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Processo n.º 628/2012/A
(Suspensão de eficácia )

Data : 26/Julho/2012

ASSUNTOS:
    
    - Suspensão de eficácia de acto que adjudicou, na sequência de um concurso, a construção de uma passagem superior para peões
    - Requisitos da suspensão de eficácia
    - Reparação dos danos


SUMÁRIO:
     
     Não é de conceder a suspensão de eficácia de acto que adjudicou, na sequência de um concurso, a construção de uma passagem superior para peões, solicitada pela empresa que ficou graduada em segundo lugar, considerando que os prejuízos que invoca, tratando-se da construção de uma dada obra devidamente orçamentada e localizada no tempo e no espaço, não deixam de poder ser reparados se se vier a apurar no recurso contencioso que a requerente devia ter sido graduada em primeiro lugar e que ela era que devia ganhar o concurso e a ela ser adjudicada a obra, donde não se observar, no caso, o requisito decorrente do art. 121º, n.º 1, al. a) do CPAC.

O Relator,
  
João Gil de Oliveira

Processo n.º 628/2012/A
(Suspensão de Eficácia)

Data : 26 de Julho de 2012

Requerente: A

Entidade Requerida: Chefe do Executivo da RAEM
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    A, mais bem identifica nos autos vem requerer um

Procedimento conservatório de suspensão de eficácia

    relativo a acto do Exmo Senhor Chefe do Executivo da R.A.E.M, alegando fundamentalmente e em síntese:
    
