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Recurso nº 381/2012/A
Recorrente: Agência Comercial A, Lda.
(A投資有限公司)
Entidade Recorrida: Chefe do Executivo da RAEM
(澳門特別行政區行政長官)




Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:
   “Agência Comercial A, Limitada”, sociedade comercial por quotas com sede em Macau, na Rua de Cantão, nº XX, Hotel XXX, XXº andar, vem nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 120º, 121º e 123º, nº 1, alínea c) do Código de Processo Administrativo Contencioso (doravante designado por CPAC), e por apenso aos autos de recurso acima catado, requer Procedimento Cautelar de Suspensão da Eficácia do Acto proferido pelo Exmo. Senhor Chefe do Executivo, do Governo da Região Administrativa Especial a 25 de Novembro de 211 no Relatório 8099/DURDEP/2011 de 13 de Janeiro de 2012 notificado à ora Requerente através do ofício do Exmo. Senhor Director da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, exarado na notificação nº 01687/DURDEP/2012, de 23 de Fevereiro de 2010, pela qual determinou a desocupação do terreno sito na encosta contígua ao edifício com o nº 679/681 da Rua Dois dos Jardins de Cheok Van, Coloane e a desmontagem e remoção de todas as construções e objectos que ali se encontram depositados.
   Nestes termos, e nos melhores de direitos, deverá a presente procedimento cautelar ser julgado procedente por provado decretando-se em conformidade;
a) A suspensão de eficácia do acto praticado pelo Exmo. Senhor Chefe do Executivo a 25 de Novembro de 2011 no Relatório 8099/DURDEP/2011 de 13 de Janeiro de 2012 notificado à ora Requerente através do ofício do Exmo. Senhor Director da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, exarado na notificação nº 01687/DURDEP/2012, de 13 de Fevereiro de 2012, pela qual determinou a desocupação do terreno sito na encosta contígua ao edifício com o nº 679-681 da Rua Dois dos Jardins de Cheok Van, Coloane e a desmontagem e remoção de todas as construções e objectos que ali se encontram depositados;
b) A suspensão da demolição dos prédios acima referidos até decisão final do Recurso Contencioso, e consequentemente, seguindo-se os ulteriores termos até final.
   
   Citada a entidade, esta contestou, pugnam do pela improcedência do pedido.
   O Digno Magistrado do Mº Pº apresentou o douto pareceu que se transcreva o seguinte:
   “No caso sub judice, o despacho suspendendo consiste em ordenar a demolição da obra construída pela Requerente e a devolução do terreno por si ocupado à RAEM, pelo que se consubstancia no acto administrativo de conteúdo positivo.
   Nesta medida e ao abrigo do disposto na alínea a) do art. 120º do CPAC, verifica-se in casu a idoneidade do objecto, no sentido de o qual ser susceptível de suspensão da eficácia.
   Sobe os requisitos previstos no nº 1 do art. 121º do CPAC, pode-se asseverar que é pacífico e constante que “A não verificação de um dos requisitos da suspensão de eficácia de acto administrativo previstos no nº 1do art. 121º do Código de Processo Administrativo Contencioso torna desnecessária a apreciação dos restantes porque o seu deferimento exige a verificação cumulativa de todos os requisitos e estes são independentes entre si.” (Acórdão do TUI no Processo nº 2/2009, vide, ainda Ac. do TUI no Processo nº 33/2009).
   E, em regra, cabe ao requerente o ónus de demonstrar, mediante prova verosímil e susceptível de objectiva apreciação, o preenchimento do requisito consagrado na alínea a) do referido nº 1, por aí não se estabelecer a presunção do prejuízo de difícil reparação.
   Não fica tal ónus cumprido com a mera utilização de expressões vagas e genéricas irredutíveis a factos a apreciar objectivamente. Terá de tornar credível a sua posição, através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivos. (vide., de entre muitos, Acórdão do TUI no Processo nº 33/2009)
   E, só relevam os prejuízos que resultam directa, imediata e necessariamente, segundo o princípio da causalidade adequada, do acto cuja inexecução se pretende obter, ficando afastados os prejuízos conjecturais, eventuais e hipotéticos.
   E, no que respeite à questão afim à suscitada no caso presente, o Venerando TUI inculca propositadamente (Acs. nos Procs. nº 13/2010 e nº 74/2010):
   Determina grave lesão do interesse público a suspensão da eficácia do acto administrativo que ordena a demolição de uma moradia construída, de início até ao seu acabamento, sempre sob cominação de duas ordens de proibição de execução de obra, no terreno de propriedade do Estado, circunstâncias de conhecimento do interessado.
   Não é de difícil reparação o prejuízo derivado da demolição de uma moradia nova localizada em Coloane, onde alegadamente vive um casal, que foi construída já menos de um ano e na situação referida no sumário anterior, sem qualquer valor histórico ou arquitectural de relevo, nem foi alegada qualquer ligação afectiva do interessado ou da sua família com a casa.
   Em conformidade com estas criteriosas jurisprudências, e ressalvado o respeito pela opinião diferente, temos por certo que in casu não merece deferimento o pedido de suspensão de eficácia em apreço.
   Bem ponderando, afigura-se-nos que a Requerente não alegou, no Requerimento Inicial, factos convincentes de se verifica in casu prejuízo de difícil reparação. E o art. 5º da contestação revela que os prejuízos resultantes da demolição determinada pelo acto suspendendo foram provocados pela Requerente, pelo que lhe são imputáveis.
   Sendo assim, não resta margem para dúvida de que não existe《prejuízo de difícil reparação》para os efeitos contemplados na a) do nº 1 do art. 121º do CPAC.
   De outro lado, os factos aludidos nos arts. 13º e 14º da contestação demonstra concludentemente que a suspensão da eficácia do despacho em crise contende frontalmente com o interesse público concretamente prosseguido pelo referido despacho. O que torna inviável e insubsistente o pedido de suspensão de eficácia.
   Por todo o expedido acima, propendemos pelo não provimento do presente pedido de suspensão de eficácia.”
   
