da situação jurídica que dê cobertura a essa operação - na certeza de que os interesses em causa impõem que esse serviço público continue a ser assegurado -, não se vê em que medida daí resulte prejuízo para a posição das requerentes, que continuam na disputa pela adjudicação concursal, de forma a suspender a eficácia desse acto que visa efectivar um novo concurso, expurgando-o dos vícios que levaram à anulação do anterior.


              O Relator,

              
              (João Gil de Oliveira)









Processo n.º 389/2012
(Suspensão de Eficácia)

Data : 7 de Junho de 2012

Requerente: O consórcio formado por A e
             B Tecnoloyg Co., Ltd.

Entidade Requerida: Chefe do Executivo da RAEM
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    A e B科技股份有限公司 ou, em inglês, B TECHNOLOGY CO. LTD., mais bem identificadas nos autos, vêm requerer a suspensão de eficácia do despacho de Sua Excelência, o Senhor Chefe do Executivo, de 16/3/12 que, anuiu a informação do GDI de 8/3/12.
    Para tanto invocam que
    no Recurso Administrativo Contencioso n° Proc. 74/2011 desse Tribunal contra o despacho do Exmo Senhor Chefe do Executivo que indeferiu o seu recurso hierárquico necessário e manteve a deliberação da Comissão de Abertura das Propostas que em 30.06.2010 excluiu as recorrentes, e sua proposta, do concurso para adjudicação da «Modernização, operação e manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau» aberto por anúncio publicado no B.O. da RAEM n° 13, II Série, de 31.003.2010,
    tendo tido conhecimento de que, alegando cumprimento dos acórdãos que naquele recurso anularam a referida exclusão, o Senhor Chefe do Executivo, por seu despacho de 16 de Março de 2012 (reproduzido em Doc. N° 1) procedera à admissão das recorrentes mas mantendo a adjudicação entretanto feita a outra concorrente, e sem reabrir o Concurso na fase em que se encontrava à data da exclusão (fase de concorrentes ainda não avaliados mas apenas admitidos e não admitidos)
    vêm requerer a suspensão da eficácia do acto
    o que fazem nos termos e com os fundamentos seguintes:
“I
(Acto Visado)

    O acto recorrendo objecto do Pedido de Suspensão de Eficácia aqui deduzido é o douto despacho do Exmo Chefe do Executivo de 16.03.2012 reproduzido in fls.. 3 a 16 da Certidão junta como Doc. n° 1, na parte em que admite as requerentes a concurso já objecto de Acto Final de Adjudicação de 05.Agosto.2011 (e por isso extinto), mantendo essa adjudicação e negando a reintegração das recorrentes na situação de admitidas na fase de concorrentes ainda não 'avaliados mas apenas admitidos, e em cuja fase e situação se encontravam e devem ser repostas por ter sido judicialmente anulado o acto que de lá as excluíu.
II
(Fundamentos do Pedido)

    Por Acórdão proferido por esse Tribunal em 27.10.2011 no Recurso Contencioso de Anulação n° 74/2011 (reproduzido a fls.. 65 e segs da certidão junta como Doc. n° 1), acima referenciado, foi anulado o recorrido Acto de Exclusão das requerentes, e sua proposta, do Concurso Público Internacional «Modernização, operação e manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da , Península de Macau», Acto de exclusão esse que havia sido praticado por despacho do Exmo Chefe do Executivo 04 de Novembro de 2011 a indeferir o recurso hierárquico necessário por elas para ele interposto contra a deliberação da Comissão de Abertura das Propostas do que em 30.Junho.2010 e a manter essa deliberação de exclusão - cfr. cit. Ac in Doc. n° 1;

    Não conformado com o Acórdão desse Tribunal (T.S.I.) que anulou o referido recorrido acto de exclusão, o Exmo Senhor CHEFE DO EXECUTIVO interpôs contra essa decisão Recurso Jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI) no qual, registado como Proc. n° 0112012, por Acórdão de 15.2.2012, o T.U.I. negou provimento ao recurso do Chefe do Executivo e assim manteve a anulação decretada por esse TSI – cfr. reproduzido a fls.. 86 e segs. da Certidão junta como Doc. n° 1:

    O referido concurso visava a obtenção de propostas concorrentes interessadas na adjudicação de contrato de «Modernização, operação e manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau» e sua efectiva adjudicação ao concorrente que, entre todos, melhor classificação obtivesse para a satisfação ou cumprimento da matéria posta a concurso - cit. Acto e actas in cit. Doc. n° 1;

    O Acto de Adjudicação foi praticado mediante despacho Senhor Chefe do Executivo de 05.Agosto.2011 adjudicando o Concurso ao Consórcio concorrente n° 4 formado pelas empresas "C-Investimentos e Serviços, S.A. / D-Indústria e Gestão de Águas, S.A. / F Co. Ltd. "após Acto de Avaliação-Selecção restrito a esse Concorrente n" 4 e ao concorrente n° 5 "G Consultores de Engenharia e Gestão Lda/H Consultores de Engenharia e Gestão SA", ou seja, sem apreciar a proposta das aqui exequentes – cfr. fls.. 126 e segs. da certidão junta como Doc. n° 1;

    As aqui exequentes não se conformaram com a ADJUDICAÇÃO, tendo interposto o Recurso Contencioso de Anulação que sob o n° 734/2011 corre termos pelo TSI contra esse Acto Final de Adjudicação, tal como se vê do Acórdão interlocutório de 15.3.2012 desse TSI - Doc. n° 2;

    Na sequência do cit. Acórdão do TUI de 15.2.2012, e mediante oficio n° 1647/GDII2012, de 04.04.2012, enviado para a sede da exequente A na Bélgica, o Gabinete Para o Desenvolvimento de Infra-estruturas (G.D.I.) notificou de que "por despacho de despacho de 16 de Março de 2012 do Senhor Chefe do Executivo, exarado sobre a informação n° 230/GDI/2012, de 8 de Março, foram as empresas A e B Technology Co. Ltd., em consórcio, bem como a respectiva proposta, admitidas ao concurso em referência" mas sem o conteúdo integral, nomeadamente outras decisões lá tomadas – cfr. Doc. n° 3 confrontado com o acto integral in fls.. 126 e segs. da certidão junta como Doc. n° 1;