    1. Este procedimento conservatório de suspensão de eficácia é instaurado em relação ao despacho de 11 de Maio de 2012 proferido pelo Chefe do Executivo da RAEM. No despacho em causa, o Chefe do Executivo adjudicou à B a execução da «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase — Construção da Passagem Superior para Peões A».
    2. Encontrou-se aberto, pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), o concurso público para a Empreiteira que se chama «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase — Construção da Passagem Superior para Peões A».
    3. A requerente participou no concurso público da Empreitada em causa. Entregue a proposta, a requerente foi notificada, em 31 de Maio de 2012, pela DSSOPT, de que o Chefe do Executivo tinha adjudicado, pelo despacho de 11 de Maio de 2012, à B a execução da empreitada, pelo montante de $ 38.217.969,50 (trinta e oito milhões, duzentas e dezassete mil, novecentas e sessenta e nove patacas e cinquenta avos).
    4. No entanto, a DSSOPT informou a requerente da decisão do Chefe do Executivo sem lhe ter oferecido o texto integral do despacho deste, nem a ter notificado das notas adquiridas no concurso público.
    5. Por isso, a requerente pediu em 4 de Junho de 2012 à DSSOPT que lhe mostrasse o relatório de avaliação das propostas. Entretanto, a DSSOPT só lhe emitiu o relatório requerido (documento 3, cujo original apensado nos autos do recurso) em 18 de Junho de 2012, quer dizer 14 dias após o pedido.
    6. Atento o teor do relatório de avaliação, a requerente descobriu que a B a que tinha sida adjudicada a empreitada tinha no concurso nota total de 85,78, e a requerente tinha 85,67, que se trata da segunda nota mais alta, apenas 0,11 ponto atrás daquela.
    7. Atentos os 4 itens de avaliação, a requerente descobriu que é relativamente grande a diferença de notas adquiridas pelas duas companhias em relação à experiência e qualidade de execução de obras. A B tinha 15,63 pontos enquanto a requerente 14,32, 1,31 pontos atrás daquela.
    8. Tendo suscitado dúvida à Comissão da avaliação das propostas quanto ao correcto no processo da avaliação, a requerente emitiu mais uma carta em 19 de Junho de 2012 à DSSOPT, requerendo os anexos 5, 7 e 8 escritos no relatório da avaliação.
    9. Dado que a DSSOPT não tinha respondido o pedido supracitado, a requerente emitiu em 22 de Junho de 2012 à DSSOPT mais uma carta em que pediu o acesso aos processos do concurso para a respectiva empreitada.
    10. A DSSOPT só autorizou o pedido em causa em 28 de Junho de 2012, por volta das 17h00, pelo que a requerente dirigiu-se na manhã de 29 de Junho de 2012 à DSSOPT para o acesso aos processos em causa.
    11. Após o acesso aos processos supra referidos, a requerente descobriu que a Comissão da avaliação das propostas realmente tinha erro na avaliação.
    12. Apesar de a Comissão em causa ter declarado no relatório: “não se encontra registo de atraso de pagamento de salários por parte dos concorrentes num prazo de 5 anos passados, contados a partir de 5 anos antes do dia da abertura do concurso até este dia. Segundo as regras da avaliação deste item, todos os concorrentes têm 1 ponto neste item” (o artigo 3.5 a fls. 6 do relatório), na verdade, a nota que a requerente tinha neste item (14,32) não inclui este 1 ponto.
    13. Na verdade, em relação à parte de atraso de pagamento de salários nos últimos 5 anos, a Comissão em causa deu 0 ponto à requerente, porque se encontraram, nos documentos exigidos pela Comissão à Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais (DSAL) em relação ao concurso (o anexo 8 do relatório da avaliação, ou seja o ofício n.º 1555/01023/DIT/GAP/2012), três casos definitivos de atraso no pagamento de salários por parte da requerente nos últimos 5 anos, casos esses envolvem 15 pessoas em total.
    14. A requerente não tinha nenhuma ideia da situação supra referido antes de ter tido acesso aos processos do concurso.
    15. Segundo a definição feita pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais no seu ofício, o chamado caso definitivo refere-se do caso em que se encontra decisão administrativa ou judicial.
    16. No entanto, segundo o registo da requerente, não se encontra, nos últimos 5 anos ou mais, nenhum registo, feito por qualquer serviço do governo (designadamente a DSAL) ou pelos tribunais, de atraso no pagamento de salários por parte da requerente.
    17. Por outro lado, segundo a certidão emitido pela DSAL à requerente em relação à mesma matéria, durante 16 de Junho de 2006 e 15 de Março de 2012, não há nenhum caso definitivo de atraso de pagamento de salários por parte daquela.
    18. Disso pode revelar que, quanto ao mesmo assunto – se a requerente tem registo de atraso no pagamento de salários – a DSAL prestou à DSSOPT informações integralmente contrárias às que prestou à requerente.
    19. Recebidas as informações prestadas pela DSAL, a DSSOPT não as prestou à requerente para que esta as confirmasse, pelo que a requerente não teve oportunidade de esclarecer ou emitir parecer sobre as informações.
    20. Na verdade, durante Março e Setembro de 2007, a requerente foi envolvida em três casos de conflitos laborais. No entanto, todos os conflitos foram resolvidos de forma transaccional através de negociação, sendo arquivados pela DSAL os respectivos processos.
