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Processo nº 514/2010
Data do Acórdão: 25OUT2012

Assuntos:

Responsabilidade civil
Tiragem de fotografias

SUMÁRIO

Ao celebrar com os Autores um contrato de prestação de serviços, a Ré, enquanto fornecedora profissional e especializada dos serviços para a preparação e celebração de casamento, nomeadamente a tiragem de fotografias na cerimónia de casamento, deveria ter o devido cuidado de fazer o chamado “back up” fazendo reproduzir sempre pelo menos mais uma cópia das imagens tiradas e gravá-las num veículo diverso, uma vez que a Ré não podia ignorar a importância das fotografias para os Autores e que deveria prever a irrecuperabilidade das mesmas se algo anormal acontecer com o único veículo em que se encontram gravadas todas as imagens já tiradas na cerimónia do casamento.

O que lhe é perfeitamente exigível, dada a facilidade de se proceder a tal back up num veículo diverso.

Não o tendo feito e havendo ocorrido a falha, a Ré tem a obrigação de indemnizar os Réus pelo prejuízo que lhes causou a perda das imagens fotografadas.

O relator

Lai Kin Hong

Processo nº 514/2010


Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I

A e B, devidamente identificados nos autos, vieram intentar contra C COMPANY uma acção declarativa ordinária, que veio a ser registada no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base sob o nº CV1-08-0009-CAO, pedindo a condenação da Ré a pagar a eles a quantia de MOP$207.680,00, dispendida com o jantar da boda, e as quantias de MOP$7.000,00, MOP$5.000,00, MOP$680,00 e MOP$2.000,00, todas a títulos de danos patrimoniais, a que acrescem os juros legais até efectivo e integral pagamento, assim como as quantias de MOP$100.000,00, a título de danos não patrimoniais, a que acrescem os juros legais até efectivo e integral pagamento.

Por despacho proferido pelo Mmº Juiz titular do processo, foi liminarmente indeferido o pedido referente às reivindicadas despesas alegadamente realizadas com o jantar do casamento, nas quantias de MOP$207.680,00.

E ao mesmo tempo o Mmº Juiz titular do processo mandou citar a Ré para contestar.

Citada a Ré, contestou deduzindo excepção da extinção dos direitos invocados e subsidiariamente impugnando a acção contra ela intentada.

Notificados da decisão de indeferimento liminar e inconformados, vieram os Autores interpor o recurso dessa mesma decisão.

A Ré não respondeu ao recurso dos Autores.

Admitido o recurso e fixado a ele o regime de subida diferida, continuou a marcha processual na sua tramitação normal.

Veio a final ser proferida a seguinte sentença:

