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Processo nº 393/2012 Data: 14.06.2012
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Acidente de viação.
Enxerto civil.
Fundo de Garantia Automóvel e Marítimo.
Responsabilidade solidária.
Indemnização.
Danos patrimoniais.
Danos não patrimoniais.



SUMÁRIO

1. Os art°s 3°, n.° 4, e 14°, al. d), do D.L. n.° 24/86/M de 15 de Março, que regulamenta o “acesso aos cuidados de saúde”, não isenta o A do pagamento das despesas hospitalares tidas por lesado de acidente de viação.

2. A indemnização por danos não patrimoniais tem como objectivo proporcionar um conforto ao ofendido a fim de lhe aliviar os sofrimentos que a lesão lhe provocou ou, se possível, lhos fazer esquecer.
Visa, pois, proporcionar ao lesado momentos de prazer ou de alegria, em termos de neutralizar, na medida do possível, o sofrimento moral de que padeceu.

O relator,

______________________


Processo nº 393/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão proferido pelo Colectivo do T.J.B. decidiu-se – quanto ao pedido civil enxertado, parte que aqui interessa – condenar o A no pagamento de MOP$197,404.20 a favor do demandante B, a título de indemnização dos seus danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos com o acidente de viação matéria dos presentes autos; (cfr., fls. 373 a 374 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Inconformado com o assim decidido, veio o A recorrer para, na sua motivação, produzir as seguintes conclusões:

“I. Sendo de mera garantia a intervenção do A na acção de indemnização, o “papel principal” será sempre do responsável civil e do proprietário do veículo automóvel/sujeito da obrigação de segurar, e não da RAEM;
II. O A apenas responde de forma subsidiária e não na qualidade de responsável directo;
III. O A mais não é do que um garante, um responsável “subsidiário”, já que o principal obrigado é sempre o responsável civil e/ou o proprietário do veículo automóvel/sujeito da obrigação de segurar. E só se estes se furtarem ao cumprimento do seu dever é que o A entra em acção, satisfazendo a indemnização arbitrada;
IV. Ao estabelecer a garantia de satisfação das indemnizações por morte ou lesões corporais, nos casos previstos pelo artigo 23.° do Decreto-Lei n.° 57/94/M, de 28 de Novembro, em que o A é demandado, o legislador prescreveu a subsidiariedade, tendo em vista três objectivos evidentes:
a) Tornar acessível ao A, pela via mais autêntica do próprio interveniente no acidente, a versão deste e todo o material probatório a que doutro modo não acederia;
b) Facilitar ao lesado a satisfação do seu direito, permitindo-lhe optar entre o património do lesante faltoso e a indemnização do A;
c) Tirando partido da presença do responsável, definir de imediato, na medida do possível e sem mais dispêndio processual, os pressupostos de facto e jurídicos em que há-de basear-se o direito de sub-rogação do A;
V. Nos referidos casos, existe uma solidariedade imprópria, imperfeita ou “impura”;
VI. Enquanto no plano externo o lesado pode exigir de qualquer um dos responsáveis-obrigados – do lesante ou do A – a satisfação do seu crédito, já no plano interno, só se for o último a pagar a indemnização é que fica sub-rogado nos direitos lesados, podendo, depois, exigir do lesante tudo aquilo que pagou, acrescido dos juros legais de mora e das despesas efectuadas com a liquidação e cobrança;
VII. Daí que na sentença final devam o responsável civil e o proprietário do veículo automóvel/sujeito da obrigação de segurar ser condenados solidariamente a pagar a quantia reclamada, sendo que a responsabilidade do A é meramente subsidiária daquele;
VIII. No âmbito do processo crime no qual resultou a condenação do A deve também condenar-se solidariamente o ou os responsáveis civis e o proprietário do veículo automóvel/sujeito da obrigação de segurar;
IX. «Não há indemnização sem dano», dado que constitui pressuposto da responsabilidade civil, nos termos do artigo 477.° do Código Civil de Macau, o dano ou prejuízo e o nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima;
X. Ainda que o Demandante tivesse sofrido um prejuízo pelo pagamento das despesas hospitalares – que, como vimos, não sofreu –, ainda assim jamais o A poderia ser responsabilizado pela totalidade de tais despesas, dado que o Demandante concorreu em 70% para a produção do acidente;
XI. O A não é responsável, atento o disposto no n.° 4 do artigo 3.° e na alínea d) do artigo 14.°, ambos do Decreto-Lei n.° 24/86/M, de 15 de Março e, bem assim, nos artigos 477.°, 496.° e 566.° e seguintes do Código Civil de Macau, pelas despesas médicas e hospitalares quando o ofendido não as satisfez e existe um terceiro por elas responsável;
XII. Tendo as vítimas direito a uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, pelos padecimentos sofridos, sendo tal lesão ainda passível de reparação pecuniária, a fixação do respectivo montante há-de ser operada equitativamente, atendendo-se ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica do lesante e do lesado, estando assente que a indemnização nestes casos visará proporcionar ao lesado um prazer capaz de neutralizar a angústia, dor ou contrariedade sofridas;
XIII. O montante de indemnização há-de ser, pois, proporcionando à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida;
XIV. São desajustados e extremamente elevados, se se atentar ao prescrito no artigo 489.°, em conjugação com o disposto no artigo 487.°, e no artigo 564.° do do Código Civil de Macau, à matéria de facto provada e aos valores constantes na jurisprudência da RAEM, para situações semelhantes, os montantes arbitrados pelo Tribunal a quo ao Demandante, a título de danos não patrimoniais;
XV. Mostra-se outrossim adequada ao circunstancialismo do caso em apreço a indemnização de MOP$100.000,00 equitativamente proporcionada face à gravidade dos danos, grau de culpa do agente e do lesado, vistas ainda a situação económica de ambos e demais factualidade descrita nos autos”.