    Em 20 de Abril de 2012 foi requerida à entidade notificante certidão integral do Acto de alegado cumprimento espontâneo e fundamentos em que assenta, por forma a conhecermos o conteúdo integral do Acto e por cuja emissão e entrega se espera - Doc. n° 4;

    Mas foi-nos fornecida pública-forma de certidão obtida por outra concorrente, notificada antes das exequentes – cfr. Certidão junta como Doc.1.
10°
    E desse conteúdo do cit. Acto do Senhor Chefe do Executivo de 16.3.2012 de alegado cumprimento espontâneo, consta que ele mantém a Adjudicação já feita ao Consórcio concorrente actual adjudicatário, formado pelas cit. empresas "C-Investimentos e Serviços, S.A. / D-Indústria e Gestão de Águas, S.A. / F Co. Ltd., " - Doc. n° 1;
11°
    Embora admitindo a sua eventual futura "revogação fundada em invalidade superveniente e substituição por outra que espelhe o novo resultado de avaliação", tudo como melhor consta do conteúdo do despacho e cit. Informação 230/GDI/2012, de 08 de Março de 2012, em que assenta - cfr. fls. 3 a 16° da certidão junta como Doc. n° 1;
12°
    O cit. Acto Final de Adjudicação, de 05.Agosto.2011, encontra-se em execução desde 01 de Outubro de 2011, data a partir da qual a anterior adjudicatária cessou a actividade e, imediata e simultaneamente, a actividade passou a posse e a ser exercida pelo Consórcio concorrente actual adjudicatário, formado pelas cit. empresas "C-Investimentos e Serviços, S.A. / D-Indústria e Gestão de Águas, S.A. / F Co. Ltd.".
13°
    Em 02 de Maio de 2012, as requerentes, por apenso ao Recurso Contencioso de Anulação n.º 74/2011 desse TSI, requereram execução do julgado nesse processo por Acórdão do TSI de 27.10.2011 e Acórdão do TUI de 15.2.2012 – cfr. cópia que junta como Doc. n° 5;
14°
    O Acórdão do TUI de 15.2.2012 julgou improcedente o recurso da entidade recorrida por acertado o Acórdão do TSI de 27.10.2011 e ilegal o Acto lá recorrido, nomeadamente por violação do princípio da boa-fé - cfr. cit. Acórdão a fls. 121 da certidão junta como Doc. n° 1;
15°
    Princípio da boa-fé que as requerentes consideram que o acto aqui suspendendo também viola por entenderem que o Acto praticado de alegada admissão das exequentes é falso cumprimento, falsa admissão, e que mais não visa do que manter a situação de vantagem em que colocou o actual adjudicatário mediante avaliação e adjudicação já feita em vez de admissão, para avaliação e sua selecção ou não, em pé de igualdade com restantes admitidos, isto é, fase de concorrentes admitidos mas ainda não avaliados e muito menos já nomeados e empossados como adjudicatários,
16°
    Pois era essa a situação em que todos se encontravam e teriam sido avaliados se dessa situação e avaliação não tivessem sido ilegalmente afastados pelo acto judicialmente anulado e em cuja posição têm direito a ser repostas por anulado estar o acto que de lá as retirou - arte 174° n° 3 do CPAC.
17°
    Isto é, a lei manda colocar as exequentes na situação de concorrentes admitidas a concurso de adjudicação a fazer. Não no contra-senso de concorrentes admitidas a concurso de concorrentes já avaliadas e adjudicação já feita como, em contra-senso e ao arrepio do que manda a ordem jurídica violada, pretende a entidade recorrida.
18°
    Ou, por outras palavras, colocar as concorrentes em concurso aberto (não em concurso extinto pela Adjudicação feita) em avaliação em total pé de igualdade "ex novo" com todos os concorrentes, em total imparcialidade, transparência e igualdade de critérios, grelha, tempo e circunstâncias.
19°
    E perante Comissão que a todos conheça igualmente pela 1ª vez, em igualdade de tempo e avaliação, e não sob a avaliação duma Comissão "ex novo" para as requerentes mas já ''velha'' conhecedora e avaliadora da proposta a quem deu a vitória e adjudicação impugnada no nosso supra indicado Recurso Contencioso de Anulação n° 734/2011 em que foi proferido o Acórdão interlocutório de 15.3.2012 desse TSI, reproduzido no Doc. n° 2;
20°
    Esta falta de igualdade com todos os concorrentes, de imparcialidade, transparência e igualdade de critérios, grelha, tempo e circunstâncias de avaliação constitui ilegalidade, ferindo o acto de anulabilidade.
21°
    Bem como o fere a nulidade pois se trata de admissão e avaliação em concurso que já se encontrar extinto, já não existir o concurso ao qual as exequentes deviam ser admitidas, sendo por isso acto nulo por já não existir o objecto, por impossibilidade de objecto - art. 273° n.º 1 do Cód. Civil e art. 122° n.º 2 alínea c) do Cód. Procedimento Administrativo (CPA).
22°
    Bem como nulo é também por desconforme com a sentença exequenda e normas legais que definem o conteúdo do seu cumprimento e reposição da situação a que tinham e têm direito de estar se o Acto anulado não tivesse sido praticado farto 174° n.° 3 do CPAC), salvo causa legítima de inexecução evidentemente - art. 122° n.º 2 alíneas d) e h) do Cód. Procedimento Administrativo (CPA) e art. 184° n.º 2 do Cód. Processo Administrativo Contencioso (CPAC).
23°
    Só assim não seria se o Acto tivesse procedido à admissão, precedido de procedimento com a ordem seguinte:
    a) despacho a revogar o Acto de Adjudicação por si proferido a 05 de Agosto de 2011 e a declarar reaberto o cit. Concurso Público Internacional «Modernização, operação e manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau», aberto por anúncio no Boletim Oficial da RAEM n° 13, II Série, de 31.Março.2010, na fase em que se encontrava quando as requerentes foram objecto do anulado acto de exclusão, isto é, a fase de lista de admitidos para a avaliação e selecção da melhor proposta entre todos os concorrentes admitidos mas ainda não avaliados nem seleccionados e muito menos já contemplados com a adjudicação;