RELATÓRIO
A e B intentaram a presente acção comum de forma ordinária contra C有限公司, alegando, em síntese:
- A R. é uma sociedade comercial por quotas registada na Conservatória do Registo Comercial de Macau sob o n.º 22031 SO e que tem por objecto o comércio de artigos de noivado e fotografia;
- Em 4 de Março de 2006, a R. encontrava-se na Torre de Macau numa acção de promoção dos seus produtos, entre os quais se incluía todos os serviços referentes à preparação e celebração de casamentos, nomeadamente, entre outros, o aluguer de vestuário para os noivos e convidados, a preparação e maquilhagem dos noivos e as fotografias e filmagens de toda a cerimónia, tendo abordado os AA. para promover os seus produtos;
   - Os AA. pretendiam casar em 2006, segundo os usos e costumes chineses, casamento este que se veio a realizar em 24 de Dezembro de 2006;
   - Em 5 de Março de 2006, os AA. contrataram os serviços prestados pelo Restaurante de Macau Tower para a boda a celebrar no dia 24 de Dezembro de 2006, tendo para o efeito pago nessa data a quantia de MOP$10,000 a titulo de sinal e o remanescente de MOP$197,680 sido pago em 23 de Janeiro de 2007;
   - Em 5 de Março de 2006, e na sequência da promoção acima referida, os AA. resolveram contratar os serviços da R. para a preparação e celebração do seu casamento e boda, a realizar em 24 de Dezembro de 2006, tendo efectuado de imediato o pagamento de MOP$7,000;
   - Em Julho de 2006, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. para escolherem as roupas para o casamento;
   - Nessa ocasião, verificaram que o vestuário de cerimónia existente no estabelecimento da R. nada tinha a ver com o vestuário que esta promovera na Torre de Macau e que os levara a contratar os seus serviços;
- O estabelecimento da R. só tinha roupa muito velha, em muito mau estado de conservação e em muito pouca quantidade;
- Nessa ocasião foi dito aos AA. pela R. que se quisessem roupa de melhor qualidade tinham que pagar mais sobre o preço convencionado e já integralmente pago;
- Face à escassez de roupa e à falta de qualidade desta apresentada pela R., os AA. ficaram com medo de chegarem ao dia do casamento e não terem roupa para a cerimónia;
- Motivo pelo qual, decidiram dirigir-se à D Wedding onde alugaram 13 conjuntos de roupa de cerimónia tendo, para tanto, pago a quantia de MOP$5,000;
- Em Novembro de 2006, a A. telefonou para a R. para marcar o dia 26 de Novembro para experimentar a maquilhagem que iria usar no casamento ao que lhe foi dito que, para esse efeito, teria que se deslocar ao seu estabelecimento em Zhuhai;
- A A. teve que se deslocar a Zhuhai no dia 26 de Novembro de 2006 para experimentar a maquilhagem que contratara em Macau;
- Quando a A. se dirigiu ao estabelecimento da R. em Zhuhai para experimentar a maquilhagem, foi-lhe dito que não constava nenhuma reserva ou marcação feita em seu nome, pelo que não podia ser atendida;
- A A. pediu-lhes então para lhe fazerem uma reserva ou marcação para o dia 2 de Dezembro de 2006 na loja de Macau;
- A A. mais uma vez ficou com receio de que não lhe fosse efectuada uma boa maquilhagem e, em consequência e à cautela, contratou outra empresa para garantir que efectivamente teria um bom serviço de maquilhagem no dia do seu casamento, tendo despendido para o efeito mais MOP$680;
- Em meados de Dezembro de 2006, a mãe e os irmãos do A. foram ao estabelecimento da R. para escolherem os fatos para a cerimónia, sendo que mais uma vez não tiveram possibilidade de escolha, tendo saído de lá sem qualquer roupa e tendo que ir adquirir a mesma noutro estabelecimento tendo despendido para o efeito mais MOP$2,000;
- No dia do casamento, 24 de Dezembro de 2006, os AA. foram buscar e acompanharam até à sua casa dois operadores de video e fotografia da R. para filmarem e fotografarem os noivos e os preparativos para a cerimónia;
- Chegada a hora da sessão de filmagens os dois operadores de video e fotografia tinha desaparecido de sua casa e fizeram-no de forma definitiva não tendo efectuado qualquer filmagem ou tirado quaisquer fotografias aos noivos ou a suas famílias em casa destes;
- Quando terminaram a sessão fotográfica, o operador de video e fotografia da R. disse aos AA. que tinha tirado mais 280 fotografias do que o contratado e por isso tinha que receber um pagamento extra;
- Os AA. disseram ao operador de video e fotográfico da R. para continuar a tirar as fotos que eles pagavam o extra;
- Terminada a celebração do casamento tradicional chinês dos AA. ficaram a aguardar que a R. lhes telefonasse, conforme fora combinado, para irem buscar os fotos e filmagens da cerimónia;
- Volvida uma semana, e como a R. nada disse, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. e questionaram pela entrega dos fotos e filmagens ao que foram informados que tinham que aguardar mais uma semana;
- Em 7 de Janeiro de 2007, a A. dirigiu-se novamente ao estabelecimento da R. para ir buscar as fotografias, quando constatou que faltavam cerca de 800 fotografias, sendo que a maioria delas eram fotos de grupos, com amigos, chefes, colegas e familiares que tinham vindo de outros países propositadamente para a cerimónia de casamento dos AA.;
- Com efeito, tratavam-se de fotos mais importantes para os AA. e como tal, de imediato, reclamaram à R. a apresentação das fotografias em falta;
- A R. respondeu que já tinham imprimido todos os fotos existentes no computador, num total de 418, e que não existiam mais fotos;
      - Mais disseram aos AA. que iam ver se encontravam os fotos em falta;
- Posteriormente, o A. contactou a R. e quis saber o que é que se passava com os fotos, tendo-lhe sido reafirmado que não encontravam os fotos por causa de o hard disk já tinha ido para reparação;
   - A A. em virtude da não existência dos fotos do seu casamento entrou numa profunda depressão, acompanhada de profunda tristeza, de insónias e grande ansiedade emocional que a levou a ter que recorrer a serviços médicos especializados;
   - Ambos os AA. não sabem como explicar a não existência de fotos da cerimónia de casamento a familiares, amigos, chefes e colegas que reiteradamente perguntam pelas mesmas, ficando por isso profundamente desgostosos;
   - Acresce que esta situação afectou profundamente a relação amorosa entre os AA. que passaram a culpabilizar-se mutuamente sobre a contratação da R.
Pedindo, a final, que seja a presente acção julgada procedente, e condenada a R. no pagamento de uma indemnização no montante de MOP$322,360, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados aos AA., acrescidos de juros legais vincendos contados desde a data de citação até integral e efectivo pagamento,
bem como no pagamento das custas do processo e procuradoria.
*
No despacho liminar, foi absolvido o pedido dos AA. no respeitante aos alegados danos resultantes da realização do jantar da boda, no montante de MOP$207,680, do qual foi interposto recurso (cfr. fls. 53 e 58 e seguintes).
*
Citada pessoalmente a R., esta apresentou contestação, tendo impugnado os factos articulados pelos AA. e invocado a excepção peremptória de extinção do contrato por efeito de novação.