   Cumpre conhecer.
   Sem vistos, artigo 129º nº 2 do CPAC.
   
   A requerente alegou os seguintes factos:
“1. Por despacho n.º 149/SATOP/92 publicado no boletim oficial de 9 de Novembro de 1992, o então Território de Macau concedeu à “Companhia de Investimento Imobiliário XX Limitada”, por arrendamento e com dispensa de hasta pública o terreno sito entre a praia de Cheoc Van e a praia de Hac Sá - na ilha de Coloane, com a área de 23741.
2. Depois, a Requerente adquiriu por escritura pública outorgada no cartório do Notário Privado XXX, o direito resultante da concessão por arrendamento incluindo a construção dos prédios urbanos descritos na Conservatória do Registo Predial de Macau sob os nº 22947 e 22948.
3. E onde actualmente se encontram edificadas as vivendas identificadas pelos nº 71 e 72 do empreendimento denominado Jardins de Cheoc Van.
4. Aquando das negociações para a aquisição dos aludidos direitos resultantes da concessão por arrendamento incluindo a propriedade de construção, os representantes legais da ora Recorrente visitaram por diversas vezes o dito empreendimento.
5. Tendo constatado que, tal como acontecia com a totalidade das vivendas ali existentes, o prédio urbano descrito sob o n.º 22948, dividia-se em área coberta e descoberta.
6. À direita da construção - vivenda - ali edificada (área coberta), existia ainda uma área descoberta que era também ela parte integrante do aludido prédio urbano descrito sob o n.º 22948.
7. A Requerente ocupa uma parcela de terreno que não lhe pertence, em concreto, uma parcela de terreno situada na encosta contígua ao prédio urbano 22948, que fica imediatamente por debaixo da plataforma construída com o propósito de prolongar a via pública denominada Rua Um dos jardins dos oceanos.
8. Esta ocupação foi alegadamente motivada por razões de segurança, higiene e saúde pública, as quais se encontravam notoriamente afectadas até a ora Recorrente ter procedido às necessárias obras.
9. A Requerente veio assim a apresentar um pedido de concessão do aludido terreno por arrendamento em 10 de Janeiro de 2012 (fls. 44 e ss).
10. Ainda não logrou obter qualquer reposta ao seu pedido de concessão do aludido terreno.
11. Em 23 de Fevereiro de 2012, o Senhor Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes notificou à representante do requerente da decisão final do Senhor Secretário para Obras Públicas e Transportes a ordenação da demolição das construções ilegais nos termos do ofício cujo teor se consta das fls. 23 e ss dos presentes autos.1