    b) despacho a declarar admitidas as concorrentes aqui requerentes e sua proposta, em pé de igualdade com restantes admitidos, isto é, fase de concorrentes admitidos mas ainda não avaliados e muito menos já nomeados e empossados como adjudicatários;
    c) despacho de nomeação de nova Comissão de Avaliação de Propostas, "ex novo" com novas pessoas como se a anterior nunca tivesse existido, e não Comissão avaliadora e conhecedora "ex novo" das requerentes e sua proposta mas já "velha" conhecedora e avaliadora da proposta a quem deu a vitória e adjudicação;
    d) e, depois de nomeada a nova Comissão, mandar esta proceder à avaliação de todos os concorrentes, em juízo actual e comparativo de todos como se nunca nenhuma tivesse sido avaliada, em total pé de igualdade "ex novo" com todos os concorrentes, em total imparcialidade, transparência e igualdade de critérios, grelha, tempo e circunstâncias.
    e) E depois de realizada esta avaliação, proferido novo despacho de adjudicação pelo Chefe do Executivo, ao concorrente que melhor servir for em meios e custos a matéria posta a concurso ..
III
(A Concluir)
24°
    Porque assim não foi feito e por todo exposto:
    1) - o Acto suspendendo é ilegal (por ferido quer dos referidos vícios de nulidade quer de anulabilidade) daí a legalidade de recurso a atacar o Acto suspendendo;
    2) - com efeito, imputa-se-lhe falta de igualdade com todos os concorrentes, de imparcialidade, transparência e igualdade de critérios, grelha, tempo e circunstâncias de avaliação constitui ilegalidade, ferindo o acto de anulabilidade, dentro do princípio da boa-fé;
    3) é nulo por o concurso que já se encontrar extinto, já não existir o concurso ao qual as exequentes deviam ser admitidas, sendo por
    4) isso acto nulo por já não existir o objecto, por impossibilidade de objecto - art. 273º n.º 1 do Cód. Civil e art. 122º n° 2 alínea c) do Cód. Procedimento Administrativo (CPA).
    5) bem como nulo é também por desconforme com a sentença exequenda e normas legais que definem o conteúdo do seu cumprimento e reposição da situação a que tinham e têm direito de estar se o Acto anulado não tivesse sido praticado (art. 174º n.º 3 do CPAC), salvo causa legítima de inexecução evidentemente - art. 122º n° 2 alíneas d) e h) do Cód. Procedimento Administrativo (CPA) e art. 184º n.º 2 do Cód. Processo Administrativo Contencioso (CPAC).
    6) nega às requerentes, sem opor causa legítima de inexecução, o direito à reconstituição e reintegração na posição a que teria direito e teria ocupado se dessa fase e situação não tivesse sido ilegalmente afastada pelo acto judicialmente anulado, razão pela qual é acto de conteúdo positivo;
    7) bem como também o é, pela vantagem e falta de igualdade que dá à concorrente a quem já adjudicou o concurso e lho mantém;
    8) lesa o interesse público e a boa imagem da Administração pela imagem que dá de, sem invocar o meio de causa legítima der inexecução que a lei lhe faculta, querer favorecer e manter como consumadas situações e avaliações e adjudicação já feitas (apesar de admitir vir, eventualmente, a revogar essa adjudicação) em vez de reconstituir a situação decorrente da decisão judicial - a de admitidas a concurso ainda sem avaliação nem adjudicação, que era a situação em que se encontrava o concurso quando foi praticada a exclusão anulada pelo Tribunal;
    9) e a SUSPENSÃO DA SUA EFICÁCIA não lesa o interesse público (antes o defende) pois está a correr execução do julgado (execução para prestação de facto) e, além disso, o serviço público já se encontra adjudicado, na posse e actividade exercida e assegurada pelo consórcio a quem este concurso foi adjudicado - o consórcio "C-Investimentos e Serviços, S.A. / D-Indústria e Gestão de Águas, S.A. / F Co. Ltd.,";
    10) e, por último, o Acto cuja suspensão de eficácia se pede além de não poder revogar o já julgado nem o que for julgado na execução, gera obrigatória e necessariamente circuitos e dificuldades a todos os interessados, expectativas e sofrimentos e prejuízos às requerentes (e provavelmente também aos restantes interessados) em trabalho, tempo e dinheiro cuja reparação total será de difícil quantificação e difícil reparação.
IV
(Pedido)
NESTA CONFORMIDADE,
    Porque estamos perante acto de conteúdo positivo, sua execução causa prejuizo de difícil reparação às requerentes e aos interesses que visam defender no recurso a interpôr bem como nos já interpostos nomeadamente no já sob Execução n° 74/2011-A, porque a suspensão não lesa o interesse público (antes o defende) e dos documentos juntos e elementos dos fundamentos supra resulte patente a legalidade do recurso a interpor e nos já interpostos e não indícios da sua ilegalidade,
    REQUEREM a V. Exa. se digne conceder a suspensão da eficácia do acto recorrido.”
    
    O Exmo Senhor Chefe do Executivo do Governo da Região Administrativa Especial de Macau, entidade ora requerida, apresentou a sua contestação, pronunciando-se pelo não acatamento do pedido, em suma:
    1) Por ser o acto de conteúdo puramente negativo, não podendo a eficácia do acto administrativo ser suspensa, nos termos do artigo 120.° do CPAC.
    No entanto, para o caso de assim não se entender, sempre se requer a V. Exas. se dignem:
    2) Considerar não verificados, muito menos cumulativamente, quaisquer dos requisitos a que se referem as alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 121.° do CPAC,
    - Por não se descortinarem prejuízos de difícil reparação para as requerentes ou para os seus interesses, que possam resultar da execução do acto;
    - Por a suspensão do acto em causa determinar grave lesão do interesse público concretamente prosseguido; e
    - Por resultarem fortes indícios de ilegalidade do recurso interposto.
    