    21. Por outro lado, independentemente das causas dos conflitos laborais e dos seus resultados, aqueles não devem ser considerados neste concurso, isso é porque segundo as regras da adjudicação desta empreitada, o registo de atraso de pagamento de salários refere-se do facto ilícito de atraso de pagamento de salários reconhecido na aplicação da Lei n.º 7/2008 (Lei das relações de trabalho). Dado que a Lei n.º 7/2008 só entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2009, qualquer incidente ocorrido antes desta data não deve ser considerado no concurso.
    22. Mesmo que sejam considerados os casos ocorridos antes de 1 de Janeiro de 2009, tais conflitos laborais eram resolvidos de forma transaccional e os respectivos processos eram arquivados pela DSAL. Pelo que, se seja aplicada a definição feita pela DSAL no ofício n.º 1555/01023/DIT/GAP/2012, isto quer dizer que o caso definitivo significa que há decisão administrativa ou judicial para o conhecimento do facto de atraso de pagamento de salários, os incidentes ocorridos entre Março e Setembro de 2007 não se tratam de “casos definitivos” de atraso de pagamento de salários.
    23. Com base do entendimento supracitado, a DSAL entendeu, na certidão por esta passada, que não existiu entre 16 de Junho de 2006 e 15 de Março de 2012 qualquer caso definitivo de atraso de pagamento de salários.
    24. A conclusão errada feita pela DSAL em relação a atraso de pagamento de salários dos trabalhadores causou que a requerente perdeu neste concurso, no item de experiência e qualidade de execução de obras, 1 ponto que aquela devia ter, do qual resultou que a mesma só adquiriu 85,67 pontos em total e ficou no segundo lugar, 0,11 ponto atrás da B.
    25. Se a requerente adquirisse aquele 1 ponto, a sua nota total seria 86,67, e aquela ficaria no primeiro lugar deste concurso com 0,89 ponto mais da B que adquiriu 85,78 pontos.
    26. Assim sendo, a requerente interpôs em 2 de Julho de 2012 recurso contencioso da decisão da adjudicação da empreitada proferida pelo Chefe do Executivo.
    27. A requerente pediu que o TSI anulasse a decisão administrativa que, proferida pelo recorrido no despacho de 11 de Maio de 2012, adjudicou à B a execução da «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase — Construção da Passagem Superior para Peões A», mais lhe pediu que reconhecesse que a requerente adquiriu 86,67 pontos no concurso e que lhe devia ser adjudicada a «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase — Construção da Passagem Superior para Peões A».
    28. Além disso, a requerente requereu subsidiariamente ao Tribunal que declarasse a anulação do acto administrativo do recorrido pela violação dos artigos 70, al. a), 114 e 115.
    29. O processo do recurso em causa está pendente.
    30. No entanto, interposto o recurso, a requerente descobriu que o Chefe do Executivo já tinha assinado em 19 de Junho de 2012 o Despacho do Chefe do Executivo n.º 160/2012 em que foi autorizada a celebração do contrato com a B, para a execução da empreitada em causa e foi escalonado o pagamento da verba no valor de $ 38.217.969,50 (trinta e oito milhões, duzentas e dezassete mil, novecentas e sessenta e nove patacas e cinquenta avos).
    31. Isso revela que a entidade que abriu o concurso (DSSOPT) e a Companhia adjudicatária (B) já começaram o exercício do respectivo acto administrativo.
    32. Apesar do recurso interposto pela requerente da decisão da adjudicação do Chefe do Executivo, nos termos do artigo 22 do Código do Processo Administrativo Contencioso, tal recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto do Chefe do Executivo da adjudicação da empreitada à B.
    33. Uma vez celebrado o contracto entre a DSSOPT e a B e iniciada a execução da obra, mesmo que o recurso interposto pela requerente seja julgado procedente, provavelmente não lhe seria adjudicada a empreitada.
    34. Assim, se a eficácia da adjudicação não seja suspensa, sofreria prejuízos difíceis de reparar o interesse que a requerente pretende defender através do recurso contencioso.
    35. Além disso, os programas da realização da obra dos concorrentes são diferentes, se a eficácia da adjudicação não seja suspensa agora, quando julgado procedente o recurso interposto pela requerente e lhe adjudicada a empreitada, o seu programa da realização da obra possivelmente será afectado pela obra já realizada pela B.
    36. A empreitada trata-se de construção duma passagem superior para peões que visa facilitar o atravessamento dos peões em Seac Pai Van.
    37. Tendo em conta a fraca densidade de tráfego dos veículos e peões no local em causa, mesmo que a suspensão da eficácia da adjudicação cause atraso da realização da obra, não seria prejudicado de qualquer forma o interesse público procurado pela obra.
    38. Além disso, tendo em conta os factos e fundamentos alegados pela requerente no recurso, é de certeza que não há nenhum indício da ilegalidade do recurso. Pelo contrário, segundo as provas documentais entregues pela requerente, há razões para crer que esta é qualificada para lhe ser adjudicada a empreitada.
    39. Por isso, este requerimento preenche plenamente os três requisitos previstos no artigo 121, n.º 1 do CPAC e deve ser deferido.

