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Processo n.º 403/2010
(Recurso Contencioso )

Relator : João Gil de Oliveira
Data : 31/Janeiro/2013


ASSUNTOS:
    
    - Competência do tribunal
    - Legitimidade activa
    - Acto recorrível
    - Rescisão de um contrato de sub-concessão

SUMÁRIO:
    
    1. Não sendo o contrato de concessão ou subconcessão que está em causa, mas sim um pretenso acto de um membro do Governo, pretensamente definitivo e executório, dotado de poderes de autoridade pública que teria sido determinante de uma rescisão levada a cabo por uma das partes contratantes o recurso contencioso é o meio próprio e o Tribunal de Segunda Instância não deixa de ser o competente na sua secção com competência administrativa para conhecer do caso.
    
    2. Se a recorrente, com ou sem razão, entende que a perda da sua sub-concessão e do seu AOC é um efeito directo do acto administrativo recorrido que, por conseguinte, a lesou directamente, não deixa de ter legitimidade activa no recurso interposto.
    
    3. Cada acto administrativo deve exprimir o exercício de uma função, a função administrativa, na qual a entidade pública está investida. Donde a tomada de posição da entidade recorrida, com o alcance pretendido, determinante da rescisão de uma sub-concessão, não poder funcionalmente ser enquadrada como poder de manifestação de um poder de definição jurídica unilateral.
    4. A recorribilidade do acto prende-se com a sua definitividade em termos de estabelecimento da definição de uma situação jurídica, isto é, quando constitua uma resolução final da Administração definindo a sua situação jurídica ou a de pessoas que com ela estão, ou pretendem estar, em relação jurídica.
    5. Pelo que o acto administrativo definitivo há-de ser um acto pela qual a Administração define a sua esfera jurídica ou a esfera de outros sujeitos de direito que com ela estão ou pretendiam estar em relação jurídica, em termos de uma resolução final, no sentido de que com ela se põe termo a um processo gracioso ou a um seu incidente autónomo e de que é a resolução dum órgão de cujos actos não cabe recurso hierárquico necessário.
    6. Se não se apura se o Senhor Secretário, entidade recorrida, fosse porque instruído superiormente, fosse por sua auto-recriação, fosse porque instado a tal, deu uma ordem, directiva, sinal, instruções no sentido da produção de efeitos em termos de cessação da relação contratual vigente entre a concessionária e a sub-concessionária, pelo menos em termos vinculativos e determinante numa relação de causa-efeito da rescisão do contrato de sub-concessão, nem tendo poderes para ditar tal rescisão, teremos de concluir que não estamos perante um acto recorrível, o que determinará a absolvição de instância do recorrido e contra-interessadas.
                
                Relator,
  






















Processo n.º 403/2010
(Recurso Contencioso)

Data: 31 de Janeiro de 2013

Recorrente: A – sociedade de Aviação, Limitada

Entidade Recorrida: Secretário para os Transportes e Obras Públicas
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    1. A - SOCIEDADE DE AVIAÇÃO, LIMITADA, uma sociedade por quotas constituída segundo as leis da Região Administrativa Especial de Macau, sediada em Macau, na Avenida XX, n.ºs XX, XX Tower, XX.° andar, matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º 20047, vem interpor recurso contencioso de acto administrativo praticado pelo Exmo Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas do Governo da RAEM, em 28 de Março de 2010, recurso esse que, entretanto, foi prosseguido pela respectiva massa falida, visto o decretamento da sua falência.
    
