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Processo nº 580/2006
Data do Acórdão: 14JUN2012


Assuntos:

advogado
notário privado
processo disciplinar de advogados
suspensão do prazo de prescrição
prescrição do procedimento disciplinar
princípio do contraditório


SUMÁRIO

1. Inexistindo no Código Disciplinar dos Advogados normas reguladoras da matéria da suspensão e da interrupção do prazo de prescrição do procedimento disciplinar, é de aplicar supletivamente e mutatis mutandis o regime correspondente consagrado no direito penal, por remissão expressa operada pelo artº 65º-a) do Código Disciplinar dos Advogados

2. Pela natureza secreta do processo disciplinar até ao despacho de acusação expressamente prescrita no artº 8º do Código Disciplinar dos Advogados, os meios de prova produzidos ou apresentados ao longo de toda a fase da investigação pré-acusatória não podem ser submetidos ao princípio do contraditório. Assim, para dar cumprimento ao estatuído no artº 10º do Código Disciplinar dos Advogados, basta assegurar ao arguido o pleno exercício do contraditório após o despacho de acusação.

3. O Conselho Superior da Advocacia detém competência para punir os advogados que tiverem praticado facto ilícito à luz própria dos deveres de advogado exercendo as funções de notário privado, o que não contende ou prejudica a competência punitiva da DSAJ em relação aos notários privados.


O relator


Lai Kin Hong

Processo nº 580/2006

I

Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

A, Advogado devidamente identificado nos autos, vem recorrer contenciosamente da deliberação do Conselho Superior da Advocacia que lhe aplicou a pena de suspensão pelo período de oito anos, concluindo e pedindo:

1. O Recorrido foi notificado em 07/11/06 de decisão disciplinar proferida pelo Recorrido no âmbito do Proc.N°27/03/CSA, o qual para todos efeitos legais aqui se dá por reproduzido tendo sido aplicada pena de suspensão pelo período de oito anos.
2. O acto punitivo praticado pela Entidade Recorrida, salvo devido respeito por opinião contrária, constitui autêntica barbárie jurídica que nuclearmente se descreve:
a) Relevância de facto prescrito, ocorrido no "...Iongínquo ano de 1995... "; (cfr.fls. )
b) Falta de jurisdição disciplinar do Recorrido em razão dos factos praticados pelo ora recorrente terem sido na "qualidade de Notário Privado";
c) Omissão de dever de pronúncia relativamente a Incidente de Suspeição deduzido pelo Recorrente em defesa escrita contra o Senhor Instrutor, M.I. Dr. B ; (cfr.fls. 733 e sgts do processo instrutor)
d) Violação do Princípio do Contraditório em razão de ao Recorrente ter sido denegado o direito a audição que se encontra legalmente consagrado na lei; (cfr.art.32 do Regulamento do CSA)
e) Audição de pessoas inábeis para depor (clarius, depoimento de advogados intervenientes em processo conexo sem que, contudo, estes tenham solicitado prévia autorização ao Presidente da AAM)
f) Depoimentos prestados com violação de segredo profissional (com concomitante junção de documentos que se encontravam abrangidos por essa limitação);
g) Junção ilegal de documentos e correspondente valoração prejudicial ao ora Recorrente;
h) Aplicação analógica e extensiva das normas de Direito Penal em prejuízo do ora Recorrente;
i) Menção de facto FANTÁSTICO cuja inexistência a ora Recorrida tinha obrigação de conhecer (aplicação de circunstância agravante, fls.49 do Relatório Final do Instrutor, que se consubstanciou em relevar um processo arquivado por falta de ilícito disiplinar)
j) Intervenção de Presidente e Vice-Presidente do C.S.A. no âmbito do Proc.N°27/03/CSA em razão de não terem solicitado escusa ou suspensão (cfr. art.311° e sgts. do CPC ex vi art.65° do C.D.A.)
k) Violação de normas internas do CSA por parte da Entidade Recorrida, por omissão de projecto de acordão. (cfr.art.13° do Regulamento Interno)
3. Primo, o facto qualificado pela Entidade Recorrida como " ... Iongínquo ... " está, por isso mesmo, prescrito há longa data visto que a sua prática se verificou em 07/06/95.
4. A prescrição é de conhecimento oficioso e a Recorrente é composta por profissionais do Direito pelo que tinha obrigação de conhecer o instituto da prescrição e os seus efeitos... Ignorantia juris nemimen excusat. Pelo que o eventual ilícito penal prescreveu na pior das hipóteses em 2005, ergo, por maioria de razão também prescreveu processo disciplinar segundo as mais básicas regras da hermenêutica jurídica.
5. "Havendo fundadas dúvidas sobre o início do prazo da prescrição do procedimento criminal o princípio do in dubio pro reo impoe que as mesmas sejam resolvidas em benefício do arguido." (cfr. Ac.N°0096573 do Tribunal de Relação de Lx de 21.12.01)
6. Confessa-se a fls.683 e seguintes do mui douto Despacho Acusatório " ... que o Arguido praticou os eventuais factos (na qualidade de Notário Privado) e no Cartório do Arguido..." ; (realçado nosso)
7. O art.1° do C.D.A. limita a sua aplicabilidade jurisdicional aos advogados e no âmbito do exercício da sua profissão.
8. De qualquer modo, já se deixou claro a quem tinha dúvidas que as procurações notariais só podem ser revogadas em primeiro lugar perante o notário público, em segundo lugar com o consentimento do mandante e em terceiro lugar recorrendo ao Tribunal Judicial de Base. (cfr. ofício N°109/DSAJ/DIC/04 da Direcção dos Serviços de Justiça de 28/06/04 doc.11)
9. Também o ofício 110/DSAJ/DIC/2004 da Direcção dos Serviços de Justiça de 06/07/04 deixou o ensinamento de que "...de acordo com o Código do Notariado as revogações de procurações apenas podem ser feitas perante Notário Público ou Privado". (doc.12)
10. O ora Recorrente deduziu Incidente de Suspeição contra o M.I. Senhor Instrutor, Dr. B.
11. Tendo ora Recorrente juntado com a sua defesa (fls.733 e sgts.) uma certidão do TJDB com o N°103/93 na qual constava que o Senhor Dr. C preparou a procuração forense, o M.I. Senhor Instrutor e o Dr. B preparou a Contestação da acção Ordinária.
12. Ora, atentos que o processo Ordinário em causa só terminou no ano de 1996, e que os mandatários continuaram a fazer uso da procuração forense não podiam, por isso, que atestar no sentido de que esta tinha sido revogada no ano de 1995!!!! (cfr. fls.21 do Parecer do Senhor Instrutor)