Face ao exposto, a requerente pede se julgue procedente este requerimento do procedimento conservatório e mande suspender a eficácia da decisão administrativa do Exmo Senhor Chefe do Executivo traduzida no despacho de 11 de Maio de 2012, que adjudicou à B a execução da «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase - Construção da Passagem Superior para Peões A», até à decisão definitiva do respectivo recurso contencioso.


O Exmo Senhor Chefe do Executivo contesta, alegando, em síntese:
     
     1. A entidade requerida não entende que o interesse do requerente sofrerá de prejuízo insanável. O referido prejuízo é apenas a adjudicação da respectiva obra, e o valor da empreitada da referida obra já foi fixado quando o requerente participou em concurso. Por outra palavra, o respectivo prejuízo já é liquidado e não é insanável.
     2. O valor e o número das obras já são fixados de forma detalhada nas listas de preços e medições do projecto apresentadas pelo requerente, pelo que pode-se avaliar, determinar concretamente e quantificar o prejuízo se for necessária a indemnização.
     3. Mesmo que a Administração Pública precise indemnizar o requerente, este pode obter a indemnização via recurso contencioso.
     4. Se o prejuízo for avaliável, não é insanável.
     5. Apesar de existirem umas diferenças nos projectos de execução desenhados pelos proponentes, a influência é fútil, porque a obra em questão é uma obra de construção, e a referida influência pode ser reduzida através da cooperação entre as companhias do ponto de vista da técnica de execução.
     6. Com base nisso, mesmo que continue-se a executar a obra adjudicada, o prejuízo do requerente não será insanável. Pelo que não está reunido o requisito previsto pelo art.º 121.º, n.º 1, al. a) do Código do Procedimento Administrativo (sic.).
     7. Em articulação com os objectivos da política de habitação pública delineados pelo governo em 2012, a autoridade lançou o “plano urbanístico para a zona de Seac Pai Van, na ilha de Coloane”, e a referida obra é uma empreitada importante deste plano. O interesse público será lesado de forma grave se a execução da empreitada for adiada, porque:
     8. Em primeiro lugar, a presente obra é a principal instalação de travessia para peões naquela zona. Se a execução da obra for suspensa, não será possível a transferência de circulação de veículos e peões e a segurança dos residentes será afectada, provocando situações perigosas e engarrafamentos.
     9. Em segundo lugar, a presente passagem superior para peões tem escadas, escadas rolantes, elevadores e pavimentos-guias, com o objectivo de construir um sistema de passagem sem impedimentos. Se for suspensa a execução da obra, a segurança dos deficientes e idosos será afectada.
     10. Em terceiro lugar, a presente obra tem de ser em articulação com outras obras de infra-estruturas do plano urbanístico para a zona de Seac Pai Van. Se for suspensa a execução da obra, o progresso das outras obras de infra-estruturas será afectado, e será possível que os residentes na zona de Seac Pai Van não tenham suficientes instalações de travessia.
     11. Em quarto lugar, a presente obra é uma passagem superior para peões com um vão longo e estrutura de aço, situa-se numa intersecção das principais artérias rodoviárias e do sistema de drenagem. Se for suspensa a execução da pena, serão afectados a execução das outras obras de infra-estruturas e o enterramento das canalizações públicas subterrâneas, e serão causados o aumento do preço e a alteração do desenho, bem como a execução de novo da obra desnecessária.
     12. Em quinto lugar, a presente obra precisa dum espaço relativamente grande para a execução e o prazo de execução é longo. Se for suspensa a execução da obra, quando as habitações públicas forem construídas em 2012, será inevitável a ocupação dos passeios e das faixas de rodagem, assim o ambiente habitacional será gravemente afectado e causará caos do trânsito.
     13. Com base nisso, o requerente não reúne o requisito previsto pelo art.º 121.º, n.º 1, al. b) do Código do Procedimento Administrativo (sic.).
     14. De acordo com o art.º 121.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo (sic.), deve ser reunidos ao mesmo tempo os três requisitos nas alíneas a), b) e c) deste número para suspender a eficácia dos actos administrativos. Por o requerente não reunir os requisitos nas alíneas a) e b), deve ser indeferido o seu requerimento de suspensão da eficácia do acto administrativo.
     15. O requerente ainda pôs em causa a informação do seu “registo de atraso de pagamento de salários nos últimos 5 anos” emitida pela Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais. Para o efeito, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes já pediu à DSAL para esclarecimento através do ofício, e verificou-se que no período compreendido entre 14 de Janeiro de 2007 e 13 de Janeiro de 2012, quando o Decreto-Lei n.º 24/89/M, «Relações Laborais – Regime Jurídico», ainda estava em vigor, o requerente tinha 3 registos de atraso de pagamento de salários.
     16. Estes três casos, após a investigação, foram resolvidos através de negociações entre o empregador e os empregados, e os queixosos obtiveram em fim as verbas devidas (incluindo os salários devidos). Porém, a resolução dos conflitos laborais não significa a inexistência do atraso de pagamento de salários, e em contrário, tem-se o resultado de resolução dos conflitos laborais porque existe o atraso de pagamento de salários.
     17. O requerente alegou que segundo a Lei n.º 7/2008 – Lei das relações de trabalho (entrada em vigor a partir do dia 1 de Janeiro de 2009), não teve registo de atraso de pagamento de salários, mas é indicado expressamente no art.º 3.5 do programa do concurso (vide as fls. 26 do processo n.º 7) “o registo de atraso de pagamento de salários nos últimos 5 anos”. Daí se pode ver que a Comissão de apreciação de propostas não tinha erro na avaliação.

