Processo n.º 454/2012 Data do acórdão: 2012-6-21 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– suspensão da pena
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal
– condenação anterior
– condução sob influência de estupefaciente
S U M Á R I O
Como a suspensão da execução da pena única de prisão então decretada no outro processo penal anterior do arguido recorrente pelo crime de consumo ilegal de estupefaciente e pelo de detenção indevida de utensilagem já não conseguiu evitar a prática, por ele, e ainda dentro desse período de suspensão da pena, do crime de condução sob influência de estupefaciente agora em questão, com a agravante de que são também elevadas as exigências de prevenção geral deste delito em Macau, é realmente impensável formar no presente processo qualquer juízo de prognose favorável em sede do art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal, ainda que ele tenha profissão estável, tenha colaborado na realização do teste hospitalar para descoberta da verdade no caso e tenha confessado integralmente e sem reservas os factos na audiência e mesmo que isto tenha representado o já sincero arrependimento dele na prática do crime.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 454/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 18v a 20v dos autos de Processo Sumário n.° CR4-12-0075-PSM do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de um crime consumado de condução sob influência de estupefaciente, p. e p. pelo art.o 90.o, n.o 2, da Lei n.o 3/2007, de 7 de Maio (Lei do Trânsito Rodoviário), na pena de três meses de prisão efectiva e na inibição de condução por um ano e seis meses, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando concreta e unicamente a essa decisão condenatória a violação do art.o 48.o, n.o 1, do vigente Código Penal (CP), para rogar que passasse a ser decretada a suspensão da execução da sua pena de prisão, atendendo sobretudo que ele tem profissão estável, confessou os factos imputados e demonstrou assim o seu já sincero arrependimento, bem como colaborou na realização de teste à sua urina para descoberta da verdade no caso, para além de que em outros processos penais decididos pelo TSI, só se aplicou prisão efectiva a partir da terceira condenação do agente por crimes relativos à droga (cfr. a motivação de fls. 34 a 37 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 48 a 52v) no sentido materialmente de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fl. 62 a 63), pugnando pela manifesta improcedência do recurso.
Feito subsequentemente o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser decidido em conferência) e corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada no texto da sentença recorrida (concretamente, desde a 9.a linha da fl. 18v até à 14.a linha da fl. 19 dos autos), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal (CPP), segundo a qual, e, na sua essência:
– em 22 de Abril de 2012, às 22:15 horas, o arguido conduziu um veículo automóvel ligeiro numa via pública e foi interceptado pela Polícia;
– aquando da investigação, a Polícia descobriu que o arguido não conseguia responder às perguntas e tinha pó branco no nariz;
– do teste hospitalar a que se sujeitou depois o arguido, resultou provada a reacção positiva quanto à substância Ketamina;
– o arguido consumiu Ketamina em 22 de Abril de 2012 num centro de massagem na cidade de Gongbei, e depois conduziu automóvel em Macau cerca das 22:15 horas do mesmo dia;
– o arguido sabia da natureza da substância referida como produto controlado pela legislação de Macau;
– o arguido agiu livre, consciente e voluntariamente, e sabia que a sua conduta era proibida e punível por lei;
– o arguido declara que começou a consumir Ketamina há cerca de um ano, que tem por habilitações literárias o 2.o ano do curso universitário, que tem por profissão empregado de venda de automóveis com salário mensal de quatro mil e quinhentas patacas e que precisa de dar três mil patacas por mês aos pais para sobrevivência destes;
– segundo o certificado de registo criminal, o arguido não é delinquente primário: em 16 de Dezembro de 2011, foi condenado no Processo Sumário n.o CR3-11-0240-PSM pela prática de um crime ilegal de consumo de estupefaciente e de um crime de detenção indevida de utensilagem, na pena única de dois meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com regime de prova e sujeição ao tratamento de toxicodependência e ao acompanhamento pelo Instituto de Acção Social e do Departamento de Reinserção Social, decisão condenatória essa já transitada em julgado em 9 de Janeiro de 2012;
– o arguido confirmou ainda o teor da listagem de infracções estradais constante de fls. 7 e 8 dos autos.
Outrossim, da acta da audiência em julgamento em primeira instância (lavrada a fls. 17 a 21 e na qual se contém o texto da sentença ora recorrida), consta que o arguido confessou integralmente e sem reservas os factos imputados.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, é de conhecer agora da unicamente levantada questão de violação, pelo Tribunal a quo, do art.o 48.o, n.o 1, do CP.
A este respeito, e ante todos os elementos fácticos pertinentes já referidos na parte II do presente acórdão de recurso, é patente que não se pode concordar com a tese do recorrente segundo a qual nesta vez, a simples censura dos factos e a ameaça da pena de prisão também já consigam realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição do crime por que vinha condenado na sentença recorrida, ainda que ele tenha profissão estável, tenha colaborado na realização do teste hospitalar e tenha confessado integralmente e sem reservas os factos na audiência e mesmo que isto tenha representado o já sincero arrependimento dele na prática do crime.
Na verdade, se a suspensão da execução, pelo período de um ano, da pena única de dois meses de prisão então decretada no outro processo penal anterior (com o n.o CR3-11-0240-PSM) do recorrente (pelo crime de consumo ilegal de estupefaciente e pelo de detenção indevida de utensilagem), já não conseguiu evitar a prática, por ele, e ainda dentro desse período de suspensão da pena, do crime de condução sob influência de estupefaciente agora em questão (concretamente cometido em 22 de Abril de 2012), com a agravante de que são também elevadas as exigências de prevenção geral deste delito em Macau, é realmente impensável formar no presente processo qualquer juízo de prognose favorável em sede do art.o 48.o, n.o 1, do CP.
Dest’arte, é de rejeitar o recurso em conferência por ser manifestamente improcedente (cfr. os art.os 409.o, n.o 2, alínea a), e 410.o, n.o 1, do CPP), sendo de notar que cada caso é um caso, cuja solução depende da análise do concreto pano de fundo subjacente.
IV – DECISÃO
Em sintonia com o exposto, acordam em rejeitar o recurso.
Custas pelo arguido recorrente, com duas UC de taxa de justiça e três UC de sanção pecuniária.
Passe mandados de detenção e condução contra o arguido, para efeitos de cumprimento da sua pena de três meses de prisão.
Comunique ao Processo Sumário n.o CR3-11-0240-PSM do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, ao Instituto de Acção Social e à Direcção dos Serviços de Justiça.
Macau, 21 de Junho de 2012.
_______________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
_______________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
_______________________
José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
Processo n.º 454/2012 Pág. 1/8