    O Consórcio entre a C - INVESTIMENTOS E SERVIÇOS, S.A., D - INDÚSTRIA E GESTÃO DE ÁGUAS, S.A. e F CO., LTD., "Contra-interessado", adjudicatário no Concurso Público Internacional para a "Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau", veio apresentar a sua CONTESTAÇÃO, concluindo, em rotunda síntese, que, não resultando da anulação do acto administrativo qualquer benefício para as requerentes e não sendo o seu interesse directo, não lhes assiste legitimidade para obter a anulação pretendida, nos termos previstos na alínea d) do n.º 2 do artigo 46.º do CPAC.
    Termos em que deve ser:
    Indeferido o pedido de suspensão de eficácia do acto de admissão das Requerentes ao Concurso, ora em apreço, por falta de preenchimento dos requisitos do artigo 120.º do CPAC,
    Ou, caso assim não se entenda,
    Indeferido o mesmo pedido, por não estarem preenchidos os pressupostos consagrados no artigo 121.º do mesmo diploma.
    
    A, com sede na Bélgica e B Technology Co. Ltd., com sede em Pequim, tendo sido notificados da junção aos autos do despacho em que o Exmo. Senhor Chefe do Executivo declara grave prejuízo para o interesse publico a não imediata execução do seu citado despacho, vieram oportunamente pronunciar-se sobre a oposição à suspensão de eficácia por banda da entidade recorrida, chamando a atenção que o objecto do recurso não punha em causa o interesse público e que este não estaria suficientemente referenciado ou integrado.

    O Digno Magistrado do MP oferece o seguinte douto parecer:
    Do algum emaranhado que constitui o presente procedimento preventivo, ousamos concluir pretenderem os requerentes a suspensão de eficácia do despacho do Chefe do Executivo de 16/3/12 que, anuindo a informação do GDI de 8/3/12, procurou, alegadamente, dar cumprimento ao acórdão do TUI de 15/2/12, prolatado no proc. 112012, que anulou despacho daquela entidade de 4/11/10 que, em sede de recurso hierárquico, mantivera deliberação da Comissão de Abertura das Propostas que excluiu a proposta dos requerentes ao Concurso Público Internacional para a "Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau" (ETAR).
    Tal despacho suspendendo anuiu à citada "Informação", do teor seguinte:
    "A - A fim de ser dado cumprimento espontâneo à decisão do TUI no recurso contencioso interposto pelo Concorrente n.º 2, A / B TECHNOLOGY CO. LTD., em consórcio, caso se entenda não ser de invocar a causa legítima de inexecução, torna-se necessário a prática de um acto do Senhor Chefe do Executivo que admita o referido concorrente e a respectiva proposta no concurso público internacional para "Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau".
    B - No mesmo despacho deverá ser designada a mesma comissão de avaliação das propostas que efectuou a avaliação das propostas dos Concorrentes n.ºs 4 e 5, para efectuar agora a avaliação conjunta das propostas dos Concorrentes n.ºs 2, 4, 5 e 6, em obediência ao princípio da estabilidade do procedimento do concurso, bem como aos princípios da transparência, da igualdade e da imparcialidade.
    C - Em função da avaliação efectuada, a comissão de avaliação das propostas deverá informar, propondo a manutenção da decisão de adjudicação anteriormente efectuada, ou a sua revogação fundada em invalidade superveniente e substituição por outra que espelhe o novo resultado de avaliação.
    D - Enquanto não houver resultado da avaliação, e respectivo despacho superior que o sancione, não deverá ser celebrado o contrato com o actual adjudicatário, deforma a melhor proteger a posição da RAEM- mantendo com este a relação jurídica numa base pré-contratual."
    Atento tal teor, mal se compreende a pretensão dos recorrentes: sendo certo que através do despacho em questão os mesmos obtiveram a sua admissão e respectiva proposta ao concurso em questão, revela-se evidente que, sendo-lhes favorável, não será, concerteza, a suspensão dessa decisão que almejarão.
    Ao que se colhe da argumentação respectiva, o efectivamente pretendido será a suspensão da manutenção da adjudicação " ... entretanto feita a outra concorrente e sem reabrir o Concurso na fase em que se encontrava à data da exclusão fase de concorrentes ainda não avaliados mas apenas admitidos e não admitidos)."
    A questão é que, desde logo, não se descortina, pelo externado pelo acto, a menção expressa daquela manutenção de adjudicação. O que apenas se determina é que (ponto C) "Em função da avaliação efectuada, a comissão de avaliação das propostas deverá informar, propondo a manutenção da decisão de adjudicação anteriormente efectuada, ou a sua revogação fundada em invalidade superveniente e substituição por outra que espelhe o novo resultado de avaliação", mais se acrescentando (ponto D) que "Enquanto não houver resultado da avaliação, e respectivo despacho superior que o sancione, não deverá ser celebrado o contrato com o actual adjudicatário, de forma a melhor proteger a posição da RAEM, mantendo com este a relação jurídica numa base pré-contratual."
    De modo que, aparentemente, a esgrima será contra "moinhos de vento".
    Talvez por isso, acabam os requerentes por empreender numa outra fórmula, dirigindo o meio preventivo contra o não cancelamento da adjudicação.
    Mas, nessa perspectiva (de resto, também omissa no externado pelo acto), estar-se-ia perante acto de conteúdo negativo, sendo que, em virtude de hipotético deferimento da suspensão de eficácia, as coisas continuariam, a tal nível, rigorosamente na mesma, já que não seria possível, por este meio, obterem os requerentes decisão administrativa de sentido inverso ou seja, de prévia revogação do acto de adjudicação.
    É claro que nada disto tem a ver com considerações atinentes ao cumprimento efectivo, à execução cabal do decidido pelo TUI, matéria a ser escrutinada nos meios próprios, que os requerentes não terão deixado de empreender, sendo certo que o não deixaram de fazer relativamente ao próprio acto de adjudicação (proc. 734/2011).
    Seja como for, quer porque o acto suspendendo não contém qualquer menção expressa quer à manutenção, quer ao não cancelamento da adjudicação a que os requerentes se reportam, quer por que, no que se mostra expresso, o conteúdo do mesmo não lhes acarreta ónus ou encargos, não denegando, retirando ou extinguindo quaisquer direitos ou expectativas legítimas, somos a concluir pela ilegitimidade dos recorrentes para o pedido em causa, dado dela carecerem para o recurso contencioso do mesmo acto, tudo, nos termos do n° 1 do art° 121°, CPAC.
    Ou, se assim se entender, na esteira do já decidido no Venerando TUI, em recente ac. de 23/5/12, in proc. 22/2012, por o acto em questão, determinando a reabertura de concurso público com admissão de propostas de concorrentes, se mostrar irrecorrível, por não ser definitivo nem lesivo de quaisquer interesses nem dos requerentes nem dos outros recorrentes, não produzindo efeitos externos, assistindo-se, assim, ao não preenchimento do requisito contemplado na al. c) da norma supra referida, ou seja, por resultarem do processo fortes indícios da ilegalidade do recurso.
    "Soit quíl soit", certo é que, em nossa perspectiva, haverá que soçobrar, liminarmente o peticionado.
    Nesta perspectiva, o pedido de execução indevida (art° 127°, CPAC) formulado pelos requerentes relativamente ao despacho do Chefe do Executivo de 7/5/12 encontrar-se-á prejudicado.
    De todo o modo, não deixa de ser bizarro tal pedido, quando aquele despacho, em nome da grave lesão para o interesse público que adviria da suspensão, decidiu apenas manter a eficácia do acto de admissão dos requerentes bem como da respectiva proposta ao concurso em questão ! É obra!
    