    Pelo exposto, entende que o requerente não reúne os requisitos previstos pelo art.º 121.º, n.º 1, al.s a) e b) do Código do Processo Administrativo Contencioso, pelo que pede ao Tribunal para julgar improcedente o requerimento de suspensão da eficácia do acto administrativo, mantendo-se a eficácia do despacho proferido pelo Chefe do Executivo no dia 11 de Maio de 2012.

    
    A B, contra-interessada citada no procedimento à margem referenciado, vem contestar, dizendo, em suma:
    I. Alega a sociedade Requerente que o Despacho do Chefe do Executivo de 11.05.2012 que adjudica a obra n.º 30/2012 "Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase _ Construção da passagem superior para peões A", à sociedade contra-interessada pelo montante de MOP$38,217,969.50 e pelo prazo de 460 dias, está inquinado de ilegalidade, por ter ocorrido erro na aplicação dos critérios fixados para o processo de concurso, nomeadamente no ítem 3. "Experiência e qualidade em obras", e mais especificamente no sub-item 3.5. "Registo sobre dívida no pagamento de salários nos últimos cinco anos".
    II. No Programa do Concurso, sobre os critérios de avaliação e factores de ponderação, exara-se que o concorrente que não tiver registo de infracção por falta de pagamento pontual de salários na Direcção dos Assuntos Laborais nos últimos cinco anos contados desde a data do acto de abertura de propostas, neste caso, 12.01.2012 (abrangendo pois o período de 12.01.2007 a 11.01.2012) é pontuado com 1, o que tiver é pontuado com 0, sendo a existência de registos verificada por documento emitido para o efeito pela DSAL, que contém os relevantes registos das concorrentes durante esse período.
    III. Para integrar a noção de "salários em atraso", equivalente a "falta de pagamento pontual de salários", tem de se recorrer aos normativos legais da lei em vigor relevante para o efeito, que fixa o prazo para pagamento do salário ao trabalhador.
    IV. Desde 01.01.2009, data em que entrou em vigor a Lei n.º 7/2008, "Lei das Relações de Trabalho", nos termos do art. 97.° do mesmo diploma, e até ao presente, o normativo legal relevante é o artigo 62.°, n.º 3 - que estabelece que o salário deve ser pago no prazo de nove dias úteis, contados da data do vencimento da obrigação.
    V. Logicamente que, anteriormente a essa data, o conceito de salários em atraso, tem de ser integrado com a lei relevante então em vigor, a Lei n.º 24/89/M, "Relações de Trabalho em Macau", que dispunha no art. 28.°, n.º 3, que o pagamento do salário se devia efectivar no prazo máximo de 3 dias úteis imediatos ao do termo do período a que o salário respeitasse, ainda que no sub ítem se tenha mencionado entre parênteses o acima referido normativo legal da nova lei em vigor.
    VI. Sob pena de o critério fixado no "Programa do Concurso" ser indevidamente interpretado e aplicado na avaliação dos concorrentes, pois o mesmo preceitua que na ausência de infracção de falta de pagamento pontual de salários, nos últimos cinco anos contados da data do acto público de abertura das propostas, o concorrente é pontuado com 1, senão é pontuado com 0.
    VII. No "Relatório da Avaliação", a fls. 10, exara-se que segundo os registos fornecidos pela D.S.A.L. (Anexo 8) nos últimos cinco anos, contados desde a data do acto público da abertura das propostas nenhum concorrente tem qualquer registo de salários em atraso, por isso, nos termos dos critérios fixados, a todos os concorrentes ao concurso foi atribuído 1 ponto.
    VIII. Ainda, que assim não tivesse ocorrido, facto que a sociedade Requerente não prova ou demonstra, verifica-se pelos ofícios-resposta da DSAL, juntos aos requerimento inicial como Docs. 6 e 7, que os registos pela mesma solicitados se referem únicamente a infracções da sociedade ao art. 62.0, n.º 3, da Lei n.º 712008 e cobrem só o período de 16.03.2007 a 15.03.2012, estando aí declarado que nesse período existem dois registos de infracção ao art. 28.º da Lei n.º 24/89/M, normativo legal que previa o prazo legal em que o empregador devia pagar o salário ao trabalhador.
    IX. Resultam claramente do processo graves indícios de ilegalidade do recurso, sendo manifesta a litigância de má fé da Requerente e do seu mandatário que não pode manifestamente ignorar a falta de fundamento legal da sua pretensão, vindo ater-se ao "preciosismo" de no critério se citarem dois normativos legais de uma lei que não cobre a totalidade do período relevante em causa, para verificar da infracção ou infracções às leis de trabalho em vigor por falta de pagamento pontual de salários, nos últimos cinco anos contados da data do acto público de abertura das propostas.
    X. Não é manifestamente previsível que da execução do acto administrativo de execução resulte para a sociedade Requerente qualquer prejuízo e, muito menos, portanto, prejuízo de difícil reparação, quando o recurso contencioso do acto administrativo que pretende anulado se funda no facto de lhe haver sido atribuída a pontuação de O no subitem "Salários em atraso", e quando do relatório de avaliação resulta demonstrado, desde logo, facto contrário ao alegado pelo Requerente, pois daí consta que a todos os concorrentes por ausência de registos de salários em atraso nos últimos cinco anos foi atribuído 1 ponto.
    XI. A execução do acto administrativo de adjudicação recorrido não modifica de qualquer modo o "status quo ante" da sociedade Requerente, que, nos termos legais, concorreu a um concurso público de empreitada de uma obra seguramente prevendo que a sua proposta poderia não ser a melhor classificada no concurso.
    XII. O requisito positivo de existência de prejuízo de difícil reparação que a execução do acto possa causar, impõe sobre o Requerente da suspensão de eficácia do acto administrativo o ónus de alegar factos concretos susceptíveis de formarem a convicção de que a execução do acto causará provavelmente prejuízo de difícil reparação, devendo tal prejuízo ser consequência adequada, directa e imediata da execução do acto.
    XIII. Eventual prejuízo só se verificará se e quando o concurso for anulado por erro na aplicação dos critérios fixados para o concurso e à sociedade Requerente vier a ser atribuída pontuação mais alta em novo processo de avaliação, mas, se assim for, o seu eventual prejuízo é perfeitamente determinável, quantificável e passível de avaliação pecuniária, pois a verificar-se tal situação a medida da indemnização sempre seria o lucro que a Requerente poderia obter com a empreitada.
    XIV. O requisito negativo do art. 121.°, n.º 1, al c), do CPCA - que a suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto (sendo que a obra da passagem superior se destina a assegurar primordialmente o interesse público da segurança dos peões na travessia das vias públicas estradais, mas indirectamente, assegura, igualmente, a segurança do trânsito de veículos ao eliminar um previsível obstáculo) deve ser alegada e demonstrada pela entidade recorrida, sob pena de se ter por verificado, excepto se for manifesta e ostensiva tal lesão.
    XV. É facto notório e de conhecimento generalizado, a intensa construção de um grande número edifícios de habitação na zona de Seac Pai Van, que determinam e determinarão, em curto prazo, dado o avançado estado das obras de construção, um tráfico intenso e caótico de peões e veículos, sendo necessário que a Administração provisione, atempadamente, a referida zona de todas as infra-estruturas peonais, rodoviárias e de transportes adaptadas à quantidade de tráfico de pessoas e veículos, privados e públicos, que se prevê irá existir.
    Termos em que,
    Deve ser considerado totalmente improcedente, o pedido de suspensão de eficácia do acto de adjudicação, por falta de verificação cumulativa dos necessários requisitos legais.
    
