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Processo nº 886/2012 Data: 21.03.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “condução em estado de embriaguez”.
Pena.
Substituição por multa.



SUMÁRIO

1. Sendo a pena para o crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, a de prisão até 1 ano, excessiva não é de considerar a pena de 4 meses de prisão fixada a uma arguida, agente da P.S.P., já que esta constitui (apenas) 1/3 do limite máximo, não sendo de olvidar que a “qualidade” da arguida implica, necessariamente, um mais acentuado desvalor da sua conduta.

2. Tal pena, em caso de aplicação do art. 44° do C.P.M., (“substituição”), é substituída por “igual dias de multa”, correspondendo cada dia de multa a uma “quantia de 50 a 10.000 patacas”, taxa esta que deve ser fixada, tendo-se em atenção a situação económica e financeira do condenado e aos seus encargos pessoais.

O relator,

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Processo nº 886/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por sentença proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. decidiu-se condenar A, arguida com os sinais dos autos, como autora da prática de 1 crime de “condução em estado do embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007 (“Lei do Trânsito Rodoviário”), na pena de 4 meses de prisão, que se substituiu pela multa também de 4 meses, à taxa diária de MOP$200,00, perfazendo a multa global de MOP$24.000,00 e na inibição de condução pelo período de 1 ano; (cfr., fls. 15 a 17-v).

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Inconformada, a arguida recorreu.
Motivou para, a final, produzir as conclusões seguintes:

“1ª A douta decisão recorrida padece de erro de direito.
2ª Limitan o recurso à questão de vícios de excessos de pena condenada e da fixação da taxa diária de multa.
3ª O Código Penal de Macau, no seu art.° 40.° determina que a pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
4ª A recorrente foi detectada a conduzir com uma taxa alcoolémica de 1,32 gramas por litro no sangue, entende-se de uma diminuição acentuada de ilicitude, uma vez que, só, e apenas só, excedeu ligeiramente 0,12 gramas por litro de taxa alcoolémica.
5ª O art.° 65.° n°.2 do Código Penal determina que o Tribunal, na medida da pena, atenda todas as circunstâncias que depuserem a favor ou contra do agente.
6ª O Tribunal a quo na medição da pena à ora recorrente levou em consideração da profissão da recorrente - agente da Polícia Segurança Pública - que devia ter especial dever de cumprir as leis.
7ª De facto, como agentes policiais e funcionários públicos estão vinculados com deveres profissionais, nomeadamente deveres disciplinares.
8ª Outrossim, agentes da polícia e funcionários serão severamente criminalmente punidos em determinados crimes, mas sempre quando a lei assim especificar.
9ª Todavia, os factos ora dados por assentes foram ocorridos fora do exercício das funções da recorrente, nem a elas motivadas ou inerentes.
10ª A norma do art.° 90.° da Lei do Trânsito Rodoviário também não prevê alguma situação agravante para funcionários no cometimento daquela infracção.
11ª Um agente policial, fora do exercício das suas funções é como um cidadão vulgar, muito embora como os outros, tem obrigação de cumprir as leis.
12ª O art.° 25.° da Lei Básica consagra que todos são iguais perante a lei, portanto o Tribunal a quo na medição da pena, não devia ter levado em consideração da recorrente de ser um agente da polícia de segurança pública.
13ª A decisão recorrida reconhece que para além de ser delinquente
primário, a ora recorrente confessou expontâneamente os factos imputados, revelador de uma acentuada diminuição da culpa do agente.
14ª O art.° 45.° n°. 2 do Código Penal determina ainda que o Tribunal fixe uma taxa diária de multa em função da situação económica e financeira do condenado.
16ª A arguida aufere mensalmente MOP$24.000,00 e tem como encargos os pais e uma irmã, ou seja Mop$6.000 per capita.
17ª Resulta assim também uma desproporcionalidade na determinação pelo Tribunal a quo da taxa diária de multa de Mop $200,00.
18ª A decisão recorrida violou, nomeadamente os art.° 40.°,45.° n°. 2 e 65.° n°.2 do Código Penal.
19ª Violou, ainda o princípio da culpa e da proporcionalidade das penas”; (cfr., fls. 25 a 34).

