Processo n.º 474/2012 Data do acórdão: 2012-6-21 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– furto qualificado
– art.o 198.o, n.o 2, alínea g), do Código Penal
– medida da pena
– imigrante clandestino
– prevenção geral do crime
S U M Á R I O
A pena de dois anos e três meses de prisão, imposta ao arguido pelo tribunal recorrido dentro da moldura penal de dois a dez anos de prisão, prevista no art.o 198.o, n.o 2, alínea g), do Código Penal para o crime de furto qualificado por que vinha condenado, já não pode admitir mais margem para redução, precisamente porque as circunstâncias de ausência de antecedentes criminais dele em Macau, de já confissão integral e sem reservas dos factos com arrependimento, e de o numerário contido na carteira furtada ao ofendido não ser muito elevado já ficam totalmente neutralizadas pelo facto de ele ter cometido o crime na qualidade de imigrante clandestino e pela consideração de que são muito elevadas as exigências de prevenção, pelo menos, geral do crime de furto qualificado em questão.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 474/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 173 a 183 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR2-12-0014-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como co-autor material de um crime consumado de furto qualificado, p. e p. pelo art.o 198.o, n.o 2, alínea g), do vigente Código Penal (CP), na pena de dois anos e três meses de prisão efectiva, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para assacar a essa decisão judicial o excesso na medida da pena, por entender não ter o Tribunal Colectivo a quo ponderado, aquando da imposição da dita pena de prisão, as circunstâncias, nomeadamente, de já confissão integral e sem reservas, por ele, dos factos acusados com demonstração do seu sincero arrependimento, para além de ele, aquando da prática do crime, não ter ofendido a integridade física do ofendido e também não sendo grande o valor total dos objectos furtados (cfr. a motivação do recurso de fls. 202 a 205 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público no sentido de improcedência da argumentação do recorrente (cfr. a resposta de fls. 207 a 210).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 201 a 222), pugnando até pela improcedência manifesta do recurso.
Feito subsequentemente o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser decidido em conferência) e corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada no texto do acórdão da Primeira Instância (constante de fls. 173 a 183), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal (CPP).
Outrossim, do teor da acta da audiência em julgamento em primeira instância (lavrada a fls. 171 a 172v), resulta que o arguido ora recorrente prestou declarações sobre o objecto do processo, tendo confessado integralmente e sem reservas os factos.
E de acordo com a fundamentação fáctica do acórdão recorrido, na sua essência: o recorrente, delinquente primário em Macau e então expulso de Macau, entrou de novo em Macau em 11 de Setembro de 2011, cerca das 23:00 horas, por via de barco clandestino; e para obter vantagens ilícitas, associou-se a dois outros homens para formar um grupo criminoso para a prática de furtos; em 12 de Setembro de 2011, cerca das 14:00 horas, ele, em conjugação de esforços com aqueles dois homens, tirou a carteira do ofendido numa via pública, carteira essa que continha no seu interior, nomeadamente, três mil dólares de Hong Kong e dois mil renminbis tudo em numerário; o arguido é agricultor com cerca de três mil renminbis de rendimento mensal, com ensino secundário elementar como habilitações literárias e um filho a seu cargo.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, e no tocante ao unicamente assacado exagero na medida da sua pena de prisão, mostra-se evidente que ante todos os elementos fácticos pertinentes já referidos na parte II do presente acórdão de recurso, e sob a égide sobretudo dos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o do CP, a pena de dois anos e três meses de prisão, imposta ao recorrente pelo Tribunal recorrido dentro da moldura penal de dois a dez anos de prisão, prevista legalmente no art.o 198.o, n.o 2, alínea g), do CP para o crime de furto qualificado por que vinha condenado, já não pode admitir mais margem para redução, precisamente porque as circunstâncias de ausência de antecedentes criminais dele em Macau, de já confissão integral e sem reservas dos factos com arrependimento, e de o numerário contido na carteira furtada não ser muito elevado já ficam totalmente neutralizadas pelo facto de ele ter cometido o crime na qualidade de imigrante clandestino e pela consideração de que são muito elevadas as exigências de prevenção, pelo menos, geral do crime de furto qualificado em questão, cujo tipo foi criado pelo legislador para punir quem furtar (e não roubar) coisa móvel alheia “como membro de grupo destinado à prática reiterada de crimes contra o património” (pelo que se patenteia também descabida a tese do arguido de que ele pessoalmente não tenha chegado a praticar reiteradamente crimes contra o património, ou de que ele não tenha ofendido a integridade física do ofendido dos autos).
Naufraga, assim claramente, o recurso, que como tal deve ser rejeitado em conferência, nos termos conjugadamente ditados pelos art.os 409.o, n.o 2, alínea a), e 410.o, n.o 1, do CPP.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso.
Custas pelo arguido recorrente, com duas UC de taxa de justiça e três UC de sanção pecuniária, e mil e trezentas patacas de honorários a favor do seu Exm.o Defensor Oficioso, a adiantar, por ora, pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 21 de Junho de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
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