    
    O Exmo Senhor Procurador Adjunto emite o seguinte douto parecer:
    Sendo certo que na suspensão de eficácia não poderão ser apreciados os vícios imputados ao acto administrativo, tendo de se partir da presunção da legalidade de tal acto e respectivos pressupostos de facto, temos que a maior parte do alegado pela requerente a tal nível no presente meio processual se apresenta como inócuo, nomeadamente as considerações atinentes à exposição dos motivos por que entende ter a Administração agido erradamente ao adjudicar a obra em questão à "B" e não à requerente, por, na sua perspectiva, dever obter melhor pontuação no concurso, matérias que, como é bom de ver, haverão que ser apreciadas em sede do recurso.
    Posto isto, vem a requerente, "A", requerer a suspensão de eficácia do acto do Chefe do Executivo de 11/5/12 que, na sequência do concurso para a "Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, 1ª Fase - Construção da Passagem Superior para Peões A" adjudicou a mesma à companhia acima mencionada, em detrimento designadamente da requerente.
    Tanto quanto se alcança da redacção introduzida no art. 121.° do CPAC, os requisitos contemplados nas diversas alíneas do seu n.º 1 para a suspensão de eficácia dos actos administrativos são cumulativos, bastando a inexistência de um deles para que a providência possa ser denegada.
    Tais requisitos são, um positivo (existência de prejuízo de difícil reparação que a execução do acto possa, previsivelmente, causar) e dois negativos (inexistência de grave lesão do interesse público e não resultarem do processo fortes indícios de ilegalidade do mesmo).
    Aceitamos a verificação "in casu" dos dois requisitos negativos, já que se não divisam indícios (e muito menos, fortes) de ilegalidade na interposição do recurso, sendo que, por outro lado, mesmo a decorrer, como causa directa e adequada da eventual procedência do presente meio preventivo a suspensão dos trabalhos porventura já em curso, a verdade é que se trata de "obra nova", de construção de uma passagem superior para peões, anteriormente não existente, não se vislumbrando, por tal facto, que da eventual delonga nesses trabalhos decorra grave lesão do interesse público, tanto mais que o acréscimo dos possíveis utentes deriva da construção do dito "bairro" de habitações públicas na zona, não se detectando ou comprovando que a ultimação do mesmo se encontre para muito breve.
    Quanto ao requisito positivo, tem vindo a constituir jurisprudência constante, o facto de, no incidente de suspensão de eficácia do acto administrativo, incumbir ao requerente o ónus de alegar factos concretos susceptíveis de formarem a convicção de que a execução do acto causará provavelmente prejuízo de difícil reparação, insistindo permanentemente tal jurisprudência no ónus de concretização dos prejuízos tidos como prováveis, insistindo-se também que tais prejuízos deverão ser consequência adequada, directa e imediata da execução do acto.
    A tal propósito, esgrime a requerente, apenas e só (cfr. pontos 32 a 35 da P.I. respectiva) com a circunstância de, não detendo o recurso contencioso que interpôs do acto, efeito suspensivo, adjudicada a obra e iniciados os trabalhos por parte da concorrente vencedora, mesmo que venha a obter sucesso com o recurso "provavelmente não lhe seria adjudicada a empreitada", sendo que, mesmo que o fosse "o seu programa de realização da obra será afectado pela obra já realizada pela B".
    Francamente, não descortinamos como, validamente, subsumir tal tipo de danos no conceito de "prejuízos de difícil reparação" a que se reporta o normativo supra aludido, ou seja, a al. a) do n° 1 d art. 121° CPAC.
    Desde logo, não se descortina por que razão, a vir a adjudicação a ser anulada judicialmente, a proposta da requerente não haveria de merecer, a devida maturação e ponderação, consonante com os termos daquela decisão, por parte da Administração, vinculada como esta se encontra, nas suas decisões, além do mais, à observância escrupulosa dos princípios da legalidade, prossecução do interesse público, igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade e boa-fé, nos termos dos artigos 3° e segs. do CPA.
    Trata-se, ao que se constata, apenas de "pouca fé" por parte da requerente relativamente à actividade e lisura das entidades administrativas, matéria que, contudo, como bem se percebe, não assume qualquer relevância quanto ao que nos ocupa.
    Depois, inexistindo, à partida, até por força da "alea" que normalmente intervém num concurso público, qualquer contrapartida ou obrigação da entidade adjudicante no suporte das despesas porventura efectuadas pelos concorrentes interessados nesse concurso, a verdade é que se não descortina (mais uma vez, na hipótese de sucesso do recurso contencioso) que, se porventura já efectuada parte da obra pela primitiva adjudicatária e contendendo a mesma com o projecto da requerente, o assunto não pudesse e devesse, em consonância, até, com os princípios acima assinalados, ser alvo de proposta negocial com a Administração, sem necessariamente daí decorrerem, como é óbvio, prejuízos para a requerente.
    Donde, por não verificação do requisito positivo cumulativo em causa, sermos a entender ser de indeferir o presente meio preventivo.
    
    Foram colhidos os vistos legais.
    
   
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito.
    
    III - FACTOS

É do seguinte teor o despacho recorrido, comunicado na seguinte notificação à requerente:

“Número da empreitada: 30/2012 – «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase — Construção da Passagem Superior para Peões A»

   Venho notificar a A de que segundo o despacho do Chefe do Executivo de 11 de Maio de 2012, é autorizada a adjudicação, à B, da execução da empreitada acima referida, pelo montante de $ 38.217.969,50 (trinta e oito milhões, duzentas e dezassete mil, novecentas e sessenta e nove patacas e cinquenta avos), por série de preços e pelo prazo de execução da obra de 460 dias.
   Mais notifico a A para, querendo, reclamar do despacho da adjudicação para o Chefe do Executivo, no prazo de 15 dias e, recorrer do despacho para o Tribunal de Segunda Instância, no prazo de 30 dias.
   Com os melhores cumprimentos!
   Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, aos 23 de Maio de 2012
  
Pelo Director,”

    IV - FUNDAMENTOS
     1. O objecto do presente recurso passa por saber se se verificam os pressupostos que possibilitam a suspensão da eficácia do acto praticado.
    O instituto da suspensão de eficácia do acto administrativo traduz-se numa medida de natureza cautelar, cujo principal objectivo é atribuir ao recurso, de que é instrumental, o efeito suspensivo. Isto porque, como regra, o recurso contencioso de anulação tem sempre efeito meramente devolutivo, já que o acto administrativo a impugnar goza de presunção de legalidade e do privilégio da executoriedade, entendida esta como “a força que o acto possui de se impor pela execução imediata, independentemente de nova definição de direitos”. 1
    