*
Oportunamente, realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância das formalidades legais.
O Tribunal é o competente e o processo o próprio.
  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas, e têm interesse processual.
Não existe outras nulidades, excepções nem questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
***
FUNDAMENTOS
Face à prova produzida, resulta provada a seguinte matéria fáctica com interesse para a decisão da causa:
   A R. é uma sociedade comercial por quotas registada na conservatória do registo comercial de Macau sob o n.º 22031 SO e que tem por objecto o comércio de artigos de noivado e fotografia. (cfr. Doc. n.º 1 junto na p.i.) (A)
Em 4 de Março de 2006, a R. encontrava-se na Torre de Macau numa acção de promoção dos seus produtos, entre os quais se incluía todos os serviços referentes à preparação e celebração de casamentos, nomeadamente, entre outros, o aluguer de vestuário para os noivos e convidados, a preparação e maquilhagem dos noivos e as fotografias e filmagens de toda a cerimónia, tendo abordado os AA. para promover os seus produtos. (B)
   Os AA. pretendiam casar em 2006, segundo os usos e costumes chineses, casamento este que se veio a realizar em 24 de Dezembro de 2006. (C)
   Em 5 de Março de 2006, os AA. contrataram os serviços prestados pelo Restaurante de Macau Tower para a boda a celebrar no dia 24 de Dezembro de 2006, tendo para o efeito pago nessa data a quantia de MOP$10,000 a titulo de sinal e o remanescente de MOP$197,680 sido pago em 23 de Janeiro de 2007. (cfr. Docs. n.ºs 2 e 3 juntos na p.i.) (D)
   Em 5 de Março de 2006, e na sequência da promoção referida em B), os AA. resolveram contratar os serviços da R. para a preparação e celebração do seu casamento e boda, a realizar em 24 de Dezembro de 2006, tendo efectuado de imediato o pagamento de MOP$7,000. (cfr. Doc. n.º 4 junto na p.i.) (E)
   Em Julho de 2006, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. para escolherem as roupas para o casamento. (F)
   No dia do casamento, 24 de Dezembro de 2006, os AA. foram buscar e acompanharam até à sua casa dois operadores de video e fotografia da R. para filmarem e fotografarem os noivos e os preparativos para a cerimónia. (G)
   Na festa do jantar do casamento, o operador de video e fotografia da R. disse aos AA. que se ultrapassasse o número de fotografias inicialmente acordado tinha que receber um pagamento extra. (H)
   Os AA. disseram ao operador de video e fotográfico da R. para continuar a tirar as fotos que eles pagavam o extra. (I)
   Quando os AA. chegaram ao estabelecimento da R. em Julho de 2006, lá tinha algumas roupas velhas. (1º)
Nessa ocasião foi dito aos AA. pela R. que se quisessem roupa de melhor qualidade tinham que pagar mais sobre o preço convencionado e já integralmente pago. (2º)
Os AA. ficaram com medo de chegarem ao dia do casamento e não terem roupa para a cerimónia, pelo que decidiram dirigir-se à D Wedding onde alugaram 13 conjuntos de roupa de cerimónia tendo, para tanto, pago a quantia de MOP$5,000. (3º e 4º)
Em Novembro de 2006, a A. telefonou para a R. para marcar o dia 26 de Novembro para experimentar a maquilhagem que iria usar no casamento ao que lhe foi dito que, para esse efeito, teria que se deslocar ao seu estabelecimento em Zhuhai. (5º)
A A. teve que se deslocar a Zhuhai no dia 26 de Novembro de 2006 para experimentar a maquilhagem. (6º)
Nesse dia, a A. dirigiu-se ao estabelecimento da R. em Zhuhai para experimentar a maquilhagem, mas não foi feito, a A. pediu então para lhe fazerem noutro dia. (7º, 8º, 20º, 21º e 22º)
A A. mais uma vez ficou com receio de que não lhe fosse efectuada uma boa maquilhagem e, em consequência e à cautela, contratou outra empresa para garantir que efectivamente teria um bom serviço de maquilhagem no dia do seu casamento, tendo despendido para o efeito mais MOP$680. (9º)
Terminada a celebração do casamento tradicional chinês dos AA. ficaram a aguardar que a R. lhes telefonasse, conforme fora combinado, para irem buscar os fotos e filmagens da cerimónia. (11º-A)
Volvida uma semana após o casamento, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. e questionaram pela entrega dos fotos e filmagens ao que foram informados que tinham que aguardar mais uma semana. (11º-B)
Mais tarde, a A. dirigiu-se novamente ao estabelecimento da R. para ir buscar as fotografias, quando constatou que faltavam a maior parte das fotografias tiradas no banquete, nomeadamente em grupo, com amigos, chefes, colegas e familiares. (12º)
Posteriormente, o A. contactou a R. e quis saber o que é que se passava com os fotos, tendo-lhe sido reafirmado que não encontravam os fotos por causa de o hard disk ter jogado fora, pelo que os fotos estavam perdidos. (13º)
Conforme o acordo celebrado entre os AA. e a R. na acção de promoção de produtos na Torre de Macau no dia 5 de Março de 2006, eram de MOP$7,000 as despesas para a preparação e celebração do casamento dos AA., em que se integravam os seguintes serviços:
1. Cinco vestidos de noiva (incluindo um vestuário chinês tradicional para noiva, bordado com fio cor de ouro e prata), um vestido de dama de honra, dois fatos de noivo, dois vestidos para a sogra;
2. A maquilhagem da noiva para todo o dia (incluindo a maquilhagem da dama de honra), e é cobrada a quantia de MOP$100 por cada maquilhagem adicional;
3. Fotografia (incluindo 10 rolos de filmes e revelação de 360 fotos 4R), e, pela revelação, é cobrada a quantia de $80 por cada rolo de filme adicional;
4. Filmagem para a reprodução de um DVD, e é cobrada a quantia de $80 por cada cópia de DVD adicional (17º)
Durante a cerimónia de casamento dos AA., foram tiradas várias fotografias, mas só foram revelados 418 fotos. (23º e 24º)
      A R. propõe a seguinte forma de compensação:
1. As despesas totais de tiragem de fotografias no dia de casamento, no montante de RMB$1,500, seriam devolvidas integralmente aos AA.;
2. Os serviços de fotografia prestados no dia de casamento: em vez da revelação gratuita de 10 rolos de filmes com 360 fotos, a Ré daria aos AA. 418 fotos tirados no dia de casamento, sendo os excedentes 58 fotos relativamente ao número inicial mente acordado oferecidos gratuitamente aos AA.;
3. A pedido dos AA., a R. reproduziria 10 cópia de vídeo relativas às fotografias em causa que seriam oferecidas gratuitamente aos AA.;
     4. A revelação gratuita de 836 fotos 4R a serem oferecidos aos AA. (25º)
*
Em sede do enquadramento jurídico, cumpre analisar os factos e aplicar o direito.
De acordo com os factos acima descritos, podemos configurar a relação controvertida material estabelecida entre AA. e R., aferida através do seu conteúdo, como um contrato de prestação de serviços.
    Consagra-se no artº 1080º do Código Civil de Macau o seguinte:
“Contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.”
Nos termos do acordado, a R. obriga-se a prestar diversos serviços para a preparação e celebração do casamento dos AA., a saber, aluguer de vestuário, tratamento de maquilhagem, serviço de tiragem de fotografias e filmagem, e respectiva revelação e reprodução em DVD, mediante pagamento por parte dos AA. duma prestação pecuniária.
