Processo nº 447/2012
(Recurso Cível)
Data: 18/Outubro/2012
Assuntos:
- Concorrência desleal
SUMÁRIO :
1. A interpretação da expressão normas e usos honestos da actividade económica, na integração dos pressupostos de uma concorrência desleal, assenta numa noção de natureza valorativa, sendo uma figura de difícil aplicação, possuindo uma maleabilidade que permite que o âmbito seja adaptado às circunstâncias concretas, tudo dependendo do ramo de actividade.
2. A proibição da concorrência desleal visa essencialmente assegurar a honestidade no exercício da actividade comercial entre empresas que exerçam actividades idênticas ou afins .
3. Num caso em que alguns agentes rescindiram os seus contratos de agência com a A. e não deram o pré-aviso, mas não estando provado que tal tenha acontecido como resultado de indução de uma outra C.ª com ela concorrente, que não logrou provar que aqueles agentes de seguros rescindiram os seus contratos por causa dos RR, antes se provando que abandonaram a A. para ingressarem na Sociedade, 1ª Ré, por razões de melhoria das condições laborais, não permite concluir, sem mais, pela integração dos pressupostos de uma concorrência desleal.
4. Os meros contactos e propostas, ou promoção da cessação de contratos, acompanhada do oferecimento de melhores condições de trabalho, não consubstancia um acto de concorrência desleal, isto é, actos de concorrência contrários às normas e aos usos honestos da actividade económica.
O Relator,
(João Gil de Oliveira)
Processo n.º 447/2012
(Recurso Cível)
Data: 18/Outubro/2012
Recorrentes: - American Internacional Assurance Company (Bermuda), Limited
- AXA China Region Insurance Company (Bermuda), Limited
- A
- B
Recorridos: - Os mesmos
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
1. American International Assurance Company (Bermuda) Limited, (AIA) sociedade com sede em Bermuda e sucursal em Macau, mais bem identificada nos autos, intentou no Tribunal Judicial de Base acção ordinária contra AXA China Region Insurance Company (Bermuda) Limited, (AXA, 1ª Ré) sociedade também com sede em Bermuda e sucursal em Macau, A e B, também mais bem identificados nos autos (, 2° e 3° Réus - RR.), pedindo, a final, que fosse a acção julgada procedente e se condenassem os RR. a absterem-se, por si ou por interposta pessoa, de influenciar qualquer agente da AIA a resolver ou cessar o seu contrato de agência, aliciar e/ou recrutar qualquer agente ou colaborador da AIA para trabalhar para qualquer sociedade concorrente, incentivar os ex-agentes da AIA a interferirem, por qualquer forma, com a actividade comercial da AIA, contactar os clientes da AIA; se condenassem os 2° e 3° RR. a pagarem solidariamente à A. o montante a liquidar em execução de sentença a título de prejuízos pela violação das cláusulas 24ª, alínea b) e 25ª do contrato de agência celebrados com a AIA; o montante a liquidar em execução de sentença pelos danos causados pelos actos de concorrência desleal; custas e procuradoria.
A final a acção veio a ser julgada improcedente.
2.1. AMERICAN INTERNACIONAL ASSURANCE COMPANY (BERMUDA), LIMITED (AIA), Autora/Recorrente, no processo identificado em epígrafe, inconformada com a sentença proferida que julgou a acção improcedente, vem recorrer, concluindo as suas alegações como seguem:
A. Andou mal o Tribunal a quo pois, se deu como provado os contratos celebrados entre a A. e o 2.º e 3.º RR. (Quesitos 4.º e 5.º), bem como o não cumprimento, por estes, da cláusula 24.ª al. b) (Quesito 15.º), outra alternativa não restava ao Tribunal a quo, senão dar como provado, pelo menos, que o 2.º e 3.º RR. tinham assumido a obrigação de não concorrência e não solicitação válidas para além da vigência do contrato pelo prazo de 1 ano, prevista exactamente na cláusula 25.ª do contrato;
B. Há contradição, quando se considera provado que "Os 2.º e 3.º RR. fizeram propostas mais vantajosas e aliciantes, pelo menos aos dois antigos colegas, Sra. Lao e Sr. Un, tanto em termos de funções a desempenhar, como em termos de remuneração." (Quesito 48.º) e depois julga não provado que "As condições oferecidas aos agentes da AIA pelo 2.º e 3. º RRs. são muito superiores às oferecidas a qualquer agente que queira trabalhar com a AXA." (Quesito 49.º);
C. Ao julgar que as propostas foram mais vantajosas e aliciantes, está a fazer um juízo comparativo, sob pena do quesito 48.º não fazer qualquer sentido, deveria o Tribunal a quo considerar provado, pelo menos, que "As condições oferecidas aos agentes aliciados pelo 2.º e 3.º RR. foram superiores às oferecidas a qualquer outro agente que queira trabalhar na AXA.";
D. Tribunal a quo errou quando Julgou o quesito 50.º não provado, mas deu 1 como provado os quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 16.º, 47.º, 51.º, esquecendo-se ainda do teor do documento junto pela A. em 20/01/2011, certidão da AMCM n.º 001/2011 que comprova que não foram só o 2.º e 3.º RRs. que rescindiram os seus contratos com AIA tendo, em seguida, iniciado funções para a AXA, (Facto Assente E).;
E. Se os agentes têm qualidades reconhecidas e mudam da AIA para a AXA, o Tribunal a quo deveria dar como provado que "a A. perdeu "know-how" para a AXA, sua concorrente directa.";
F. O Tribunal a quo ao julgar provados os quesitos 54.º, 55.º e 56º deveria ter julgado provado, no quesito 53.º que "Aqueles agentes, agora da AXA, acederam a informação sobre clientes e as respectivas apólices, informação que pertence à AIA." Considerando não provado a primeira parte do quesito "Em consequência do seu comportamento";
G. Tribunal a quo, errou quando dando como provado apenas os quesitos 67.º, 68.º, 69.º, 70.º e 71.º, acaba por concluir no Acórdão recorrido que "provado que aqueles agentes abandonaram a AIA para ingressarem na companhia da 1.ª R. porque o Director Regional da A., no exercício das suas funções, impunha aos agentes que se encontravam sob a sua direcção, uma elevada carga horária e sujeitava-os a reuniões de largas horas, dificultava-lhes a possibilidade de progressão no negócio, aplicava-lhes penalidades elevadas, tendo, assim, provocado um descontentamento entre os agentes da A. que reportavam ao referido Director Regional." pois, não consta dos quesitos provados este nexo causal.
H. Aceita-se que a A. não conseguiu provar alguns actos materiais das práticas desleais dos RR., sendo o ónus da prova da A., mas o grau de exigência dessa prova não pode corresponder a um nível cientifico de causa de verificação;
I. Deve aferir-se por padrões razoáveis de comportamento, fazendo intervir regras da experiência comum de avaliação da conduta lesiva;
J. Como processo lógico e mental de assegurar um coeficiente de probabilidade de verificação do dano que, de outro modo, não se verificaria, ou verificar-se ia de modo diferente;
K. O Tribunal a quo considerou provado que alguns agentes rescindiram os seus contratos de agência com a A. e não deram pré-aviso, violando a sua obrigação contratual, considerou ainda provado que O 2.º R., C, D, E, F, G, H e o 3.º R. apresentaram as suas demissões, enviadas no mesmo dia, com a mesma minuta, bem como, os agentes I e J, recorreram à mesma minuta dos anteriores;
L. Não viu aqui nada de estranho e omite o facto de todas estas cartas serem assinadas pela mesma Advogada, a Dra. Leonor Peres;
M. Pelo contrário, o TSI, em Acórdão de 10 de Dezembro de 2010, no Proc. 787/2009, que decidiu a providência cautelar a este apensa, "Também não pode ignorar o facto de todos estes agentes faziam rescindir o contrato sem dar cumprimento do obrigado aviso prévio, tal como foi imposto no seu respectivo contrato. Viu-se obviamente uma anormalidade.";
N. Julgou, ainda, o TSI, "Por outro lado não podia esquecer o documento junto ... carta da AMCM datada de 14/04/2009 (facto assente F) " ... instruindo todas as companhias de seguros a absterem-se de empregar práticas comerciais clandestinas para aumentar a sua quota de mercado. Especificamente, as companhias de seguros devem acrescentar valor em termos de novos agentes de seguros e clientela., através do recrutamento e de programas de formação para novos agentes de seguros. Como a autoridade do poder de que a AMCM exerce, não se pode ignorar esta anormalidade alertada, como assente, e a conclusão chegada acerca de "práticas comerciais clandestinas para aumentar a quota de mercado";
O. "Não se limitando o instituto da "concorrência desleal" à protecção dos direitos privativos da propriedade industrial (marca, nome, insígnia, firma, etc ... .), e, visando essencialmente assegurar a honestidade no exercício da actividade comercial entre empresas que exerçam actividades idênticas ou afins ... " no Ac. do TSI-A-13-2004;
P. Pelo que o TSI quando julgou a providência cautelar dúvidas não teve em considerar os acessos dos agentes demissionários, nos últimos dias na AIA, violadoras do Art. 9.º al. f) do DL n.º 38/89/M de 5 de Junho, que prescreve como obrigação do mediador: "Guardar segredo profissional, em relação a terceiros, dos factos de que tome conhecimento por força do exercício da sua actividade".
Q. Pois, "Com o conhecimento dos dados pessoais de que fizeram o download da base de dados da AIA, muito facilmente contactaria os segurados daquela.";
R. Pelo que facilmente é de concluir que com aqueles acessos os agentes subtraíram informação pertencente à AIA sobre os seus clientes e apólices para, assim, os desviar da AIA para a empresa concorrente AXA;
S. Sendo o cancelamento das 75 apólices da AIA (quesito 66.º), certamente, consequência daqueles comportamentos;
T. Somos, assim, do entendimento que os RR. violaram, também, o Art. 31.º al. e), do DL n.º 38/89/M de 5 de Junho, que estipula que a "Prática de concorrência desleal com o intuito de obter um benefício próprio.";
U. Andou mal o Tribunal a quo quando julgou que o 2.º e 3.º RR. violaram a sua obrigação contratual, por não terem dado o aviso prévio de 15 dias, sem daí retirar quaisquer consequências;
V. Nos termos do Art. 400.º n.º 1 do CC "O contrato deve ser pontualmente cumprido e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento ou nos casos admitidos por lei.";
W. Quer nos preliminares do contrato e na sua formação (Art. 219.º do CC), quer na sua execução, devem as partes pautar a sua conduta pela Boa Fé (Art. 752.º n.º 2 do CC);
X. Estes dois princípios básicos da autonomia privada (pacta sunt servanda e boa fé) implicam, como refere o Acórdão do TSI de 23/03/2000, " ... o cumprimento pontual e rigoroso do que, validamente, foi acordado, ... "
Y. Sendo este incumprimento do 2.º e 3.º RR. demonstrativo e indissociável da sua má fé;
Z. Não restam dúvidas de ter havido uma actuação simultânea e concertada pelos RR. com os 16 agentes demissionários da AIA no sentido de rescindirem os contratos de agência com a mesma celebrados, assim agindo deliberadamente no intuito de se transferirem para outra sociedade concorrente, a AXA;
AA. Sobre questão idêntica, o S.T.J de Portugal julgou que "gera responsabilidade civil, o acto de concorrência desleal com a consequente obrigação de indemnizar, o acto de concorrência desleal traduzido na actuação simultânea e concertada dos 41 agentes comerciais de uma sociedade por quotas no sentido de rescindirem os contratos de agência com a mesma celebrados, assim, agindo deliberadamente no intuito de se transferirem para outra sociedade concorrente.";
BB. O aliciamento e recrutamento de agentes (com incitamento à violação por parte destes do referido contrato de agência) corresponde a um conjunto complexo de prejuízos, com o qual a AIA teve de se confrontar tantas vezes quanto o número de agentes que foram aliciados e recrutados pelos Réus;
CC. Assim, em primeiro lugar, há sempre uma perda do investimento que a AIA fez e faz, na formação dos seus agentes, custos que são elevados e suportados pela AIA, com vista à profissionalização e maior qualificação dos seus agentes.
DD. Em segundo lugar a AIA perde para uma empresa directamente concorrente, a AXA, o "know-how" que os seus agentes adquiram ao seu serviço;
EE. Em terceiro lugar, a AIA teve que suportar os custos acrescidos com o novo processo de selecção e recrutamento - a saída inesperada de um funcionário acarreta, inevitavelmente, um novo processo de selecção e recrutamento de um outro agente, com os consequentes gastos em formação inicial da pessoa seleccionada;
FF. Em quarto lugar, para além do recrutamento efectivo, dos 16 agentes, prejudicar a actividade da AIA, há que contar com as tentativas de aliciamento, as abordagens e contactos feitos pelos Réus como nos casos da Sra. Lau e do Sr. Un, interferem com a actividade da AIA e criam um clima de pressão, receio e suspeição entre os outros agentes da AIA;
GG. Por último, temos que considerar toda a informação, propriedade da AIA, sobre os clientes e respectivas apólices que os agentes demissionários acederam para, sem o consentimento daquela, os contactar e aliciar para mudarem as suas apólices para a AXA;
HH. A todos os danos acima referidos e que a AIA teve que suportar acrescem ainda as 75 apólices que vieram a ser canceladas e transferidas da AIA;
II. Estes danos são consequência directa da actuação dos Réus;
JJ. Quanto aos facto do número de agentes e apólices canceladas não ser mais elevado, cumpre referir que a providência cautelar instaurada previamente a esta acção foi julgada procedente, pelo TSI;
KK. O que, limitou, de forma clara, os danos, o que era, aliás, seu propósito;
LL. Assim, a AIA não suportou mais prejuízos porque, atempadamente, recorreu aos Tribunais para colocar um ponto final aos actos de concorrência desleal que os Réus praticavam;
MM. Quanto à, a AXA, a grande instigadora e grande beneficiada com este aliciamento ilegal, não pode o Tribunal ad quem deixar de considerar que violou o Art. 167.º do e. Comercial;
NN. Citando o Acórdão do TSI n.º 787/2009, que julgou procedente a providência cautelar a este apenso: "No nosso ordenamento jurídico, a concorrência desleal é uma actividade voluntária, desonesta e conscientemente praticada com intenção de desviar clientela em proveito próprio. Estando em causa duas companhias de seguros sediadas em Macau, ambas exercem as actividades seguradoras, (...) sem dúvida existe uma relação de concorrência entre si no mercado de Macau.";
OO. Constatada a situação anormal da actuação simultânea e concertada dos agentes demissionários, facto para o qual a AMCM alertou com a sua carta de 22/04/2009, dúvidas não restam da responsabilidade da AXA.
PP. O Tribunal a quo violou os arts. 153.º, 156.º e 167.º do e. Comercial, Arts. 9.º al. f) e 31.º do DL n.º 38/89/M de 5 de Junho, e ainda os arts. 219.º, 400.º n.º 1 e 752.º n.º 2 do C.C.
Termos em que,
deverá ser substituído por um outro que acolha materialmente as conclusões ora formuladas, e em consequência, serem os réus condenados como se pediu na P.I.