A final, afirma que “deve a sentença recorrida e proferida nestes autos, ser parcialmente revogada e substituída por outra decisão em que (i.) o Co-Demandado responsável pelo acidente, C, e o proprietário do veículo automóvel com a chapa de matrícula MD-XX-XX, D, sejam solidariamente condenados com o Fundo de A – A; (ii.) seja julgado totalmente improcedente o pedido indemnizatório de MOP$158.014,00, a título de despesas hospitalares e medicamentosas; e (iii.) seja arbitrada indemnização consentânea, a título de danos não patrimoniais, que leve em consideração o grau de culpabilidade do agente e do lesado, a situação económica de ambos, e as demais circunstâncias do caso…”; (cfr., fls. 412 a 430).

*

Após resposta do demandado C (cfr., fls. 446 a 452), e admitido o recurso, vieram os autos a este T.S.I..

*

Observados os devidos tramites legais, efectuada a audiência de julgamento do recurso, e nada obstando, cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido, a fls. 369 a 370 dos presentes autos, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Como resulta do que se deixou relatado, três são as questões colocadas pelo A, ora recorrente.

Pretende pois a condenação solidária do arguido, C e de D, que seja alterada, (revogada), a decisão de condenação no montante de MOP$158.014,00 a título de indemnização do ofendido demandante pelas suas despesas hospitalares e medicamentosas, e que se reduza a indemnização pelos danos não patrimoniais do mesmo demandante, (inicialmente) fixada em MOP$500,00,00, para MOP$100,000,00.

Vejamos se tem razão.

–– Quanto à primeira questão.

Preceitua o art. 23° do D.L. n.° 57/94/M de 28.11 que:

“1. O A, adiante designado abreviadamente por FGA, é uma pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, instituída no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.

2. Ao A compete satisfazer as indemnizações por morte ou lesões corporais consequentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório, quando:

a) O responsável seja desconhecido ou não beneficie de seguro válido ou eficaz;

b) For declarada a falência da seguradora.

3. Em todos os actos e contratos relativos aos seus direitos e obrigações, o A está sujeito à jurisdição do direito privado.