Segundo o princípio da liberdade contratual previsto no artº 399º do Código Civil de Macau, “Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste Código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver”.
Uma vez celebrado o contrato, este deve ser pontualmente cumprido, nos termos do artº 400º, nº 1 do mesmo Código, sob pena de o devedor faltoso vir a tornar-se responsável pelos prejuízos causados ao credor (artº 787º do CCM).
    Vejamos se as partes cumpriram as suas obrigações.
  Conforme a matéria provada nos autos, verifica-se que as partes acordaram que os AA pagavam MOP$7,000 à R., e esta por sua vez proporcionava serviços para a preparação e celebração do casamento dos AA., em que se integravam os seguintes serviços: aluguer de cinco vestidos de noiva, um vestido de dama de honra, dois fatos de noivo, dois vestidos para a sogra; tratamento de maquilhagem da noiva para todo o dia (incluindo a maquilhagem da dama de honra); tiragem de fotografia (incluindo 10 rolos de filmes e revelação de 360 fotos 4R); e filmagem para a reprodução de um DVD.
Ora, no que respeita ao pagamento do preço, provado já nos autos o seu pagamento pelos AA., pelo que é altura oportuna para apreciar se por parte da R. também cumpriu as suas obrigações.
Em primeiro lugar, no respeitante à questão de vestuário, ficaram assentes os seguintes factos pertinentes para a decisão:
  “Em Julho de 2006, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. para escolherem as roupas para o casamento. (F)”
“Quando os AA. chegaram ao estabelecimento da R. em Julho de 2006, lá tinha algumas roupas velhas. (1º)”
“Nessa ocasião foi dito aos AA. pela R. que se quisessem roupa de melhor qualidade tinham que pagar mais sobre o preço convencionado e já integralmente pago. (2º)”
“Os AA. ficaram com medo de chegarem ao dia do casamento e não terem roupa para a cerimónia, pelo que decidiram dirigir-se à D Wedding onde alugaram 13 conjuntos de roupa de cerimónia tendo, para tanto, pago a quantia de MOP$5,000. (3º e 4º)”
Ora segundo a matéria fáctica acabada de descrever, julgo que não podemos assacar a responsabilidade à R. pelas despesas do vestuário, uma vez que como as partes não chegaram a especificar, aquando da celebração do contrato, que qualidade de roupas seria destinada ao uso dos AA., e embora algumas das roupas encontradas na loja da R. fossem velhas, esta não deixou de cumprir a sua obrigação. O facto de os AA. ter recorrido a outro estabelecimento foi escolha e decisão deles, nada tem a ver com a R.
Em segundo lugar, no que concerne ao tratamento de maquilhagem, ficou assente a seguinte matéria fáctica:
“Em Novembro de 2006, a A. telefonou para a R. para marcar o dia 26 de Novembro para experimentar a maquilhagem que iria usar no casamento ao que lhe foi dito que, para esse efeito, teria que se deslocar ao seu estabelecimento em Zhuhai. (5º)”
“A A. teve que se deslocar a Zhuhai no dia 26 de Novembro de 2006 para experimentar a maquilhagem. (6º)”
“Nesse dia, a A. dirigiu-se ao estabelecimento da R. em Zhuhai para experimentar a maquilhagem, mas não foi feito, a A. pediu então para lhe fazerem noutro dia. (7º, 8º, 20º, 21º e 22º)”
“A A. mais uma vez ficou com receio de que não lhe fosse efectuada uma boa maquilhagem e, em consequência e à cautela, contratou outra empresa para garantir que efectivamente teria um bom serviço de maquilhagem no dia do seu casamento, tendo despendido para o efeito mais MOP$680. (9º)”
Mais uma vez, foi por iniciativa da A. ter deixado de usufruir o serviço prestado pela R.
Como não foi acordado entre as partes a experimentação de maquilhagem, em princípio não teria a A. direito a esse serviço. Mesmo que entendesse teria a R. essa obrigação perante a A., a verdade é que foi ela própria que recusou da prestação pela R., indo contratar outra empresa para tratamento de maquilhagem por estar com receio.
Assim, a R. não é obrigada a suportar essa despesa adicional de MOP$680.
Em terceiro lugar, quanto ao serviço de tiragem de fotografias e filmagem, julgo que já neste caso não ter a R. cumprido o que ficou obrigada.
Temos a seguinte matéria provada pertinente para apreciação da respectiva questão:
“Terminada a celebração do casamento tradicional chinês dos AA. ficaram a aguardar que a R. lhes telefonasse, conforme fora combinado, para irem buscar os fotos e filmagens da cerimónia. (11º-A)”
“Volvida uma semana após o casamento, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. e questionaram pela entrega dos fotos e filmagens ao que foram informados que tinham que aguardar mais uma semana. (11º-B)”
“Mais tarde, a A. dirigiu-se novamente ao estabelecimento da R. para ir buscar as fotografias, quando constatou que faltavam a maior parte das fotografias tiradas no banquete, nomeadamente em grupo, com amigos, chefes, colegas e familiares. (12º)”
“Posteriormente, o A. contactou a R. e quis saber o que é que se passava com os fotos, tendo-lhe sido reafirmado que não encontravam os fotos por causa de o hard disk ter jogado fora, pelo que os fotos estavam perdidos. (13º)”
“Durante a cerimónia de casamento dos AA., foram tiradas várias fotografias, mas só foram revelados 418 fotos. (23º e 24º)”
Ora bem, provada está a falta de cumprimento integral da prestação pela R. a que ficou adstrita, resultante da perda da maior parte das fotografias, por motivo de o seu disco rígido do computador ter jogado fora, torna-se responsável pelo prejuízo que causou aos AA., nos termos do artº 787º do Código Civil de Macau.
     Ainda nos termos do artº 790º do mesmo Código, dispões-se o seguinte:
“1. Tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação.
2. Tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a restituição dela por inteiro.”
Assim, no que respeita à questão de indemnização, estipula-se o artº 556º do Código Civil de Macau o seguinte princípio geral:
“Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.”
Por outro lado, “o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão”, conforme o consagrado no artº 558º, nº 1 do mesmo Código.
Nos presentes autos, provado está que na altura da celebração do contrato, as partes acordaram que na tiragem de fotografias, eram incluídos 10 rolos de filmes e revelação de 360 fotos 4R. Após a cerimónia do casamento, provado que tiraram-se várias fotografias, mas só foram reveladas 418 e perderam-se a maior parte delas.
Na petição inicial, os AA. pediram indemnização por dano não patrimonial pela perda das referidas fotografias, mas como não conseguiram lograr provar os factos a ela atinentes, não resta outra solução senão a absolvição do pedido.
Em consequência, ficaria assim prejudicada a apreciação da excepção peremptória invocada pela R.
***
DECISÃO
Tudo exposto e nos fundamentos acima descritos, julgo improcedente por não provada a presente acção comum de forma ordinária intentada pelos AA. A e B contra a R. C有限公司, e:
- Absolvo a R. de todos os pedidos formulados pelos AA. na sua petição inicial.
     Custas do processo pelos AA.
     Registe e notifique.
     