    2. Requisitos da suspensão de eficácia do acto
    Prevê o art. 121º do CPAC:
    “1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
    a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
    b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
    c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
    2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
    3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
    4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
    5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
    Da observação desta norma é fácil verificar que não importa nesta sede a análise da questão de fundo, de eventuais vícios subjacentes à decisão impugnada, tendo, no âmbito do presente procedimento preventivo e conservatório, que se partir, por um lado, da presunção da legalidade do acto e da veracidade dos respectivos pressupostos - fumus boni iuris -, por outro, de um juízo de legalidade da interposição do recurso.
    Tal como foi decidido no acórdão do Tribunal de Última Instância de 13 de Maio de 2009, proferido no processo n. 2/2009, para aferir a verificação dos requisitos da suspensão de eficácia de actos administrativos é evidente que se deve tomar o acto impugnado como um dado adquirido. O objecto do presente procedimento preventivo não é a legalidade do acto impugnado, mas sim se é justo negar a executoriedade imediata dum acto com determinado conteúdo e sentido decisório. Assim, não cabe discutir neste processo a verdade dos factos que fundamentam o acto impugnado ou a existência de vícios neste.2
    A suspensão dessa eficácia depende assim da verificação dos três requisitos das alíneas a), b) e c) do n.º 1 artigo 121º do C.P.A.C.: previsível prejuízo de difícil reparação para o requerente, inexistência de grave lesão de interesse público pelo facto da suspensão e o não resultarem do processo fortes indícios da ilegalidade do recurso.
    
    3 Os requisitos previstos no art. 121º supra citado, por norma, são de verificação cumulativa, pelo que, não se observando qualquer deles, é de improceder a providência requerida.3
    E se dizemos por norma é porque importa atentar nas situações particulares dos n.ºs 2, 3 e 4 do art. 121º e 129º, n.º 1 do CPAC, sendo certo que, no caso, não se verifica qualquer dessas situações.
    Daí que a ponderação da multiplicidade de interesses, públicos e privados, em presença, pode atingir graus de complexidade dificilmente compagináveis com a exigência de celeridade da decisão jurisdicional de suspensão dos efeitos da decisão impugnada. Sem falar no facto de o interesse público na execução do acto não se dissociar de relevantes interesses particulares e o interesse privado da suspensão tão pouco se desligar de relevantes interesses públicos, sendo desde logo importantes os riscos económicos do lado público e do lado privado, resultantes quer da decisão de suspensão dos efeitos quer da decisão de não suspensão.
    É importante reconhecer que a avaliação da juridicidade da decisão impugnada em tribunal reside hoje, muitas vezes, no refazer metódico da ponderação dos diferentes interesses em jogo.
    
    4. A lei não impõe o conhecimento de tais requisitos por qualquer ordem pré determinada, mas entende-se por bem que os requisitos da al. c), relativos aos indícios de ilegalidade do recurso, por razões lógicas e de precedência adjectiva deverão ser conhecidos antes dos demais e ainda, antes de todos, o pressuposto relativamente à legitimidade do requerente, já que a norma fala exactamente em quem tenha legitimidade para deles interpor recurso e, seguidamente, nos requisitos elencados nas diversas alíneas.
    Até porque a existência de fortes indícios da ilegalidade da interposição do recurso reporta-se às condições de interposição ou pressupostos processuais e não às condições de natureza substantiva ou procedência do mesmo.4
    
    5. Dentro do enquadramento abstracto e perfunctório que se vem realizando a propósito dos requisitos de suspensão de eficácia do acto, como está bem de ver, é pressuposto do procedimento a existência de um acto administrativo, enquanto conduta voluntária de um órgão da Administração, no exercício de um poder público e na prossecução de interesses postos por lei a seu cargo produtora de efeitos jurídicos num caso concreto5 e que esse acto seja recorrível.
Nos termos do nº 1 do art.º 28º do CPAC, “são actos administrativos contenciosamente recorríveis os que, produzindo efeitos externos, não se encontram sujeitos a impugnação administrativa necessária”.
E só os actos externos, definitivos e executórios são susceptíveis de recurso contencioso.
Os actos são definitivos ou não definitivos consoante se contenham resolução final que define a situação jurídica da pessoa cujo órgão se pronunciou ou de outra que com ela está ou pretende estar em relação administrativa.
E a resolução final é o acto que ponha termo a um processo gracioso ou a um incidente autónomo desse processo e de que não caiba recurso na ordem hierárquica.
Sendo de registar ainda que a definição de situações jurídicas difere da produção de efeitos jurídicos na medida em que se traduz numa decisão que fixa os direitos da Administração ou os dos particulares, ou os respectivos deveres, nas suas relações jurídicas. 6
   
   6. O caso
   Importa analisar agora a situação em concreto.
   Está em causa o acto consubstanciado no despacho do Exmo Senhor Chefe do Executivo que adjudicou à B a execução da «Empreitada da Urbanização de Seac Pai Van, Coloane, 1.ª Fase - Construção da Passagem Superior para Peões A», conforme documento 1, cujo original se mostra apensado aos autos do recurso.
   Trata-se de um caso em que a requerente A, candidata ao concurso em causa dele foi excluída.
   Pretende a requerente sustar a adjudicação efectuada, pondo em causa a adjudicação do concurso, pretendendo convencer de que foi erradamente graduada em segundo lugar.7. Pretende a requerente convencer da ilegalidade da adjudicação, perdendo-se em grande parte da sua alegação na demonstração do erro em que a Administração terá incorrido na referida graduação, reservando apenas quatro artigos a referir a matéria da ausência de prejuízos para o interesse público e dos prejuízos que para si podem decorrer da não concessão da suspensão .
   