4. O limite, por acidente, das indemnizações a satisfazer pelo A é determinado pelas quantias fixadas na tabela constante do Anexo I ao presente diploma”.

Por sua vez, nos termos do art. 25° do mesmo D.L.:

“1. Satisfeita a indemnização, o A fica sub-rogado nos direitos do lesado, tendo ainda direito aos juros de mora legal e ao reembolso das despesas que houver feito com a liquidação e cobrança.

2. No caso de falência da seguradora, o A fica sub-rogado apenas contra aquela.

3. O lesado pode demandar directamente o A, o qual tem a faculdade de fazer intervir no processo o obrigado ao seguro e os co-responsáveis.

4. As pessoas que, estando sujeitas à obrigação de segurar, não tenham efectuado seguro podem ser demandadas pelo A, nos termos do n.º 1, beneficiando do direito de regresso contra outros responsáveis pelo acidente, se os houver, relativamente às quantias que tiverem pago”.

E atento o assim preceituado, mostra-se de considerar que:

“Em face da matéria fáctica assente na decisão final da Primeira Instância, o ora recorrente A nunca pode ser considerado como pessoalmente responsável (nem em sede de responsabilidade civil extracontratual nem contratual) pelos danos causados pelo acidente de viação dos presentes autos, pelo que não se lhe aplicam as regras da “solidariedade de devedores” plasmadas nomeadamente nos art.os 505.o, n.o 1, 506.o, e 490.o do vigente Código Civil (as quais pressupõem naturalmente que qualquer dos “devedores solidários” em questão seja ele próprio um condevedor), mas sim, in casu, a regra de sub-rogação do art.o 25.o, n.o 1, do Decreto-Lei n.o 57/94/M, de 28 de Novembro, ex vi do art.o 23.o, n.o 2, alínea a), deste diploma legal (que reza que “Ao A compete satisfazer as indemnizações... consequentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório, quando: a) O responsável... não beneficie de seguro válido ou eficaz”).
No fundo, o recorrente A é apenas um terceiro (legalmente sub-rogado nos direitos do lesado, uma vez satisfeita a indemnização), e não um condevedor (a quem caberia exercer depois o direito de regresso nos termos do art.o 517.o do Código Civil).
Daí que:
– o direito de regresso de que se fala n.o 4 do art.o 25.o daquele Decreto-Lei é somente benefício das pessoas que, estando sujeitas à obrigação de segurar, não tenham efectuado seguro e que como tal podem ser demandadas pelo A como um sub-rogado nos direitos do lesado, por um lado;
– e, por outro, os “co-responsáveis” a que alude a letra do n.o 3 desse mesmo art.o 25.o são naturalmente co-responsáveis do sujeito obrigado ao seguro;
– e, por fim, a parte inicial da norma desse n.o 3 (no sentido de que “O lesado pode demandar directamente o A”, como uma opção legal à disposição do lesado) também não tem a virtude de alterar a qualidade do A como um terceiro e não um condevedor (cfr. o conceito básico de “sub-rogação pelo credor” definido no art.o 583.o do Código Civil, e a situação de “sub-rogação legal” prevista no art.o 586.o do mesmo Código, cuja parte inicial dá para contemplar a norma do n.o 1 do art.o 25.o do referido Decreto-Lei como uma das “outras disposições da lei”).
Termos em que é impertinente, por estar deslocada do foco da questão acima acabada de ser analisada, a tese defendida pelo A segundo a qual ele o próprio A “apenas responde de forma subsidiária” “do responsável civil e do proprietário do veículo automóvel/sujeito à obrigação de segurar”.
Cabe, pois, ao A pagar primeiro a indemnização à parte lesada no acidente de viação dos autos, e depois, em outra acção autónoma, exercer, querendo, o seu direito processual previsto no n.o 4 do art.o 25.o do Decreto-Lei n.o 57/94/M”.

Dest’arte, e na parte em causa, improcede o recurso.

Continuemos.

–– Da “indemnização por despesas hospitalares”.