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Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela integral confirmação da decisão recorrida; (cfr., fls. 36 a 37-v).

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Neste T.S.I., juntou a Ilustre Procuradora Adjunta o seguinte douto Parecer:

“A arguida A veio interpor recurso da douta sentença que a condenou na pena da multa de 24,000 patacos, à taxa diária de MOP200,00, a que correspondem 4 meses de prisão subsidiária, e na pena acessória da inibição de condução por um período de 1 ano, alegando a violação das normas contidos nos art.°s 40, 45 n.° 2 e 65 n.° 2 do C.P.M., e defendendo o redução da taxa diária da multa para MOP100,00.
Subscrevemos os judiciosas considerações explanadas pela Magistrado do Ministério Público na sua resposta à motivação do recurso.
Analisados os autos, entendemos que não se pode reconhecer razão à recorrente, pois não se vislumbra que a douta sentença ora recorrida tenho violado a regra e a norma legal acima mencionada.
O art.° 40 n.° 1 do CPM prevê que o aplicação de penas "visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade".
Não podemos deixar de considerar, nos casos da aplicação da pena de multa, as finalidades e as limitações estipuladas nos art.°s 40 e 65 do C.P .M.. Sendo a culpa do agente e as exigências de prevenção criminal como os princípios e critérios da determinação da medida da pena.
In casu, a recorrente tem, na qualidade de guarda da P.S.P. e como deveres gerais, o dever de aprumo que consiste em assumir atitudes e comportamentos que exprimam, reflictam e reforcem a dignidade da função e o prestígio das Forças de Segurança de Macau, incluindo o dever de evitar actos ou comportamentos que possam prejudicar o vigor e a aptidão física ou intelectual, nomeadamente o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, e o dever de não praticar qualquer acção ou omissão que possa constituir ilícito criminal ou contravencional (cfr. art.°s n.°s 5 e 12 n.°s 1 e 2, al. g) e o) do D.L. n.° 66/94/M).
Repare-se que, pelo dever de disponibilidade legalmente imposto no art.° 15 do mesmo diploma, o recorrente tem a obrigação de, no caso de necessidade, permanecer no seu posto ou local de serviço, mesmo fora do período normal de trabalho, e de apresentar-se no local a que for chamado e tomar qualquer ocorrência, ainda que no gozo de férias ou de folga, o que significa que o recorrente deve estar sempre disponível para o serviço, mesmo que se encontre na situação de descanso.
No entanto, a recorrente violou os deveres que lhe são impostos, o que torna ainda mais censurável a sua conduta.
Por outro lado, considerando que a recorrente à funcionária pública, não vemos qualquer violação ao art.° 45 n.° 2 do CPM, tendo em conta a sua situação económica e financeira e os seus encargos pessoais.
Nota-se que, tal como resulta da douta sentença ora recorrida, o Tribunal a quo teve cuidado em analisar e ponderar criteriosamente a situação em apreciação, tendo tomado decisão, muito correcta no nosso entender, da aplicação da pena”; (cfr., fls. 73 a 74).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão dados como provados os factos seguintes:
“Em 19 de Setembro de 2012, pelas 06h20, a arguida A teve um acidente de viação quando conduziu, em estado de embriaguez, um veículo ligeiro de matrícula n.º MN-XX-XX perto da Avenida Dr. Sun Yat-Sem de Macau. A arguida foi submetida a tratamento no Hospital Kiang Wu, onde também se realizou o exame de pesquisa de álcool no ar expirado, cujo resultado mostrou que a taxa de álcool no sangue da arguida alcançou 1,32 gramas por litro.
A arguida agiu de forma consciente, livre e voluntária ao praticar o acto supra referida, conduzindo sob efeito de álcool com a taxa de álcool no sangue superior a 1,2 gramas por litro.
A arguida bem sabia que a sua conduta era legalmente proibida e punida.
Também se provou as condições pessoais da arguida:
A arguida A tem como habilitação literária o 5º ano do ensino secundário; trabalha como agente policial da PSP (agente n.º 197110); recebe mensalmente cerca de MOP$24.000,00, tem a seu cargo o pai, a madrasta e uma irmã mais nova”; (cfr., fls. 16 a 16-v).

