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Processo nº 391/2012 Data: 31.05.2012
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “brula (qualificada)”.
Pena.
Atenuação especial.



SUMÁRIO

1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

2. A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

O relator,

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José Maria Dias Azedo


Processo nº 391/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. No Tribunal Judicial de Base e em audiência colectiva, responderam (1°) A, (2°) B (XXX), (3°) C, (4a) D (XXX), (5°) E (XXX) e (6a) F (XXX), todos com os sinais dos autos.

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Realizada a audiência, proferiu o Colectivo Acórdão, condenando os ditos (1°, 2°, 3°, 4°, 5° e 6°) arguidos (1°) A, (2°) B (XXX), (3°) C, (4a) D (XXX), (5°) E (XXX) e (6a) F (XXX), como autores da prática de 1 crime de “burla (qualificada)”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) do C.P.M., fixando a pena de 4 anos de prisão para os primeiros cinco arguidos, e a de 5 anos de prisão para a (6ª) arguida F; (cfr., fls. 580 a 581 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformados, os arguidos recorreram.
Motivaram para, em síntese, manifestar a sua discordância com a pena que lhes foi fixada; (cfr., fls. 615 a 620 e 625 a 628).

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Em resposta, é o Exmo. Magistrado do Ministério Público de opinião que os recursos devem ser rejeitados; (cfr., fls. 651 a 653-v a 654 a 656-v).

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Admitidos os recursos e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando pela integral confirmação do decidido; (cfr., fls. 677 a 678-v).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos elencados no Acórdão recorrido, a fls. 575 a 577, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem os arguidos recorrer da decisão que os condenou pela prática de 1 crime de “burla (qualificada)”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) do C.P.M..

Insurgem-se (tão só) contra a pena que lhes foi fixada, considerando a exagerada.

Motivos não havendo para se alterar a decisão da matéria de facto e o seu enquadramento jurídico, vejamos.

O crime de “burla (qualificada)” em questão é punido com a pena de 2 a 10 anos de prisão; (cfr., art. 211°, n.° 4, al. a) do C.P.M.).

In casu, os (1° a 5°) arguidos (1°) A, (2°) B, (3°) C, (4°) D e (5°) E, foram condenados com a pena (individual) de 4 anos de prisão.

A (6a) arguida F, na pena de 5 anos de prisão.

É sabido que nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.

3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Por sua vez, estatui o art. 65° do mesmo Código que:

“1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.

2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:

a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

b) A intensidade do dolo ou da negligência;

c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

3. Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da determinação da pena”.

E, como temos vindo a afirmar, “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 29.09.2011, Proc. n° 483/2011).

Aqui chegados, vejamos.

Desde já, e antes de mais, mostra-se-nos totalmente inviável uma (eventual) “atenuação especial da pena”.

De facto, sobre tal questão, tem este T.S.I. afirmado que:

“A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.04.2011, Proc. n°130/2011 e de 19.01.2012, Proc. n° 795/2011).

E, como acertadamente se fez constar no douto Parecer do Ilustre Procurador Adjunto:

“A jurisprudência tem entendido que o número das circunstâncias atenuantes nunca implica necessariamente a atenuação especial, sendo preciso demonstrar-se a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena. Ou seja, só depois de valorizar todas as circunstâncias verificadas no caso concreto e se do imagem global do facto resulta a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena é que se deve utilizar a atenuação especial da pena. (Acórdão do TSI no Processo n.° 153/2010).
Com efeito, não é uma qualquer das circunstâncias previstas no n.° 2 do art. 66.° do Código Penal ou semelhantes logo capaz de accionar o regime de atenuação especial da pena, antes tem de apreciar todo o quadro da actuação do agente para ponderar a atenuação especial e encontrar a medida concreta da pena. (vide. Acórdão do TUI no Processo n.° 20/2004)
Pois, para poder beneficiar da atenuação especial da pena prevista no art. 66.° do Código Penal, é necessário que se verifica uma situação de diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena, em resultado da existência de circunstâncias com essa virtualidade. (vide. Acórdão do TUI no Processo n.°20/2004)
A confissão dos factos, por siso, não basta fazer accionar o mecanismo de atenuação especial da pena a que alude o art. 66.° do Código Penal, um vez que não consegue diminuir por forma acentuada, e pelo menos, a necessidade da pena para o tipo de crime em questão, quando praticado por pessoas não locais. (Acórdão do TSI no Processo n.° 636/2010)
No que respeite à d) do n.°2 do art.66.° do Código penal, inculca o Venerando TUI (Acórdão do TUI no Processo n.° 10/2011): A boa conduta mantida durante a prisão preventiva pelo recorrente não cabe na previsão da al. d) do n.° 2 do art. 66.° do Código Penal, pois nesta se estatui para o caso de que já tem decorrido muito tempo sobre a prática do crime e durante este período o agente tem mantido boa conduta”.

Dito isto, resta dizer que a matéria de facto provada não permite considerar a situação dos autos como uma situação “excepcional” ou “extraordinária”, onde presentes estão “circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena”; (cfr., art. 66°, n.° 1 do C.P.M.).

E será possível uma redução da pena?

Também aqui cremos que evidente é a improcedência do recurso.

De facto, em causa está uma “burla” cometida pelos seis arguidos dos autos em “conjugação de esforços e divisão de tarefas”, (co-autores), no seguimento de 1 plano previamente elaborado, (o que demonstra a premeditação), e que deu lugar a um prejuízo de HKD$230.000,00.

Colhe-se também dos autos que os arguidos, (os 1° a 5°, naturais da Malásia, e a 6ª, da R.P.C.), deslocarem-se a Macau para por em prática o plano que tinham, agindo, todos, com dolo directo intenso, sendo também certo que existem ainda indivíduos envolvidos cuja total identificação está por efectuar.

Nesta conformidade, tendo presente a pena que ao crime pelos ora recorrentes cometido cabe – 2 a 10 anos de prisão – atento o dolo directo e intenso, a também acentuada ilicitude – até mesmo pela forma de cometimento do crime, em “comparticipação” – e ponderado o teor do art. 40° e 65° do C.P.M. e nas necessidades de prevenção geral e especial, exageradas são as penas pelo Colectivo a quo fixadas.

Na verdade, as mesmas ainda estão próximas do limite mínimo da moldura penal em questão, (estando ainda relativamente aquém do seu meio).

É verdade que à (6ª) arguida fixou o Tribunal a pena de 5 anos de prisão, (mais 1 que os outros cinco arguidos).

Porém, não se pode olvidar que nos termos do art. 28° do C.P.M.:

“Cada comparticipante é punido segundo a sua culpa, independentemente da punição ou do grau de culpa dos outros comparticipantes”.

E, no caso, adequada se mostra pois a “diferença” feita, pois que diferente é também o “envolvimento” desta (6ª) arguida na prática do crime pelo qual foi condenada.

Dest’arte, e manifestamente improcedente sendo os recursos, impõe-se a sua rejeição.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar os recursos; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagarão os recorrentes 5 UCs de taxa (individual) de justiça, e como sanção pela rejeição dos seus recursos, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor dos 1° a 5° arguidos no montante de MOP$1.500,00, e ao Exmo. Defensor da 6ª arguida, no montante de MOP$1.000,00.

Macau, aos 31 de Maio de 2012
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa


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