2.2. AXA - CHINA REGION INSURANCE COMPANY (BERMUDA), LIMITED contra-alega este recurso, dizendo, em suma:
1. Com o seu recurso, a Recorrente pretende apenas discordar da interpretação do Tribunal a quo, quanto à decisão da matéria de facto, colocando em causa o livre arbítrio do julgador consagrado no art. 558.º do CPC, sendo que não cumpre o ónus imposto pelo art. 599.º do mesmo diploma, designadamente da sua alínea b), não indicando, nas suas alegações, quais os concretos meios probatórios que constam do processo, que imponham uma decisão diversa daquela que foi proferida pelo Tribunal a quo;
2. Tanto mais que a Recorrente alega contradição entre respostas a quesitos para impugnar a douta decisão recorrida e nem sequer reclamou anteriormente de tais respostas, como podia e devia, ao abrigo do n.º 5 do art. 556.º do CPC.
3. O recurso apresentado pela AIA é uma reclamação encapotada, a qual não deve ser acolhida, devendo, por isso, ser o seu recurso indeferido.
4. Caso assim não se entenda, verifica-se que a Recorrente, nos artigos 46.º a 59.º das suas alegações de recurso e nas alíneas M., N., P, Q., R, S. e NN. das conclusões, litiga com deliberada má fé e pleno conhecimento de que viola a lei.
5. Ao alegar como o faz, a Recorrente viola com dolo e de forma grave o art. 328.°, n.º 5, do CPC, sendo ilegais e despropositadas as citações feitas nos artigos 51.º e 52.º das alegações de recurso, e, bem assim, as ilações que são tiradas nos seus art. 46.º a 50.º, 53.º e 55.º a 59.º.
6. O Tribunal a quo está impedido de utilizar o julgamento da matéria de facto e a decisão final produzida nos autos de recurso n.º 787/2009 desse TSI, perante a regra do citado n.º 5 do art. 328.º do CPC, e a prova produzida, ou não, em sede do processo declarativo, sobre a mesma matéria que foi julgada na providência cautelar.
7. Ao inserir tal texto nas suas alegações e conclusões, a Recorrente tem como único objectivo influenciar ilegitimamente a decisão do Tribunal ad quem, comportamento que consubstancia violação grave do dever de cooperação e do princípio da boa fé, consagrados nos art. 8.º e 9.º do CPC.
8. Por isso, os referidos artigos 46.° a 59.° das alegações de recurso e as alíneas M., N., P, Q., R, S. e NN. das conclusões, devem dar-se por não escritos, condenando-se a Recorrente como litigante de má fé, nos termos da al. c) do n.º 1 do art. 385.º do CPC, com as legais consequências.
9. Contesta-se que exista alguma das contradições entre quesitos defendida pela Recorrente, afigurando-se sem qualquer mácula as conclusões extraídas pelo Tribunal a quo, vertidas na douta sentença recorrida;
10. Ao considerar provados os quesitos 4.º, 5.º e 15.°, mas não aceitar a redacção original do quesito 11.º, a douta sentença recorrida não entra em qualquer contradição.
11. Atenta a redacção primitiva do quesito 11.º, esta continha meras ilações e juízos de valor esgrimidos pela Recorrente na sua petição inicial, além de que não ficou provado que "cargo de responsabilidade" era exercido pelo 3.º Recorrido, nem se o cargo de Unit Manager exercido pelo 2.° Recorrido era de responsabilidade e, em caso afirmativo, qual a sua extensão.
12. Se os 2.º e 3.º Recorridos eram ou não "profissionais muito bem pagos" é matéria conclusiva, sendo que nem sequer ficou provado ao longo de quanto tempo terá a Recorrente pago o total de MOP1.616.226,53 em remunerações ao 3.º Recorrido.
13. Esteve bem o Tribunal a quo quando, ao invés de qualificar as obrigações dos 2.º e 3.º Recorridos, como faz a Recorrente, que não as define nem delimita, dá como resposta ao quesito 11.º que os 2.º e 3.º Recorridos estavam simplesmente obrigados ao que constava nos seus contratos, porque nada mais se provou.
14. Contrariamente ao que é alegado pela Recorrente, o quesito 48.º não ficou provado na redacção que a ela lhe interessava, porque não fez prova de que os 2.º e 3.º Recorridos se aproveitaram dos conhecimentos que adquiriram por via das funções que desempenhavam na AIA para fazerem propostas a outros agentes desta, nem que tais propostas foram feitas a antigos colegas em geral.
15. Também não existe qualquer contradição entre a matéria provada no quesito 48.º e o facto de não ter ficado provado o quesito 49.°, porque estes dois quesitos tratam de matéria diferente e distinta.
16. De facto, não ficou de todo provado que os 2.º e 3.º Recorridos ofereciam condições a agentes de seguros da Recorrente que eram mais favoráveis do que aquelas que eram oferecidas a agentes de outras seguradoras que quisessem trabalhar para a l.ª Recorrida.
17. Este quesito não tem qualquer relação com a circunstância de ter ficado provado que os 2.º e 3.º Recorridos fizeram propostas a dois agentes da Recorrente, que eram mais vantajosas do que as que tais agentes então usufruíam com esta.
18. Isto porque, no primeiro, o ponto de partida para se comparar se existe maior vantagem é o facto de o agente ter trabalhado anteriormente com a Recorrente, e noutro são as condições que a Recorrente oferecia em particular ao agente concretamente contactado.
19. A resposta ao quesito 50.º não está em contradição com as respostas aos quesitos 1.°, 2.°, 3.°, 16.°, 47.° ou 51.°, como alega a Recorrente.
20. O quesito 50.º referia-se a comportamentos dos Recorridos, os quais teriam supostamente causado perdas à Recorrente. No entanto, não se provaram total ou parcialmente, os quesitos 16.°, 19.°, 20.°, 31.°, 32.°, 33.°, 34.°, 41.°, 46.°, 47.°, 48.º e 49.°, os quais faziam referencia à dita conduta dos Recorridos, que não ficou suficientemente provada; por isso, desaparecendo a causa, não existirá o efeito de a Recorrente ter perdido know-how para a concorrência.
21. Ao contrário do que alega a Recorrente, os quesitos 1.°, 2.°, 3.°, 16.°, 47.° e 51.°, não ficaram provados na sua redacção original, verificando-se que aquela não logrou fazer prova de factos que lhe eram indispensáveis para obter a condenação dos Recorridos.
22. Apesar de ter ficado provado que alguns agentes rescindiram os contratos que os ligavam à Recorrente, cfr. respostas aos quesitos 42.º a 46.°, e que alguns terão depois iniciado funções junto da AXA, a AIA não fez nenhuma prova de que tais agentes a abandonaram em virtude de qualquer aliciamento por parte dos Recorridos.
23. Os dois agentes as que se refere a resposta ao quesito 16.° são aqueles que vêm mencionados nos quesitos 17.º a 40.º, os quais continuam agentes da AIA, tal como também consta da sentença recorrida a fls. 661v.
24. Mesmo que alguns ex-agentes da Recorrente tenham iniciado funções na AXA após rescindirem os seus contratos com aquela, qualquer hipotética perda de "know-how", a existir, resulta apenas do normal exercício do direito ao trabalho de qualquer residente de Macau, e consagrado na Lei Básica.
25. Tal perda não aconteceu, cfr. resposta ao quesito 50.°, e mesmo que tivesse sucedido, ficou apenas estabelecido pelo Tribunal a quo que os agentes da AIA recebiam formação da companhia, dominavam os procedimentos e políticas internas e tinham conhecimentos e aptidões técnicas exigidos para a actividade de mediação de seguros, cfr. resposta ao quesito 51.°, o que não constitui nenhuma mais-valia em especial.
26. O Tribunal a quo não se esqueceu do documento que aquela juntou aos autos em 20/01/2011, o que se verifica pelo teor do último parágrafo a fls. 661 da douta sentença recorrida, a qual menciona expressamente "... provado que aqueles agentes abandonaram a AIA para ingressarem na companhia da l.ª Ré ...", para mais adiante referir ainda que "... no respeitante à saída dos agentes da A. para entrar na companhia AXA. .." cfr. fls. 661v.
27. Perante a prova produzida, está assente que alguns agentes de seguros rescindiram os seus contratos com a Recorrente e foram depois trabalhar com a AXA. O que não ficou provado é que tais agentes demissionários, mesmo que possuíssem conhecimentos técnicos especiais que os tornassem particularmente apetecíveis no mercado de trabalho, tenham sido ilicitamente induzidos por qualquer dos Recorridos a abandonarem a AIA para irem trabalhar com a AXA.
28. Mesmo que se considere que a transferência de um número de agentes de seguros da Recorrente para a AXA tenha causado perdas à primeira, e que tal transferência tenha sido induzida pelos Recorridos, o que não fico provado nem se concede, atente-se que a doutrina e a jurisprudência consideram que nem todos os desvios de trabalhadores configuram, automaticamente, actos de concorrência desleal.
29. Também não ficou provado de que forma se terá aproveitado a ora Recorrida do tal "know-how" que a Recorrente alega ter perdido porque, genericamente e por definição, existe sempre uma transferência de conhecimentos de empregador para empregador, sempre um qualquer funcionário ou colaborador decide mudar de emprego, mas, ao contrário do que a Recorrente defende, tal não significa que esta transferência é sempre ilícita ou contrária aos usos leais do comércio.
30. A Recorrente, ao alegar como alega, parece confundir correlação ou coincidência com causalidade, porque não existe nenhuma presunção legal de responsabilidade que recaia sobre a ora Recorrida, apenas porque alguns dos ex-agentes da Recorrente fizeram cessar os seus contratos e depois foram trabalhar com a AXA, sendo que as razões e circunstâncias que rodearam tal transferência são factos que carecem de prova.
31. Esteve bem o Tribunal a quo, ao utilizar as regras da experiência comum para, na ausência de outra prova, considerar que os ex-agentes da Recorrente a abandonaram devido ao comportamento adverso e ditatorial do seu Director Regional, o qual, sim, ficou provado, cfr. respostas aos quesitos 67.º a 71.º.
32. Ao contrário do que diz a Recorrente, o quesito 54.° não foi dado como provado na sua redacção original, a qual, além disso, era conclusiva e não fáctica, porque reproduzia sem mais o alegado pela Autora na sua p.i ..
33. Ficou provado que alguns ex-agentes da Recorrente, antes de rescindirem os seus contratos com esta, acederam a dados de clientes, mas a Recorrente não provou que (1) tais ex-agentes tenham copiado para si essa informação nem que, ainda que tal tivesse acontecido, (2) tenham dela feito qualquer uso, em benefício próprio ou de outrem, designadamente da AXA.
34. Tal cópia e subsequente uso é matéria de facto que a Recorrente não conseguiu provar, cfr. respostas totalmente negativas aos quesitos 53.º, 57.º 59.º, 60.º, 61.º, 62.º e 63.º.
35. Dado o que ficou provado quanto à matéria dos quesitos 54.º, 55.º e 56.º, o entendimento propugnado pela Recorrente quanto à resposta ao quesito 53.º é redundante, e a circunstância que neste consta, de a informação sobre clientes poder pertencer à AIA é matéria de direito.
36. Esteve bem o Tribunal a quo, ao concluir, perante as respostas aos quesitos 67.º, 68.º, 69.º, 70.º e 71.º, que a saída de agentes da Recorrente se devia ao comportamento de um Director Regional desta, já que esta foi a única razão efectivamente provada para tais rescisões contratuais.
37. Não está provado que algum agente ou ex-agente da Recorrente tenha sido induzido pelos Recorridos, incluindo a AXA, a violar a sua obrigação de dar um pré-aviso de 15 dias aquando da rescisão do seu contrato com aquela, e, perante a total falta de prova nesse sentido, não se afigura legítimo ao Tribunal tirar essa conclusão.
38. Apesar de ter ficado provado que alguns dos agentes demissionários teriam acedido a informações sobre clientes antes de abandonarem a sua relação consigo, a Recorrente também não logrou provar que tal tivesse acontecido a instigação dos Recorridos.
39. A Recorrente não provou, como lhe competia, que alguém tivesse copiado tais informações, ctr. resposta ao quesito 58.º.
40. Mesmo que, por absurdo, se admita ter existido tal cópia, a Recorrente não provou que as 75 apólices a que se refere a resposta ao quesito 66.º tenham sido rescindidas pelos clientes a instâncias dos Recorridos (compare-se, a esse propósito, o teor original do mesmo quesito), e também não existe qualquer prova que essas apólices se encontravam entre as que fora acedidas pelos agentes demissionários.
41. Sendo certo, que tal movimento de rescisão de apólices se verificou entre Março de 2009 e Janeiro de 2010 - um período de 10 meses, portanto - e que é fácil de verificar que, entre elas, se encontravam contratos de seguro titulados pelos próprios agentes demissionários - cfr. documentos juntos aos autos pela Recorrente em 25/10/2012.
42. Relativamente à circunstância de ter ficado provado que os 2.º e 3.º Recorridos não deram o pré-aviso contratual de rescisão a que estavam obrigados (resposta ao quesito 15.°), fica sem se saber quais os prejuízos efectivamente sofridos pela Recorrente com tal omissão, porque esta nunca os concretizou nem fez deles qualquer prova.
43. Não existe nenhuma perda da Recorrente cujo ressarcimento seja obrigação dos Recorridos.
44. Tanto mais que nem sequer a Recorrente conseguiu provar que a cessação das 75 apólices a que se refere a resposta ao quesito 66.º se traduziu num benefício para qualquer dos Recorridos.
45. Não existe nos autos qualquer informação sobre alguma queixa apresentada pela Recorrente junto da Autoridade Monetária de Macau, contra os Recorridos, comportamento que se impunha a qualquer seguradora séria e diligente, que tivesse efectivamente razões fundamentadas para crer estar a ser vítima de práticas anticoncorrenciais, potencialmente violadoras do Decreto-Lei n.º 38/89/M, de 5 de Junho, ou do Decreto-Lei n.o 27/97/M, de 30 de Junho, e que teria certamente acontecido, caso a Recorrente estivesse de consciência tranquila quanto ao que afirma em sede de causa de pedir.
46. Vigoram em Macau os princípios da livre concorrência ~ livre contratação, para além da liberdade de escolha e obtenção de emprego.
47. É ponto assente na doutrina que apenas em determinadas condições pode a contratação de colaboradores ou funcionários alheios ser considerada concorrência desleal, desde logo pela aplicação dos requisitos consagrados no n.o 2 do art. 167.° do Código Comercial.
48. Atentos os argumentos da Recorrente, conclui-se que a AIA pretende apenas restringir a concorrência, e não, como proclama, procurar protecção contra fantasiosos actos de concorrência desleal, designadamente quando alega a violação por parte da 1.a Recorrida AXA do art. 167.º do CCom, embora sem se dar ao trabalho de concretizar qual dos seus números foi infringido.
49. A cessação de um contrato (mesmo os de agente de seguros) não constitui, só por si, nenhuma violação contratual, e nem sequer está provado que os agentes demissionários designados nas respostas aos quesitos tenham violado a sua obrigação de pré-aviso induzidos pela AXA ou pelos outros Recorridos.