Do direito

3. Vem a arguida recorrer da sentença que a condenou como autora da prática de 1 crime de “condução em estado do embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007 (“Lei do Trânsito Rodoviário”), na pena de 4 meses de prisão que se substituiu pela multa de valor total de MOP$24.000,00, e na inibição de condução pelo período de 1 ano.

Pede, em síntese que se proceda às “reduções da pena de substituição de multa para não superior a 3 meses e de uma taxa diária não superior a Mop$100,00”.

Todavia, não cremos que tem a arguida razão.

Vejamos.

Como se viu, a pena de prisão de 4 meses aplicada à arguida ora recorrente foi substituída por uma pena de multa também de 4 meses à taxa diária de MOP$200,00, perfazendo a multa global de MOP$24.000,00.

E, antes de mais, cabe dizer que sendo o crime em questão punido com pena de prisão até 1 ano, não nos parece que se possa considerar excessiva a pena de 4 meses de prisão inicialmente fixada, que (apenas) corresponde a 1/3 do limite máximo da respectiva moldura legal.

Não se pode esquecer que a arguida é agente da P.S.P., e tal circunstância, (há que reconhecer), implica, necessariamente, um mais acentuado desvalor da sua conduta, que não pode deixar de se reflectir na “reacção penal”.

Continuemos.

Preceitua o art. 44° do C.P.M.:

“1. A pena de prisão aplicada em medida não superior a 6 meses é substituída por igual número de dias de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes, sendo correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo seguinte.

2. Se a multa não for paga, o condenado cumpre a pena de prisão aplicada, sendo correspondentemente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 47.”.

Nesta conformidade, e estatuindo-se no n.° 1 do transcrito comando que a pena de prisão é substituída por “igual número de dias de multa”, sem esforço se conclui que manifestamente inviável é a pretendida redução dos dias de multa fixados.

Por sua vez, nos termos do art. 45° do mesmo C.P.M.:

“1. A pena de multa é fixada em dias, de acordo com os critérios estabelecidos nos n.os 1 e 2 do artigo 65.º, tendo, em regra, o limite mínimo de 10 dias e o máximo de 360.

2. Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre 50 e 10 000 patacas, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.

3. Sempre que a situação económica e financeira do condenado o justificar, o tribunal pode autorizar o pagamento da multa dentro de um prazo que não exceda 1 ano, ou permitir o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir além dos 2 anos subsequentes à data do trânsito em julgado da condenação; dentro dos limites referidos e quando motivos supervenientes o justificarem, os prazos de pagamento inicialmente estabelecidos podem ser alterados.

4. A falta de pagamento de uma das prestações importa o vencimento das restantes”.

Ora, também aqui, atento o estatuído no n.° 2 do transcrito comando legal, e à situação económica e financeira da arguida, não nos parece de censurar a sentença recorrida.

De facto, provado está que a arguida “aufere mensalmente MOP$24.000,00”, e não obstante os encargos que certamente tem, (e que não são os alegados em sede do presente recurso porque não provados), de olvidar não é que o n.° 3 do transcrito art. 45° faculta o pagamento de multa no prazo de 1 ano ou em prestações, o que, obviamente, permite ir ao encontro de eventual dificuldade por parte da mesma arguida.
Dest’arte, e apresentando-se o presente recurso manifestamente improcedente, imperativa é a sua rejeição; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Macau, aos 21 de Março de 2013


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José Maria Dias Azedo
(Relator)

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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)

Proc. 886/2012 Pág. 16

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