13. Apesar do Incidente de Suspeição suscitado, o M.I. Senhor Instrutor continuou impávido e sereno no seu papel (não tendo o M.I. Senhor Instrutor o pundonor de ter solicitado a escusa a Senhora Presidente do CSA) constatando-se,aliás, hoje (dia 15/11/06 após consulta dos autos de fls.2 a 1048) que não há qualquer despacho ou decisão sobre o incidente suscitado.
14. Nos autos, foram prestados vários depoimentos testemunhais de advogados (com violação do dever de segredo profissional) e ao ora Recorrente não ter sido dada oportunidade de exercer o seu direito de audiência, em violação do art.36° do CDA: Os M.I. Senhores Advogados Dr.D, Dr. C e Dr. F (apesar de serem pessoas inábeis para depor, por não terem requerido autorização ao presidente da AAM) prestaram depoimento testemunhal nos autos e estes foram relavados como meio de prova.
15. Os dois primeiros M.I. Advogados intervieram em processo judicial como mandatários da participante (Dr. F) não podem, ergo, depor como testemunhas nos termos do CDA. (Doc.2)
16. A participante também se encontrava impedida de depor na qualidade de testemunha pelo simples facto de ser ... A participante!
17. É pacífico na Jurisprudência da Advocacia comparada que "... não pode fazer prova em juízo as declarações feitas pelo advogado com violação de segredo profissional." (Doc.3 e 4)
18. Os documentos juntos pelos advogados/mandatários/testemunhas estão directa e totalmente relacionados com o processo do litígio processual pendente (Proc.NCV3-03-0013-CAO)
19. Pelo que "... em nosso entender existe violação no caso concreto do dever de guardar segredo profissional por parte do mandatário do A. que requereu a junção dos documentos não podendo estes, em consequência, fazer prova em juízo". (Doc.7)
20. Não tendo sido pedido prévia dispensa não poderá, nunca, o Presidente da A.A.M. levantar o sigilo, nem a pedido do Tribunal. (Doc.8)
21. Com efeito verifica-se que nos autos, tendo em conta os factos em questão, a assinatura do "cancelamento" em causa terá tido o M.I. Advogado Dr. C conhecimento dos mesmos no exercício da profissão estando, como tal, sujeito a sigilo profissional. (Doc.9 e 10)
22. A Entidade Recorrida fez interpretação analógica e extensiva do Direito Penal aplicando regras do C.D.A. para punir eventuais infracções cometidas por Notário Privado.
23. É pacífico que o C.S.A. não tem atribuições e competências para tal, pois que a admitir este tipo de interpretação extensiva poder-se-ia, no futuro, a Entidade Recorrida vir a punir disciplinarmente ex-magistrados que actualmente exercem funções de Advogados em Macau pela autoria de actos disciplinares in iIIo tempore em que foram magistrados!
24. O M.I. Senhor Instrutor emprestou relevância, agravante, emergente de um processo disciplinar " ... arquivado por inexistência de ílicito disciplinar. .. ". (cfr. Deliberação CSA de 09/6/06)
25. A relevância de elemento Fantástico e só existe na mente persecutória do Senhor Instrutor do Processo que, sabendo que o processo tinha sido arquivado em Junho vem, contudo, emprestar relevância punitiva em Novembro do mesmo ano! E a Fantasia foi continuada quando (a fls.32) o Senhor Instrutor do Processo alega que o ora Recorrente " ... recusava-se a receber cartas dos correios ... " e, continua, invectivando o CSA" ... a não deixar certamente de formular o juízo que se impõe".
26. Ou seja, tentando inventar uma atenuante ou agravante em função dos destinatários das missivas receberam as cartas dos correios no primeiro, segundo ou último aviso...O que não pode proceder, sob pena de ninguém na perspectiva do C.S.A. não poder sair da RAEM durante os três anos, ou mais, que decorre processo disciplinar!
27. Apesar desta tese peregrina de recepção de cartas registadas do CSA, até já nas férias judiciais (significativamente, recorde-se o Incidente de Suspeição não apreciado pela Recorrente) o Recorrente chegou a ser notificado ...
28. No que à al.j) do art.3° da presente, resulta a fls.548 e sgts. (cfr. ofícios da Presidente e Vice-Presidente da Recorrida) que, salvo melhor e mais douta opinião, nos termos das já citadas regras do C.P.C. deviam ter pedido suspensão ou excusa em razão de o TJDB, 1° Juízo criminal, ter mandado extrair certidão e, assim, se actuar em conformidade com o princípio da Igualdade e se atalhar condutas discriminatórias. (doc.13,13 e 15)
29. O acto punitivo praticado pelo C.S.A. encontra-se viciado por violação de lei expressa, violação do princípio do contraditório, violação do princípio da imparcialidade; mais concretamente, foram violados os seguintes normativos:
a) art.16° do Regulamento do C.S.A.;
b) art. 32° do Regulamento do C.S.A.;
c) art. 10º do Regulamento do C.D.A.;
d) art.311° e sgts. Do CPC ex vi art.65° do C.D.A.;
e) art.13° do Regulamento do Interno do C.S.A.;
f) al.a), d), art.112° do C.P.A.;
g) art.124° do C.P.A ..
h) art.315° a 325° do CPC;