50. A Recorrente, embora sem o conseguir concretizar nem provar, pretende invocar a suposta prática pelos Recorridos de actos que doutrinal mente são caracterizados como "actos de desorganização".
51. Só que, como diz a doutrina, não há concorrência desleal no mero aproveitamento de uma pessoa que tenha rompido irregularmente a sua relação com a empresa concorrente. Desde que não tenha havido qualquer forma de encorajamento, a contratação torna-se depois livre.
52. Assim, não estando provado qualquer encorajamento ou promoção por parte dos Recorridos, e não existindo nenhuma presunção legal nesse sentido, não existe deslealdade na concorrência e, logo, não está preenchido o pressuposto da ilicitude, geradora da responsabilidade Civil cuja indemnização é reclamada pela Recorrente.
53. E mesmo que assim não se considere, o que não se aceita, não se poderá considerar que tal promoção, caso tivesse existido, se rodeou de intenções de difundir ou explorar segredo empresarial alheio, nem que foi rodeada de circunstâncias como o engano, a intenção de eliminar um concorrente ou outras análogas, exigidas pelo art.o 167.º, n.º 2, do Código Comercial, em face das respostas aos quesitos 19.º, 20.º, 53.º, 57.º, 58.º, 59.º, 60.º, 61.º, 62.º e 66.º.
54. Não existiu, nem ficou provada, existir por parte dos Recorrentes qualquer intenção de eliminar um concorrente do mercado também porque tal objectivo seria totalmente irrealista, atenta a diferença em termos de volume de negócios entre a Recorrente e a ora Recorrida - cfr. relatórios da actividade seguradora, produzidos pela AMCM, designadamente o que consta a fls. 374 e o que foi juntos aos autos na audiência de discussão e julgamento, e em face das respostas aos quesitos 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 59.º, 60.º, 61.º e 62.º.
55. O facto de ter havido alguns ex-agentes da Recorrente que decidiram trabalhar para a AXA, e que o 2.º e 3.º Recorridos terão contactado dois agentes da primeira, tentando recrutá-los para a segunda (sem esquecer que tais dois agentes não chegaram a abandonar a AIA), tem de ser observado à luz de que a concorrência é pressuposto necessário da existência de concorrência desleal, sendo que esta última existe para garantir a primeira, não com a finalidade de a reprimir ou restringir, mas, pelo contrário, com a justificação de que, de outro modo, a concorrência não lograria atingir o seu objectivo de premiar os empresários que o mercado repute como mais dignos de sucesso.
56. Verificando-se, pela prova produzida, designadamente da certidão n.º 003/2011, emitida pela Autoridade Monetária de Macau, junta aos autos pela ora Recorrida na audiência de discussão e julgamento, a qual nem sequer foi impugnada pela Recorrente, que esta última tinha, em 2008 e 2009, mais de 1000 agentes ao seu serviço, verifica-se singelamente que, mesmo que tivesse existido alguma indução por parte dos Recorridos a que os referidos ex-agentes fizessem cessar os seus contratos, o que não sucedeu, e ainda que tenham ocorrido contactos nesse sentido com outros dois, o desiderato da Recorrente é apenas e tão só, restringir a normal concorrência do mercado.
57. Porque, mesmo que, por absurdo, se considere, face à prova produzida, que existiu tal indução, a doutrina ensina que só se puder ser caracterizada como sistemática ou em bloco, pode a atracção do pessoal de outra empresa ser considerada como desleal.
58. Apenas a ânsia litigante da Recorrente a fará encaixar as respostas aos quesitos 16.º a 18.º, 21.º a 30.º e 35.º a 40.º numa dessas situações, porque a Recorrente possuía 1200 agentes em 2008, cfr. certidão da AMCM, junta aos autos no na audiência de julgamento, e que os 16 agentes demissionários fizeram cessar os seus contratos ao longo de um período de 120 dias, entre Dezembro de 2008 e Abril de 2009.
59. Ainda segundo o mesmo documento, a Recorrida perdeu, entre 2008 e 2009, um total de 187 agentes, 10 dos quais optaram por ir trabalhar com a seguradora Manulife - cfr. respostas aos quesitos 71.º e 72.º - sendo que não há notícia de a Recorrente ter também iniciado qualquer contencioso contra esta outra seguradora alegando violação das regras da concorrência.
60. O mesmo se diga, quanto à suposta perda de clientela a favor da AXA, invocada pela Recorrida, a qual esbarra irremediavelmente nas respostas aos quesitos 53.°, 57.°, 58.°, 59.º e 60.º, sendo que a Recorrente não produziu qualquer prova que infirme a posição expressa na douta sentença recorrida, relativamente a esta matéria.
61. Os pedidos da Recorrida constituem uma violação ilegítima da liberdade de contratar pelas seguradoras, pelos agentes e, até, pelos próprios clientes, tanto mais que nada na lei impede um tomador de adquirir mais do que um ; seguro do ramo vida e é público e notório que, nesta região do mundo, tais seguros são frequentemente adquiridos como forma de investimento, sendo frequente a aquisição pelo mesmo cliente de múltiplas apólices, de seguradoras diversas.
62. Acresce que a doutrina é pacífica em considerar que a classificação de certas práticas concorrenciais como contrárias às normas e aos usos honestos da actividade económica tem de assentar nos usos, regras e práticas que se vão formando como consequência da necessidade de regular os interesses de cada um de harmonia com os interesses próprios da respectiva actividade, os quais são, por natureza, variáveis consoante o tempo, os lugares e os sectores de actividades profissionais, porque se adaptam aos interesses da particular categoria de pessoas a que respeitam.
63. Por isso, mesmo que se possa, por absurdo, considerar estranha a movimentação de agentes a que aludem as respostas aos quesitos 12.º e 15.º a 48.°, convém sublinhar que está junto aos autos a folhas 441 a 446 uma notícia de jornal, sobre práticas levadas a cabo pela AIA, ora Recorrente, em Hong Kong e Macau, quanto a métodos de angariação de agentes de seguros que prestam serviços para a concorrência, nomeadamente, através do pagamento de bónus muito elevados aos agentes que decidam mudar, bem como de penalizações contratuais para os mesmos, se estes não conseguirem trazer consigo não só outros agentes, como também clientes de outras seguradoras.
64. Assim, todas as práticas comerciais que a Recorrente vem, no seu recurso, atribuir aos Recorridos, e à ora Recorrida em particular, e qualificar como desleais e ilícitas, são praticadas por si própria, numa dimensão e gravidade muito mais acentuada do que a que se discute nos presentes autos, nomeadamente, no que refere à angariação de clientes por aquela.
65. Isto demonstra que, ao contrário do que é alegado pela Recorrente, as práticas de recrutamento de agentes qualificadas como "desleais" por aquela, são comuns e habituais neste sector de actividade económica, sendo também utilizadas, em maior e mais grave escala, pela própria Recorrente no âmbito da sua actividade comercial.
66. Só está dado como provado nos presentes autos que o 2.º e o 3.° Recorridos contactaram com dois agentes da Recorrente e que lhes apresentaram propostas para que passassem a ser agentes da ora Recorrida, as quais não tiveram, de resto, qualquer sucesso uma vez que esses agentes continuam, até hoje, a ser agentes da AIA.
67. Tais contactos não se podem considerar contrários aos usos do comércio, sobretudo tendo em conta o entendimento da doutrina e os factos relatados na citada notícia da imprensa, os quais apontam para a normalidade destes comportamentos na actividade económica aqui especificamente em causa.
68. Assim, não existindo a violação de nenhum direito da Recorrente, nem nexo de causalidade entre a saída de agentes e clientes da AIA e uma qualquer conduta dos Recorridos, lícita ou ilícita, não se vislumbra a que título poderá aquela reclamar qualquer indemnização em sede de responsabilidade civil extra-contratual.
69. Afigura-se que a Recorrente não pode já, nesta fase, pretender relegar para execução de sentença a determinação dos prejuízos que reclama, uma vez que tal adiamento seria admissível apenas na circunstância de serem alegados prejuízos concretos, mas o respectivo montante não poder ser, por diversas razões, quantificável, no todo ou em parte.
70. O que, in casu, se afigura despropositado, uma vez que os factos que a Recorrente alega com causa de pedir terão ocorrido entre Dezembro de 2008 e Abril de 2009, portanto há mais de três anos, sendo certo que a petição inicial deu entrada no Tribunal Judicial de Base em Janeiro de 2010 e o despacho saneador foi notificado às partes em Outubro do mesmo ano.
71. Teve já, portanto, a Recorrente mais que tempo para quantificar e fundamentar devidamente, pelo menos provisória ou parcialmente, o prejuízo que alega ter sido causado pela conduta supostamente ilícita dos Recorridos.
72. Não estão preenchidos os requisitos consagrados na al. b) do n.º 1 do art. 392.º do CPC, tanto mais que a Recorrente não suscitou, em tempo útil, podendo e devendo fazê-lo, o incidente de liquidação consagrado nos art. 308.º a 310.º daquele diploma legal: dado o tempo decorrido entre os factos invocados pela AIA e o início da discussão da causa nos presentes autos, a Recorrente, que não pede indemnização por danos futuros, teve mais que tempo para fazer a devida liquidação e não se vislumbram razões atendíveis para que não tivesse podido tomar tal iniciativa, ainda que com carácter sumário ou provisório.
73. Esteve, por tudo isto, bem a douta sentença recorrida, a qual não tem mácula que se lhe aponte.
Nestes termos entende dever ser negado provimento ao presente recurso.
2.3. A e B, contra-alegam o mesmo recurso, concluindo:
1. A Recorrente viola a al. b) do artigo 599.° do CPC, ao se insurgir contra a forma como foi julgada a matéria de facto sem indicar quais os concretos meios de prova que, a seu ver, impõem decisão diversa e deverão ser reapreciados pelo douto Tribunal ad quem;
2. Mesmo que seja de reapreciar a prova, o Tribunal ad quem está impedido de modificar a matéria de facto, como pretende a Recorrente, já que a douta sentença recorrida se baseou, não só nos documentos dos autos, mas também nos depoimentos prestados pelas testemunhas, os quais ficaram gravados - sendo que a Recorrente não cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 599.º do CPC, pelo que deve ser o seu recurso rejeitado;
3. Nos artigos 46.º a 59.° das alegações e nas alíneas M., N., P., Q., R., S. e NN. das conclusões do recurso, a Recorrente viola deliberada e conscientemente o artigo 328.°, n.o 5, do CPC, o qual impede o Tribunal de se basear no julgamento da matéria de facto ou na decisão da providencia cautelar que consta do douto acórdão produzido nos autos de recurso desse TS1 n.º 787/2009, para proferir decisão na acção declarativa;
4. Por isso, deve a Recorrente ser condenada como litigante de má fé, com fundamento em deliberada e repreensível omissão do dever da cooperação e da boa fé processual, por aplicação da al. c) do n.º 2 do artigo 385.º do CPC, devendo os artigos 46.º a 59.º das alegações de recurso e as alíneas M., N., P., Q., R., S. e NN. das conclusões dar-se por não escritas, com as devidas consequências legais;
5. O Tribunal a quo não se contradiz quando decidiu como decidiu relativamente aos quesitos 4.°, 5.º e 15.°, sem aceitar o quesito 11.º na sua redacção original, porque a Recorrente apenas pretende provar "factos" que não aconteceram nem correspondem à prova produzida;
6. Ficou, e bem, provado, que os ora Recorridos se obrigaram apenas ao que consta nos seus contratos, porque nada mais ficou provado relativamente ao que foi alegado pela Recorrente em sede de petição inicial sobre esta matéria;
7. Neste contexto, a Recorrente utiliza expressões como "não solicitação" e "não angariação" sem explicar qual o âmbito de tais obrigações, sendo que, ao longo do processo, tem vindo a insistir que os contratos de agente dos ora Recorridos, para além de os proibirem de angariar clientela da AIA, também os impedem de contactar os seus agentes, o que não tem qualquer fundamento no teor de tais documentos;
8. O quesito 48.°, contrariamente ao que desejaria a Recorrente, não ficou provado na sua totalidade, designadamente no que respeita à matéria que dizia respeito aos ora Recorrentes terem utilizado conhecimentos que adquiriram por vias das funções e posição que desempenhavam na AIA, com o objectivo de fazerem propostas mais vantajosas e aliciantes aos seus antigos colegas;
9. O juízo comparativo que é feito na resposta ao quesito 48.º não tem qualquer relação com o quesito 49.°: as propostas seriam mais vantajosas relativamente às condições que seriam oferecidas pela Recorrente aos agentes objecto de tais contactos, e não têm qualquer relação com o teor do quesito 49.º (alegado, mas não provado) de a 1ª Recorrida AXA supostamente oferecer melhores condições aos agentes recrutados da AIA, do que àqueles que fossem recrutados de outras seguradoras;
10. Por isso, ainda que se tenha dado por parcialmente provado o quesito 48.°, tal questão é separada e independente do facto descrito no quesito 49.°, que não foi, e bem, provado;
11. Relativamente à resposta ao quesito 48.°, não ficou provado que os ora Recorrentes tivessem contactado qualquer outro agente para além dos dois que são ali referidos, os quais ainda trabalham para a AIA;
12. Pretender a Recorrente que fique provado que os ora Recorridos fizeram contactos com os seus antigos colegas em geral não tem qualquer suporte na matéria dada como provada;
13. O Tribunal a quo não errou quando deu como provados os quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 16.º, 47.º e 51.º, mas não o 50.º, nem se esqueceu do documento que a Recorrente juntou aos autos em 20/01/2011;
14. Ao dar como não provado o quesito 50.°, a douta sentença recorrida está apenas a ser coerente: não se provando qualquer aliciamento de agentes da AIA para a AXA por parte dos ora Recorridos, não se pode dizer, como pretende a Recorrente, que esta perdeu know-how algum como consequência de tais comportamentos;
15. A Recorrente nem sequer alguma vez especificou que know-how seria esse, nem provou que os conhecimentos dos seus agentes estavam acima da média ou os fariam especialmente procurados no mercado de trabalho, e se fosse esse o caso, dita a experiência do homem médio que seria fenómeno comum a Recorrente sofrer de repetidos aliciamentos por parte de outras seguradoras e agentes, mas não há disso qualquer prova nos autos;
16. Decorre da resposta ao quesito 51.° que os agentes da Recorrente receberam formação desta que lhes permitia dominar os seus procedimentos e políticas internas, e possuíam conhecimentos e aptidões que era exigíveis para o exercício da actividade de agente de seguros, o que, só por si, não os distingue dos agentes de nenhuma outra companhia seguradora;
17. Ao mencionar, neste contexto, a resposta ao quesito 16.°, a Recorrente não refere, porque não lhe convém, que os dois agentes ali referenciados continuam a trabalhar para si, tal como vem referido na douta sentença recorrida e, por isso, não houve, também por aqui, nenhuma perda de know how;
18. Em face às respostas aos quesitos 12.°, 15.° e 16.º a 48.º, e designadamente ao não se provarem os quesitos 19.º, 20.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º e 41.°, ficando apenas parcialmente provado o quesito 46º, esteve bem o Tribunal a quo;
