Reclamação nº 3/2012
A e B, dois dos co-Rés nos autos de acção ordinária nº CV2-09-0087-CAO, no âmbito desses autos formulou o requerimento do recurso do despacho saneador que julgou, inter alia, parte ilegítima o Autor e partes ilegítimas aqueles dois réus.
Por despacho datado de 25OUT2011 a fls. 159 dos autos principais, a Exmª Juiz a quo que, após o esclarecimento prestado pelos recorrentes A e B sobre qual será a parte do saneador que incide o recurso, decidiu não admitir o recurso da parte do saneador que julgou ilegítimo o Autor e admitiu o recurso que tem por objecto a parte que julgou ilegítimos os mesmos Réus, tendo-lhe fixado o regime de subida com o primeiro recurso que tenha de subir imediatamente.
E porque o recurso lhes tivesse sido admitido com subida diferida, vieram formular a presente reclamação nos seguintes termos:
I. Do efeito do Recurso
A presente Reclamação para o Excelentíssimo Senhor Juiz Presidente do Tribunal de Segunda Instância (TSI) tem por objecto o teor do douto Despacho do Mmo Juiz do Tribunal Judicial de Base (TJB), de fls. 159 e 159v que foram objecto de um pedido de esclarecimento posterior.
Consideram os Reclamantes que deveria ter sido fixado efeito suspensivo e subida imediata, ao invés do efeito devolutivo fixado doutamente pelo Mmo. Juiz.
Na verdade, ao abrigo do disposto no número 1 do artigo 601º do CPC, devem subir imediatamente os recursos interpostos "a) Da decisão que ponha termo ao processo."
Por outro lado, e ainda no mesmo preceito, mas no número 2. "Sobem também imediatamente os recursos cuja retenção os tornasse absolutamente inúteis".
Como é bom de ver, versando o recurso apresentado sobre a decisão final, a mesma põe termo ao processo.
Mesmo que assim não fosse, caso não haja qualquer recurso da parte contrária, a retenção do recurso torná-lo-ia absolutamente inútil.
Termos em que deverá ser fixado o regime de subida imediata ao recurso interposto.
Passemos pois a apreciar a reclamação.
Antes de mais, há que clarificar uma coisa, o recurso cuja retenção originou a presente reclamação tem por objecto a decisão que julgou ilegítimos os Réus ora reclamantes, que não é uma decisão final que põe termo ao processo, tal como assim alegam os reclamantes.
Pois esse despacho de per si, não pôs termo ao processo, dado que além dos ora reclamantes, co-existem outros réus, nomeadamente o Ministério Público.
Portanto, a decisão cuja retenção deu lugar à presente reclamação só afasta os ora reclamantes e não tem a virtualidade de pôr termo ao processo.
Avancemos.
Ora, a única questão levantada pelos reclamantes é saber se o recurso em causa deve subir imediatamente.
O artº 601º do CPC dispõe:
1. Sobem imediatamente ao Tribunal de Segunda Instância os recursos interpostos:
a) Da decisão que ponha termo ao processo;
b) Do despacho que aprecie a competência do tribunal;
c) Dos despachos proferidos depois da decisão final.
2. Sobem também imediatamente os recursos cuja retenção os tornasse absolutamente inúteis.
Atendendo ao que foi clarificado supra e ao que foi alegado pelos reclamantes, a boa decisão da presente reclamação deve ser encontrada com a correcta interpretação do número dois do artigo acima citado, pois in casu obviamente não estamos perante qualquer das situações previstas nas alíneas do número um.
A redacção dessa norma do número dois é bem demonstrativa de que a inutilidade absoluta diz respeito ao recurso em si e não aos actos processuais praticados posteriormente ao despacho objecto do recurso.
Considerando o objecto do recurso em causa, a eventual procedência do recurso implica a revogação do despacho recorrido, a anulação de todo o processado posterior e dependente do mesmo despacho e a admissão dos ora reclamantes como réus, o que é justamente a utilidade pretendida pelos recorrentes com a interposição do recurso,
E tendo em conta a tramitação e o fim de um processo de acção ordinária, dificilmente podemos configurar como é que podem ser absolutamente impossíveis a eventual anulação do processado e a re-admissão dos reclamantes como réus.
Daí, a retenção do recurso não conduzirá à inutilidade absoluta do recurso, pois isto só se verifica quando seja qual for a decisão que o tribunal de recurso lhe der, ele, o recurso, já é absolutamente inútil no seu reflexo sobre processo.
Ex abuntantia, quanto ao argumento deduzido pelos reclamantes dizendo que “......caso não haja qualquer recurso da parte contrária, a retenção do recurso torná-lo-ia absolutamente inútil”, limitamo-nos a dizer que ao alegarem isto, os próprios reclamantes estão a confundir as coisas inconfundíveis.
Ora, como vimos supra, no despacho saneador foi julgado ilegítimo o único Autor C, o que é verdadeiramente a decisão que põe termo ao processo.
É verdade que caso dessa decisão não venha a ser interposto recurso, o processo finda e o recurso interposto pelos reclamantes, ora retido, fica sem efeito nos termos prescritos no artº 602º/2 do CPC, e não pode em princípio trazer utilidade ao processo.
Todavia, todas essas consequências não são originadas pela retenção, mas sim pela simples circunstância de estar findo o processo.
Pois, como se sabe, a utilidade de um recurso é o reflexo que a eventual procedência poderá provocar no processo e portanto pressupõe e depende sempre da continuação ou da pendência do processo.
Se entretanto tiver terminado o processo, jamais é possível tal reflexo adveniente da eventual procedência do recurso.
Pois o regime da subida imediata do recurso só visa salvaguardar a sua utilidade decorrente da eventual procedência enquanto o processo não estiver findo.
E quando o processo estiver findo, a utilidade do recurso só pode ser salvaguardada pelo exercício da faculdade pelo recorrente nos termos permitidos no artº 602º/2, in fine do CPC, embora nesse caso, o recorrente tenha de invocar sempre ter interesse legítimo em ver recurso apreciado pelo Tribunal superior.
Assim, ao contrário do que defendem os reclamantes, caso não haja recurso da parte contrária, é o termo do processo, e não a retenção que torna inútil o recurso por ele interposto e ora retido.
Neste termos expostos e sem necessidade de mais considerações, indefiro a reclamação confirmando o despacho reclamado.
Custas pelos reclamantes.
Fixo a taxa de justiça em 1/8.
Cumpra o disposto no artº 597º/4 do CPC.
R.A.E.M., 15MAIO2012
O presidente do TSI
Recl.3/2012-1