Processo nº 797/2012 Data: 06.12.2012
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “peculato”.
Pena.
Suspensão da execução da pena.
SUMÁRIO
1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.
2. O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.
O relator,
______________________
José Maria Dias Azedo
Processo nº 797/2012
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, com os restantes sinais dos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. que o condenou pela prática de 1 crime de “peculato”, p. e p. pelo art. 340°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 1 ano e 3 meses de prisão.
*
Nas suas conclusões, afirma o que segue:
“1. A pena aplicada é irrazoável e viola o princípio da culpa;
2. Estão verificados os pressupostos legais que permitem a suspensão da execução da pena de prisão que vier a ser aplicada ao Recorrente em medida mínima, porquanto,
3. A pena não superior a três anos de prisão permite que seja suspensa na sua execução e existe uma prognose social favorável ao Recorrente;
4. Cometeu o crime por que foi condenado num quadro de circunstâncias que lhe diminuem a culpa e a ilicitude, pelo que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição;
5. O douto Acórdão recorrido violou o disposto no artigo 48.°, n.° 1 do CP”; (cfr., fls. 188 a 189-v).
*
Na sua resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela improcedência do recurso; (cfrl., fls. 192 a 198).
*
Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação (fls. 188 a 189 verso dos autos), o recorrente/arguido A pediu suspensão da execução da pena de 1 ano e 3 meses de prisão efectiva que lhe tinha sido aplicada pelo Tribunal a quo no Acórdão em causa, invocando a violação do princípio de culpa.
Antes de mais, subscrevemos inteiramente as criteriosas explanações do Exmo. Colega na Resposta (fls.193 a 195 dos autos), e nada temos, de relevante, a acrescentar-lhes.
*
Inculca o Venerando TSI (AcórdãonoProc.n.°153/2010): “A Jurisprudência tem entendido que o número das circunstâncias atenuantes nunca implica necessariamente a atenuação especial, sendo preciso demonstrar-se a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena. Ou seja, só depois de valorizar todas as circunstâncias verificadas no caso concreto e se do imagem global do facto resulta a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena é que se deve utilizar a atenuação especial da pena.”
No caso sub judice, não obstante ser primário, o recorrente nunca reconheceu a prática dos factos ilícitos dados por provados, não mostrou arrependimento nem vontade de indemnizar a ofendida.
Sendo assim, e tomando-se por base a moldura penal prevista no n.°1 do art. 340° do CPM, a pena de 1 ano e 3 meses de prisão efectiva não apresenta ser irrazoável.
O próprio art. 48° n.°1 do CPM evidencia que a suspensão da pena de prisão depende do preenchimento cumulativo de dois pressupostos: o formal e objectivo traduz em a pena aplicada não ser superior a 3 anos, e o material consubstancia-se na conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Em conformidade com este segmento legal, tal conclusão tem de basear-se em prévias apreciação e valorização, de índole prudente e prognóstico, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da sua conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Interessa reter que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°242/2002, n.°190/2004 e n.°192/2004)
No caso vertente, a apontada atitude do recorrente manifestada durante a audiência de julgamento torna razoavelmente previsível que não é adequada para a realização das finalidades da punição a suspensão da execução da pena aplicada na sentença em causa. Daí flui que o pedido da suspensão de execução fica desprovido de qualquer razão.
***
Por todo o exposto, pugnamos pela improcedência do presente recurso na sua totalidade”;(cfr., fls. 210 a 211).
*
Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos elencados na sentença recorrida, a fls. 173 a 174, que não vem impugnados, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Bate-se o arguido pela revogação da decisão ínsita na sentença recorrida, alegando que excessiva é a pena de 1 ano e 3 meses de prisão que lhe foi decretada, pedindo também a suspensão da sua execução.
Vejamos.
–– Quanto à “medida da pena”, sendo o crime em questão punido com pena de 1 a 8 anos de prisão, (art. 340°, n.° 1 do C.P.M.), inexistindo, de forma evidente, qualquer circunstância que permitisse uma atenuação especial da pena, (art. 66°), e estando a pena aplicada a 3 meses do seu limite mínimo, só por equívoco se poderá ter dito que inflacionada está a mesma.
De facto, tem este T.S.I. entendido que “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 27.09.2012, Proc. n° 682/2012).
Nesta conformidade, à vista está a solução.
Continuemos.
–– Nos termos do art. 48° do C.P.M.:
“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.
E, sobre a matéria em questão já teve também este T.S.I. oportunidade de consignar que:
“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., Ac. de 01.03.2011, Proc. n° 837/2011, do ora relator, e, mais recentemente, de 31.05.2012, Proc. n° 385/2012).
No caso dos autos, provado está que o arguido dos autos, no âmbito das suas funções, apropriou-se de quantias da assistente, que fez suas.
Embora se reconheça que o montante em causa não é “elevado”, (não ultrapassando as MOP$10.000,00), resulta porém dos autos que o arguido levou a cabo a sua conduta de forma repetida, não agindo apenas por uma única vez, (não se mostrando de alterar a qualificação jurídica dado que a factualidade provada é pouco esclarecedora quanto às circunstâncias da actuação do arguido).
Nesta conformidade, tendo em conta tal aspecto, atenta a postura processual do arguido – que não confessou os factos, não demonstrando assim qualquer arrependimento pela sua conduta – e constatando-se que situações como a dos autos, ocorridas em casinos, tem-se repetido com preocupante frequência – o que é do nosso conhecimento oficioso – cremos que não se pode acolher a pretensão apresentada.
De facto, nada nos autos permite a emissão de um juízo de “prognose favorável em relação ao arguido”, sendo, também, fortes, as necessidades de prevenção geral deste tipo de crime.
Daí, verificados não estando os pressupostos do art. 48° do C.P.M., e ociosas nos parecendo outras considerações, improcede o recurso.
Decisão
4. Nos termos que se deixam expostos, acordam negar provimento ao recurso.
Pagará o arguido a taxa de justiça de 4 UCs.
Honorários ao Exm° Defensor Oficioso no montante de MOP$1.200,00.
Macau, aos 6 de Dezembro de 2012
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 797/2012 Pág. 12
Proc. 797/2012 Pág. 1