Aqui, diz o ora recorrente que:

“Ainda que o Demandante tivesse sofrido um prejuízo pelo pagamento das despesas hospitalares – que, como vimos, não sofreu –, ainda assim jamais o A poderia ser responsabilizado pela totalidade de tais despesas, dado que o Demandante concorreu em 70% para a produção do acidente”; e que,
“O A não é responsável, atento o disposto no n.° 4 do artigo 3.° e na alínea d) do artigo 14.°, ambos do Decreto-Lei n.° 24/86/M, de 15 de Março e, bem assim, nos artigos 477.°, 496.° e 566.° e seguintes do Código Civil de Macau, pelas despesas médicas e hospitalares quando o ofendido não as satisfez e existe um terceiro por elas responsável”.

Há equívoco, (como o próprio recorrente reconheceu em sede de audiência do recurso).

O Tribunal a quo, a título de indemnização ao demandante fixou o total de MOP$197,404.20, que corresponde a 30% das despesas hospitalares, MOP$158,014.00, (MOP$47,404.20), e da indemnização a título de danos não patrimoniais (inicialmente) fixada em MOP$500.000,00, (MOP$150.000,00), respeitando a percentagem de culpa do demandante (70%) e do arguido (30%).

Porém, diz também o ora recorrente que não é o responsável pelo pagamento de tal quantia, invocando n.° 3 do art. 4°, e a al. d) do art. 14°, do D.L. n.° 24/86/M.

Vejamos.

Nos termos do art. 3° do D.L. n.° 24/86/M:

“1. Os encargos com os cuidados de saúde prestados pelos serviços e estabelecimentos dependentes da DSS são total ou parcialmente cobertos pelo Orçamento Geral do Território, variando o grau de cobertura em função das situações referidas nos números seguintes:

2. São gratuitos:

a) Os cuidados prestados pelos centros de saúde;

b) Os cuidados prestados, por razões de saúde pública, aos suspeitos ou portadores de doenças infecto-contagiosas, toxico-dependência, doenças do foro oncológico-psiquiátrico e no âmbito do planeamento familiar;

c) Os cuidados prestados a grupos populacionais em risco, como grávidas, parturientes e puérperas, crianças até à idade de dez anos, alunos do ensino primário e secundário, e indivíduos com 65 e mais anos de idade;

d) Os cuidados prestados a indivíduos ou a famílias que se encontram em situação de ruptura social, determinante de incapacidade económica para a cobertura dos encargos;

e) Os cuidados prestados ao reclusos;

f) Os cuidados prestados a pessoal dos serviços públicos do Território, incluindo os respectivos familiares e equiparados.

Em caso de internamento em qualquer das situações previstas nas alíneas b), c), d) e e) os serviços só serão gratuitos em regime de enfermaria.

3. A gratuitidade mencionada no número anterior só vigora nos casos nele referidos quando não exista ou não se presuma existir a responsabilidade de terceiro ou terceiros e no que se refere às alíneas b), c), d) e e) do número anterior, em regime de enfermaria quando haja lugar a internamento.

4. Ficam a cargo de terceiros responsáveis os encargos com os cuidados de saúde prestados a utentes que hajam transferido a respectiva responsabilidade para terceiros ou que tenham resultado de acidente ou agressão em que se possa presumir um responsável ou responsáveis.

5. Os encargos com os cuidados de saúde não abrangidos nos números anteriores são suportados pelo Orçamento Geral do Território e pelo utente”.

E nos termos do também invocado art. 14° do mesmo Código:

“São cobrados a 100% a terceiro ou terceiros responsáveis os encargos com os cuidados de saúde em serviços e estabelecimentos dependentes da DSS, independentemente das razões de cobertura referidas no artigo 3.º deste diploma, prestados a:

a) Beneficiários titulares e familiares de sistemas organizados de cobertura da doença para pessoal de empresas públicas ou privadas, do Território ou do exterior, mediante acordos a celebrar entre tais empresas e a DSS;

b) Beneficiários de sistemas individuais de seguro-doença do Território ou do exterior, com ou sem fim lucrativo, mediante acordo com a DSS, ou por facturação acto a acto;

c) Alunos de estabelecimentos de ensino oficial, oficializado ou particular, no âmbito do esquema de seguro escolar em vigor;

d) Utentes que careçam de cuidados de saúde em resultado de acidente ou agressão em que se possa presumir um responsável ou responsáveis”.