  Nestes termos, e nos melhores de Direito, se requer a V.Excelências se dignem considerar procedente o presente recurso (atribuindo-lhe o efeito suspensivo) e, desse modo, declarar a nulidade do acto recorrido e razão de o mesmo estar inquinado, fartamente, do vício de violação de lei e de usurpação de poderes fazendo, assim, a vossa habitual JUSTIÇA!

Citado, veio o Conselho Superior da Advocacia contestar pugnando pela improcedência do recurso.

Junta a contestação do Conselho Superior da Advocacia e apenso o processo instrutor, prosseguiram os autos.

Tanto o recorrente como a entidade recorrida não apresentaram alegações facultativas.

O Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pelo não provimento do presente recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Tendo embora o recorrente arrolado testemunhas a inquirir no âmbito do presente recurso contencioso, o certo é que a inquirição não teve lugar por ter sido indeferida por despacho do relator a fls. 313 dos p. autos.

Ficou intacta a seguinte matéria de facto já dada por assente no processo disciplinar:
Existe em Macau uma Associação, devidamente registada na Direcção dos Serviços de Identificação de Macau sob o no. 161, denominada ''Associação de Piedade e de Beneficência XXXX, também conhecida como "XXX".
A sua Direcção integra vários membros entre os quais o Sr. G.
Existe também uma outra Associação denominada ''Associação dos Bonzos do Templo ou Pagode XXXX (XXX)."
São legais representantes desta última os Srs. H, aliás, H1, J e K.
Nenhum destes representantes integra a Direcção da "Associação de Piedade e de Beneficência XXXX".
Em 1993, o Sr. G, na altura Vice-Presidente da referida Associação de Piedade e Beneficência XXXX, outorgou, em representação desta, no Cartório do Notário Privado do Sr. Dr. C uma procuração a favor daquele Sr. H, aliás, H1, conferindo-lhe vários poderes, entre eles o de celebrar contratos de venda tendo por objecto imóveis dos quais era proprietária (fls. 27 e 31).
No dia 14 de Fevereiro de 1995, após prévio acordo entre os representantes daquela Associação e o Sr. H1, a procuração em causa foi revogada, revogação levada a efeito no Escritório do Exmº. Sr. Dr. C e em presença deste (fls. 27 a 31).
A revogação foi feita estando também presente aquele H1 (fls. 27 a 31).
A mesma revogação foi feita, apondo-se, na parte superior do rosto do original da procuração em causa, a respectiva declaração, na redacção da qual foram utilizados caracteres chineses – 本授權書即日取消作廢 14/2/95 - que significam o seguinte: "a presente procuração cancela-se a partir da presente data 14/02/95".
Além disso, no texto da primeira página forem apostos dois riscos oblíquos e paralelos e no espaço entre os mesmos a expressão inglesa "cancelled", e outros riscos em restantes páginas (fls. 27).
A declaração em causa foi subscrita pelos legais representantes daquela Associação G e M e também pelos Srs. N e H1 (fls. 27).
A mesma declaração revogatória foi confirmada pelo Sr. Dr. C o qual sob a mesma manuscreveu a seguinte frase: "Fui presente: 14/02/95" seguida da sua rubrica, apondo também o seu carimbo de Advogado (fls. 27).
O original da procuração revogada foi então devolvido pelo Sr. H1 a um representante da mandante, sendo depois guardado num cofre de segurança do Banco Tai Fung, S.A.R.L..
Esse mesmo original ficou ali guardado e só foi retirado do cofre anos mais tarde, e isto mesmo por ordem judicial.
Não obstante o que fica referido, no dia 7 de Junho de 1995, o arguido Sr. Dr. A, na qualidade de Notário Privado, entendeu certificar que havia conferido uma fotocópia daquela Procuração com o respectivo original e elaborar a respectiva conta a qual atribuiu o nº. 6.
Em outras palavras no dia 7 de Junho de 1995, o referido arguido Sr. Dr. A, na qualidade de Notário Privado, declarou ter extraído uma fotocópia do original daquela procuração e que a mesma estava em conformidade com este (fls. 35 a 40).
Ora a data em que essa pública-forma foi elaborada, o original da Procuração, devidamente revogada e riscada nos termos anteriormente referidos, encontrava-se encerrado num cofre do Banco Tai Fung.
Não dispunha, pois, o Sr. Dr. A de quaisquer elementos que lhe permitissem certificar a conformidade dessa fotocópia com o original.
Trata-se, pois, duma pública-forma inteiramente falsa, motivo por que dela não constam nem a declaração revogatória, nem os falados riscos, nem a menção "cancelled", nem a confirmação feita pelo Sr. Dr. C (fls. 35 a 39), sendo também fictícia a conta atrás referida já que a mesma não se mostra lançada no competente Livro de Registos de Contas Emolumentos e Selo do Cartório do arguido Dr. A.
Uma pública-forma constitui uma cópia de teor total ou parcial extraída de documentos avulsos exibidos para esse efeito ao Notário e deve conter a declaração de conformidade com o original.
Ora, era de todo impossível alguém que não fosse legítimo representante daquela Associação exibir o original da falada procuração ao referido Sr. Dr. A por o mesmo estar guardado num cofre do Banco Tai Fung.
Consequentemente, jamais poderia o Sr. Dr. A extrair uma fotocópia desse original.
Consequentemente também não dispunha de quaisquer elementos que o habilitassem a emitir a declaração de conformidade do teor da fotocópia com o do original.
Está, assim, plenamente justificada a afirmação de que essa pública-forma é falsa. Tanto o Sr. Dr. A como o Sr. Dr. P eram mandatários daqueles H1 e J.
No dia 13 de Janeiro de 2003, o Sr. H, fazendo uso da referida pública-forma e depositando-a no Cartório Notarial da Ilhas, substabeleceu os poderes nela referidos nos Sr. J e K (fls. 537 a 547).
No dia 28 de Janeiro de 2003, o referido H fazendo uso daquela pública-forma falsa, substabeleceu os poderes nela referidas na pessoa do Sr. Dr. P, seu Advogado (fls. 478 a 479).
Os documentos em questão ficaram arquivados no Cartório Notarial das Ilhas, figurando nas respectivas senhas de apresentação como interessada a mencionada Associação e como representante desta o Sr. Dr. P (fls. 537 a 545).