19. Ainda que se considere, contra o que ficou provado, que as movimentações de agentes da AIA para a Recorrida AXA tenham ocorrido a instâncias dos ora Recorridos, o que não se concede, não se vislumbra de que forma tal ocorrência viola as regras da lealdade no comércio, especialmente tendo em conta que os factos descritos nas respostas aos quesitos ocorreram no decurso de um longo período de quase 4 meses;
20. Como consta da certidão da AMCM junta aos autos na audiência de discussão e julgamento, na altura em que ocorreram os factos alegados a Recorrente possuía ao seu serviço mais de 1000 agentes, sendo que aqueles dizem respeito a apenas 16 e a Recorrente, entre 2008 e 2009 perdeu 187 agentes;
21. Mesmo que se tenha por provada toda a matéria alegada pela Recorrente nestes autos, o que não aconteceu nem se concebe, não se verificam preenchidos nenhum dos requisitos do artigo 167.° do Código Comercial, os quais permitam condenar os ora Recorridos por concorrência desleal;
22. Quanto ao que ficou provado nos quesitos 54.°, 55.º e 56.º estar supostamente em contradição com a resposta ao quesito 53.º, padece a Recorrente, salvo o devido respeito, de um equívoco, porque não existe nenhuma presunção legal que possa permitir inferir-se o acto de copiar informação quando está provado que alguém simplesmente a consultou;
23. A Recorrente, a partir desta presunção, pretende ir mais longe, defendendo que, porque a informação foi acedida, logo foi necessariamente copiada e, além disso, utilizada, entendimento que não se pode de forma alguma aceitar, perante a prova produzida;
24. Verificando-se ainda que a Recorrente não provou que as 75 apólices a que se refere a resposta ao quesito 66.º se encontravam entre os dados supostamente copiados pelos agentes demissionários ou pelos ora Recorridos, nem que aquelas apólices em concreto tivessem sido canceladas a instâncias dos Recorridos, nem que os específicos clientes titulares dessas apólices se tenham depois tornado clientes da 1.a Recorrida;
25. A Recorrente, na sua argumentação, não menciona que algumas dessas apólices eram tituladas pelos agentes que abandonaram a AIA, mencionados nas respostas aos quesitos 12.º e 42.º a 46.º, conforme se pode comprovar pelos documentos que ela juntou aos autos em 25/10/2012, sendo compreensível que estes as façam rescindir após fazerem cessar os seus contratos de agente com a seguradora;
26. Acresce que, ainda conforme os mesmos documentos, as tais 75 apólices foram rescindidas entre Março de 2009 e Janeiro de 2010, um período de dez meses e, por isso, difícil será, face ao volume de negócios da Recorrente nesses anos e que consta de vários relatórios da Autoridade Monetária de Macau relativos à actividade seguradora durante os anos de 2008, 2009 e 2012, juntos aos autos, dizer que tais cessações acarretaram para esta perdas tais que prejudicaram a sua posição largamente dominante no mercado, facto que é determinante para se considerar que existe qualquer concorrência desleal e/ou obrigação de indemnizar;
27. Esteve igualmente bem o Tribunal a quo, quando deu primazia à matéria dada como provada, para atribuir as causas de saída de agentes da Recorrente a certos comportamentos tirânicos de um seu director regional, com referência às respostas aos quesitos 67.º, 68.º, 70.º e 71.º., em detrimento de qualquer outras, que não ficaram provadas;
28. O entendimento da Recorrente nesta parte não pode ser acolhido, especialmente quando afirma que o grau de prova exigido não deverá corresponder a um " ... nível científico de causa de verificação ..." (sic);
29. O Tribunal a quo esteve bem quando produziu a resposta ao quesito 12.º, sem considerar ser estranho tal evento, como pretendia e convinha à Recorrente;
30. Não está quesitado, nem sequer é relevante, que as cartas de rescisão contratual apresentadas por diversos agentes tivessem sido assinadas pela mesma advogada, porque é um direito de qualquer pessoa a obtenção de serviços de assistência jurídica, até com recurso a advogado recomendado por amigos ou familiares, pelo que não se verá que consequências poderá ter tal facto;
31. Esteve bem o Tribunal a quo, quando, mesmo dando por provado o quesito 15.º, segundo o qual os ora Recorridos terão violado a sua obrigação contratual de dar um pré-aviso de 15 dias sobre a data de cessação dos seus contratos de agente, mas disso não tirou qualquer conclusão, porque não o podia fazer, já que a Recorrente não especificou qual o dano que tal violação lhe poderá ter causado, nem qualquer facto que o permita quantificar;
32. Além disso, convém atentar à resposta ao quesito 73.º, verificando-se que foi a própria Recorrente que impediu os ora Recorridos de comparecerem nas suas instalações, imediatamente após ter recebido as suas cartas de rescisão contratual em 30 de Dezembro de 2008;
33. Não existiu, nem ficou provada, nenhuma acção concertada entre os ora Recorridos e os agentes demissionários a que se refere a douta sentença recorrida;
34. Não existiu, nem ficou provada, nenhuma saída de clientes da Recorrente, em resultado de qualquer acto praticado pelos ora Recorridos ou a seu mando;
35. Não existiu nem ficou provada qualquer conduta ilícita por parte dos ora Recorridos, e também não ocorreu nenhuma violação dos direitos da Recorrente que a faça merecer a tutela do Direito;
36. Apenas em especiais e determinadas circunstâncias, a contratação de colaboradores ou empregados alheios pode ser considerada concorrência desleal, até porque há que ter em conta o que vem imposto no artigo 167.°, n.º 2, do Código Comercial, sendo que tão importante como a protecção contra a concorrência desleal será a protecção da concorrência;
37. E a qualificação de determinadas práticas ou actos como constituindo concorrência desleal deve ter em conta os usos específicos à indústria ou actividade comercial em causa;
38. A Recorrente, com a presente acção, apenas pretende colocar entraves à concorrência, e não proteger-se contra supostos actos de concorrência desleal, procurando reprimir e prejudicar a normal actividade comercial dos Recorridos, a qual, como vimos, é legalmente protegida;
39. Os pedidos da Recorrente constituem uma tentativa ilegítima de limitar a concorrência, tanto mais que ela própria é culpada das condutas que atribui aos ora Recorridos;
40. Todas as práticas comerciais que a Recorrente vem, no seu recurso, atribuir a Recorridos e qualificar como desleais e ilícitas, são praticadas por si própria, nu dimensão e gravidade muito mais acentuada do que a que se discute nos presentes nomeadamente, no que refere à angariação de clientes por aquela;
41. Ao contrário do que é alegado pela Recorrente, as práticas de recrutamento de agentes qualificadas como "desleais" por aquela, são comuns e habituais neste sector de actividade económica, sendo também utilizadas, em maior e mais grave escala, pela própria Recorrente no âmbito da sua actividade comercial;
Nestes termos, deverá ser a recorrente condenada como litigante de má fé, por aplicação da al. c) do n.º 2 do artigo 385.° do CPC, e em qualquer caso, ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida, com as demais consequências legais,
3.1. AXA CHINA REGION INSURANCE COMPANY (BERMUDA) LIMITED, demandada nos autos à margem referenciados, notificada do douto despacho de fls. 672, inconformada com o não conhecimento do pedido de condenação da A. como litigante de má-fé, vem, ao abrigo e para os efeitos do art. 598, n.º 1, do Código de Processo Civil, , apresentar as suas ALEGAÇÕES DE RECURSO, dizendo, em síntese:
a) O presente recurso tem por objecto a douta sentença de fls. 655 e segs., na parte em que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre o requerimento apresentado pela ora recorrente com as suas alegações de direito, onde esta pretendia ver a autora condenada como litigante de má fé;
b) Nos parágrafos 130 e segs. das suas alegações de direito, a ora recorrente invocou factos relativos à conduta da autora nos presentes autos, os quais, defendeu, constituíam (e constituem) a prática consciente de acto processualmente desleal;
c) A questão relativa à condenação da autora como litigante de má fé, suscitada pela ora recorrente, foi atempada e regularmente submetida à apreciação do douto Tribunal a quo e não está prejudicada pela solução dada à causa principal na douta sentença recorrida, a qual, no demais, não merece qualquer reparo;
d) O decretar-se a improcedência, na douta sentença recorrida, do pedido da autora nos presentes autos não prejudica a possível condenação desta como litigante de má fé, em sede de aplicação do art. 385.° do CPC;
e) Ao não se pronunciar sobre o aludido requerimento da ora recorrente, devendo fazê-lo, a douta sentença ora objecto de recurso viola o n.º 2 do art. 563.° e o n.º 1 do art. 106, ambos do CPC, e é nula nos termos previstos na al. d) do n.º 1 do art. 571.º do mesmo diploma legal.
Nestes termos, pede, deverá ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, ser anulada a douta sentença ora recorrida, sem prejuízo do disposto no art. 630º do CPC.
3.2. A e B, RR. nos autos à margem referenciados e aí melhor identificados, também relativamente à má-fé, notificados do douto despacho de fls. 672, vêm, nos termos do art. 598º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), apresentar as suas ALEGAÇÕES DE RECURSO, concluindo:
1. Este recurso tem como objecto a douta sentença de fls. 655 e segs., a qual não contém qualquer decisão sobre o requerimento inserido pelos ora recorrentes nas suas alegações de direito, nos termos do qual era pedido que a autora American International Assurance Company (Bermuda) Limited fosse condenada em multa e indemnização como litigante de má fé;
2. Os ora recorrentes fizeram incluir nas suas alegações de direito, um requerimento ao abrigo do qual era pretendido que a autora fosse condenada como litigante de má fé, porque, nas suas alegações de direito, dá repetidamente como provada matéria que o não está, entorpecendo a acção da justiça e dificultando o trabalho do tribunal;
3. Para além de, naquela sua peça processual, a autora deduzir pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar, porque, ao contrário do que ali alega, as respostas a multas dos quesitos que lhe serviam como causa de pedir foram negativas -razão pela qual a douta sentença recorrida indefere o seu pedido;
4. Ao não se pronunciar sobre o referido requerimento dos ora recorrentes, quando o deveria fazer, a douta sentença recorrida viola o n.º 2 do art. 563.º e o n.º 1 do art. 106, ambos do CPC, e é nula, nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 571.º do mesmo diploma.
Nestes termos deverá ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a douta sentença ora recorrida, com as demais consequências legais.
3.3. Contra alega neste recurso AMERICAN INTERNACIONAL ASSURANCE COMPANY (BERMUDA), LIMITED (AIA), Autora/Recorrida, acabando por sustentar, depois de se pronunciar pela inadmissibilidade do recurso:
Em nenhum momento das alegações de direito da A. se alega ou dá como provado algum facto.
Alegou-se, isso sim, a convicção da A. nesse momento, como agora, bem como se concluiu como na Petição Inicial.
Mas, não podemos deixar de registar o nosso espanto, perante o comportamento processual dos RRs., para agora virem tentar imputar à A. o entorpecimento da justiça e dificultar o trabalho dos Tribunais.
Registamos, apenas, para que conste, o facto da 1.ª R. não ter admitido que os agentes demissionários tinham passado a exercer funções para si própria, (facto do qual tinha que ter conhecimento), sendo necessário a certidão da AMCM, junta aos autos em 20/01/2011, para provar tal facto.
Registamos, ainda, o facto do 2.º e 3.º R. em depoimento de parte, no procedimento cautelar, terem negado, os encontros tidos com os agentes da A., factos dados como provados pelo Tribunal Judicial de Base, no referido procedimento cautelar, bem como, na acção principal. Factos, esses, essenciais para este Venerando Tribunal julgar procedente o referido procedimento cautelar.
Não foi formulado ou autonomizado qualquer pedido, terminando as alegações com "Nestes termos e nos mais de direito aplicável, e contando com o douto suprimento de V. Ex.ª, deve a acção ser julgada improcedente, sendo os RR. absolvidos de todos os pedidos formulados pela A …"
Nada pedindo, o 2,º e 3.º Réus, quanto à alegada má fé da Autora.
Pelo que, também, por esta razão não pode ser atendido o recurso do 2.º e 3.º Réus.
Termos em que,
o presente recurso deve ser rejeitado por inadmissível, na eventualidade de assim não se entender, deverá o mesmo ser julgado improcedente por não provado.
3.4. American Internacional Assurance Company (Bermuda), Limited (AIA), A. no processo identificado em epígrafe, notificada das alegações e no pedido, mais um, de litigância de má-fé contra a A., veio exercer o contraditório desse pedido, nos seguintes termos:
Vêm, mais uma vez, os RR. requerer a condenação da A. como litigante de má fé, agora, por violação do Art. 328º nº 5 do C.P.C.
Alegam os RR. que os Arts. 46º a 59º e as conclusões M, N, P, Q, R, S e NN das alegações de recurso da AIA devem dar-se por não escritos.
Este capítulo deverá ser uma espécie de resposta às contra legações do recurso apresentadas pela AIA em 12/04/2012.
Assim, depois de terem constado pela inadmissibilidade do recurso por si interposto, os RR. não se conformando com a sua situação processual entenderam fazer novo pedido de litigância de má fé. Em vão porém com se verá …
Cumpre-nos assim responder, mais uma vez, e todas as que forem necessárias, a mais este pedido de litigância de má fé.
Assim, vejamos os Arts. 46º e 49º das alegações.
Alegam os RR. que a AIA “pretende criar uma presunção de culpa perante o silêncio: por que os RRs. não admitiram, os factos que àquela interessavam.”
Primeiro os RR., não só não admitiram como, em depoimento de parte, negaram os factos.
O 2º e 3º Réus, em depoimento de parte, devidamente ajuramentado, negaram ao Tribunal as reuniões tidas com a Sra. Lau e o Sr. Un – Factos considerados provados não só na providência cautelar como na acção principal. – ou seja, mentiram descaradamente.
Diz-nos o Art. 384º nº 1 do C.P.C que: “O tribunal faz sentir ao depoente a importância moral do juramento que vai prestar e o dever de ser fiel à verdade, advertindo-o ainda das sanções aplicáveis às falsas declarações.” E o nº 2 “Em seguida, o tribunal exige que o depoente preste o seguinte juramento:《Juro, por minha honra, dizer toda a verdade e só a verdade》.” Pois.
Mas, quanto a esta questão não foi requerida extracção de certidão das declarações para instruir o competente processo crime por falsas declarações. Não é a AIA que litiga de má fé.
Segundo, não foi só na providência, na acção principal a 1ª R, também, não admitiu que os agentes demissionários tinham passado a exercer funções para a AXA.
Facto do qual tinha que ter conhecimento pois, os agentes trabalhavam para a AXA e estavam inscritos na AMCM como agentes da AXA.
Sendo necessário a certidão da AMCM, junta aos autos em 20/01/2011, para provar tal facto, depois deste ser transferido da matéria assente para a base instrutória, após reclamação da própria AXA que os tinha contratado.
Veja-se a este propósito o Art. 410º nº 3 do C.P.C. “Se o réu declarar que não sabe se determinado facto é real, a declaração equivale a confissão quando se trate de facto pessoal ou de que o réu deva ter conhecimento e equivale a impugnação no caso contrário.”