Atento o teor de tais normativos, nomeadamente, do n.° 4 do art. 3 e al. d) do art. 14°, outro é o nosso entendimento, pois que não nos parece que os mesmos excluam a responsabilidade do A, ora recorrente, numa situação como a dos presentes autos.

Por sua vez, não se pode olvidar que, in casu, está provado que “o demandante suportou tais despesas”.

Assim, e tendo em conta a sua percentagem de culpa (70%), tem este o direito de receber o montante que atrás se deixou consignado, ou seja, MOP$47,404.20.

–– Por fim, vejamos do montante da “indemnização por danos não patrimoniais”.

Fixou o Colectivo a quo tal indemnização em MOP$500.000,00, e foi o ora recorrente condenado a pagar 30% de tal quantia, (MOP$150.000,00), atenta a percentagem de culpa do arguido, (70%).

Entende o recorrente que adequado seria o montante de MOP$100.000,00 como indemnização dos danos não patrimoniais sofridos pelo demandante.

Vejamos.

Está (essencialmente) provado que, em consequência do acidente – e não se pode esquecer que o mesmo consistiu num choque quase frontal entre a viatura e o ofendido, no qual este veio a embater no parabrisas, partindo-o, sendo depois, projectado para o solo – sofreu o mesmo ofendido fracturas várias (na 3ª e 9ª costela), distúrbios no funcionamento dos rins, e contusões e lacerações em várias partes do seu corpo, tendo padecido de fortes dores após o acidente e durante o tratamento, tendo também ficado com marcas (cicatrizes) das feridas.

Em matéria de indemnização por danos não patrimoniais tem este T.S.I. afirmado que:

“A indemnização por danos não patrimoniais tem como objectivo proporcionar um conforto ao ofendido a fim de lhe aliviar os sofrimentos que a lesão lhe provocou ou, se possível, lhos fazer esquecer.
Visa, pois, proporcionar ao lesado momentos de prazer ou de alegria, em termos de neutralizar, na medida do possível, o sofrimento moral de que padeceu.”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.03.2011, Proc. n° 535/2010), sendo também de considerar que em matérias como as em questão inadequados são “montantes miserabilistas”, não sendo igualmente de se proporcionar “enriquecimentos ilegítimos ou injustificados”; (cfr., v.g., o Ac. de 07.12.2011, Proc. n.° 724/2011).

Sendo de manter o assim entendido, e atento o estatuído nos art°s 487° e 489° do C.C.M. cremos que adequado será o montante de MOP$300,000.00.

Ao arguido cabendo 30% de culpa no acidente, em causa passa a estar o quantum de MOP$90,000.00.

Fica assim o A condenado a pagar o quantum total de MOP$137,404.20, (MOP$47,404.20 + MOP$90,000.00).

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, acordam julgar parcialmente procedente o recurso.

Custas, nas devidas proporções, pelo demandante e arguido, não se tributando o recorrente A dada a sua isenção.

