Processo n.º 651/2011 Data do acórdão: 2012-6-14 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– furto
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal
– suspensão da pena
– condenação anterior
S U M Á R I O
Atendendo sobretudo ao facto de a arguida recorrente já ter chegado a ser condenada pela prática de crimes de furto em pena de prisão finalmente suspensa na execução, e mesmo assim, ter voltado a cometer o furto dos presentes autos na plena vigência do período dessa suspensão, andou manifestamente bem o tribunal a quo ao aplicar-lhe a pena de prisão efectiva, porquanto se a suspensão da execução da sua anterior pena de prisão não a conseguiu prevenir da prática do crime de furto ora em questão, é evidentemente impensável que a suspensão da execução da pena de prisão nesta vez já consiga realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, mormente em sede de prevenção especial (cfr. o critério material exigido na parte final do art.o 48.o, n.o 1, do vigente Código Penal), mesmo que o preço venal total dos objectos furtados não tenha sido grande e a loja ofendida não tenha sofrido prejuízos.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 651/2011
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A (XXX)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com a sentença proferida a fls. 100 a 103v dos autos de Processo Comum Singular n.° CR1-11-0039-PCS do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), que a condenou, à revelia, como autora material de um crime consumado de furto, p. e p. pelo art.o 197.o, n.o 1, do vigente Código Penal (CP), em cinco meses de prisão efectiva, veio a arguida A, aí já melhor identificada, e depois de notificada pessoalmente dessa condenação, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para assacar a essa decisão a violação do art.o 48.o, n.o 1, do CP, a fim de pedir a suspensão da execução da sua pena de prisão, com fundamento no facto de o valor de objectos furtados não ser muito grande, no facto de a entidade ofendida não ter nenhum prejuízo, e, em suma, no facto de as circunstâncias do crime não serem graves, e também no facto de ela ser um doente (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 127 a 131 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 133 a 134v) no sentido de improcedência da argumentação da recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 142 a 143), preconizando a manifesta improcedência do recurso.
Feito subsequentemente o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado em conferência por manifestamente improcedente) e corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada nas páginas 3 a 5 do texto da sentença da Primeira Instância (ora a fls. 101 a 102), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal.
De acordo com essa fundamentação fáctica da decisão recorrida:
– em 26 de Novembro de 2010, cerca das 22h20m, a arguida tirou uns produtos de uma loja chamada “Mannings” na Rua Um do Bairro de Iao Hon, e os colocou numa mala de mão que trouxe com ela, e após saiu da loja sem ter pago o preço dos mesmos;
– interceptada depois por uma empregada da dita loja que pediu também auxílio a um guarda policial que passou pela referida rua, a arguida consentiu que a sua mala fosse objecto de revista por esse guarda;
– os objectos tirados pela arguida e contidos nessa mala tinham por preço venal total novecentas e cinquenta e cinco patacas e cinquenta avos;
– a arguida agiu de modo livre, consciente e intencionalmente, com o intuito de se apropriar de bens alheios contra a vontade de outrem;
– a loja ofendida não sofreu prejuízos;
– e conforme o certificado de registo criminal da arguida: em 30 de Abril de 2010, a arguida foi condenada no Processo Comum Colectivo n.o CR4-08-0085-PCC (outrora n.o CR1-08-0115-PCC) em um ano de prisão, suspensa na execução por dois anos, pela prática de um crime de peculato; e em 10 de Junho de 2010, foi condenada no Processo Comum Colectivo n.o CR3-07-0173-PCC em nove meses de prisão, pela prática de três crimes de furto, e, em cúmulo jurídico com a pena imposta no referido Processo n.o CR4-08-0085-PCC, na pena única de um ano e seis meses de prisão, suspensa na execução por três anos, tendo essa decisão transitado em julgado em 24 de Julho de 2010.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, é de ver que a arguida apenas colocou a questão de suspensão da pena de prisão.
In casu, atendendo aos elementos fácticos já acima referidos na parte II do presente acórdão, sobretudo ao facto de a recorrente já ter chegado a ser condenada pela prática de crimes de furto em pena de prisão finalmente suspensa na execução, e mesmo assim, ter voltado a cometer o furto dos presentes autos na plena vigência do período dessa suspensão, andou manifestamente bem o Tribunal a quo ao aplicar-lhe a pena de prisão efectiva, porquanto se a suspensão da execução da sua anterior pena de prisão não a conseguiu prevenir da prática do crime de furto ora em questão nos autos, é evidentemente impensável que a suspensão da execução da pena de prisão nesta vez já consiga realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, mormente em sede de prevenção especial (cfr. o critério material exigido na parte final do art.o 48.o, n.o 1, do CP), mesmo que o preço venal total dos objectos furtados não tenha sido grande e a loja ofendida não tenha sofrido prejuízos, sendo de frisar, por último, que o Tribunal a quo já deu por provado, sem nenhum erro notório na apreciação da prova, que ela, ao tirar sem pagar nesta vez os tais objectos, agiu livre, consciente e intencionalmente.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso, por manifestamente improcedente.
Custas do recurso pela arguida, com duas UC de taxa de justiça, três UC de sanção pecuniária e mil e trezentas patacas de honorários a favor da sua Ex.ma Defensora Oficiosa, honorários esses a serem adiantados pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Passe mandados de detenção contra a arguida, para efeitos de cumprimento da pena de prisão aplicada na sentença recorrida.
Comunique ao Processo n.o CR3-07-0173-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base.
Macau, 14 de Junho de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
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