Ora, em data indeterminada de 2003, mas em princípios do mesmo ano, os arguidos Sr. Dr. A e P e os Srs. H1 e J planearam alienar mediante a utilização daquela pública-forma falsa e tendo plena consciência dessa falsidade, vários imóveis pertencentes ao património da Associação de Piedade e de Beneficência "XXXX.
A fim de concretizar a plano que haviam concebido e outorgar as competentes escrituras publicas o Sr. Dr. A requereu à Direcção dos Serviços de Identificação a passagem de dois certificados respeitantes à "Associação de Piedade e de Beneficência XXXX", certificados esses que foram emitidos no dia 15 de Abril de 2003.
Por sua vez, o Sr. Dr. P procurou marcar, sem sucesso, junto de alguns Cartórios Notariais de Macau, designadamente no da Notária Privada Sra. Dra. Q data para a outorga dessas escrituras, entregado nesses Cartórios a documentação necessária para o efeito, designadamente a referida pública-forma falsa.
O arguido Sr. Dr. P manifestou sistematicamente junto desses Cartórios Notariais, extrema urgência na celebração das mesmas escrituras.
Além disso o Sr. Dr. P providenciou no sentido de através do seu Escritório de Advogado, ser liquidado o imposto de selo respeitante à compra e venda dos prédios descritos sob os nºs. 5795, como resulta dos documentos de fls. 490 a 521, em alguns dos quais aparece indicado, para os efeitos de "envio dos avisos e conhecimentos", o seguinte endereço: Av. da …… n°. …, …° andar - ….
Este endereço correspondia ao do Escritório do Sr. Dr. P.
Perante a indisponibilidade desses Cartórios Notariais, foi então contactado o Cartório Notarial do Sr. Dr. S.
Quem estabeleceu, para esse efeito, tal contacto foi o Sr. Dr. P que de igual modo aí procedeu à entrega de todos os documentos necessários para serem celebradas as escrituras públicas designadamente a pública forma atrás referida.
Esse contacto, reforçado, mais tarde, por outros feitos pelo Sr. J e por um secretário do Sr. H revelou-se altamente profícuo uma vez que nos dias 23 de Janeiro de 2003 e no dia 25 seguinte acabaram por ser outorgadas no Cartório Notarial do Sr. Dr. S e com a sua intervenção como Notário várias escrituras públicas tendo por objecto a compra e venda de imóveis pertencentes à Associação de Piedade e de Beneficência “XXXX”.
Assim no dia 23 de Junho de 2003, foi celebrada uma escritura Pública tendo por objecto a compra e venda dos prédios rústicos descritos na Conservatória do Registo Predial sob os nºs. 12255, 22759 e 12254, conforme melhor resulta da cópia que constitui o documento junto de fls. 121 a 124 cujo teor se dá aqui por reproduzido.
No dia 25 de Junho de 2003, foi celebrada uma Escritura Pública tendo por objecto a compra e venda das fracções autónomas AI do primeiro andar A, A2 do segundo andar A, A3 do terceiro andar A, A4 do quarto andar A, A5 do quinto andar A, Bl do 1 ° andar B, B2 do segundo andar B, B3 do terceiro andar B, B4 do quarto andar B, todas sitas na Rua do …… nº. … desta cidade e descritas na Conservatória do Registo Predial sob o nº. 5795, conforme resulta da fotocópia que constitui o documento junto de fls. 137 a 162.
Também no dia 25 de Junho de 2003 foi celebrada uma escritura pública de compra e venda dos prédios descritos na Conservatória do Registo Predial sob o nºs. 12249, 12248, 12251 e 12250. (fls. 163 e 167).
Ainda no dia 25 de Junho de 2003, foi celebrada uma escritura pública tendo por objecto a compra e venda das fracções autónomas AI, do primeiro andar A, A2 do segunda andar A, A3 do terceiro andar A, A4 do quarto andar A, A5 do quinto andar A, Bl do 1° andar B, B2 do segundo andar B, B3 do terceiro andar B, B4 do quarto andar B, B5 do quinto andar B, C1 do primeiro andar C, C2 do segunda andar C, C3 do terceiro andar C, C4 do quarto andar C, C5 do quinto andar C, D1 do 1 ° andar D, D2 do segundo andar D, D3 do terceiro andar D, D4 do quarto andar D, D5 do quinto andar D, E1 do primeiro andar E, E2 do segunda andar E, E3 do terceiro andar E, E4 do quarto andar E e E5 do quinto andar E, fracções estas descritas sob o n. 21459-1 a fls. 16 do Livro B50, conforme melhor resulta da fotocópias de fls. 199 a 209 cujo teor se dá aqui por reproduzido.
O preço da venda de cada um dos imóveis referidos nos documentos de fls. 121 a 124, de fls. 137 a 162 e de fls. 163 a 167 foi de $100,000.00 patacas e de cada um dos nos documentos de fls. 199 a 209 o de $80,000.00 patacas.
O comprador de todos aqueles imóveis foi o referido Sr. J, um dos representantes da Associação dos Bonzos.
Quem interveio em todas as escrituras atrás referidas em representação da Associação vendedora foi o já mencionado H aliás H1.
A qualidade do Sr. H, como Procurador da referida Associação, foi verificada com base numa certidão da pública-forma da procuração referida neste despacho.
O arguido Sr. Dr. S sabia e tinha plena consciência de que a referida pública-forma era falsa por ter recebido as comunicações que constituem os documentos de fls. 89 a 118 cujo teor se da aqui por reproduzido.
Não obstante ter plena consciência da falsidade da pública-forma em questão, o arguido Sr. Dr. S aceitou-a como boa, celebrando as referidas Escrituras.
Assim, deu como verificada a qualidade de Procurador da referida Associação de H numa altura em que lhe tinham sido retirados os poderes de representação.
O arguido Sr. Dr. S ao celebrar aquelas escrituras verificou o registo e a denominação da citada Associação através dum certificado passado no dia 15 de Abril de 2003 pela Direcção dos Serviços de Identificação de Macau.
Como se disse foi o arguido Sr. Dr. A quem requereu a passagem desse certificado sabendo que o mesmo se destinava a habilitar o arguido S a celebrar aquelas escrituras e sabendo também que a qualidade do Sr. H, seu cliente, como Procurador da vendedora Associação seria verificada com base na mencionada pública-forma falsa.