   7. Como vimos os requisitos têm de ser cumulativos.
   Vamos dar como verificado, à partida, o requisito relativo à não determinação da grave lesão do interesse público (al. b) do art. 121º do CPAC, sendo que, em boa verdade a espera por mais algum tempo de uma passagem superior de peões, onde ela não existia até aqui, não acarretaria um dano de monta, sequer significativo, para a prossecução do interesse público.
   Também o requisito relativo à não ilegalidade do recurso (al. c) do art. 121º) se pode ter como verificado, vistas as razões aduzidas e que conformam, eventualmente, a possibilidade de ter existido uma errada graduação, a partir de uma indevida ponderação de factores habilitantes, sendo certo que não cabe aqui proceder a essa análise, o que cabe, outrossim, no recurso contencioso de que esta providência depende.


8. Resta, então, a análise do requisito da al. a) do citado art. 121º do CPAC.

E sobre esta matéria o requerente refere tão somente:

“37
Uma vez celebrado o contracto entre a DSSOPT e a B e iniciada a execução da obra, mesmo que o recurso interposto pela requerente seja julgado procedente, provavelmente não lhe seria adjudicada a empreitada.
38.
Assim, se a eficácia da adjudicação não seja suspensa, sofreria prejuízos difíceis de reparar o interesse que a requerente pretende defender através do recurso contencioso.
39.
Além disso, os programas da realização da obra dos concorrentes são diferentes, se a eficácia da adjudicação não seja suspensa agora, quando julgado procedente o recurso interposto pela requerente e lhe adjudicada a empreitada, o seu programa da realização da obra possivelmente será afectado pela obra já realizada pela B.
40.
A empreitada trata-se de construção duma passagem superior para peões que visa facilitar o atravessamento dos peões em Seac Pai Van.
41.
Tendo em conta a fraca densidade de tráfego dos veículos e peões no local em causa, mesmo que a suspensão da eficácia da adjudicação cause atraso da realização da obra, não seria prejudicado de qualquer forma o interesse público procurado pela obra.”
   
    9. Ora pensamos que não está concretizado um prejuízo de difícil reparação para o requerente com a não concessão da suspensão da adjudicação e obviamente da obra em concreto.
   Trata-se de uma obra de cerca de trinta e oito milhões de patacas, localizada no tempo e no espaço, cuja realização gera ao construtor um lucro que não deixa de ser estimável. O construtor, ao candidatar-se e ao empreender aquela obra sabe quanto é que poderá ganhar com ela, ainda que dentro de uma determinada margem de acordo com diversas variáveis, mas os lucros não deixam de ser previsíveis e avaliáveis.
   Não se invocam quaisquer outros prejuízos para a requerente decorrentes da não realização da obra nem da sua não paralisação.
   Refere a requerente que o seu projecto difere do da empresa adjudicatária e com quem foi celebrado o contrato, pelo que, se viesse a ser reposta no lugar de vencedora do concurso, daí adviriam prejuízos. Convenhamos que essa diferença reforça exactamente a possibilidade de, ao identificarem-se as diferenças, sempre será difícil estimar os custos de eventuais adaptações que a requerente tivesse eventualmente de fazer.
   Isto para se concluir que, se a requerente ganhar o recurso contencioso, das duas uma: ou é colocada no papel de construtora e as diferenças de obra realizadas ou a realizar, em função dos respectivos lucros que deixou de auferir não deixam de poder ser avaliadas; se a obra já estiver realizada, também os seus prejuízos, traduzidos nos lucros deixados de auferir não deixam de poder ser computados.
   Assim se conclui pela existência de eventuais prejuízos, mas que não se configuram nem como graves nem de difícil reparação, donde não se mostrar preenchido o requisito da al. a) do art. 121º do CPAC.
   A providência em curso não deixará, pois, por todas as razões acima invocadas, de se ter por não admitida, tendo-se por não verificado o requisito da al. a) do n.º 1 do art. 121º do CPAC.
    
    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, nos termos e fundamentos expostos, acordam em não conceder a requerida suspensão de eficácia do acto.
    Custas pela requerente, com 6 UC de taxa de justiça
                Macau, 26 de Julho de 2012
                João A. G. Gil de Oliveira
Presente Ho Wai Neng
Vitor Coelho José Cândido de Pinho
    
1 - Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo”, 8º ed., 409
2 Ac. TUI 37/2009, de 17/Dez.
3 - Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 3ª ed., 176; v.g. Ac. do TSI, de 2/12/2004, proc.299/03
4 - Ac. STA 46219, de 5/772000, www//:http.dgsi.pt
5 - Marcello. Caetano, Manual de Dto Adm., 10ª ed., I, 428
6 Marcello Caetano, ob. cit. 443.
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628/2012/A 1/32