    Foram colhidos os vistos legais.
    
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito.
    
    III - FACTOS
    Com pertinência, resultam dos autos os factos seguintes:
- Tendo sido aberto em 25 de Junho de 2010 o Concurso Público Internacional de “Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”, no qual o ora requerente tinha sido excluída.
- Dos sete candidatos ao Concurso Público Internacional só 3 consórcios foram admitidos na Sessão Pública (os Consórcio ora indicados como contra-interessados), vindo a proposta do Consórcio A, admitida condicionalmente, a ser excluído na continuação da Sessão de Abertura realizada no dia 30 de Junho de 2010, exclusão que foi anulada por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 27 de Outubro de 2011, pendente de recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância.
- Do acto de exclusão, a requerente tinha interposto recurso contencioso, e finalmente obteve provimento em consequência do acórdão do Tribunal de Última Instância, de 12 de Outubro de 2011, que anulou o acto de exclusão da ora requerente ao Concurso Público.
- Por Despacho de 9 de Novembro de 2011, o Chefe do Executivo concordou com a Informação Proposta nº 995/GDI/2011, de 24 de Outubro de 2011, que propunha, por virtude da execução do dito acórdão do Tribunal de Última Instância, de 12 de Outubro de 2001, a reabertura do Acto Público do Concurso Internacional acima identificado, para readmissão da ora requerente àquele concurso internacional, tendo a mesma sido publicitada por Aviso do GDI, publicado no Boletim Oficial de 23 de Novembro de 2011 e realizada em 25 de Novembro 2011.
    - O acto recorrendo objecto do Pedido de Suspensão de Eficácia aqui deduzido é o douto despacho do Exmo Chefe do Executivo de 16.03.2012 reproduzido in fls.. 3 a 16 da Certidão junta como Doc. n° 1, na parte em que admite as requerentes a concurso já objecto de Acto Final de Adjudicação de 05.Agosto.2011, conforme parecer e proposta que aqui se dão por reproduzidas e cujas conclusões são as seguintes:
    “ (...)
    "A - A fim de ser dado cumprimento espontâneo à decisão do TUI no recurso contencioso interposto pelo Concorrente n.º 2, A / B TECHNOLOGY CO. LTD., em consórcio, caso se entenda não ser de invocar a causa legítima de inexecução, torna-se necessário a prática de um acto do Senhor Chefe do Executivo que admita o referido concorrente e a respectiva proposta no concurso público internacional para "Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau".
    B - No mesmo despacho deverá ser designada a mesma comissão de avaliação das propostas que efectuou a avaliação das propostas dos Concorrentes n.ºs 4 e 5, para efectuar agora a avaliação conjunta das propostas dos Concorrentes n.ºs 2, 4, 5 e 6, em obediência ao princípio da estabilidade do procedimento do concurso, bem como aos princípios da transparência, da igualdade e da imparcialidade.
    C - Em função da avaliação efectuada, a comissão de avaliação das propostas deverá informar, propondo a manutenção da decisão de adjudicação anteriormente efectuada, ou a sua revogação fundada em invalidade superveniente e substituição por outra que espelhe o novo resultado de avaliação.
D - Enquanto não houver resultado da avaliação, e respectivo despacho superior que o sancione, não deverá ser celebrado o contrato com o actual adjudicatário, deforma a melhor proteger a posição da RAEM- mantendo com este a relação jurídica numa base pré-contratual."
- Pretendendo interposto recurso contencioso deste acto, relativo à parte em que se entende ter sido mantida a adjudicação, requereu por isso a presente suspensão da eficácia do mesmo acto.