Atendendo ao que foi alegado e concluído no petitório do recurso, são as seguintes questões que constituem o objecto do presente recurso:

* da prescrição do procedimento disciplinar;

* da incompetência da entidade recorrida;

* da omissão da pronúncia quanto ao incidente de suspeição do instrutor;

* da violação do princípio do contraditório;

* da violação de segredo profissional;

* da interpretação analógica e extensiva do direito penal; e

* da relevância, como circunstância agravantes, da existência de um outro processo disciplinar, entretanto arquivado.

Apreciemos.

1. da prescrição do procedimento disciplinar;

Para o recorrente, como o facto constitutivo da infracção disciplinar que levou à sua punição teve lugar em 07JUN1995, já há muito ficou prescrito o prazo de 3 anos para o procedimento disciplinar.

Nos termos do disposto no artº 11º/1 e 2 do Código Disciplinar dos Advogados, adiante abreviadamente designado por CDA, o procedimento disciplinar prescreve no prazo de três anos a contar da data da infracção, e quando a infracção constituir simultaneamente ilícito penal, o procedimento disciplinar prescreve no mesmo prazo que o procedimento criminal, quando este for superior.

O recorrente limitou-se a pegar na infracção mais “longínqua” de todas infracções comprovadas determinantes da sua punição para tecer a sua tese da invocada extinção do procedimento disciplinar.

Mas na verdade, o recorrente procurou ignorar e tentar fazer o Tribunal ignorar a existência de outros factos comprovados que o fizeram incorrer pelo menos na responsabilidade disciplinar.

Pois da leitura da matéria de facto provada, verifica-se que o recorrente elaborou uma pública-forma de uma procuração já devidamente revogada em 07JUN1995, tendo nela declarado tê-la extraído do original da procuração e que a mesma estava em conformidade com o original e que posteriormente, em data indeterminada de 2003, mas em princípios do mesmo ano, o ora recorrente, juntamente com os co-arguidos do processo disciplinar Sr. Dr. P e os Srs. H1 e J planearam alienar mediante a utilização daquela pública-forma falsa e tendo plena consciência dessa falsidade, vários imóveis pertencentes ao património da Associação de Piedade e de Beneficência “XXXX”, plano esse que veio a ser concretizado mediante a feitura das várias escrituras públicas outorgadas em 23JUN2003 com o uso daquela pública-forma falsificada.

Todavia, mesmo que só olhemos para aquela mais longínqua infracção praticada em 07JUN1995, o procedimento disciplinar ainda hoje não se prescreve.

Pois a conduta, conforme a forma como foi descrita na matéria de facto assente, preenche tanto o tipo previsto e punido pelo 216º do CP de 1886, lei em vigor na data dos factos, como o previsto e punido pelo artº 245º do CP de 1995 que sucedeu o código de 1886.

O tal ilícito é punido pela pena maior de 2 a 8 anos de prisão face ao CP de1886 e pela pena de prisão de 1 a 5 anos no novo código.

Por força do disposto no artº 11º/2 do CDA, o prazo de prescrição do procedimento disciplinar é igual ao do procedimento criminal se a infracção em causa constitui ilícito criminal, o qual in casu é 10 anos – artº 110º/1-c do CP de 1995 (que in casu se aplica por ser mais favorável).

Por outro lado inexistindo no CDA normas reguladoras da matéria da suspensão e da interrupção do prazo de prescrição do procedimento disciplinar, é de aplicar supletivamente e mutatis mutandis o regime correspondente consagrado no direito penal, por remissão expressa operada pelo artº 65º-a) do CDA.

A matéria da suspensão e prescrição do procedimento criminal encontra-se previsto na parte geral do Código Penal.

Nos termos do disposto no artº 112º/1-b) e 2, a suspensão do prazo de prescrição dá-se com a notificação da acusação e só cessa com o trânsito em julgado da sentença, sem prejuízo da duração máxima inultrapassável de 3 anos.

Ao passo que o prazo de prescrição interrompe-se com a notificação do agente para o interrogatório como arguido e a prescrição tem sempre lugar desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, se tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.

Aplicando essas normas ao caso em apreço, estamos em condições de demonstrar que o procedimento disciplinar ainda não se encontra prescrito.

O facto de falsificação da pública-forma foi praticada em 07JUN1995, data a partir da qual se começou a contar o prazo de prescrição normal de 10 anos.

Em 05DEZ2003, foi o arguido ora recorrente notificado do início da instrução em processo disciplinar contra ele instaurado (notificação essa que é equiparada à notificação a que se refere o artº 113º/1-a) do CP), o que interrompeu o prazo de prescrição e fez correr o novo prazo de 10 anos – artº 113º/1-a) e 2 do CP de 1995.

Posteriormente, mediante a carta registada expedida em 03MAIO2005, o arguido ora recorrente foi notificado (presumidamente em 06MAIO2005) da acusação, o que implica logo a suspensão da contagem do prazo da prescrição de 10 anos.

Por força do disposto no artº 112º/1-b) e 2 do CP de 1995, enquanto pendente o procedimento, o prazo de prescrição suspende-se, mas não pode ultrapassar 3 anos.

Estar pendente significa que não houve ainda o trânsito da decisão que pôs termo ao processo, é justamente o que sucede no caso em apreço em que ainda hoje não houve decisão transitada em julgado.

Assim, o prazo de prescrição de 10 anos, iniciado de novo no dia seguinte a 05DEZ2003 (depois de interrompido) e suspendido desde 06MAIO2005 (com a notificação da acusação), voltou a correr em 06MAIO2008 (por ter atingido o fim da duração máxima de 3 anos de suspensão) e em princípio só terminará em 05DEZ2013.

Todavia, esse terminus ad quem deve ser anteposto pelo limite máximo da prescrição estabelecido no artº 113º/3 do CP de 1995, nos termos do qual a prescrição do procedimento penal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.

Aplicando todo esse preceituado, o procedimento disciplinar do facto praticado em 07JUN1995 só terminará ao fim de 18 anos (10 anos + 5 anos + 3 anos), isto é, em 07JUN2013.

O que significa que ainda hoje não se encontra prescrito o procedimento disciplinar mesmo em relação à tão só infracção praticada em 07JUN1995.