Macau, aos 14 de Junho de 2012


_________________________
José Maria Dias Azedo
(Relator)
[Parcialmente vencido, nos termos seguintes: não obstante ter relatado o acórdão que antecede, não subscrevo a solução pelos meus Exmos. Colegas encontrada para a 1ª questão pelo recorrente colocada quanto à “responsabilidade solidária” dos outros dois demandados civis destes autos.
Na verdade, e como sabido é, as obrigações, quando exista pluralidade de sujeitos, podem ser “conjuntas” e “solidárias”. Na primeira modalidade e no caso da existência de um só credor e de vários devedores, aquele só pode exigir de cada um destes o cumprimento de uma parte da obrigação. À pluralidade de sujeitos, corresponde aqui uma igual “pluralidade de vínculos”. No caso das obrigações solidárias o credor pode exigir de cada um dos devedores a satisfação integral da obrigação. Existe aqui “um vínculo de mútua representação entre os devedores”; (cfr., P. Lima e A, Varela, in “Noções elementares de Direito Civil”, vol. I, pág. 247).
Havendo “pluralidade de devedores”, a regra é a da conjunção, já que o art. 506° do C.C.M. estatui que a “solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes”.
E como consignei no meu projecto de acórdão, “tendo nomeadamente em atenção o estatuído no n.° 1 e 3 do art. 25° do D.L. n.° 57/94/M, cremos que imperativo é concluir que não é o A, ora recorrente, o “único responsável” pelo pagamento da indemnização arbitrada”.
De facto, importa ter presente que o A não é um “devedor” stricto sensu, sendo apenas, (e tão só), um mero “garante”, (responsável subsidiário), do pagamento das indemnizações devidas a terceiros lesados em consequência do acidente de viação.
Com efeito, sobre o A não recai uma obrigação de indemnização autónoma perante os terceiros lesados, dependendo, sempre, da responsabilidade que possa ser imputada ao condutor ou proprietário do veículo, (“principais responsáveis”), isto é, respondendo apenas se e na medida em que houver responsabilidades que lhe caiba garantir.
Aliás, tal, em nossa opinião, extrai-se também do preceituado no art. 45° do mesmo D.L. n.° 57/94/M, quanto à “ilegitimidade passiva”, sendo, igualmente, o que, em parte, se consignou no Ac. deste T.S.I. de 13.09.2007, Proc. n.° 419/2007, onde se afirmou ser de aderir “ao entendimento segundo o qual se considera que no âmbito do processo crime no qual resultou a condenação do ora recorrente – A – se devia também condenar solidariamente ou os “responsáveis civis”; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. de Évora de 04.03.2004, Proc. n° 2726/03-3, in www.dgsi.pt/jtrc, aqui citado como mera referência)”
Existe pois uma “concorrência” de responsabilidades, podendo afirmar-se que estamos perante um caso de “solidariedade imprópria”, (imperfeita ou impura), dado que, externamente, a responsabilidade dos obrigados é solidária, na verdadeira acepção da palavra, podendo o lesado exigir de qualquer um deles – responsável civil e o A – a satisfação da totalidade do seu crédito. Internamente, porém, as coisas são diferentes: se quem paga a indemnização devida for o responsável civil, nenhum direito lhe assiste perante o Fundo; se, pelo contrário, for este a pagar, fica sub-rogado nos direitos do lesado, podendo exigir do lesante aquilo que pagou, (acrescidos dos juros legais de mora e das despesas efectuadas com a liquidação e cobrança); (cfr., v.g. neste sentido, e perante análogas disposições legais, os Acs. da Rel. do Porto de 26.02.1996, Proc. n.° 9550803; de 06.11.2000, Proc. n.° 0051067; de 19.05.2010, Proc. n.° 23910/03; de 07.06.2011, Proc. n.° 1031/07, in “www.dgsi.pt”; da Rel. de Coimbra de 20.05.2000, Rec. n.° 1317, in C.J. Ano XXV, T. III, pág. 20; da Rel. de Lisboa de 10.10.2000, Proc. n.° 002651 e de 22.10.2009, Proc. n.° 7172/06; e do S.T.J. de 12.04.2011, Proc. n.° 5762/06 e de 19.04.2012, Proc. n.° 3203/05 in loc. cit.).
Nesta conformidade, e na parte em questão, julgava parcialmente procedente o recurso, condenando também (solidariamente) o arguido C, no pagamento da indemnização ao lesado, absolvendo, porém, do pedido, o demandado D, dado que em relação ao mesmo, nada se provou, nomeadamente, que era o proprietário do veículo causador do acidente e obrigado ao seguro].


_________________________
Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)


Proc. 393/2012 Pág. 26

Proc. 393/2012 Pág. 1