Não se conformando com o decidido, vieram os Autores recorrer do mesmo concluindo e pedindo que:

1. 原審法官的判決按上述,有明顯的錯誤及矛盾,依法屬無效。中級法院應宣示判決無效並產生法定後果。
2. 就本案中涉及特別法的適用問題,而此問題在判決中沒有提及,屬法律適用錯誤。固此,中級法院應考慮原告上訴陳述,裁定上訴理由成立,廢止原審判決並判處原告勝訴,要求被告按起訴狀請求賠償原告。
3. 就賠償請求與被告行為的因果關係,上訴人已作上訴陳述,中級法院應判處上訴理由成立,廢止原審判決並判處原告勝訴,要求被告按起訴狀請求賠償原告。

Respondeu a Ré pugnando pela improcedência do recurso dos Autores.

II

Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.

1. Recurso interlocutório

Um dos pedidos que os autores formularam na petição inicial foi o da condenação da Ré a pagar a quantia de MOP$207.680,00, que corresponde alegadamente ao preço que os Autores pagaram para a realização do jantar de casamento.

Esse pedido mereceu o despacho do Mmº Juiz a quo, que indeferiu liminarmente nos termos seguintes:

  在本案中,原告指被告由於沒有履行其應作之給付,繼而對前者造成金錢及非金錢損害,故此要求後者作出賠償。
  除應有的尊重外,本人認為原告針對被告所主張的關於舉行婚宴酒席的費用,合共$207,680澳門元的請求明顯不能成立,因為正如原告所言,由於婚宴已完成,好與壞已屬既定事實,雖然前者主張被告的行為有過錯,繼而使原告受到不必要的損害,但起訴狀中並無說明被告因何理由需承擔原告辦酒席的費用。
  再者,澳門《民法典》第557條的規定,“僅就受害人如非受侵害即可能不遭受之損害,方成立損害賠償之債”。
  由此可見,即使沒有被告的行為,原告與被告亦會如常擺酒宴客,故此原告所主張的$207,680澳門元的開支與被告的行為沒有直接的因果關係,須予以駁回該項請求(駁回部分請求)。
  相關訴訟費用按比例由原告負擔。

Inconformados com o indeferimento liminar, vieram recorrer dele concluindo e pedindo que:

A - No caso vertente é indubitável a existência do nexo de causalidade entre o facto da omissão, por culpa exclusiva da R, da tirar as fotos do jantar e o dano irreparável causado, pelo mesmo, aos AA.;
B - Não assiste razão ao Meritissímo Juiz ad quo ao afirmar que nos termos do artigo 5570 do Código Civil não assiste razão aos AA. ao responsabilizar a R. pela obrigação de indemnização das despesas do jantar no montante de MOP$207,680.;
D - A interpretação das normas aplicáveis ao caso vertente foi feita de forma incorrecta;
E - O Meritíssimo Juíz ad quo aceitou a existência de todos os pressupostos da responsabilidade civil, incluindo a de que a R agiu com culpa.
F - A R ao agir com culpa, agiu de uma maneira determinada pela sua vontade, quando que lhe era imposto que devia agir de modo diverso, de tal sorte que, não o fazendo, se comportou de forma censurável, ainda que apenas na vertente de mera falta de cuidado, de imprudência ou de desleixo.
G - Tendo a R. agido com culpa e não restando dúvidas de que causou um dano irreparável aos AA. está consequentemente, também, provado o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
H - Com efeito, o nexo de causalidade foi estabelecido entre a omissão da R. e o dano sofrido pelos AA., recorrentes, que pagaram a cerimónia irrepetível do seu casamento sem que ficassem com qualquer fotografia ou video da mesma, pela atitude dolosa da R. e sendo certo que esse dano se ficou a dever necessária e imediatamente à atitude desta.
I - Conclui-se, assim, que concorrem no caso todos os pressupostos que sustentam a responsabilidade civil por facto ilícito, incluindo o nexo de causalidade, pelo que existe o dever de indemnizar por parte da R. aos AA.
J - O artigo 557º do Código Civil consagra a teoria da causalidade adequada e, segundo essa tese, o caminho a percorrer inicia-se com o facto em abstracto para apurar se, quo tale, é idóneo para a produção daquele resultado.
K - Essa idoneidade é aferida em termos objectivos atendendo às normais circunstâncias da vida mas abstraindo as que não eram conhecidas nem cognoscíveis do autor, nem da generalidade das pessoas médias.
L - O dano patrimonial surge, ou na forma de damnum emergens (diminuição efectiva do património) ou de lucrum cessans (frustração de um ganho).
M - O prejuízo nada mais é do que a situação abstracta consistente na diferença entre o valor do património após a lesão e aquele que teria se não tivesse ocorrido o acto lesivo.
N - Podemos assim concluir que nexo causal é o vínculo existente entre a conduta do agente e o resultado por ela produzido.
O - Para se dizer que alguém causou um determinado facto, é necessário estabelecer a ligação entre a sua conduta e o resultado gerado, isto é, verificar se de sua acção ou omissão causou o resultado.
P - No caso sub judicie, indubitávelmente a R. ao não tirar as fotos da cerimónia de casamento que contratara com os AA., mormente da boda, fez com que esta resultasse inexistente para a posteridade.
Q - E, porque não se trata de um jantar qualquer, mas sim de um jantar único na vida dos AA., o dano causado pela R. a estes é irreparável porque irrepetível, tendo estes direito à indemnização meramente simbólica do montante dispendido com o mesmo no valor de MOP$207,680.
R - Pelo que a interpretação da norma supra à factualidade concreta, alegada na p.i., só pode ser exactamente a oposta àquela que o Meritissímo Juiz ad quo fez.
S - Com efeito, é notória a existência do nexo de causalidade entre o facto e o dano ocorrido.
T - Pelo que o MMº Juíz ad quo além de não fundamentar suficientemente a sua decisão, entrou em manifesta oposição entre os fundamentos de facto e de direito utilizados e a decisão final, tendo mesmo efectuado uma errada apreciação e aplicação da legislação vigente aplicável ao caso sub judicie, uma vez que sendo notória a existência do nexo de causalidade entre o facto e o dano ocorrido, o despacho recorrido é nulo nos termos do nº 1 alineas b) e c) do artigo 571° do Código de Processo Civil.
Termos em que, e nos melhores de Direito, sempre com o mui Douto suprimento de V.Exas. Venerandos Juízes, deverá ser declarada nulo e de nenhum efeito o Douto Despacho proferido, com as legais consequências, devendo os autos seguir os ulteriores termos da Lei, assim se fazendo a esperada
JUSTIÇA!!

Então vejamos.

De acordo com a relação controvertida configurada na petição inicial, a causa de pedir alegada pelos Autores foi os serviços alegadamente mal prestados pela Ré no âmbito de um contrato de prestação de serviços relacionados com casamento.

Mais concretamente falando, no que diz respeito ao pedido da condenação da Ré, a título de danos patrimoniais, a pagar a quantia de MOP$207.680,00, que corresponde alegadamente ao preço que os Autores pagaram para a realização do jantar de casamento, foi alegado como causa de pedir o seguinte:

20º
Na festa do jantar do casamento, apareceu um operador de video e de fotografia da R. que se dirigiu aos AA. e disse-lhes que esperava que não quisessem tirar muitas fotos, pois já tinha o cartão de memória cheio e tinha receio de não conseguir acompanhar fotograficamente toda a cerimónia .
21º
Nessa ocasião, quando terminaram a sessão fotográfica, o operador de video e fotografia da R. disse aos AA. que tinha tirado mais 280 fotografias do que o contratado e por isso tinha que receber um pagamento extra.
22º
Assim, os AA. disseram ao operador de video e fotografico da R. para continuar a tirar as fotos que eles pagavam o extra.
23º
Terminada a celebração do casamento tradicional chinês dos AA. ficaram a aguardar que a R. lhes telefonasse, conforme fora combinado, para irem buscar as fotos e filmagens da cerimónia.
24º
Volvida uma semana, e como a R. nada dissesse, os AA. dirigiram-se ao estabelecimento da R. e questionaram pela entrega das fotos e filmagens ao que foram informados que tinham que aguardar mais uma semana.
25º
Em 07 de Janeiro de 2007, a A. dirigiu-se novamente ao estabelecimento da R. para ir buscar as fotografias, quando constatou que faltavam cerca de 800 fotografias, sendo que a maioria delas eram fotos de grupo, com amigos, chefes, colegas e familiares que tinham vindo de outros países propositadamente para a cerimónia de casamento dos AA. (Cfr. Doc. nº 7 que ora se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais ).
26º
Com efeito, tratavam-se das fotos mais importantes para os AA. e como tal, de imediato, reclamaram à R. a apresentação das fotografias em falta.
27º
Uma vez interpelados pelos AA. sobre a falta de inúmeras fotos, da cerimónia de casamento, a R. respondeu que já tinham imprimido todas as fotos existentes no computador, num total de 418, e que não existiam mais fotos.
28º
Mais, disseram aos AA. que a festa de casamento já tinha sido realizada e que por isso não podiam repetir a tiragem das fotos mas que íam ver se encontravam as fotos em falta.
29º
No dia seguinte ao da interpelação a R. telefonou para a A. e disse que não encontrava mais nenhumas fotos.
30º
De imediato o A. contactou a R. e quis saber o que é que se passava com as fotos, tendo-lhe sido reafirmado que não encontravam as fotos e que o hard Disk ja tinha ido para reparação.

“……”

43º
E, paralelamente a R. telefonou aos AA. e disse que o hard disk não tinha recuperação, pelo que as fotos estavam irremediavelmente perdidas.

“……”

53°
De facto, a ora A. em virtude da não existência das fotos do seu casamento entrou numa profunda depressão, acompanhada de profunda tristeza, de insónias e grande ansiedade emocional que a levou a ter que recorrer a serviços médicos especializados.