Mas no entender, peregrino dos RR. a AIA é quem litiga de má fé. Tal não é verdade.
Quanto às conclusões M, N, P, Q e NN não passam de citações do Acórdão do TSI que julgou procedente a providência cautelar, pelo que não se percebe como se podem ter como não escritas. Se calhar, o que os RR. pretendem é o desentranhamento da providência cautelar apensa a estes autos.
Quanto às conclusões R e S, por serem a convicção, na altura como agora, da AIA, nada têm de censurável. Apenas divergem da posição reiterada pelos RR. Não sendo por isso, certamente, que se devem ter por não escritas.
Concluindo, quer as reuniões dos 2º e 3º Réus com a Sra. Lau e o Sr. Un, quer o facto dos agentes demissionários terem passado a exercer funções para a AXA, foram dados como provados na acção principal.
Pelo que toda a jurisprudência indicada nada acrescenta, ou antes pelo contrário, reforça a posição processual da AIA, pois os factos provados na providência, também o foram na acção principal.
Não se percebendo onde e como a AIA violou o Arrt. 328º nº 5 do C.P.C., nem como essa violação poderia constituir litigância de má fé.
Nestes termos, deve o presente pedido de litigância de má fé da AIA ser indeferido por não provado.
4. Foram colhidos os vistos legais.
II - FACTOS
Vêm provados os factos seguintes:
“A A. AIA (AMERICAN INTERNACIONAL ASSURANCE COMPANY (BERMUDA), LIMITED) é uma sociedade comercial que se dedica a operações de seguros, estando a Agência-Geral de Macau autorizada ao exercício da actividade seguradora, nos termos da Portaria n.º 184/82/M, de 27 de Novembro, publicada no BO n.º 48/82, no ramo dos seguros de vida. (A)
A AIA detém a maior quota de mercado dos seguros de vida em Macau. (B)
A R. AXA (AXA China Region Insurance Company (Bermuda) Limited) com sede nas Bermudas e sucursal em Macau, na Av. Infante o. Henrique n.° 43-43 A, Macau Square - 20° andar, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o n. ° 4016 (SO) está autorizada a exercer a sua actividade em Macau, no ramo vida desde 1989, nos termos da Portaria n.º 154/89/M de 28 de Agosto. (C)
A AIA tem ao seu serviço uma vasta equipa de agentes. (D)
Os 2° e 3° RR. rescindiram os seus contratos com a AIA tendo, em seguida, iniciado funções para a AXA. (E)
A AMCM emitiu uma carta datada de 14/04/2009 onde se pode ler a seguinte passagem: " ... instruindo todas as companhias de seguros a absterem-se de empregar práticas comerciais clandestinas para aumentar a sua quota de mercado. Especificamente, as companhias de seguros devem acrescentar valor em termos de novos agentes de seguros e clientela, através do recrutamento e de programas de formação para novos agentes de seguros."
A equipa de agentes da AIA é importante para o desempenho da sua actividade. (1º)
A qualificação profissional desses agentes é um dos motivos que a levou a atingir o sucesso e prestígio no mercado dos seguros. (2°)
A AIA sempre revelou cuidado e atenção na selecção dos seus funcionários e agentes, tendo também, depois da sua contratação, preocupação com a sua formação, treino e acompanhamento. (3°)
Em 1 de Novembro de 1998, a A. celebrou, por escrito, com o 2 ° R. A, um acordo, cujo clausulado consta do documento n.º 3 junto aos autos de procedimento cautelar. (4º)
Em 1 de Fevereiro de 2005, a A. assinou com o 3° R. B, um acordo, cujo clausulado consta do documento n.º 4 junto aos autos de procedimento cautelar. (5º)
Nos termos desses acordos escritos os 2° e 3° RR. assumiram o cargo de agentes de seguros da AIA. (6°)
Passando o 2° R., a Unit Manager em 1 de Dezembro de 2002. (7 °)
Nessa função cabia ao 2° R. gerir os agentes da sua unidade. (8°)
A AIA pagou, em comissões, ao 2° R. desde 2003 até à data da sua demissão o montante global de MOP$3.883.513,38. (9°)
E pagou, em comissões, ao 3° R. o montante global de MOP$1.616.226,53. (10°)
Provado apenas o teor da cláusula 25ª dos acordos aludidos em 4° e 5°. (11°)
O 2° R., C, D, E, F, G, H e o 3° R., apresentaram as suas demissões, conforme cartas de resolução do contrato enviadas a 30 de Dezembro de 2008, com a mesma minuta. (12º)
Após esse data, o 2° e 3° RR. nunca ali mais compareceram. (13°)
O 2° e 3° RR. não deram qualquer explicação para o fim do relacionamento com a AIA. (14º)
O 2° e 3° RR. não cumpriram os 15 dias de aviso prévio acordado na cláusula 24ª alínea b) dos acordos aludidos em 4° e 5°. (15°)
Os 2° e 3° RR. aliciaram pelo menos dois agentes da AIA para a AXA. (16°)
No dia 14 de Janeiro de 2009, o 2° R. telefonou à Sra. K, agente da AIA, explicando-lhe que tinha abandonado a AIA para se juntar a uma nova companhia e convidou a Sra. Lao para se juntar com ele à nova companhia. (17 °)
Para tanto o 2° R. lhe ofereceu:
a) HKD$450.º00,00 na data de assinatura do contrato;
b) Mais HKD$1.350.º00,00 pagos em três anos;
c) Sendo obrigada a atingir HKD$1.350.º00,00 em prémios nos primeiros três anos. (18º)
A esta conversação telefónica seguiu-se um encontro a 21 de Janeiro de 2009, onde o 2° R. mostrou à Sra. Lao brochuras de produtos da AXA, confirmando ser a AXA a "nova companhia". (21°)
Numa outra conversa telefónica, em 23 de Janeiro de 2009, o 2° R. reiterou a proposta de 14 de Janeiro feita à Sra. Lao em nome da AXA, agora diminuindo os objectivos. (22°)
O 2° R. ofereceu à Sra. Lao HKD$300.º00,00 se ela conseguisse recrutar outros agentes da AIA. (23°)
No dia 3 de Fevereiro de 2009, a Sra. Lao telefonou ao 2° R. para pedir uma cópia do contrato com a AXA. (24°)
O 2° R. recusou-se a fornecer-lhe a cópia. (25°)
No dia 7 de Fevereiro de 2009, pelas 18:00h, o Sr. L, agente da AIA, foi abordado pelo 3° R., que lhe disse que o 2° R. queria discutir uns assuntos com ele. (26°)
Tentou ainda marcar uma reunião entre o 2° R. e o Sr. Un, o que se concretizou para dia 10 de Fevereiro de 2009. (27°)
Nesse dia, no café do Mandarin Oriental, o 2° R. encontrou-se com o Sr. Un. (28°)
Explicou-lhe que tinha deixado de trabalhar com a AIA, passando a trabalhar com a AXA. (29°)
Explicou-lhe que a AXA estava a desenvolver uma estratégia muito agressiva e que dava melhores recursos aos seus agentes. (30º)
Depois de explicar ao Sr. Un, os planos e produtos da AXA, o 2° R. ofereceu-lhe, em nome da AXA, as seguintes condições:
a) Receberia o montante global de HKD$2.700.º00,00 (3 x o total dos seus rendimentos na AIA nos últimos dois anos);
b) Quando assinasse o contrato recebia imediatamente HKD$500.º00,00;
c) Tinha que recrutar mais 4 agentes da AIA para a AXA, a sua equipa podia atingir o prémio anual no valor de HKD$1.300.º00,00;
d) Por cada HKD de comissão (FYC) que o Sr. Un ganhasse a AXA pagar-lhe-ia mais dois HKD de comissão no primeiro ano, e um HKD no segundo ano. (35°)
E se o Sr. Un deixasse a AXA nos primeiros quatro anos tinha que devolver à companhia HKD$500.º00,00 no primeiro ano, HKD$400.º00,00 no segundo, HKD$300.º00,00 no terceiro e HKD$200.º00,00 no quarto ano. (36°)
No dia 13 de Fevereiro de 2009, o Sr. Un recebeu mais uma chamada telefónica do 3° R., pedindo-lhe cópia do BIR e dos recibos de comissão, pagos pela AIA, dos últimos anos para poderem finalizar o contrato. (37°)
No dia 20 de Fevereiro de 2009, os 2° e 3° RR. encontraram-se, de novo, com o Sr. Un (38°)
Depois de discutirem pormenores relacionados com a remuneração oferecida, o Sr. Un alertou que a AIA tinha enviado uma carta aos agentes recrutados para a AXA pelos requeridos. (39°)
Ao que o 2 ° R. respondeu que a carta não tinha nenhuma importância e que a AXA daria todo o apoio aos agentes que entendessem mudar de companhia. (40º)
Em 23 de Janeiro de 2009 e 6 de Fevereiro de 2009 rescindiram o contrato que tinham com a AIA, os agentes M e N, respectivamente (42°)
Em 20 de Fevereiro de 2009 rescindiram o contrato com a AIA, o agente O. (43º)
Em 27 de Fevereiro de 2009 rescindiram o contrato com a AIA, os agentes I e J. (44°)
Em 28 de Fevereiro de 2009 rescindiram o contrato com a AIA, os agentes P e Q. (45°)
O Sr. R pediu a demissão, em 21 de Abril de 2009, para ingressar na AXA. (46°)
Alguns desses agentes desempenhavam importantes funções junto da AIA. (47°)
Os 2° e 3° RR fizeram propostas mais vantajosas e aliciantes pelo menos aos dois antigos colegas, Sra. Lao e Sr. Un, tanto em termos de funções a desempenhar como em termos de remuneração. (48°)
Os agentes da AIA receberam formação da companhia, bem como dominaram os procedimentos e políticas internas e tinham conhecimentos e aptidões técnicas exigidos para este tipo de actividade. (51º)
O agente n.° 91519, I acedeu a 145 apólices no dia 12 de Fevereiro de 2009. (54º)
E o agente n.° 91521, J nos dias 8, 11, 12 e 13 de Fevereiro de 2009 acedeu a 83, 48, 86 e 208 apólices , respectivamente. (55 °)
O agente n. ° 93795, N acedeu a 254 apólices no dia 6 de Fevereiro de 2009, dia em que rescindiu o contrato que o ligava à AIA. (56°)
Entre Março de 2009 a Janeiro de 2010, houve pelo menos 75 apólices da AIA foram canceladas. (66°)
Os 2° e 3° RR., assim como alguns outros agentes que pediram a demissão reportavam, no exercício das suas funções, ao mesmo Director Regional ("Senior District Director") da A., o Sr. S. (67º)
No exercício das suas funções, o Sr. S decidia e impunha aos agentes que se encontravam sob a sua direcção, uma elevada carga horária e sujeitava-os a reuniões de largas horas. (68º)
Bem como, dificultava-lhes a possibilidade de progressão no negócio. (69°)
E decidia a aplicação de penalidades elevadas àqueles que não cumprissem os objectivos propostos ou não frequentassem as reuniões, acções de formação ou outras actividades promovidas a nível regional. (70º)
Esses factos provocaram um descontentamento generalizado entre os agentes da A. que reportavam a este Director Regional e que, já no decurso de 2008, tinha levado alguns agentes da A. (geridos pelo referido Director Regional) a optar pela resolução dos respectivos contratos. (71º)
Cerca de 10 agentes passaram a prestar serviços à sociedade concorrente Manulife International Limited. (72º)
A 30 de Dezembro de 2008, assim que os 2° e 3° RR. entregaram as suas cartas de resolução contratual, os seus cartões de acesso às mesmos foram imediatamente bloqueados, ficando os 2° e 3° RR. impedidos de entrar nas instalações da A. nos 15 dias posteriores a essa resolução. (73° e 74°)”
III - FUNDAMENTOS
1. Por pertinente e na medida em que grande parte das questões foram já abordadas na douta sentença recorrida que aqui se acompanha transcreve-se o que ali ficou exarado na respectiva fundamentação:
“Concorrência desleal
De acordo com a matéria dada como provada, provado está que houve encontros entre os 2° e 3° RR. com dois agentes da A., tentando aqueles aliciar os últimos para irem trabalhar na companhia da 1ª R., mas salvo melhor opinião, julgo que não se pode considerar a conduta dos mesmos como acto de concorrência desleal.
Senão vejamos.
Escreve Jorge Patrício, in "Concorrência Desleal", Coimbra Editora, pág. 41, "A concorrência desleal não só pressupõe, para poder existir, a liberdade de concorrência, como é mesmo um seu complemento necessário, um meio de garantia dessa mesma liberdade. Os actos qualificados como desleais são proibidos não com a finalidade de limitar ou restringir a concorrência, mas bem pelo contrário, com a justificação de que, de outro modo, a concorrência não poderia atingir o seu objectivo, que é o de permitir o triunfo das empresas que os consumidores reputem mais dignas de sucesso."
Nas palavras de Carlos Olavo, in Concorrência Desleal, Almedina, Coimbra, 1997, p. 53, "Concorrência é competição. A concorrência vai encontrar as suas raízes no próprio conceito de liberdade humana. Do princípio da liberdade de iniciativa económica privada decorre a existência, ou pelo menos a possibilidade, de uma pluralidade de sujeitos económicos diferenciados que actuam em direcção a um mercado, pois à liberdade de iniciativa de um contrapõe-se a liberdade de iniciativa dos demais."
Assim, a lei não proíbe que haja concorrência entre os concorrentes, apenas exige que não seja desleal, como determina o artigo 153º do Código Comercial.
No respeitante à questão de concorrência desleal, dispõe-se nos termos do artigo 156º do Código Comercial de Macau que "1. Os comportamentos previstos neste capítulo consideram-se desleais quando sejam praticados no mercado com fins concorrenciais. 2. Presume-se que o acto é praticado com fins concorrenciais quando, pelas circunstâncias em que se realize, se revele objectivamente idóneo para promover ou assegurar a distribuição no mercado dos produtos ou serviços do próprio ou de terceiro."
Por outro lado, prevê ainda o artigo 158° do mesmo Código que "Constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência que objectivamente se revele contrário às normas e aos usos honestos da actividade económica."
Também é considerado desleal, entre outras situações, "a indução de trabalhadores, fornecedores, clientes e demais obrigados à violação das obrigações contratuais que tenham assumido para com os concorrentes", como se estipula nos termos do artigo 167°, n° 1 do citado Código.
No caso em apreço, provado que alguns agentes rescindiram os seus contratos de agência com a A. e não deram o seu pré-aviso, mas não está provado que tal tenha acontecido como resultado de indução dos RR., designadamente não logrou a prova que aqueles agentes de seguros rescindiram os seus contratos com a A. o tivessem feito por causa dos RR.
Pelo contrário, provado que aqueles agentes abandonaram a AIA para ingressarem na companhia da 1ª R porque o Director Regional da A., no exercício das suas funções, impunha aos agentes uma elevada carga horária, sujeitava-os a reuniões de largas horas, dificultava-lhes a possibilidade de progressão no negócio, aplicava-lhes penalidades elevadas, tendo, assim, provocado um descontentamento entre os agentes da A. que reportavam ao referido Director Regional.