    2. A recorrente configura o ACTO OBJECTO DO RECURSO como segue:
    “O acto administrativo recorrido é, como se disse, da autoria do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes e foi praticado em 28 de Março de 2010.
    Segundo o Recorrido, o acto terá sido praticado oralmente.
    A ora Recorrente teve notícia dele por uma comunicação com a ref. 0658/DATIR/10, também de 28 de Março de 2010, que a Autoridade de Aviação Civil de Macau ("AACM") dirigiu à Companhia de Transportes Aéreos B, SARL ("B"), e que esta última anexou à carta com a ref. AMC10011 c, que endereçou, na mesma data, à Recorrente (doc. 1, junto, que, como os demais adiante indicados, aqui se dá por integralmente reproduzido).
    Os elementos essenciais do acto recorrido decorrem claramente da aludida comunicação da AACM.
    O teor do acto é, pois, o seguinte:
    - Fundamentação: "a A tem vindo a violar constantemente as suas obrigações de serviço público estatuídas na cláusula 4.8 do Contrato de Subconcessão, através do cancelamento de voos e da recusa em prestar apoio e informações aos passageiros portadores de bilhetes válidos" (em inglês: «A has been constantly violating its public service obligations stated on Clause 4.8 of the Subconcession Contract, by canceling flights and refusing to provide support and information for passengers carrying valid tickets»); estes factos são também mencionados na expressão "recusa da A de prestar o serviço público e interrupção injustificada dos serviços" (em inglês: «refusal by A to provide the public service and the unjustified interruption of services»); "danos irreparáveis aos passageiros, ao aeroporto e à imagem da RAEM" (em inglês: «irreparable damages to passengers, airport and the image of Macau SAR»); as consequências são tidas como sérias e repetidas ("considerando a seriedade e repetição das violações", em inglês, no original: «considering the seriousness and repetition ofthe violations»);
    - Conteúdo ou sentido da decisão: "a sociedade B deve terminar imediatamente o Contrato de Sub-concessão com a A de acordo com a Cláusula 14.4 e 4.1 do Contrato de Sub-concessão" (em inglês, na comunicação da AACM: «company B must terminate immediately the Sub-concession contract with A according to Clause 14.4 and 4.1 ofthe Sub-concession Contract»).”
    
    3. Concluiu o seu recurso nos seguintes termos:
    A. O acto do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes ordenou a rescisão e teve o efeito de rescindir o Contrato de Sub-concessão da Recorrente.
    B. A B cumpriu a ordem do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, recebida por intermédio da Autoridade de Aviação Civil de Macau, transmitindo à Recorrente que o Contrato de Sub-concessão era rescindido.
    C. A deliberação que o Conselho de Administração da B votou a esse respeito é nula porque a respectiva matéria não estava agendada para a reunião do órgão em que foi tomada e, ainda que assim se não entenda, porque foi simulada.
    D. Os fundamentos da rescisão decidida pelo Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes são a violação constante pela Recorrente das obrigações de serviço público estatuídas na cláusula 4.8 do Contrato de Sub-concessão, através do cancelamento de voos, também aludido como interrupção injustificada dos serviços, e da recusa em prestar apoio e informações aos passageiros portadores de bilhetes válidos, bem como os danos irreparáveis causados aos passageiros, ao aeroporto e à imagem da RAEM pela actuação da Recorrente.
    E. Além de ter tido o efeito de rescindir o Contrato de Sub-concessão, o acto em questão provocou a revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo ("AOC") da Recorrente, por acto da Autoridade de Aviação Civil de Macau, porquanto essa revogação teve como fundamento exclusivo a perda da sub-concessão pela Recorrente.
    F. O acto administrativo do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes é nulo porque estranho às atribuições do seu autor, ou anulável por incompetência, dado exceder essas atribuições ou violar os seus limites, é nulo ainda por violação da formalidade essencial de audiência prévia do interessado, é anulável por erro nos pressupostos de facto, e é ainda anulável por violação de lei, dado que afronta os princípios da igualdade, da imparcialidade e da proporcionalidade.
    Nestes termos, pede:
    deve ser declarada a nulidade ou anulado o acto recorrido.
    A recorrente identifica como contra-interessados a quem a declaração de nulidade ou anulação do acto recorrido pode directamente prejudicar a Autoridade de Aviação Civil de Macau e a B.
    