“……”

55º
Por outro lado, ambos os AA. não sabem como explicar a não existência das fotos da cerimónia de casamento a familiares, amigos, chefes e colegas que reiteradamente perguntam pelas mesmas, ficando por isso profundamente desgostosos.

Para o Mmº Juiz a quo, é evidente que não pode proceder essa pretensão dos Autores, uma vez que “apesar de os Autores terem alegado os serviços mal prestados pela Ré para sustentar a pretendida condenação da Ré no pagamento do preço do jantar de casamento, o certo é que nenhuma dessas razões deduzidas pelos Autores tem a virtualidade para apoiar a pretendida condenação da Ré a suportar o preço do jantar oferecido pelos Autores.”.

É verdade, tal como vimos na parte da matéria de facto alegada pelos Autores, ora transcrita supra, as alegadas falhas no armazenamento e conservação das fotografias tiradas no decurso do jantar em nada poderiam condicionar ou afectar a realização do jantar, que como se sabe foi ab initio planeado pelos Autores como parte integrante do seu casamento que aliás segunda a tradição chinesa, constitui normalmente o auge de toda a cerimónia de um casamento à chinesa.

Ou seja, o jantar teve sempre lugar independentemente da ocorrência das falhas no armazenamento ou conservação das fotografias tiradas.

Por outro lado, o preço do jantar que os Autores pagaram é a contrapartida da disponibilização de um espaço com certas características necessárias à realização de um tal evento, os serviços de empregados de mesa, assim como os comes e bebes de que gozaram os noivos, seus familiares e os demais convidados.

O que os Autores, enquanto noivos, perderam com a alegada má prestação de serviços de tiragem e conservação de fotografias foi a perda das recordações do tal evento em que os seus familiares, parentes, amigos e colegas vieram compartilhar com eles a alegria do momento tão importante na vida deles.

Mas nunca perderam o gozo da utilidade proporcionada pelo espaço disponibilizado, dos comes e bebes e dos serviços de empregados de mesa, a que corresponde o preço do jantar.

Então pergunta-se porque é que a Ré pode vir a ser chamada a pagar a conta daquilo que os Autores e os demais convidados efectivamente gozaram?

Obviamente não podemos responsabilizar a Ré pura e simplesmente por não ter prestado bem os serviços de tiragem de fotografias conforme os termos contratados com os Autores, pois inexiste nexo de causalidade, entre os tais factos e o alegado prejuízo, adequado e necessário à imputação do pagamento do jantar à falha na tiragem e conservação de fotografias.

Assim, bem andou o Mmº Juiz ao indeferir como indeferiu liminarmente o pedido referente à condenação da Ré a pagar o preço do jantar do casamento.

Portanto é de improceder o recurso interlocutório.

2. Recurso da sentença final

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Assim, de acordo com o vertido nas conclusões de recurso, a única questão levantada pelos recorrentes é a da nulidade da sentença por os fundamentos estarem em oposição com a decisão, no que diz respeito ao pedido de indemnização dos alegados danos não patrimoniais no valor de MOP$100.000,00.

Para os recorrentes, a sentença é nula porque não obstante a comprovada falta de cumprimento integral da prestação pela Ré, a que ficou adstrita, resultante da perda da maior parte das fotografias, o Tribunal julgou improcedente o pedido da indemnização dos danos não patrimoniais sofridos com a perda das tais fotografias, com fundamento de que “na petição inicial, os AA. pediram indemnização por dano não patrimonial pela perda das referidas fotografias, mas como não conseguiram lograr provar os factos a ela atinentes, não resta outra solução senão a absolvição do pedido.”.

Têm razão os recorrentes.

Efectivamente salta à vista uma contradição entre os fundamentos e a decisão, pois por um lado diz que ficou provada a falta de cumprimento integral da prestação resultante da perda de fotografia (que os autores alegaram ser causa dos danos morais), mas por outro decidiu pela absolvição do pedido com fundamento na não comprovação dos factos atinentes à indemnização dos tais danos morais.

Assim, é de declarar nula a sentença nessa parte por oposição dos fundamentos com a decisão.

E por força da regra de substituição consagrada no artº 630º do CPC, este Tribunal passa a conhecer do pedido da indemnização dos danos não patrimoniais nos termos requeridos de acordo com a matéria de facto provada.

No que respeitante à perda das fotografias, ficou em síntese provado que:

* Os Autores contrataram os serviços da Ré para a preparação e celebração do seu casamento, nomeadamente a tiragem e revelação das fotografias no dia do casamento;

* Nos termos do acordado, os Autores pagaram o preço de MOP$7.000,00 como contrapartida de uma série de serviços, nomeadamente a tiragem de fotografias (10 rolos de filmes) e a revelação de 360 fotos 4R;

* E pela revelação de cada rolo de filme adicional, os Autores têm de pagar MOP$80,00;

* No dia do casamento, os Autores foram buscar e acompanharam até à sua casa dois operadores de vídeo e fotografia da Ré para filmarem e fotografarem os noivos e os preparativos para a cerimónia;

* Na festa do jantar do casamento, o operador de vídeo e fotografia da Ré disse aos Autores que se ultrapasse o número de fotografias inicialmente acordado tinha que receber um pagamento extra;

* Os Autores disseram ao operador de vídeo e fotográfico da Ré para continuar a tirar as fotos que eles pagavam o extra;

* Terminada a celebração do casamento, os Autores ficaram, conforme o combinado, a aguardar que a Ré lhes telefonasse, para irem buscar as fotografias e as gravações de vídeo;

* Mais tarde, a Autora dirigiu-se ao estabelecimento da Ré a fim de buscar as fotografias, constatou que faltavam a maior parte das fotografias tiradas no jantar, nomeadamente em grupo, com amigos, chefes, colegas e familiares;

* Foi explicado pela Ré que a perda dessa parte das fotografias tiradas no jantar é devida à falha do hard disk que tinha sido jogado fora; e

* Durante a cerimónia do casamento dos Autores, foram tiradas várias fotografias, mas só foram revelados 418 fotos.