Nestes termos, no respeitante à saída dos agentes da A. para entrar na companhia AXA, salvo melhor opinião, não se logrou provar que tenha acontecido por causa da conduta dos RR.
Por outro lado, relativamente ao alegado aliciamento de dois agentes da AIA, a saber, K e L, embora provado que os 2° e 3° RR. tentaram aliciar os mesmos para ingressarem na AXA, mas não conseguiram alcançar o seu objectivo porque o "convite" foi recusado pelos próprios, os quais decidiram ficar na companhia da A., e que ainda hoje se encontram ali a trabalhar.
Isto é, os 2° e 3° RR. apenas limitaram-se a contactar com aqueles dois agentes, convidando-os a ingressar na AXA como agentes, oferecendo-lhes melhores remunerações pecuniárias, mas não ficou provado que os RR. tivessem induzido aqueles dois agentes a violar quaisquer obrigações contratuais que tinham assumido para com a AIA.
Salvo o devido respeito, julgo que os meros contactos e propostas, ou promoção da cessação de contratos, acompanhada do oferecimento de melhores condições de trabalho não consubstancia um acto de concorrência desleal, isto é, actos de concorrência contrários às normas e aos usos honestos da actividade económica.
Dito isso, porque o artigo 35º da Lei Básica da RAEM determina que "Os residentes de Macau gozam da liberdade de escolha de profissão e de emprego", e, salvo excepções legais em contrário, qualquer trabalhador tem toda a liberdade e direito de escolher a profissão e a entidade empregadora que prefere.
Toda a classe trabalhadora tem direito de escolher o emprego que mais lhe convier, procurar condições profissionais e remuneratórias mais favoráveis e satisfatórias.
A solução poderia ser diferente caso viesse provar que havia desvio injustificado de clientes da AIA para a companhia onde agora trabalham, em consequência da actuação dos RR..
Olhando para os RR., nenhuma prova foi feita de que os mesmos tentaram desviar clientes da AIA para a sua companhia, assim, sem necessidade de delongas considerações, julgo que não se verifica qualquer situação de concorrência desleal.
*
Violação de obrigações contratuais
De acordo com a matéria dada como provada, resulta que os 2º e 3º RR. foram agentes de seguros da A., tendo apresentado as suas demissões no dia 30 de Dezembro de 2008.
Posteriormente, já após a saída, os referidos RR. tentaram aliciar dois agentes da A. para que fossem trabalhar na companhia da 1ª R.
Nos termos da cláusula 25ª do contrato de agência celebrado entre a A. e o 2º R. e da cláusula 24ª do contrato de agência celebrado entre a A. e o 3º R., dispõe-se que "No caso do Carrer Representative's Contract ser resolvido, por qualquer razão, este obriga-se a durante um ano após tal resolução a não solicitar ou induzir qualquer titular de apólices da Companhia a cancelar, alterar ou reduzir qualquer apólice, contrato suplementar ou endosso."
As referidas cláusulas consistem na obrigação do agente, no ano seguinte à resolução do seu contrato, não contactar com os clientes da A. por forma a não induzir qualquer titular de apólices da Companhia a cancelar, alterar ou reduzir qualquer apólice, contrato suplementar ou endosso, e não uma proibição absoluta dos RR., exagentes da A., de contactar com outros agentes da última, após a resolução dos seus contratos.
De facto, provada não está a existência de algum contacto entre 2º e 3º RR. com clientes da A. após a resolução dos respectivos contratos de agência, pelo que, razão não há para considerar que os 2º e 3º RR. teriam violado a referida cláusula contratual.
Mas mesmo que provasse a existência de algum contacto com os clientes da A., tal conduta também não constituiria necessariamente uma violação da obrigação contratual, tomando em consideração que em Macau, os seguros de vida são muitas vezes adquiridos como forma de investimento, sendo frequente um cliente adquirir mais de uma apólice de seguradoras diversas.
*
Por outro lado, alega a A. que os 2° e 3° RR. não teriam cumprido o pré-aviso contratualmente acordado.
Nos termos da cláusula 24ª, alínea b) e 23ª, alínea b) dos respectivos contratos de agência celebrados com a AIA, dispõe-se que "Sem prejuízo da resolução do contrato pela companhia nos termos da cláusula 26ª (ou cláusula 25ª no caso do 3º R.) deste contrato, este contrato pode cessar sem qualquer motivo justificativo por qualquer das partes, mediante aviso escrito, com 15 dias de antecedência".
De facto, foi acordado por A. e 2° e 3° RR., respectivamente, que no caso de o contrato de representante de carreira cessar por qualquer motivo, o representante de carreira obriga-se a dar conhecimento à A. com uma antecedência de 15 dias.
In casu, provado que os 2º e 3º RR., juntamente com alguns outros agentes da AIA, apresentaram as suas demissões em 30 de Dezembro de 2008, e nunca mais compareceram nas instalações da A.
Embora esteja provado que logo que os 2º e 3º RR. entregaram as suas cartas de resolução do contrato, os seus cartões de acesso às instalações da A. foram imediatamente bloqueados ficando os mesmos impedidos de entrar nas respectivas instalações, ainda assim julgo que os referidos RR. violaram a sua obrigação contratual, por não terem dado o pré-aviso de 15 dias.
Senão vejamos.
Consta das cartas de resolução do contrato que os 2º e 3º RR. declararam cessar a relação com a AIA como agente de seguros já a partir de 31 de Dezembro de 2008, o que significa que desde o princípio os mesmos nunca teriam intenção de continuar a trabalhar para com a A., violando com essa sua conduta a referida cláusula contratual.
Olhando para o lado da A., considerando que os 2º e 3º decidiram terminar o contrato de agência no dia 31 de Dezembro de 2008, assim, é totalmente compreensível a decisão da A. no sentido de bloquear o acesso às suas instalações pelos RR.
Contudo, apesar de haver violação da obrigação contratual pelos 2° e 3° RR., a A. não logrou provar que sofreu prejuízos directamente provocados pela conduta dos 2° e 3° RR., pelo que, salvo o devido respeito por melhor opinião, motivos não há para condenar os RR. no pagamento de qualquer indemnização por danos..”
2. O objecto dos diferentes recursos, não obstante as prolixas e, neste ou noutro passo, menos pertinentes alegações das partes - a autora chega a chamar breves a alegações que se estendem por mais de cem artigos e a uma suposta síntese conclusiva de 42 artigos -, passa seca e linearmente, pela análise das seguintes questões:
- se houve má-fé por banda da A. na acção e no recurso;
- se houve incorrecto julgamento da matéria de facto;
- Se houve concorrência desleal:
- se houve violação das obrigações impostas.
3. Do recurso da A., AIA
3.1. Da matéria de facto
Sobre as apontadas insuficiências, contradições e erro de julgamento de facto, matéria alegada que levou a recorrida AXA a apodar o recurso de ilegal, por não ter o recorrente especificado, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, importa, desde já, referir que num ou noutro ponto não deixará aquela ter razão, argumento, contudo, que não invalida a análise dos pontos concretos da matéria de facto, sempre que se tal resulte como evidente dos elementos que se revelem como demonstrativos dos assacados vícios.
Na verdade, para se impugnar a decisão de facto e pretendendo modificá-la, há que indicar quais os concretos meios probatórios que constam do processo e que imponham uma decisão diversa daquela que foi proferida - alíneas a), b) do n.º 1 do art. 599.º do CPC.
E nem sequer se preocupou a recorrente em reclamar de eventuais contradições, insuficiências ou obscuridades como determina o artigo 556º, n.º 5 do CPC.
3.2. Não entende a recorrente a redacção do quesito 11.º dado como "Provado apenas o teor da cláusula 25.ª dos acordos aludidos em 4.º e 5.º quando o quesito da base instrutória dizia que "atenta a responsabilidade inerente ao cargo e por serem profissionais muito bem pagos, o 2.º e 3.º Réus aceitaram assumir algumas obrigações de não concorrência e não solicitação válidas para além da vigência do contrato pelo prazo de 1 ano?"
Terá julgado o Tribunal a quo que o 2.º e 3.º RR. não assumiram a obrigação de não concorrência e não solicitação válidas para além da vigência do contrato pelo prazo de 1 ano, prevista exactamente na cláusula 25.ª do contrato.
Terá andado mal o Tribunal a quo pois, se deu como provados os contratos celebrados entre a A. e o 2.º e 3.º RR. (Quesitos 4.º e 5.º), bem como o não cumprimento, por estes, da cláusula 24.ª al. b) (Quesito 15.º), outra alternativa não restava ao Tribunal a quo, senão dar como provado, pelo menos, que o 2.º e 3.º RR. tinham assumido a obrigação de não concorrência e não solicitação válidas para além da vigência do contrato pelo prazo de 1 ano, prevista exactamente na cláusula 25.ª do contrato.
Dizem as cláusulas - não exactamente coincidentes na sua numeração, em ambos os contratos -, tal como consta da tradução da própria recorrente, fornecida no artigo 14.º da sua petição inicial, que "No caso de o Contrato do Representante de Carreira por qualquer motivo cessar, o Representante de Carreira obriga-se a, pelo período de um ano após essa cessação, não solicitar ou induzir qualquer cliente da Companhia a cancelar, alterar ou reduzir qualquer Apólice, Contrato Suplementar ou Emenda e independentemente de quaisquer outros direitos."
Trata-se de uma cláusula que impede o ex-agente de seguros de solicitar ou induzir clientes a rescindirem, no todo ou em parte, os seus contratos de seguro com a recorrente, durante o ano imediatamente seguinte à cessação do seu contrato.
E, como será fácil de ver, dar o Tribunal a quo como provado que os 2.º e 3.º recorridos assinaram com a recorrente os aludidos contratos que constam como docs. n.º 3 e 4.º junto com o procedimento cautelar (quesitos 4.º e 5.º), nada terá a ver com o teor original do quesito 11.º, que a recorrente desejava que fosse consequência de tal assinatura, o qual era o seguinte: "Atenta a responsabilidade inerente ao cargo e por serem profissionais muito bem pagos, o 2.º e 3.º Recorridos aceitaram assumir as obrigações de não concorrência e não solicitação, válidas para além da vigência dos contratos pelo prazo de 1 ano."
Sinceramente que não se percebe o que pretende a recorrente ou onde esta se funda para, a partir da comprovação dos contratos, retirar uma extensão de não angariação de clientela da A., para além do prazo de um ano, como expressamente clausulado.
Para além de uma referência genérica ao conteúdo dos contratos não se diz onde radica o seu raciocínio de forma a poder dar-se uma outra resposta que fosse em sentido diferente do fixado.
Para além de ser pacífico que as respostas aos quesitos não têm de se limitar necessariamente a um mero provado ou não provado, bem podendo passar por uma resposta restritiva ou explicativa, desde que contida no âmbito da pergunta formulada.
3.3. Quanto aos quesitos 48.º e 49.º, também teria andado mal o Tribunal a quo ao considerar provado o 48.º e não provado o 49.º.
Haveria contradição, pois que, por um lado, se considera provado que os 2.º e 3.º RR. fizeram propostas mais vantajosas e aliciantes, pelo menos aos dois antigos colegas, Sra. Lao e Sr. Un, tanto em termos de funções a desempenhar, como em termos de remuneração." (48.º) e, por outro, depois julga-se não provado que "As condições oferecidas aos agentes da AIA pelo 2.º e 3.º RRs. são muito superiores às oferecidas a qualquer agente que queira trabalhar com a AXA.” (49.º)
Não há contradição alguma. Antes pelo contrário, ambas as respostas se encaixam uma na outra. O facto de terem sido feitas propostas mais vantajosas a dois funcionários da AIA para irem trabalhar para a AXA não é desmentido pelo facto de se não ter considerado provado que essas condições fossem muito superiores às oferecidas a quem quisesse trabalhar com a AXA.
Bem podia acontecer que os padrões da AXA fossem genérica e concretamente muito superiores aos da AIA. Daí que as condições oferecidas bem podiam ser superiores às da AIA mas não superiores a quem quisesse trabalhar com a AXA.
3.4. Quanto ao quesito 50.º o Tribunal a quo tê-lo-á julgado não provado, mas deu como provado os quesitos 1.º, 2.º, 3.º, 16.º, 47.º, 51.º, esquecendo-se ainda do teor do documento junto pela A. em 20/01/2011, certidão da AMCM n.º 001/2011 que comprova que não foram só o 2.º e 3.º RRs. que rescindiram os seus contratos com AIA tendo, em seguida, iniciado funções para a AXA, (Facto Assente E).
Não se compreendendo que provados os factos relativos às qualidades e importância dos agentes para A, bem como aqueles agentes que depois de rescindirem o contrato com a A. passaram a trabalhar para a AXA, o Tribunal a quo não tivesse dado como provado que a A. perdeu “know-how” para a AXA, sua concorrente directa.
Ainda aqui não lhe assiste razão. A transferência de trabalhadores qualificados não implica necessariamente uma perda de “know-how”. Basta pensar que essa saída bem pode ser compensada coma entrada de novos valores ou com acções formativas, novos sistemas, métodos ou tecnologias em relação ao pessoal que permanece.
3.5. Merece ainda censura, no dizer da recorrente, o julgamento do quesito 53.º como não provado, uma vez que, o Tribunal a quo julgou provado os quesitos 54.º, 55.º e 56º.
Se não se podia considerar provado a primeira parte do quesito "Em consequência do seu comportamento" deveria ter-se julgado provado que "Aqueles agentes, agora da AXA, acederam a informação sobre clientes e as respectivas apólices, informação que pertence à AIA."
Não havendo qualquer outra explicação disponível ao Tribunal que justificasse o acesso a tão grande número de apólices num só dia, exactamente o último dia de trabalho na AIA.
Analisando.
Importa atentar que o quesito não tem a formulação como a recorrente o transcreve nas suas alegações, mas sim “Em consequência de tal comportamento dos Réus, os agentes da Axa têm acedido a informação sobre clientes e as respectivas apólices, informação essa que pertence à AIA?”
Esta diferente redacção é muito importante, pois que aí se inculca para a manutenção de um acesso a informação continuado no tempo, que ainda hoje perdura e não já num comportamento que se esgotou num determinado espaço temporal.
A pretensão da recorrente em inverter a resposta a tal quesito baseia-se apenas numa desconfiança, numa mera presunção, não suportada em qualquer base probatória que permita afirmar o contrário do que foi consignado.
Mas reconhecemos que há uma parte do quesito que é preenchida pelas respostas aos quesitos 54º, 55º e 56º - reconhecimento que não se mostra decisivo ou sequer relevante no sentido da anulação do julgamento feito -, onde se perguntava se determinados agentes demissionários acederam a umas tantas centenas de apólices, ao que se respondeu afirmativamente, mas sem que se tenha provado que das mesmas fizeram download como se inquiria no 57º.
Para além do que ficou concretamente provado, mais nada se pode extrapolar.
