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Processo n.º 466/2012 Data do acórdão: 2012-6-21
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
  – rejeição do recurso
  – art.o 410.o, n.o 3, do Código de Processo Penal
  – crime continuado
  – furto qualificado
  – art.o 198.o, n.o 2, alínea e), do Código Penal
  – medida da pena
  – prevenção geral do crime
S U M Á R I O
1. O art.o 410.o, n.o 3, do actual Código de Processo Penal permite que “Em caso de rejeição do recurso, o acórdão limita-se a... especificar sumariamente os fundamentos da decisão”.
2. Considerada a matéria de facto já dada por provada no acórdão recorrido, segundo a qual, e nomeadamente, são todas diferentes as fracções autónomas alvo dos três crimes provados nos autos, não se vislumbra que haja existido qualquer situação exterior, de que fala o n.o 2 do art.o 29.o do vigente Código Penal, que “terá atraído” o arguido recorrente para prática dos segundo e terceiro casos de furto, em termos suficientes de atenuar considerável e progressivamente o seu grau de culpa no cometimento dos factos nos mesmos segundo e terceiro crimes, pelo que não pode ele beneficiar do regime punitivo mais favorável do art.o 73.o do Código Penal.
3. São elevadas as exigências de prevenção geral do crime de furto qualificado do art.o 198.o, n.o 2, alínea e), do Código Penal, pelo que as penas aplicadas pelo Tribunal a quo já não admitem mais margem para redução.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 466/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A



ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I - RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 195 a 201 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR4-12-0028-PCC do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de três crimes consumados de furto qualificado, p. e p. pelo art.o 198.o, n.o 2, alínea e), do Código Penal de Macau (CP), em dois anos e nove meses de prisão por cada, e, em cúmulo jurídico, em quatro anos de prisão única, e na obrigação de pagar duas mil patacas de indemnização, arbitrada oficiosamente, de danos morais da ofendida concretamente identificada no dispositivo dessa decisão, com juros legais desde a data da decisão até efectivo e integral pagamento, veio o arguido A, já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar a aplicação, a seu favor, do regime punitivo de crime continuado, e a redução da pena, por entender haver erro de julgamento de direito por parte do Tribunal a quo ao ter decidido em o punir como autor de três crimes em concurso efectivo, e não de um só crime continuado, e, fosse como fosse, haver também excesso na medida das penas parcelares dos dois primeiros crimes e da pena única final (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 214 a 221 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 223 a 229) no sentido materialmente de improcedência da argumentação do arguido.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 242 a 244v), pugnando também pela manutenção da decisão recorrida.
Feito subsequentemente o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado por manifestamente improcedente) e corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada no texto do acórdão recorrido (concretamente, desde o último parágrafo da sua página 4 até à 5.a linha da página 8, ora a fls. 196v a 198v dos autos), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal (CPP), segundo a qual, e em síntese da parte que ora interessa à solução:
– em 23 de Outubro de 2011, em hora não apurada da noite à alta madrugada do dia seguinte, o arguido chegou à porta da fracção autónoma “XX” de um edifício sito na Rua XX, e depois de confirmar que a gente aí habitante já se encontrava a dormir, abriu, por instrumentos, a fechadura da porta de ferro e da porta de madeira da fracção e entrou na mesma, onde acabou por tirar e fazer seus os seguintes objectos, contra a vontade de respectivo dono: um telemóvel com mil e seiscentas patacas de valor aproximado e um computador portátil com seis mil e centro e oitenta patacas de valor aproximado;
– em 24 de Outubro de 2011, em hora não apurada compreendida entre as 02:30 e as 07:00, o arguido chegou à porta da fracção autónoma “XX” de um edifício sito na Rua de XX, e depois de confirmar que a gente aí habitante já se encontrava a dormir, abriu, por instrumentos, a fechadura da porta de ferro e da porta de madeira da fracção e entrou na mesma, onde acabou por tirar e fazer seus os seguintes objectos e valores, contra a vontade de respectivo dono: um telemóvel com três mil patacas de valor aproximado, um computador do tipo pad com quatro mil e duzentas patacas de valor aproximado, quinhentos e cinquenta dólares de Hong Kong em numerário, e quatrocentas e quarenta patacas em numerário;
– em 25 de Outubro de 2011, cerca das 05:30, o arguido chegou à porta da fracção autónoma “XX” de um edifício sito na Rua da XX, e depois de confirmar que a gente aí habitante já se encontrava a dormir, abriu, por instrumentos, a fechadura da porta de ferro e da porta de madeira da fracção e entrou na mesma, onde acabou por tirar e fazer seus os seguintes objectos e valores, contra a vontade de respectivo dono: um music player com trezentas patacas de valor aproximado, trezentos e cinquenta dólares de Hong Kong, duas mil e duzentas patacas e duzentos renminbis, tudo em numerário;
– o arguido agiu livre, consciente e voluntariamente, sabendo que a sua conduta era ilegal e punível por lei;
– o arguido é delinquente primário em Macau.
Outrossim, o arguido é identificado no intróito do texto do acórdão recorrido como sendo solteiro, desempregado e titular do passaporte da República Popular da China, com morada no Interior da China.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
O art.o 410.o, n.o 3, do Código de Processo Penal de Macau (CPP) permite que “Em caso de rejeição do recurso, o acórdão limita-se a... especificar sumariamente os fundamentos da decisão”.
E é isto que se faz agora, sendo, aliás, de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Ora, desde já, quanto à pretendida aplicação do regime punitivo, mais favorável, do crime continuado, é manifesto que considerada a matéria de facto já dada por provada no texto decisório ora sob impugnação (já acima referenciada em síntese), é inviável esse pedido do arguido, visto que para além de, nomeadamente, serem todas diferentes as fracções autónomas alvo dos três crimes provados nos autos, não se vislumbra que haja existido qualquer situação exterior (de que fala o n.o 2 do art.o 29.o do CP) que “terá atraído” o arguido para prática dos segundo e terceiro casos de furto, em termos suficientes de atenuar considerável e progressivamente o seu grau de culpa no cometimento dos factos nos mesmos segundo e terceiro crimes, pelo que não pode ele beneficiar do regime punitivo do art.o 73.o do CP.
E no tocante ao subsidiariamente assacado exagero na medida das penas parcelares dos dois primeiros furtos e da pena única final de prisão, também se mostra patente ao presente Tribunal de recurso que em face da mesma factualidade já apurada em primeira instância e vistas as inegáveis elevadas exigências de prevenção geral do tipo de crime em causa, e sob a égide sobretudo dos art.os 40.o, n.os 1 e 2, 65.o e 71.o, n.os 1 e 2, do CP, as penas parcelares dois dois primeiros crimes e a pena única impostas na Primeira Instância ao arguido dentro da respectiva moldura da pena parcelar (prevista no art.o 198.o, n.o 2, alínea e), do CP) e da pena única aplicáveis já não podem admitir mais margem para redução.
Naufraga, claramente, o recurso, que deve ser rejeitado em conferência, nos termos dos art.os 409.o, n.o 2, alínea a), e 410.o, n.o 1, do CPP.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso.
Custas pelo arguido, com duas UC de taxa de justiça e quatro UC de sanção pecuniária (referida no art.o 410.o, n.o 4, do Código de Processo Penal), e duas mil patacas de honorários a favor do seu Exm.o Defensor Oficioso, a adiantar, por ora, pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Comunique aos três ofendidos referidos na 10.a linha da página 8 do acórdão recorrido.
Macau, 21 de Junho de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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