Ante esta matéria de facto, cremos que estamos em condições para decidir de direito o pedido de indemnização pelos danos não patrimoniais causados aos Autores pela perda das fotografias.

Trata-se grosso modo de um contrato de prestação de serviços, a que alude o artº 1080º do CC, à luz do qual é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra parte certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.

Nos termos do disposto no artº 400º do CC, o contrato deve ser pontualmente cumprido.

Da matéria de facto provada resulta que houve falta parcial do cumprimento por parte da Ré, pois ela não conseguiu entregar parte das fotografias que tirou no jantar do casamento.

Indubitavelmente estamos perante um incumprimento parcial.

Como se sabe, a falta de cumprimento só dá lugar à obrigação de indemnizar se, o credor sofrer com ela um prejuízo.

Além disso, é preciso que a falta de cumprimento seja imputável ao devedor, isto é, a obrigação de indemnizar pressupõe a culpa do devedor na inexecução da sua obrigação.

Quanto ao prejuízo sofrido pelo credor, a falha técnica no tratamento das fotografias tiradas no jantar traz sem dúvidas aos Autores graves prejuízos que consistem na perda definitiva e irreversível das preciosas recordações de um dos eventos mais importantes na vida de ambos os Autores.

Perda essa que poderá, na pior da hipótese, representar uma triste mancha indelével na memória dos Autores no resta da vida.

No que diz respeito à imputação, cremos que a Ré agiu com culpa.

Ora, não obstante a inevitabilidade da falha técnica de computadores por mais sofisticados que sejam, temos de reconhecer que hoje em dia, a nossa vida e o nosso trabalho quotidiano com certeza não poderiam funcionar de forma devida se sem que recorrêssemos a computadores ou aparelhos cujo funcionamento depende da tecnologia digital.

É justamente por causa da inevitabilidade de falhas, quaisquer utentes prudentes das facilidades proporcionadas por computadores devem contar com a possibilidade da ocorrência de falhas que lhes poderão causar consequências desastrosas, nomeadamente a perda dos documentos armazenados.

Face a essa possibilidade, todos nós sabemos, se agirmos com a exigível prudência, que quando precisar de armazenar documentos importantes, é preciso produzir sempre pelo menos mais uma cópia a armazenar em veículo diferente.

In casu, a perda das fotografias é devida a falha técnica do disco rígido do computador da Ré, que acabou por ter jogado fora depois de tentativas fracassadas da reparação.

Ao celebrar com os Autores um contrato de prestação de serviços, a Ré, enquanto fornecedora profissional e especializada dos serviços para a preparação e celebração de casamento, nomeadamente a tiragem de fotografias na cerimónia de casamento, deveria ter o devido cuidado de fazer o chamado “back up” fazendo reproduzir sempre mais uma cópia das imagens tiradas e gravá-las num veículo diverso, uma vez que a Ré não podia ignorar a importância das fotografias para os Autores e que deveria prever a irrecuperabilidade das mesmas se algo anormal acontecer com o único veículo em que se encontram gravadas todas as imagens já tiradas na cerimónia do casamento.

O que lhe é perfeitamente exigível, dada a facilidade de se proceder a tal back up num veículo diverso.

Chegamos aqui, é altura para a determinação do quantum da indemnização dos danos não patrimoniais sofridos pelos Autores.

Quanto à ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, o artº 489º/1 do CC estatui que deve atender-se aos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

Tal como ficou dito supra, a perda irreversível da maior parte das fotografias tiradas no jantar do casamento representa o prejuízo grave tendo em conta a importância do casamento na vida de uma pessoa.

Por isso não parece questionável ser graves os prejuízos sofridos pelos Autores.

Tendo em conta o valor peticionado (MOP$100.000,00) e de acordo com o critério legal para a fixação do quantum da indemnização consagrado no artº 489º/3 do CC, afigura-se-nos que não é nada exagerada a fixação em MOP$100.000,00 da indemnização dos danos não patrimoniais, dado que não sendo embora pecuniariamente compensáveis os sofrimentos, só um valor pecuniário razoavelmente suficiente é que pode aliviar esses sofrimentos que lhes foram e vão ser causados pela perda das recordações do casamento dos Autores

3. Excepção peremptória

Finalmente, tal como vimos na parte final da fundamentação da sentença recorrida, com a absolvição total da Ré do pedido, ficou prejudicado o conhecimento da excepção peremptória deduzida pela Ré.

Em princípio deve este Tribunal passar a apreciar essa excepção peremptória nos termos impostos pelo artº 630º/2 do CPC, após cumprido o contraditório.

Todavia, in casu, nenhum facto essencial que se prende com a deduzida excepção peremptória ficou provada, o que nos dispensa de proceder à apreciação dessa questão considerada prejudicada pela primeira instância.

Tudo visto, resta decidir.
III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam:

* julgar improcedente o recurso interlocutório interposto pelos Autores; e

* julgar procedente a arguição de nulidade da sentença na parte que diz respeito ao danos não patrimoniais peticionados, revogando a sentença recorrida nessa parte que absolveu a Ré do pedido e passando a condenar a Ré no pagamento a favor dos Autores, de MOP$100.000,00, com juros legais calculados de acordo com a forma definida pelo TUI no seu douto Acórdão de 02MAR2011, tirado no processo nº 69/2010.

Custas pelos Autores e pela Ré na proporção de decaimento em ambas as instâncias.

Notifique.

RAEM, 25OUT2012
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan
João A. G. Gil de Oliveira