    IV - FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso passa por saber se se verificam os pressupostos que possibilitam a suspensão da eficácia do acto praticado.
    O instituto da suspensão de eficácia do acto administrativo traduz-se numa medida de natureza cautelar, cujo principal objectivo é atribuir ao recurso, de que é instrumental, o efeito suspensivo. Isto porque, como regra, o recurso contencioso de anulação tem sempre efeito meramente devolutivo, já que o acto administrativo a impugnar goza de presunção de legalidade e do privilégio da executoriedade, entendida esta como “a força que o acto possui de se impor pela execução imediata, independentemente de nova definição de direitos”. 1
Faz parte da justiça administrativa a possibilidade de quem recorre ver suspensos os efeitos do acto sobre o qual recai a invocação de ilegalidade, porque, como dizia Chiovenda, «o tempo necessário para obter a razão não deve converter-se em dano para quem tem razão».
Importará ter presente, em sede desta introdução, que “o princípio da legalidade da Administração Pública ampliou-se, transformando-se num princípio de juridicidade; a presunção de legalidade de que gozavam os actos administrativos perdeu razão de ser; a emergência de uma nova geração de direitos fundamentais juridicizou a eficácia e a eficiência e colocou a prevenção e a precaução na ordem do dia; finalmente, o direito à tutela jurisdicional efectiva ganhou dimensão constitucional.”2

2. Há uma questão prévia que importa referir.
   Vem suscitado nos autos o incidente do pedido de suspensão provisória previsto no artigo 126º do CPAC, pedido este a que o requerente se opõe por execução indevida.
    Importaria conhecer previamente este incidente, não fora o caso de se considerar prejudicado o seu conhecimento, vista a tramitação desenvolvida que trouxe ao Relator no mesmo momento o processo para despacho, prejudicialidade essa que resultará da decisão a proferir sobre o pedido de suspensão de eficácia do acto, como adiante se verá.
    
    3. Requisitos da suspensão de eficácia do acto
    Prevê o art. 121º do CPAC:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
    Da observação desta norma é fácil verificar que não importa nesta sede a análise da questão de fundo, de eventuais vícios subjacentes à decisão impugnada, tendo, no âmbito do presente procedimento preventivo e conservatório, que se partir, por um lado, da presunção da legalidade do acto e da veracidade dos respectivos pressupostos - fumus boni iuris -, por outro, de um juízo de legalidade da interposição do recurso.
    Tal como foi decidido no acórdão do Tribunal de Última Instância de 13 de Maio de 2009, proferido no processo n. 2/2009, para aferir a verificação dos requisitos da suspensão de eficácia de actos administrativos é evidente que se deve tomar o acto impugnado como um dado adquirido. O objecto do presente procedimento preventivo não é a legalidade do acto impugnado, mas sim se é justo negar a executoriedade imediata dum acto com determinado conteúdo e sentido decisório. Assim, não cabe discutir neste processo a verdade dos factos que fundamentam o acto impugnado ou a existência de vícios neste.3
    A suspensão dessa eficácia depende assim da verificação dos três requisitos das alíneas a), b) e c) do n.º 1 artigo 121º do C.P.A.C.: previsível prejuízo de difícil reparação para o requerente, inexistência de grave lesão de interesse público pelo facto da suspensão e o não resultarem do processo fortes indícios da ilegalidade do recurso.
    
    4. Resulta da Doutrina e Jurisprudência uniformes que os requisitos previstos no art. 121º supra citado são de verificação cumulativa, pelo que, não se observando qualquer deles, é de improceder a providência requerida.4
    Daí que a ponderação da multiplicidade de interesses, públicos e privados, em presença, pode atingir graus de complexidade dificilmente compagináveis com a exigência de celeridade da decisão jurisdicional de suspensão dos efeitos da decisão impugnada. Sem falar no facto de o interesse público na execução do acto não se dissociar de relevantes interesses particulares e o interesse privado da suspensão tão pouco se desligar de relevantes interesses públicos, sendo desde logo importantes os riscos económicos do lado público e do lado privado, resultantes quer da decisão de suspensão dos efeitos quer da decisão de não suspensão.
    É importante reconhecer que a avaliação da juridicidade da decisão impugnada em tribunal reside hoje, muitas vezes, no refazer metódico da ponderação dos diferentes interesses em jogo.
    
    5. A lei não impõe o conhecimento de tais requisitos por qualquer ordem pré determinada, mas entende-se por bem que os requisitos da al. c), relativos aos indícios de ilegalidade do recurso, por razões lógicas e de precedência adjectiva deverão ser conhecidos antes dos demais e ainda, antes de todos, o pressuposto relativamente à legitimidade do requerente, já que a norma fala exactamente em quem tenha legitimidade para deles interpor recurso e, seguidamente, nos requisitos elencados nas diversas alíneas.
    Até porque a existência de fortes indícios da ilegalidade da interposição do recurso reporta-se às condições de interposição ou pressupostos processuais e não às condições de natureza substantiva ou procedência do mesmo.5
    
    6. Por outro lado, e uma vez que a questão vem colocada, importa ter presente que o art.º 120º do CPAC prevê que só há lugar a suspensão de eficácia quando os actos tenham conteúdo positivo ou, tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
    E o que importará, para se determinar se um acto administrativo é de conteúdo positivo ou negativo e se um acto negativo tem ou não vertente positiva, é a influência, a alteração introduzida pela prolação do acto na esfera jurídica do interessado.
    É, no entanto a Doutrina e Jurisprudência que assinalam que, não obstante estarmos perante um acto de conteúdo negativo continua a ser possível a suspensão se esse acto produz acessoriamente efeitos de natureza secundária, caso em que a suspensão a ser decretada tornaria possível a manutenção ou conservação de uma situação jurídica anterior. Trata-se daqueles casos em que para além de um conteúdo denegatório de uma pretensão de ampliação da esfera jurídica de um particular o acto em causa tenha o aludido efeito secundário que se traduz na ablação de um bem jurídico pré-existente, paralisando assim os efeitos secundários de natureza positiva, tal como acontece, designadamente, nos pedidos de prorrogação ou manutenção de situações jurídicas, sempre que a lei admita tal prorrogação ou manutenção.6
    Isto para já não falar na admissibilidade da suspensão dos actos negativos, como refere Vieira de Andrade, desde que haja utilidade nessa suspensão e a aparência de bom direito.7
    