Improcede assim o argumento da prescrição do procedimento disciplinar.

2. da incompetência da entidade recorrida

Diz o recorrente que como o artº 1º do CDA limita a sua aplicabilidade jurisdicional aos advogados e no âmbito do exercício da sua profissão, a entidade recorrida não tem competência para o punir pelos factos praticados na qualidade de notário privado e no seu cartório.

A propósito desta questão, o douto parecer do Ministério Público já pôs a nu a sem razão do argumento deduzido pelo recorrente.

Ai destaca o Dignº Representante do Ministério Público que:

“Entende, depois, o recorrente que a qualidade em que interveio nos factos que originaram o processo que conduziu à sua punição disciplinar foi a de notário privado e não de advogado, daí retirando a conclusão da incompetência da entidade recorrida para o efeito, pois que, de acordo com o Dec Lei 66/99/M de 1/11 é a DSAJ a entidade que detém poder disciplinar sobre aqueles profissionais.
Entende-se a argumentação mas não se aceita ao raciocínio.
Isto porque:
Por um lado, como se sabe, em Macau a possibilidade do exercício da função notarial privativa é prerrogativa exclusiva dos advogados, razão, aliás, porque não existe propriamente a profissão de notário privado, existindo sim alguns advogados a que é permitido exercer essa função, se qualificados para o efeito, estando, assim, qualidade de notário privado dependente da de advogado, cujos deveres e crédito público só se podem acentuar em tais circunstâncias;
Por outro lado, pelo menos alguns dos deveres cuja violação é imputada ao recorrente (cfr. por exemplo, a do artº 1º do Cód. Deontológico), constituem deveres gerais de conduta, contendendo com a respectiva honra e responsabilidades, pelo que impossível se tornaria a separação do que umbilicalmente se mostra junto;
Finalmente, no caso concreto em escrutínio, em 2003, ano da ocorrência da maioria dos factos que estão na base da sua condenação, o recorrente já não era notário privado.
Tudo para reforçar que, de facto, a entidade recorrida detinha competência para punir, como puniu, o recorrente, sendo que o fez à luz própria dos deveres de advogado exercendo as funções de notário privado, o que, como é óbvio, não contende ou prejudica o que a tal propósito a entidade para o efeito vocacionada, no âmbito da DSAJ, possa vir a entender ou tenha entendido já.”.

Por serem sensatas e muito convincentes as doutas razões expostas pelo Dignº Representante do Ministério Público, somos de as subscrever e demos as mesmas aqui por integralmente reproduzidas para julgar improcedente esta parte do recurso.

3. da omissão da pronúncia quanto ao incidente de suspeição do instrutor

Aqui, o recorrente imputa ao acto recorrido a omissão da pronúncia quanto ao incidente de suspeição do instrutor, por ele suscitado na defesa por escrito constante das fls. 733 e s.s. do processo instrutor.

Lido com atenção o teor da defesa subscrita pelo próprio recorrente, verifica-se que na parte dominada NULIDADES foram tecidas algumas considerações vagas e conclusivas, sem a devida exposição de factos necessários a permitir compreensão por parte do seu destinatário quem quer que seja, acerca do relacionamento de alguns advogados, incluindo o Advogado Sr. Dr. T, Ilustre instrutor do inquérito e que na parte final da defesa escrita só se limitou a requer tal e qual o seguinte:

* que o processo seja arquivado por incompetência funcional deste distinto órgão jurisdicional;
* que os documentos e provas juntos pelo Sr. Instrutor – Dr. T – sejam desentranhados e arquivados no copiador do CSA;
* que o processo seja arquivado por prescrição legal nos termos do artº 37º do C.D.A. e artº 11 nº 1 do C.D.A.

Como se vê no acima transcrito, nenhum incidente de suspeição do instrutor foi suscitado.

Não tendo de facto suscitado qualquer incidente da suspeição do Ilustre Instrutor Sr. Dr. B no âmbito do processo disciplinar, inexiste logo qualquer omissão da pronúncia.

De qualquer maneira, percorrendo todo o processado ao longo do processo disciplinar, não detectámos qualquer circunstância, respeitante à pessoa do Ilustre Instrutor Dr. B no desempenho das funções no mesmo processo, susceptível de gerar prejuízo para a justiça da decisão do proceso disciplinar.

4. da violação do princípio do contraditório

Entende o recorrente que o acto recorrido padece da nulidade por violação do princípio do contraditório consagrado nos artº 10º e 36º do CDA – cf. o ponto14º das conclusões do recurso.

Mais concretamente falando, o recorrente diz que não lhe foi dada a oportunidade para exercer o seu direito de audiência em relação aos vários depoimentos testemunhais prestados pelos Srs. Advogados Dr. D, Dr. C e Dra. F.

Ora, tal como vimos supra quando tratámos da questão da alegada omissão de pronúncia, o recorrente apresentou defesa por escrito depois de receber a acusação.

Pela natureza secreta do processo disciplinar até ao despacho de acusação expressamente prescrita no artº 8º do CDA, os meios de prova produzidos ou apresentados ao longo de toda a fase da investigação pré-acusatória não podem ser submetidos ao princípio do contraditório.