Embora sendo certo que ficou provado que alguns ex-agentes da recorrente, antes de rescindirem os seus contratos com esta, acederam a dados de clientes, não é menos certo que a recorrente alegou mas não provou que tais agentes tenham copiado para si essa informação nem que, ainda que tal tivesse acontecido, tenham dela feito qualquer uso, em benefício próprio ou de outrem, designadamente da AXA, ou causado prejuízo à Recorrente - cfr. respostas totalmente negativas aos quesitos 53.º, 57.º 59.º, 60.º, 61.º, 62.º e 63.º.
Dito de outro modo, confirmou-se que ex-agentes da recorrente acederam a informações de clientes antes de rescindirem os seus contratos, mas tal facto, só por si, é inócuo, já que não ficou de tal forma provado que tal acesso tenha resultado em qualquer benefício para tais agentes nem para a ora recorrida, nem que os clientes cujos dados foram consultados tenham rescindido os seus contratos de seguro com a AIA, instigados por quaisquer dos recorridos ou por alguém a mando destes.
Donde se conclui que eventual imprecisão ou incompleição na resposta ao quesito 53º é facilmente colmatada pela apreensão do que realmente se comprovou a partir da matéria que ficou comprovada.
3.6. Não se vê onde e em que medida é que o Tribunal a quo extrapolou nas suas respostas aos quesitos 67.º, 68.º, 69.º, 70.º e 71.º, enquanto considerou "provado que aqueles agentes abandonaram a AIA para ingressarem na companhia da 1.ª R porque o Director Regional da A., no exercício das suas funções, impunha aos agentes que se encontravam sob a sua direcção, uma elevada carga horária e sujeitava-os a reuniões de largas horas, dificultava-lhes a possibilidade de progressão no negócio, aplicava-lhes penalidades elevadas, tendo, assim, provocado um descontentamento entre os agentes da A. que reportavam ao referido Director Regional."
O nexo causal está bem patenteado na redacção do quesito 71º, aí se referindo que foi esse circunstancialismo, relacionamento com o Director Regional e difícil condicionalismo de exercício que já tinha levado cerca de 60 agentes da A. a optar pela resolução dos contratos, não deixando de ser compreensível que o Mmo Juiz fizesse de tal factualidade uma interpretação plausível e para o que apontam as regras da experiência comum, de modo a poder justificar-se a mudança dos agentes em presença.
3.7. Diz ainda a recorrente que num outro ponto da matéria de facto, o Tribunal a quo considerou provado que alguns agentes rescindiram os seus contratos de agência com a A. e não deram pré-aviso de 15 dias a que estavam obrigados, tal como terá acontecido com os 2º e 3º RR.
Porque terão todos utilizado a mesma minuta de carta de rescisão e recorrido à mesma advogada, conclui a recorrente no sentido de uma indução e influência por banda dos RR em relação a tal rescisão.
Para mais quando o Tribunal deu como provado o aliciamento de pelo menos dois agentes da AIA para a AXA (resposta ao quesito 16.º) e os exactos termos desse aliciamento (quesitos 17.º, 18.º, 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º e 40.º), naquelas exactas datas e não infere nenhuma indução dos RR. àqueles dois agentes a violar obrigações contratuais.
Nem se retira desses aliciamentos nenhuma consequência, nem nenhuma semelhança com o que se passou com os agentes que, efectivamente, rescindiram com a A. e foram exercer funções para a l.ª R, AXA.
Mesmo julgando provados os quesitos 54.º, 55.º, 56.º e 66.º, o Tribunal a quo não viu nenhuma relação entre eles, nem concluiu nada em relação aos acessos às apólices, pelos agentes demissionários.
Não obstante não vir provado o download apontado, o tribunal deveria ter considerado que o acesso de 254 apólices, pelo N, no dia 06/02/2009, dia em rescindiu o contrato (Quesito 56.º) era, no mínimo, anormal.
Deveria, assim, o Tribunal a quo ter julgado provado não só o contacto de clientes como a indução dos clientes em cancelar as apólices da A.
O que dizer sobre esta alegação?
Desde logo que a recorrente é confusa e mistura factos com conclusões e ilações a extrair da matéria de facto, para além de não concretizar quais os quesitos que mereciam resposta diferente.
É certo que não deixa de ser estranho o acesso a centenas de apólices pelo funcionário em causa no último dia de trabalho. Mas daí a retirar uma acção de conluio entre os réus, um aproveitamento dessa situação para retirar clientes à A., uma mudança de seguradora por parte desses clientes, vai uma grande distância, sendo que, para além disso, mais nada se provou.
Não existe assim nenhum nexo causal entre qualquer comportamento dos recorridos e as supostas condutas de agentes e clientes descritas pela recorrente, pelo que a conclusão que a recorrente retira no sentido das obrigações contratuais e de não concorrência desleal se mostra despropositada e não tem qualquer apoio na prova produzida.
3.8. O Tribunal a quo, acrescenta a recorrente, também nada terá inferido do facto do 2.º e 3.º RR, em depoimento de parte terem, sob juramento, na audiência de discussão e julgamento da providência cautelar, terem mentido ao Tribunal e negado os encontros agora dados como provados.
Se não havia mais que normal concorrência, por que razão nem a AXA, nem os 2.º e 3.º RR nunca admitiram tais encontros ou contactos, com a Sra. Lao ou com o Sr. Un?
A 1.ª R nem sequer admitiu que os agentes demissionários tinham passado a exercer funções para a AXA, (facto do qual tinha que ter conhecimento) sendo necessário a certidão da AMCM, junta aos autos em 20/01/2011, para provar tal facto.
Trata-se de matéria manifestamente impertinente, na medida em que eventual incorrecção de postura processual não deve ser aqui analisada.
Não se mostra correcto esgrimir com o que foi provado ou não provado em sede de procedimento cautelar, sabendo-se que a matéria ali provada não vincula o Tribunal na acção principal. Trata-se ali de uma prova indiciária e que não deixa de merecer um melhor aprofundamento e análise na acção, vista a diferente natureza e função entre esses processos.
Se as partes mentiram, importa averiguar o facto em sede própria e não retirar daí, necessariamente como assente, o facto que é negado.
3.9. E do facto de não ter sido dado o aviso prévio nas rescisões ocorridas e da carta da AMCM datada de 14/04/2009 (facto assente F) também nada se retira directamente em termos de uma actuação conformadora de uma concorrência desleal, entendida esta como prevê o artigo 158.º do Código Comercial como " todo o acto de concorrência que objectivamente se revele contrário às normas e aos usos honestos da actividade económica".
A interpretação da expressão normas e usos honestos da actividade económica assenta assim numa noção de natureza valorativa, sendo uma figura de difícil aplicação, possuindo uma maleabilidade que permite que o âmbito seja adaptado às circunstâncias concretas, tudo dependendo do ramo de actividade.1
Também é considerado desleal, entre outras situações, "a indução de trabalhadores, fornecedores, clientes e demais obrigados à violação das obrigações contratuais que tenham assumido para com os concorrentes", como se estipula nos termos do artigo 167°, n° 1 do citado Código.
Havendo que ter presente que, no que concerne à actividade seguradora, estipula o artigo 9º, alínea f) do DL n.º 38/89/M, de 5 de Junho, que cabe ao mediador “Guardar segredo profissional, em relação a terceiros, dos factos de que tome conhecimento por força do exercício da sua actividade”, punindo-se a concorrência desleal nos termos do artigo 31º, al. e), do mesmo diploma legal - "Prática de concorrência desleal com o intuito de obter um benefício próprio" - com as penas previstas no art. 30.º.
A proibição da concorrência desleal visa essencialmente assegurar a honestidade no exercício da actividade comercial entre empresas que exerçam actividades idênticas ou afins .
Ou numa outra asserção, com incidência nos autos “é todo o acto ou omissão, não conforme aos princípios da honestidade e da boa-fé em comércio, susceptível de causar prejuízo à empresa de um concorrente, pela usurpação total ou parcial da sua clientela”2
Pelo que os respectivos pressupostos de tal concorrência desleal e de tais violações não podiam deixar de ser comprovados.
E onde estão os usos honestos que correspondam a uma prática no ramo segurador e que em concreto tenham sido violados?
Partir da factualidade indiciária, tal como o facto respeitante ao cancelamento das 75 apólices da AIA, que seriam consequência daqueles comportamentos, parece um salto lógico que não deixará de arrostar com alguma insegurança.
3.10. Mais, as partes aqui em causa celebraram um contrato válido, tendo aceite legitima e reciprocamente direitos e deveres dele advenientes.
É certo que nos termos do art. 400.º n.º 1 do CC "O contrato deve ser pontualmente cumprido e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento ou nos casos admitidos por lei."
Quer nos preliminares do contrato e na sua formação (art. 219.º do CC), quer na sua execução, devem as partes pautar a sua conduta pela boa fé: "No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de Boa fé." (art. 752.º n.º 2 do CC)
Estes dois princípios básicos da autonomia privada (pacta sunt servanda e boa fé) implicam o cumprimento pontual e rigoroso do que, validamente, foi acordado, nessa altura se estabilizando o contrato.
Daqui decorre que, não obstante se ter comprovado que o Tribunal a quo julgou que o 2.º e 3.º RR. violaram a sua obrigação contratual, por não terem dado o aviso prévio de 15 dias, tal não implica que daí se retirem as consequência relativas à satisfação do pedido indemnizatório, importando comprovar os danos.
Se se observa a violação da cláusula 24.ª b) - aviso prévio -, já o mesmo não acontece com o alegado incumprimento da cláusula 25.ª, importando distinguir entre a prova efectivamente produzida, a convicção do julgador, a convicção da recorrente e curando indagar se há elementos objectivos que inculquem no sentido da validação da convicção da parte.
Ora, não parece ser esse o caso.
3.11. As respostas negativas aos quesitos integrantes da matéria em que assentariam os pressupostos de uma concorrência desleal ou actuação lesiva, nomeadamente aos quesitos 57º a 65º são bem elucidativas da sem razão da recorrente, não se podendo concluir por um incumprimento demonstrativo e indissociável da sua má fé (dos réus).
Esta posição mostra-se bem esclarecida na seguinte passagem da sentença recorrida, enquanto aí se disse:
“No caso em apreço, provado que alguns agentes rescindiram os seus contratos de agência com a A. e não deram o seu pré-aviso, mas não está provado que tal tenha acontecido como resultado de indução dos RR., designadamente não logrou a prova que aqueles agentes de seguros rescindiram os seus contratos com a A. o tivessem feito por causa dos RR.
Pelo contrário, provado que aqueles agentes abandonaram a AIA para ingressarem na companhia da 1ª R porque o Director Regional da A., no exercício das suas funções, impunha aos agentes uma elevada carga horária, sujeitava-os a reuniões de largas horas, dificultava-lhes a possibilidade de progressão no negócio, aplicava-lhes penalidades elevadas, tendo, assim, provocado um descontentamento entre os agentes da A. que reportavam ao referido Director Regional.
(…)
Salvo o devido respeito, julgo que os meros contactos e propostas, ou promoção da cessação de contratos, acompanhada do oferecimento de melhores condições de trabalho não consubstancia um acto de concorrência desleal, isto é, actos de concorrência contrários às normas e aos usos honestos da actividade económica.”
3.12. O cancelamento das 75 apólices não é por si só demonstrativa da actividade de concorrência desleal.
Nem o será o contacto com outros trabalhadores da A. na medida em que se não traduza na indução da quebra dos seus deveres ou obrigações contratuais.
Não tem, assim, razão a recorrente quando afirma que será suficiente para o preenchimento de uma situação geradora de ilicitude que esse desvio fosse potencial, isto é, não seria imperioso que se verificasse o cancelamento efectivo de apólices de seguros, bastando que o comportamento dos agentes fosse meramente preparatório ou de molde a criar a expectativa desta actividade concorrencial.
Mas o que temos aqui não é uma probabilidade embrionária de concorrência desleal, mas sim a não comprovação dessa concorrência, donde a realidade dos factos não confirmar aquilo que num primeiro momento poderia parecer e para onde terá apontado uma primeira prova indiciária em termos cautelares.
O direito à concorrência não deve ser menos relevante do que o direito à protecção contra a concorrência desleal.
Sendo certo que ambas as Seguradoras são concorrentes, verifica-se, no entanto, que não existe, nos factos provados, nenhuma violação contratual por parte dos agentes que rescindiram os seus contratos com a primeira, no período entre Dezembro de 2008 e Abril de 2009, que seja resultante de indução pela AXA ou pelos outros recorridos.
De facto, a cessação de um contrato não constitui, só por si, como acima já se disse, nenhuma violação contratual, e nem sequer está provado que os agentes demissionários tenham violado a sua obrigação de pré-aviso induzidos pela AXA ou pelos outros recorridos.
Alia-se a esta questão, a plena liberdade de contratação e emprego acima aflorada, que é consequência do artigo 35.º da Lei Básica - "Os residentes de Macau gozam da liberdade de escolha de profissão e emprego".
A recorrente, nos autos, embora sem o conseguir concretizar nem provar, pretende invocar a suposta prática pelos recorridos de actos que integrariam uma concorrência desleal, mas na verdade não vem comprovada, não obstante uma orla de incerteza3 que rodeia estas matérias, matéria fáctica integrante do tipo na sua formulação genérica ou especial como, nomeadamente, a decorrente de factos integrantes do que possa constituir o tipo de tal prática, seja na vertente da deslealdade, na confusão, na desacreditação, na denegrição, na invocação ou utilização de elementos ou sinais alheios, violação de segredos, agressão, indução em erro, coacção, aproveitamento de fraquezas ou desvio de consumidores, desorganização ou falseamento das regras do mercado.
Mesmo a considerar que existiu qualquer violação contratual por parte dos agentes que vêm referidos nas respostas aos quesitos 12.º e 42.º a 46.º, "... se não houver incitamento à ruptura, pode-se contratar livremente. Mas não se pode transformar a falta de prova do incitamento numa espécie de presunção universal de responsabilidade de todos os concorrentes.” Não há concorrência desleal no mero aproveitamento de uma pessoa que tenha rompido irregularmente a relação com a empresa concorrente. Desde que não tenha havido qualquer forma de encorajamento, a contratação torna-se depois livre.4
Assim, não estando provado qualquer encorajamento por parte dos recorridos, e não existindo nenhuma presunção legal nesse sentido, não existe concorrência desleal e, logo, não está preenchido um dos pressupostos da responsabilidade civil cuja indemnização é reclamada pela recorrente, isto é a ilicitude.
Na verdade, não está provada nos presentes autos a promoção pela AXA da cessação de qualquer contrato.
3.13. O simples facto de ter havido alguns ex-agentes da recorrente que decidiram trabalhar para a AXA, e que o 2.º e 3.º recorridos terão contactado dois agentes da primeira, tentando recrutá-los para a segunda (sem esquecer que tais dois agentes não chegaram a abandonar a AIA), tem de ser observado à luz de que a concorrência é pressuposto necessário da existência de concorrência desleal, sendo que esta última existe para garantir a primeira, não com a finalidade de a reprimir ou restringir, mas, pelo contrário, com a justificação de que, de outro modo, a concorrência não lograria atingir o seu objectivo de premiar os empresários que o mercado repute como mais dignos de sucesso.