    4. O Exmo Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas da Região Administrativa Especial de Macau, veio apresentar a sua contestação, o que fez, em síntese final:
    i. Não existiu qualquer acto administrativo praticado pelo ora Recorrido neste âmbito, pelo que o acto objecto do recurso contencioso é inexistente;
    ii. Estamos perante a inexistência de um acto administrativo com as características da definitividade e da executoriedade, que são os pressupostos básicos para qualquer recurso contencioso;
    iii. Acompanha-se o entendimento sobre esta matéria desse Douto Tribunal proferido nos Autos de Suspensão de Eficácia 311/2010 e, bem assim, o do Digno Magistrado do Ministério Público, no que toca à qualificação do alegado acto praticado pela Entidade Recorrida;
    iv. Acresce que, no presente caso, esta decisão de rescisão do Contrato de Sub-concessão, não estava na esfera da competência do Secretário para as Obras Públicas e Transportes do Governo da RAEM, uma vez que, por força das relações jurídicas estruturadas de acordo com os Contratos de Concessão e de Subconcessão, tal decisão cabia única e exclusivamente à B;
    v. Deverá a presente instância ser declarada extinta, com todos os efeitos legais.
    vi. Não tendo praticado C' referido acto, a Entidade Recorrida é parte ilegítima na presente acção.
    vii. O Tribunal é incompetente pelos motivos supra expostos, visto a competência caber ao Tribunal Arbitral, pelo que, também por este motivo, a Entidade Recorrida deve ser absolvida da instância sem mais delongas.
    viii. Finalmente, caso se venha a entender que a comunicação oral havida entre a Entidade Recorrida e a AACM, em 28 de Março de 2010, constituiu um acto administrativo definitivo e executório, o que por mera cautela de patrocínio se concebe sem contudo conceder, sempre se dirá que este acto teria sido válido, apesar de revestir a referida forma oral, pelas natureza e circunstâncias excepcionais em que foi tomado.
    
    Nestes termos, pede, deverão os argumentos apresentados nesta contestação merecer acolhimento e em consequência:
    (a) Declarar-se extinta a presente instância com todos os efeitos legais;
    (b) Declarar-se a entidade recorrida parte ilegítima com todos os efeitos legais;
    (c) Proceder a excepção dilatória de incompetência do Tribunal com todos os efeitos legais;
    
    Sem conceder, admitindo por mera cautela de patrocínio:
    
    (d) Caso venha a entender-se que a comunicação oral havida entre a entidade recorrida e a AACM, em 28 de Março de 2010, constituiu um acto administrativo definitivo e executório, deverá ser julgado improcedente o presente recurso contencioso pelos motivos supra expostos.
    
    Mais informa que não existe qualquer processo administrativo, pelo que é impossível cumprir o estipulado no artigo 55° do CPAC.

