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Processo n.º 49/2013. Recurso jurisdicional em matéria penal.
Recorrente: A.
Recorrido: Ministério Público.
Assunto: Recurso para o Tribunal de Última Instância. Tráfico de estupefacientes Medida da pena. Pena desproporcionada.
Data do Acórdão: 18 de Setembro de 2013.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
Ao Tribunal de Última de Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada.
O Relator

Viriato Manuel Pinheiro de Lima
  ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
  
I – Relatório
O Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base, por Acórdão de 18 de Março de 2013, condenou o arguido A, pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009, na pena de 11 (onze) anos e 9 (nove) meses de prisão.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 20 de Junho de 2013, negou provimento ao recurso interposto pelo arguido.
Inconformado, recorre o arguido para este Tribunal de Última Instância (TUI), terminando com as seguintes conclusões:
  Dado que o acórdão recorrido incorreu no vício por não ter ponderação suficiente quanto à determinação da “culpa” do recorrente, solicita que os MM.ºs Juízes do Tribunal de Última Instância:
1. Julguem procedentes os fundamentos invocados pelo recorrente;
  2. Julguem que o acórdão recorrido incorreu no vício na determinação da medida da pena por não analisar nem ponderar suficientemente a “culpa” do recorrente;
Por fim, condenem o recorrente numa pena efectiva inferior a 8 anos de prisão.
Na resposta à motivação do recurso a Ex.ma Procuradora-Adjunta defendeu que deve ser negado provimento ao recurso.
No seu parecer, a Ex.ma Procuradora-Adjunta manteve a posição já assumida na resposta à motivação.
  
II – Os factos
As duas instâncias inferiores consideraram provados os seguintes factos:
1.
A partir de Maio de 2012, o arguido A e o suspeito B (aliás B1) começaram a dedicar-se à actividade de tráfico de droga, adquirindo droga no Interior da China para a transportar, por via de Macau, para Manila, Filipinas, com a finalidade de obter interesse pecuniário.
2.
Em 5 de Junho de 2012, cerca das 09h00, o arguido levantou no [Hotel (1)], Shenzhen, três sacos de “droga ice” e depois chegou a Zhuhai por autocarro directo. Na casa de banho do posto fronteiriço de Gongbei, o arguido guardou esses três sacos de “droga ice” no interior das suas cuecas e transportou-os para Macau.
3.
No mesmo dia, isto é, em 5 de Junho de 2012, à tarde, o arguido guardou a referida droga nas suas cuecas e dirigiu-se ao Aeroporto Internacional de Macau para apanhar um voo aéreo com destino a Manila, Filipinas. Cerca das 19h55, o arguido passou com sucesso a inspecção de segurança no aeroporto e quando o arguido estava a esperar na zona de embarque do aeroporto, agentes da Polícia Judiciária interceptaram-no e levaram-no para o gabinete da Polícia Judiciária junto do Aeroporto Internacional de Macau para efeitos de investigação.
4.
No gabinete da Polícia Judiciária acima referido, os agentes da Polícia Judiciária encontraram em cada um dos dois lados laterais das cuecas do arguido A, ou seja, perto da cintura, 1 saco de cristal transparente, e no interior da bolsa a tiracolo de cor castanha que o arguido levou consigo, também encontraram 1 saco de cristal transparente, 1 caderno de telefone de cor azul, contendo impressos os dizeres “TELEFONE BOOK”, 1 nota com o valor facial de 500 pesos filipinos, 5 notas com o valor facial de 100 pesos filipinos, 4 telemóveis, 7 cartões SIM e 2 cartões de memória para telemóvel (cfr. o auto de revista e apreensão a fls. 916 a 917 dos autos).
5.
Após exame laboratorial, verificou-se que o peso líquido total de cada um dos três sacos de cristal transparente acima referidos era respectivamente de 400,88g, 401,29g e 701,99g, contendo “Metanfetamina” e “N,N-dimetanfetamina”, substâncias abrangidas pela Tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009. Após análise quantitativa, a proporção de “Metanfetamina” de cada um dos três sacos de cristal acima referidos foi verificada em 71,66% (com o peso de 287,27g), 72,59% (com o peso de 291,30g) e 75,29% (com o peso de 528,53g), respectivamente.
6.
A finalidade de o arguido ter guardado a referida droga é a de transportá-la para Manila, Filipinas, de forma a obter interesse pecuniário.
7.
O caderno de telefone, os telemóveis e as verbas acima referidos são instrumentos e ganho do arguido A na prática de actividade de tráfico de droga.
8.
O arguido A agiu de forma livre, voluntária e consciente a praticar dolosamente as condutas acima referidas.
9.
O arguido A bem sabia a natureza e características da aludida droga.
10.
  O arguido sabia perfeitamente que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
***
Na audiência de julgamento também foram provados os seguintes factos:
Conforme o CRC, o arguido é primário em Macau.
O arguido declarou possuir como habilitações académicas o 12.º ano de escolaridade, sendo mestre de medicina tradicional chinesa, auferindo mensalmente RM$2,000,00 a $3.000,00.

(2) Factos não provados
Não existem factos não provados que não estejam em conformidade com a factualidade assente.

  III - O Direito
  1. A questão a resolver
  A questão a resolver é a de saber se o Acórdão recorrido deveria ter aplicado uma pena inferior ao arguido.
  
  2. Medida da pena
  Vem suscitada a questão da medida da pena.
O Tribunal de 1.ª Instância condenou o arguido pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009, na pena de 11 (onze) anos e 9 (nove) meses de prisão.
  Quanto à questão suscitada a propósito da medida da pena este Tribunal tem entendido que “Ao Tribunal de Última de Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada” (Acórdãos de 23 de Janeiro e 19 de Setembro de 2008 e 29 de Abril de 2009, respectivamente, nos Processos n. os 29/2008, 57/2007 e 11/2009).
Não se mostram violadas quaisquer vinculações legais, nem regras da experiência, que não foram alegadas.
Mas, atentos os factos provados, os limites da penalidade e os critérios previstos no artigo 65.º do Código Penal para a determinação da medida da pena, parece-nos ser desproporcionada a pena fixada pelo acórdão recorrido.
Há que notar que o arguido confessou totalmente e sem reservas os factos de que vinha acusado, o que, no mínimo facilita a actuação da Justiça (se bem que não se possa sobrevalorizar esta circunstância em virtude o arguido ter sido encontrado com o produto estupefaciente nas suas roupas interiores).
Por outro lado, o dano social provocado pelo crime em Macau é relativamente diminuto, em virtude de o arguido, cidadão malaio, residente na Malásia, ter adquirido o produto estupefaciente no Interior da China e ter vindo a Macau apanhar o avião para as Filipinas, que era o destino final do mesmo. Macau foi, assim, apenas o local de trânsito, durante algumas horas. O dano provocado à sociedade de Macau é apenas o custo do funcionamento dos aparelhos policial, judicial e prisional.
Assim, considerando os limites da penalidade e o circunstancialismo dos autos, afigura-se-nos que a pena justa para o arguido é de 10 (dez) anos e 3 (três) meses de prisão, pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 17/2009.
  
IV – Decisão
Face ao expendido, julgam parcialmente procedente o recurso e como autor material, na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 8.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, condenam o arguido na pena de 10 (dez) anos e 3 (três) meses de prisão.
  Custas pelo arguido, com taxa de justiça que se fixa em 2 UC.
  Ao defensor do arguido fixam-se honorários no montante de MOP$3.750,00 (três mil setecentas e cinquenta patacas).
  Macau, 18 de Setembro de 2013.
  
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai


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Processo n.º 49/2013

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