Conhecendo.
Como se sabe, o mecanismo de suspensão da eficácia do acto administrativo tem a natureza e a estrutura do processo cautelar, tendo como requisitos a instrumentalidade (artigo 123º do CPAC), o fumus bonni juris, o periculum in mora, e, até certo posto, a proporcionalidade.
Para que possa ser concedida a dita suspensão da eficácia terão de satisfazer-se, cumulativamente, o pressuposto do artigo 120º e os três requisitos gerais do nº 1 do artigo 121º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Vejamos em primeiro lugar o pressuposto.
Dispõe o artigo 120º:
“Artigo 120º (Suspensão de eficácia de actos administrativos)
A eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
a. Tenham conteúdo positivo;
b. Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
Tradicionalmente falando, a suspensão de eficácia tem uma função conservatória ou cautelar, admitida no âmbito dos processos do contencioso administrativo, que visa obter provisoriamente a paralização dos efeitos ou da execução de um acto administrativo.
Assim, o acto administrativo cuja suspensão se requer tem de ter, por natureza, conteúdo positivo, pois de outro modo, a ser decretada a suspensão, em nada alteraria a realidade preexistente, deixando o requerente precisamente na mesma situação em que se encontra.
   In casu, como o despacho suspendendo consiste em ordenar a demolição da obra construída pela Requerente e a devolução do terreno por si ocupado à RAEM, consubstancia manifestamente um acto administrativo de conteúdo positivo, pelo que o mesmo é susceptível de ser objecto da suspensão da eficácia ao abrigo do disposto na alínea a) do art. 120º do CPAC.
E quanto aos requisitos, digamos o seguinte:
Prevê o artigo 121° do CPAC que:
“Artigo 121º (Legitimidade e requisitos)
1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a. A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b. A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c. Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1. a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessa-dos façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
Em conformidade com o disposto no artigo 121º ora citado, para obter uma autorização da suspensão da eficácia de um acto administrativo deve satisfazer cumulativamente os requisitos, um positivo e dois negativos.
O requisito positivo é a possibilidade de ocorrer prejuízo de difícil reparação, enquanto os requisitos negativos a inexistência de grave lesão de interesse público pelo facto da suspensão e o não resultarem do processo fortes indícios da ilegalidade do recurso.
Em primeiro lugar, a título do requisito positivo, vejamos o dos prejuízos de difícil reparação.
Para tal, o requerente alegou essencialmente que a demolição daquela construção implicaria inutilizar por completo todo o imóvel pertencente à requerente uma vez que não será possível demolir aquela parte da construção sem destruir totalmente, a função do imóvel que ali se encontra construído, que é a habitação.
Em primeiro lugar, não podemos deixar de referir que, por um lado, a requerente ocupou o terreno por mera razão de segurança, por outro lado, a eventual demolição implica a destruição por completo todo o imóvel pertencente à ora requerente. O que nos parece é que a requerente não só construiu no pedaço do terreno público por motivo de segurança, como também fez, intencionalmente, a construção em cima do terreno público integrar na construção da sua habitação, criou um facto da referida impossibilidade de demolição.
Logo perde a razão por motivo da segurança em que a ocupação se fundamentara.
Por outro lado, hoje em dia, com o desenvolvimento dos meios de construção, não se afigura ser minimamente creditável a alegada impossibilidade da demolição das obras feitas no terreno público, mesmo que já se integrasse no imóvel que lhe pertence.
Digamos que, só se consideram prejuízos de difícil reparação os prejuízos que tem natureza de irreversibilidade, e todos os danos ou prejuízos económicos não tem esta natureza, podendo sempre ser recuperados ou compensados economicamente.
De máxime, a requerente, ao obter a procedência do contencioso com a anulação definitiva do acto recorrido, ainda poderia pedir a indemnização pelos prejuízos causados, até os não patrimoniais.
Por isso, como não tem os eventuais prejuízos contornos de irreversibilidade, não se verifica o primeiro requisito da suspensão de eficácia.
Não podemos ainda deixar de acrescentar a concordância com o douto parecer do Ministério Público, pois a não execução o acto contende frontalmente com o interesse público concretamente prosseguido pelo referido despacho, face ao facto de ter o DSSOPT ordenado por duas vezes a demolição da construção ilegal e de a ocupação do terreno público da requerente desencadeou-se pela forma de destruir as instalações feitas pelo IACM e de danificar o ambiente daquele sítio. O que torna inviável e insubsistente o pedido de suspensão de eficácia, pedido este que, neste ponto de vista, deve ser também indeferido.

Pelo exposto, acordam neste Tribunal de Segunda Instância em indeferir o pedido de suspensão da eficácia do acto em causa.
Custas pela requerente com a taxa de justiça de 8 UC’s.
RAEM, aos 26 de Julho de 2012
Choi Mou Pan
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng

Presente
Vítor Manuel Carvalho Coelho
1 O ofício tem seguinte teor em Chinês:

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