Sendo certo que “A delimitação dos vários sectores de mercado está em constante mutação. A identidade da clientela costuma ser o critério adoptado para delimitar o mesmo sector de mercado. Mas onde está a identidade da clientela, perante a extrema diversidade dos bens oferecidos num hipermercado? Aliás, é sabido que o cliente de um hipermercado acaba muitas vezes por adquirir produtos diferentes daqueles que procurava quando aí se deslocou e que essas compras resultam de técnicas de venda destinadas a criar artificialmente essa sua motivação.
A actual distorção dos circuitos comerciais tradicionais torna possível a concorrência entre agentes situados em estádios diversos do processo económico (produtores, grossistas, retalhistas), que passaram a ter, muitas vezes, uma clientela comum.
Pode, por outro lado, verificar-se uma actuação distorcida do mercado, por parte de entidades que nele não actuam directamente. Será o caso de um médico que recomenda aos seus numerosos doentes que as análises que prescreve sejam feitas em determinado laboratório ou que só lhes receita medicamentos de certa empresa farmacêutica. Situações idênticas ocorrerão quando os sócios de um popular clube desportivo obtêm descontos em lojas de comerciantes simpatizantes desse clube, ou ainda quando uma cadeia de distribuição adquire a produção de determinado fabricante, autorizando este que esses produtos sejam vendidos sem marca (produtos brancos) ou com a marca da rede distribuidora.
A concorrência pode procurar não a conquista directa da clientela, mas ter como objectivo primordial a disputa de fornecedores, distribuidores, vendedores, ou dos próprios trabalhadores. Estes actos continuam a ser actos de concorrência, porque através deles o que se procura é o melhor apetrechamento da empresa para a conquista de posições vantajosas no mercado.
Há casos em que se obtêm vantagens na concorrência, através da prática de actos que não são, em si mesmos, actos de concorrência, e que, quando ilícitos, são sancionados através de normas legais específicas. Como exemplo, podemos referir o não pagamento dos impostos ou das contribuições para a segurança social.
Embora seja uma questão controversa, continuamos a considerar que no próprio conceito de acto de concorrência está ínsita a sua susceptibilidade de causar prejuízos a terceiros, ainda que tais prejuízos possam efectivamente não ocorrer.
Com efeito, a conquista de posições vantajosas no mercado é feita em detrimento dos outros agentes económicos que nele actuam e cuja clientela, actual ou potencial, é disputada.
Deste modo, em nosso entender, o acto de concorrência, para verdadeiramente o ser, tem como seu elemento co-natural, implícito na própria noção, a sua idoneidade ou aptidão para provocar danos a terceiros.”5
Daqui resulta, naturalmente, que o acto de concorrência causa sempre, por definição, perdas ao concorrente - sem que tais perdas signifiquem necessariamente que tal acto constitua qualquer deslealdade.
3.14. Em todo o caso, os actos não podem ser vistos desgarradamente.
Verificando-se, pela prova documental produzida e alegação da própria parte que a A. captava o maior segmento de mercado no domínio dos seguros de vida e que, em 2008 e 2009, teria mais de 1000 agentes ao seu serviço, verifica-se singelamente que, mesmo que porventura se presuma ter existido alguma indução por parte da ora recorrida, não se vê em que medida uma qualquer indução aos referidos 16 agentes demissionários pela AXA e/ou pelos outros recorridos no sentido de aqueles fazerem cessar os seus contratos, e mesmo em face dos contactos que ocorreram entre os 2.º e 3.º Recorridos e outros dois agentes, se pode considerar tal prática como extravasando uma concorrência traduzida ainda numa sadia disputa no mercado de trabalho. Isto, exactamente na esteira de Oliveira Ascensão, que faz depender a ilicitude de uma actuação massiva, sistemática e em bloco, fazendo-a depender sempre de “um acto (finalístico) de captar ou atrair”.
A não se entender desta forma, difícil seria aceitar as normais flutuações de mão de obra entre empresas, aliás, tão vulgares nas empresas da RAEM, para já não falar naquelas que vêm documentadas nos autos no seio das Seguradoras
3.15. O mesmo se diga, quanto à suposta perda de clientela a favor da AXA, invocada pela recorrida, a qual esbarra irremediavelmente nas respostas aos quesitos 53.º, 57.º, 58.º, 59.º e 60.º, sendo que a Recorrente não produziu qualquer prova que infirme a posição expressa na douta sentença recorrida, relativamente a esta matéria.
De facto, a recorrente não tem qualquer fundamento para requerer ao Tribunal a tutela que pretende, porque nenhum dos seus direitos foi ilicitamente violado pela ora Contra-Alegante AXA, nem pelos restantes recorridos - tendo, por isso, decidido bem o douto Tribunal a quo.
Só está dado como provado nos presentes autos que o 2.º e o 3.º recorridos contactaram com dois agentes da recorrente e que lhes apresentaram propostas para que passassem a ser agentes da ora recorrida, as quais não tiveram, de resto, qualquer sucesso uma vez que esses agentes continuam, até hoje, a ser agentes da AIA - cfr. a douta sentença recorrida, a fls. 661v.
Relativamente à saída de clientes de uma seguradora para outra, aquando da transferência de agentes, falta sempre a comprovação do pressuposto da ilicitude ínsito a eventual indução enganosa ou ilegítima nesse sentido.
4. Vejamos agora os danos.
4.1. Pretende a recorrente que lhe seja arbitrada uma indemnização por danos, com fundamento na sua suposta perda de agentes e clientela a favor da 1ª Ré, em montante a liquidar em execução de sentença, pelos danos causados pelos actos de concorrência desleal.
Fala a recorrente numa perda do investimento que a AIA fez e faz, na formação dos seus agentes, custos que são elevados e suportados pela AIA, com vista à profissionalização e maior qualificação dos seus agentes.
Em segundo lugar, refere a A., AIA, a perda para uma empresa directamente concorrente, a AXA, do "know-how" que os seus agentes adquiram ao seu serviço.
Em terceiro lugar os custos acrescidos com o novo processo de selecção e recrutamento - a saída inesperada de um funcionário acarreta, inevitavelmente, um novo processo de selecção e recrutamento de um outro agente, com os consequentes gastos em formação inicial da pessoa seleccionada.
Em quarto lugar, para além do recrutamento efectivo, dos 16 agentes, prejudicar a actividade da AIA, há que contar com as tentativas de aliciamento, as abordagens e contactos feitos pelos Réus como nos casos da Sra. Lau e do Sr. Un, interferem com a actividade da AIA e criam um clima de pressão, receio e suspeição entre os outros agentes da AIA.
Por último, considera toda a informação, propriedade da AIA, sobre os clientes e respectivas apólices que os agentes demissionários acederam para, sem o consentimento daquela, os contactar e aliciar para mudarem as suas apólices para a AXA.
A todos os danos acima referidos e que a AIA teve que suportar acrescem ainda as 75 apólices que vieram a ser canceladas e transferidas da mesma.
4.2. Sobre isto diremos tão-somente que são vaguidades. Esses prejuízos são os decorrentes de se estar instalado no mercado e sujeito a uma livre concorrência que, como se viu, não se configurou como desleal.
Trata-se de factos que não vêm comprovados.
O investimento na formação de pessoal é um custo inerente ao exercício de uma certa actividade e é uma decorrência normal da saída de um trabalhador.
A transferência de clientes não vem comprovada em si nem que tenha ocorrido por indução dos recorridos.
A perda de uma certa carteira de clientela é também uma decorrência normal de quem está no mercado sujeito às variações e flutuações do mesmo.
Os apontados danos ou não se verificaram ou não se podem conexionar com a conduta das rés, pelo que se afigura não se observarem os pressupostos da responsabilidade civil inerentes ao dever de indemnizar.
A recorrente, em fase alguma do processo, justificou ou provou os danos que reclama, em especial, o respectivo nexo causal, os quais têm como causa de pedir eventos que são muito anteriores à entrada da petição inicial.
Por essa razão, pois, e não já pelas razões processuais aduzidas pela 1ª recorrida, que alega inadmissibilidade do pedido genérico, face ao disposto no artigo 563º do CC, pedido aí consentido e exercitável nos termos da disjuntiva ou, contida na al. b) do n.º 1 do artigo 392º do CPC.
5. Da má-fé e do recurso da má-fé interposto pelos RR
5.1. A ré AXA recorre da sentença de fls. 655 e segs., na medida em que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre o requerimento apresentado pela ora recorrente com as suas alegações de direito, onde esta pretendia ver a autora condenada como litigante de má fé;
Tal omissão afigura-se-lhe constituir violação do n.º 2 do art. 563.° do CPC e do n.º 1 do art. 106º do mesmo diploma legal e fere a douta decisão recorrida com a nulidade prevista na al. d) do n.º 1 do art. 571.º do CPC, a qual, nos termos do n.º 3 do mesmo normativo, serve de fundamento ao presente recurso.
Nos parágrafos 130 e segs. das suas alegações de direito, a ré, ora recorrente, invocou factos relativos à conduta da autora nos presentes autos, os quais, defendeu, constituíam (e constituem) a prática dolosa e repreensível de actos processualmente desleais
A inversão e deturpação das respostas aos quesitos, de forma dolosa e descarada, a qual se afigura ultrapassar em muito, a mera litigância apaixonada justificaria plenamente a condenação da autora como litigante de má.
Alegam os RR. que a AIA “pretende criar uma presunção de culpa perante o silêncio: porque os RRs. não admitiram, os factos que àquela interessavam.”
5.2. E no que à má-fé concerne, A e B, RR. nos autos à margem referenciados, dizem, em síntese, o mesmo.
5.3. Já em sede de recurso insistem na condenação da A., recorrente como litigante de má fé, por violação da al. c) do n.º 1 do art. 385.° do CPC.
Vejamos.
5.4. Reconhece-se a existência de omissão de pronúncia geradora da nulidade da sentença proferida, face ao disposto no artigo 571º, n.º 1, d) do CPC, mas que nos termos do disposto no artigo 630º, n.º 1 e 2 do mesmo diploma legal não se deixará de conhecer.
5.5. Começa a A. AIA por defender a inadmissibilidade do recurso dos RR., pois que, embora no âmbito da má-fé, não estaríamos perante uma condenação, como determina o n.º 3 do artigo 385, nos termos do qual “Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido o recurso, em um grau, da decisão que condene por litigante de má-fé.” E mesmo que a parte tenha ganho da causa não fica impedida de se bater pela condenação da parte que perdeu e que litigou com má-fé.
Não se concede razão à A., pois que, não se tratando de condenação, mas sim de não condenação, parece não ser de plicar aquela norma que se afigura ser de carácter excepcional e não passível de interpretação analógica.6
Rege então a regra do n.º1 do artigo 583º, atendendo-se apenas ao valor da causa e na impossibilidade de determinação do valor da sucumbência rege apenas aquele primeiro factor, donde se conclui pela admissibilidade do recurso.
E quanto à legitimidade para recorrer reconhece-se que ela advém do facto de os recorrentes se considerarem prejudicados nessa questão, não tendo aí tido ganho de causa.
5.6. Quanto à não admissão dos factos relativos aos encontros tidos com a Sra. Lau e o Sr. Un - factos considerados provados não só na providência cautelar como na acção principal - evidenciando-se uma mentira descarada das partes, importa referir que a desconformidade, inverdade ou falsas declarações deve ter um tratamento processual autónomo e o certo é que não foi extraída certidão para o respectivo procedimento inculcado no artigo 384º nº 1 do CPC que estabelece:
“O tribunal faz sentir ao depoente a importância moral do juramento que vai prestar e o dever de ser fiel à verdade, advertindo-o ainda das sanções aplicáveis às falsas declarações.” E o nº 2 “Em seguida, o tribunal exige que o depoente preste o seguinte juramento:《Juro, por minha honra, dizer toda a verdade e só a verdade.”
Acresce que se essas condutas não podem ser assacadas à ré AXA, também não será aí a AIA que litiga de má fé.
5.7. Depois, quanto ao facto de os agentes demissionários trabalharem para a AXA, não foi só na providência, mas também na acção principal que foi a 1ª R. que não admitiu que os agentes demissionários tinham passado a exercer funções para a AXA, facto que só documentalmente veio a poder ser comprovado e que a ré AXA não devia ignorar.
Isto apenas para referir que o calor do patrocínio é apanágio das partes e que por vezes se observa menos transparência em todas elas no que aos seus interesses respeita. Só que há um limite, a partir do qual aquela falta de lisura não se pode tolerar, impondo-se então o recurso aos meios processuais sancionatórios para reprimir uma manifesta e intolerável postura processual.
Quanto à matéria citada e extraída do que foi decidido em sede de providência cautelar, ainda que o artigo. 328º, n.º 5° do CPC, preveja
"O julgamento da matéria de facto e a decisão final proferida no procedimento cautelar não têm qualquer influência no julgamento da acção principal “
Tal não impede a parte de se prevalecer do que aí indiciariamente vem provado de forma a tornar firme e consistente o que não passou de uma primeira aparência.
E no caso essa aparência não deixava de beneficiar a A. que, aliás, não deixou de ver acolhida a sua pretensão.
Só que, como está bem de ver, o Juiz sabe bem as linhas com que se cose e, noutra sede, não deixa de julgar objectivamente e com independência de um primeiro julgamento perfunctório.
Nada de anormal, pois, na postura da A.
5.8. Por outro lado quanto à pretensa inversão da matéria de facto, as coisas não são tão lineares como os aqui recorrentes as colocam. Há factos e factos. Há factos de muita e variada ordem e nada impede que a partir de uns se extraiam outros. Uns são o desenvolvimento de uma outra factualidade que a precede e o que a A. na sua alegação e litigância pretende, mais não é do que fazer concluir no sentido de uma factualidade provada, de forma a extrair outra que lhe seja favorável.
O que não deixa de ser legítimo.
Por tudo isto, não se vê que tenha litigado com má-fé, apenas pretendendo convencer das suas razões a partir dos dados apurados nos autos e que numa primeira aparência até pareceria que lhe seriam favoráveis.
Posto isto, o pedido de litigância não deixará de improceder.
Tudo visto e ponderado resta decidir.
IV - DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso da A. e em conceder parcial provimento aos recursos dos RR., na medida em que se reconhece a existência de omissão de pronúncia relativamente à má-fé, mas, conhecendo-se da questão, nos termos vistos, julga-se improcedente o pedido de condenação da A. como litigante da má-fé, tanto na acção, como no recurso.
Custas dos recursos pelos recorrentes e do incidente da má-fé nesta instância, pelos réus, aí recorrentes e requerentes.
Macau, 18 de Outubro de 2012,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 - Oliveira Ascensão Concorrência Desleal, Almedina, 2002,. 155 e 156
2 - Ferrer Correia, Lic. Dto Com., 1º, 224
3 - Para usar a expressão de Oliveira Ascensão, in Concorrência Deslael, Curso promovida pela FDL, Almedina, 1997, 7
4 Idem, pág. 155.
5 - Jorge Patrício Paúl, Conc. Desleal, ob. cit. 43
6 - Neste sentido, Cândida Pires e Viriato Lima, CPC de Macau Anotado II, 2008, 529,
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