Assim, para dar cumprimento ao estatuído no artº 10º do CDA, basta assegurar ao arguido o pleno exercício do contraditório após o despacho de acusação.

O que in casu sucedeu e portanto cai por terra a tese do recorrente nesta parte.

5. da violação de segredo profissional

Acerca desses meios de provas que o recorrente alegou não lhe ter sido dada oportunidade de exercer o contraditório, invoca agora que estes meios de provas foram obtidos por violação de segredo profissional por parte dos advogados inquiridos.

De acordo com o alegado e concluído nos pontos 15 a 21 das conclusões do recurso, o raciocínio do recorrente é simples: tudo quanto que os Senhores Advogados contaram quando inquiridos pelo Ilustre Instrutor no processo disciplinar, desde que tenham tomar conhecimento no exercício da profissão como mandatário em litígios pendentes, independentemente do seu teor, não pode fazer prova em juízo por ter violado o segredo profissional.

Obviamente errou o tal raciocínio.

Sem especificar o que corporiza e consubstancia o alegado segredo profissional, o tribunal não pode senão julgar improcedente o recurso nessa parte.

Todavia e ex abuntantia, compulsados os autos do processo disciplinar, nomeadamente as declarações prestadas pelos Ilustres Causídicos identificados pelo recorrente no petitório do recurso, não se vislumbra que o conteúdo dos depoimentos por eles prestados tenha contendido o segredo profissional.

6. da interpretação analógica e extensiva do direito penal

Aqui, sinceramente falando, não percebemos o que o recorrente pretende atacar, pois a tal alegação seria desprovida de qualquer conteúdo, se nós a não considerássemos como a mera reteiração dos argumentos já deduzidos acerca das questões de prescrição do procedimento disciplinar e de incompetência da entidade recorrida.

De qualquer maneira, pelo que ficou decidido supra nas partes dedicadas à questão da alegada prescrição do procedimento disciplinar e à alegada incompetência da entidade recorrida, naufraga a tese do recorrente nos termos da qual a entidade recorrida fez interpretação analógica e extensiva do Direito Penal aplicando regras do C.D.A. para punir eventuais infracções cometidas por Notário Privado.

7. da relevância, como circunstância agravantes, da existência de um outro processo disciplinar, entretanto arquivado

O recorrente entende que o M.I. Senhor Instrutor emprestou relevância, agravante, emergente de um processo disciplinar arquivado por inexistência de ilícito disciplinar.

Não tem razão o recorrente.

Pois, tal como observou e bem o Dignº Representante do Ministério Público, a aludida referência à existência de um outro processo disciplinar pendente contra o recorrente não é mais do que uma referência inócua já constante do relatório final e posteriormente reproduzida no acto recorrido.

Todavia, não se vislumbra que a tal circunstância chegou a exercer qualquer influência, nomeadamente como agravante, na determinação da dosimetria da punição, o que aliás é bem demonstrado pela óbvia justeza e proporcionalidade da medida concreta da pena disciplinar aplicada ao recorrente face à gravidade dos factos comprovados praticados pelo recorrente na qualidade de advogado.

Tudo visto, resta decidir.

Todavia, antes de decidir, é-nos conveniente dizer qualquer coisa sobre o que foi dito pelo recorrente nos pontos 8 e 9 das conclusões do recurso com vista a afastar a eventualidade de nos acusar da omissão de pronúncia.

Diz ai o recorrente que de acordo com o Código do Notariado as procurações notariais só podem ser revogadas perante notários público ou privado.

Parece que está a insinuar que a procuração referida no artº 5º acusação nunca foi validamente revogada por não tê-lo feito perante notário e que por isso a pública-forma que o recorrente elaborou não pode ser considerada falsificada.

Esta questão já foi objecto da decisão do Sr. Instrutor do processo disciplinar que remeteu para o decidido a este propósito no Douto Acórdão do Venerando Tribunal de Última Instância, tirado em 01DEZ2004 no proc. nº 23/2004, cuja cópia se encontra junta aos autos de processo instrutor a fls. 622 e s.s..

Sinteticamente falando, esse Douto Acórdão entende que de acordo com a lei vigente no momento da revogação (em 14FEV1995), a revogação das procurações regia-se pelo princípio da liberdade de forma (artº 219º do CC de 1966) e que tendo in casu a procuração sido revogada perante o Sr. Advogado Dr. C mediante as menções da vontade dos mandantes devidamente certificadas pelo mesmo Sr. Advogado, o acto de revogação foi legalmente válido.

Não vimos razões para não acolher as Doutas razões expostas nesse Acórdão do supremo Tribunal da RAEM e portanto não podemos senão dar aqui por integralmente reproduzidas para rejeitar a tese deduzida pelo recorrente de que a procuração em causa não foi validamente revogada.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente pela improcedência do recurso, com a taxa de justiça fixada em 15 UC.

Notifique.

RAEM, 14JUN2012


Relator Presente
Lai Kin Hong Vítor Manuel Carvalho Coelho

Primeiro Juiz-Adjunto Choi Mou Pan

Segundo Juiz-Adjunto
João A. G. Gil de Oliveira