    7. Dentro do enquadramento abstracto e perfunctório que se vem realizando a propósito dos requisitos de suspensão de eficácia do acto, como está bem de ver, é pressuposto do procedimento a existência de um acto administrativo, enquanto conduta voluntária de um órgão da Administração, no exercício de um poder público e na prossecução de interesses postos por lei a seu cargo produtora de efeitos jurídicos num caso concreto8 e que esse acto seja recorrível.
Nos termos do nº 1 do art.º 28º do CPAC, “são actos administrativos contenciosamente recorríveis os que, produzindo efeitos externos, não se encontram sujeitos a impugnação administrativa necessária”.
E só os actos externos, definitivos e executórios são susceptíveis de recurso contencioso.
Os actos são definitivos ou não definitivos consoante se contenham resolução final que define a situação jurídica da pessoa cujo órgão se pronunciou ou de outra que com ela está ou pretende estar em relação administrativa.
E a resolução final é o acto que ponha termo a um processo gracioso ou a um incidente autónomo desse processo e de que não caiba recurso na ordem hierárquica.
Sendo de registar ainda que a definição de situações jurídicas difere da produção de efeitos jurídicos na medida em que se traduz numa decisão que fixa os direitos da Administração ou os dos particulares, ou os respectivos deveres, nas suas relações jurídicas. 9
   
   8. O caso
   Importa analisar agora a situação em concreto.
   Trata-se de um caso em que as requerentes, candidatas ao concurso em causa (chamemos-lhe Tratamento de Águas) dele foram excluídas.
   Reagiram contenciosamente e acabaram por ter sucesso no TUI que lhes deu razão anulando o acto e procedimento concursal.
   Posteriormente, dando execução ao decidido pelo TUI o Governo pela pena do Exmo Senhor Chefe do Executivo que anuiu e deu corpo e expressão jurídica ao parecer tendente à execução do acórdão, empreendeu a conduta proposta naquele despacho, já acima transcrito.
   Compreende-se a preocupação da requerente. O concurso de tratamento das águas foi anulado, mas afigura-se-lhe que a empresa adjudicatária continua no terreno e a operar. E temos de reconhecer que essa adjudicação de jure se mantém.
O que as requerentes pretenderiam é que a adjudicatária, o consórcio C e C.ª, saísse da operação e o que parece é que, também de facto, aquela C.ª continua a operar.
   
   9. Não estamos em condições de operar qualquer crítica em termos de administração da coisa pública de forma a dizer como pode o serviço público que se impõe, urge e se assume como vital, como pode ele ser assegurado se não fosse desta forma. Essa é matéria que não cabe ao Tribunal.
   O certo é que o despacho proferido não se deixa de compreender como a expressão de uma vontade em dar execução ao que foi decidido pelos Tribunais.
   Por outro lado, não deixa de transparecer dele uma aparente contradição, pois que ali se diz que, feita uma nova reavaliação dos candidatos, das duas uma: ou se mantém a anterior adjudicação ou será revogada e substituída por outra que espelhe o resultado de uma outra avaliação. Parece que se mantém a anterior adjudicação enquanto por outro lado se percebe a vontade de repetir o concurso, admitir e reavaliar, o que não se compagina bem com a manutenção de alguns efeitos do que anulado foi.
   Neste último sentido parece que não devem recear as requerentes. Mas receiam porque, não obstante se inculcar no sentido de que a operação da adjudicatária que está no terreno o seja em termo de um enquadramento pré-contratual, não deixam de permanecer algumas dúvidas sobre a situação jurídica em que ela está a operar, já que se fala em manutenção da adjudicação ou revogação da mesma, o que dá a ideia de que a adjudicação se mantém.
   É evidente, concede-se, que, sob o ponto de vista subjectivo isto faz temer e agrava os receios das interessadas, ora requerentes, no sentido de esta actuação implicar uma posição, um ferro, um marco que determinará, porventura, uma posição dominante.
   
   10. E não deixa de se admitir que eventualmente se imponha expressamente a declaração de nulidade da adjudicação anteriormente feita como flui do artigo 122º, n.º 2, i) do CPA. Mas essa é outra questão de que não cabe agora curar e se traduz na omissão de um acto que devia ter sido praticado e não foi.
   Situamo-nos, pois, no domínio dos receios, das especulações, das dúvidas e incertezas quanto a um desfecho que não seja favorável às pretensões das requerentes. Ora, sobre isso, este Tribunal nada pode fazer, pela razão simples de que não há ainda um acto final lesivo para os interesse da requerente, constatando-se que estamos ainda perante a execução da anulação de um contrato e que os actos praticados no âmbito dessa execução, conduzem à integração da requerente como concorrente, satisfazendo a sua pretensão.
   Situação que não deixa de ser algo bizarra, como bem anota o Digno Magistrado do MP, não se compreendendo como podem as requerentes pretender a anulação com prévia suspensão de um acto que, no fundo, as admite e as coloca na linha de partida em igualdade com os demais.
   Não se pode esgrimir contra moinhos de vento ou contra fantasmas.
   11. Admitamos mesmo que se pretendia suspender o acto na parte em que, como dizem as requerentes, se manteve a adjudicação.
   Desde logo, como se viu, não é pacífico, não é translúcido, não obstante as dúvidas já enunciadas, que o despacho seja expresso em tal manutenção - o que não implica que tal situação jurídica se mantenha também como tal já se observou -, importando, de todo o modo, não confundir a satisfação de uma necessidade básica e vital para a população com a conversão dessa situação de facto em jurídica.
   E neste passo chamamos a atenção para o acto na parte em que se alude a uma definição como que pré-contratual da situação em que a adjudicatária se encontra.
   Mas, por mera hipótese de raciocínio, admitindo que a adjudicação se mantém porque não foi praticado um acto anulatório ou de declaração da nulidade do acto, então, perguntamo-nos, o que é que se suspenderia?
   Responderá o requerente: o acto que manteve essa adjudicação. Não, dir-se-á, aí, não houve acto que manteve a adjudicação; o que houve foi um acto omissivo, quanto muito, que a não extinguiu. E, então, sendo assim, quais os efeitos práticos da suspensão da eficácia de um acto que não foi praticado? Nenhuns.
   Admite-se até, não obstante a falta de clareza do petitório quanto a esse desiderato, que em relação ao acto praticado em que se determina a admissão e reavaliação das requerentes elas o não pretendem enquanto a outra se mantiver como adjudicatária
   Estaremos, no entanto, sempre perante uma situação que não configuramos como lesiva dos interessas das requerentes, não resultando para já uma consequência negativa dessa permanência para as requerentes que foram admitidas e irão ser avaliadas a par daquela.
   Na verdade, não se concretiza em que medida a permanência daquela já lesou os interesses das requerentes e se os vai lesar no futuro é questão que se mostra prematura.
   Essa questão - a da permanência do referido consórcio C e outros - deve ser colocada pelo requerente, não nesta sede procedimental cautelar, mas sim em sede da própria execução do acto, importando não esquecer que mesmo os actos de execução de um acto só podem ser atacados por vícios próprios e autónomos.
   A natureza do recurso contencioso pressupõe uma prévia definição de direitos por autoridade competente.10
   A Administração ainda não disse aqui a sua última palavra e colhe-se desse despacho do Exmo Senhor Chefe do Executivo uma vontade em dar execução à anulação do contrato e em não só admitir os excluídos como em reavaliá-los.
   Donde, por todas estas razões e por não se configurar o acto praticado como lesivo, não se alcançar como possa ter êxito alguma pretensa suspensão de eficácia que não deixa de perder sentido ao pretender-se com ele bulir com a manutenção da adjudicação. É que, mesmo a admitir-se que tal acto seria suspenso, daí não decorre necessariamente que por via dessa suspensão se poria termo à adjudicação, sendo essa a vertente enfatizada pelas requerentes no artigo 1º da sua petição de recurso.
   Em sentido não exactamente idêntico, mas por trilhos em certa medida próximos aos ora traçados, colhemos os ensinamentos plasmados no acórdão do TUI, processo n.º 22/2012, de 23 de Maio último.
   
   12. Mas vamos até admitir, por mera hipótese de raciocínio, que no referido e respectivo segmento evidenciado pelo requerente no seu pedido de suspensão do acto - “... mantendo essa adjudicação e negando a reintegração das requerentes na situação de admitidas na fase de concorrentes ainda não avaliados mas apenas admitidos ...” se podia ler escondidamente que o Governo encenava aí uma farsa.
   Essa pretensa encenação só se converte em realidade se por causa dela, se por causa da manutenção da adjudicação as requerentes vierem a ser excluídas.
   Ora isto ainda não se observou, pois, ao contrário do que afirmam, não só foram admitidas, como se mantêm na corrida, como nem sequer se sabe quem vai ser avaliado em primeiro lugar e quem vai ganhar. Todas as hipóteses estão em aberto e é o próprio despacho que o diz.
   Não está excluída a hipótese de as requerentes virem a ganhar ou até, em qualquer momento, a Administração vir a declarar expressamente a nulidade da adjudicação mantida.
   E se assim é, então onde está o prejuízo da requerente? Não estando excluída e mantendo-se na corrida não se vislumbra onde esteja o prejuízo para as requerentes, para mais de difícil reparação, ou para os seus interesses futuros, pressuposto decorrente do pedido de suspensão de eficácia do acto como acima visto.
   A disputa está aberta a todos os concorrentes, todos estão na grelha da partida e a meta não está neste momento interdita a quem quer que seja.
   Se a adjudicatária, o consócio C e outros está a correr, está a fazê-lo na pista ao lado, noutra vertente, noutro quadro. Perante o quadro que se desenha, perante o despacho posto em crise não deixará de ter de correr na pista própria ao lado dos outros concorrentes e partindo com eles.
    Erram, pois, as requerentes, enquanto pretendem ver-se excluídas. Sinceramente que não é isso que em boa razão transparece do despacho. Não podem as requerentes impor a sua visão e forma de execução ao procedimento que vise a reposição da situação resultante da anulação do concurso. Essa é matéria que compete à Administração e até ao momento ainda não se viu que dessa actuação tenha resultado lesão do interessado particular, convindo não esquecer a particularíssima e relevantíssima especialidade do interesse público que está em causa e não pode ter hiatos, não se vislumbrando para já qualquer lesão do particular interessado.
   A providência em curso não deixará, pois, por todas as razões acima invocadas, de se ter por não admitida, tendo-se por não verificado o requisito da al. a) do n.º 1 do art. 121º do CPAC.
    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, nos termos e fundamentos expostos, acordam em não conceder a requerida suspensão de eficácia do acto.
    Custas pela requerente, com 6 UC de taxa de justiça
                Macau, 7 de Junho de 2012

(Relator) João A. G. Gil de Oliveira

(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng

(Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho

Estive presente Mai Man Ieng
1 - Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo”, 8º ed., 409
2 - Maria da Glória Garcia, Professora das Faculdades de Direito da Universidade de Lisboa e da Universidade Católica Portuguesa, Suspensão de Eficácia do Acto Administrativo

3 Ac. TUI 37/2009, de 17/Dez.
4 - Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 3ª ed., 176; v.g. Ac. do TSI, de 2/12/2004, proc.299/03
5 - Ac. STA 46219, de 5/772000, www//:http.dgsi.pt
6 - Pedro Machete, O Direito, 123, 304
7 - Lições de Dto Administrativo e Fiscal, 124 e ac. STA, processo n.º 042206, de 15/5/97
8 - Marcello. Caetano, Manual de Dto Adm., 10ª ed., I, 428
9 Marcello Caetano, ob. cit. 443.
10 - Marcello Caetano, ob. cit, II, 1308
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389/2012 1/37