    5. A Companhia de Transportes Aéreos B, S.A.R.L., em chinês "B航空股份有限公司" , e, em inglês "B Company Limited" , com sede em Macau, na Alameda XX, n° XX, Edifício XX, XX° - XX° andares, registada sob o n° 9578 (SO), vem, na qualidade de Contra-Interessada, contestar.
     Depois de impugnar grande parte da matéria de facto invocada pela recorrente, alega, em rotunda síntese:
    A recorrente, como é facto público e notório, não tinha condições financeiras para prosseguir a sua actividade comercial, sendo devedora de centenas de milhões de patacas a um universo de milhares de credores pelo mundo fora, incluindo à própria entidade sub-concedente (a B).
    A C através da recusa de fornecer mais combustível (o que constitui uma recusa legítima face à existência de uma excepção de não cumprimento) - vejam os artigos 154º e 155º da petição de recurso;
    A B através da resolução do Contrato de Subconcessão, que nunca foi respeitado pela rcorrente (quer no que diz respeito ao pagamento, quer no que diz respeito às obrigações de fornecimento de informações e documentos), apesar das inúmeras interpelações.
    Salvo o devido respeito por opinião contrária, o acto praticado pelo senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes não deve, nem pode, ser entendido como um acto, como pretende a recorrente com os presentes autos.
    O acto que a recorrente pretende que seja anulado ou declarado nulo consistiu apenas na interpretação de diversas cláusulas contratuais do Contrato de Subconcessão e na extrapolação de uma opinião por parte do seu autor.
    Se essa interpretação tivesse tido por base cláusulas do Contrato de Concessão com a B, estaríamos claramente perante um acto opinativo previsto no artigo 173° do Código do Procedimento Administrativo, que dispõe que "Os actos administrativos que interpretem cláusulas contratuais ( ... ) não são definitivos e executórios, pelo que na falta de acordo do co-contratante, a Administração só pode obter os efeitos pretendidos através de acção a propor no tribunal competente."
    No caso presente, a Administração nem sequer interpretou o contrato administrativo propriamente dito, já que as cláusulas contratuais sobre as quais opinou dizem respeito ao Contrato de Subconcessão outorgado entre a B e a Recorrente, a que é alheia a Administração.
    O acto administrativo em questão limitou-se a mandar informar ("I hereby inform you") a B que esta deveria resolver o contrato de subconcessão nos termos das cláusulas contratuais que o Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes considerou pertinentes.
    O Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes apenas determinou que a Autoridade de Aviação Civil informasse a B que, de acordo com a interpretação que fez das cláusulas do Contrato de Subconcessão, estariam reunidos os pressupostos para resolver o Contrato de Subconcessão e que, para proteger e prosseguir o interesse público, a B deveria resolver o contrato.
    A decisão da B veio a ser concordante com o acto administrativo opinativo do senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, mas o acto opinativo não teve, nem poderia ter tido, qualquer efeito definitivo e executório.
    Aliás, a própria Autoridade de Aviação Civil só veio a revogar o Certificado de Operador de Transporte Aéreo depois de a B lhe ter informado que resolvera o Contrato de Subconcessão com a Recorrente.
    Até esse momento, a Autoridade de Aviação Civil e a Administração abstiveram-se de retirar quaisquer efeitos jurídicos ou administrativos do acto opinativo do senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes porque estavam bem cientes da sua inocuidade decorrente da ausência de definitividade e executoriedade.
    Mesmo que se entenda que o acto impugnado pela Recorrente não é um acto opinativo, o que por mero dever de patrocínio se admite, sem se conceder, ainda assim não se poderá entender o referido acto como um acto administrativo anulável.
    De facto, o acto do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes foi praticado no âmbito dos poderes de fiscalização que à Administração são conferidos pelo artigo 167°, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo.
    Todavia, esse acto, por se inserir no âmbito da fiscalização do contrato administrativo de concessão outorgado entre a Região Administrativa Especial de Macau e a B, não assume a natureza de acto administrativo para efeitos da pretendida anulação.
    O acto do senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes compreende-se perfeitamente no âmbito do poder contratual de fiscalização do cumprimento do Contrato de Concessão, em que se compreende, como vimos, a possibilidade de formular exigências à B, enquanto entidade concessionária.
    Tal acto é insusceptível de, por si só, produzir quaisquer efeitos porque, caso não obtivesse a concordância da B no sentido da resolução do Contrato de Subconcessão, não teria qualquer possibilidade de coercivamente executar a resolução do Contrato de Subconcessão que a Administração houvera exigido (até porque a Administração não é parte nesse contrato).
    Tendo em atenção o facto de a Administração não ser parte no Contrato de Subconcessão celebrado entre a B e a Recorrente, a decisão do senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes não pode ser vista como produzindo efeitos jurídicos na esfera jurídica da B ou da Recorrente porque, para que se verificassem os efeitos pretendidos pela Administração, seria necessária uma decisão conformadora da B.
    Aliás, a Administração e a Autoridade de Aviação Civil de Macau não tiveram qualquer tipo de actuação visando directamente a Recorrente enquanto a B não lhes comunicou que já resolvera o contrato de subconcessão porque sabiam que o acto do senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes não produziria, por si só, quaisquer efeitos jurídicos directos nas esferas jurídicas da B nem da Recorrente.
    A recorrente não foi, nem poderia ser, directamente visada com o alegado acto administrativo, já que ele é proferido no domínio do Contrato de Concessão celebrado entre a Região Administrativa Especial de Macau e a B.
    Foi no âmbito dessa relação jurídico-administrativa que o referido acto foi praticado e é apenas nesse âmbito que eventuais consequências jurídicas do seu cumprimento ou incumprimento deverão ser retiradas.
    Pelo que apenas a B deveria ter o direito de impugnar esse acto já que esse acto apenas é susceptível de produzir efeitos na esfera jurídica da B porque a resolução do Contrato de Subconcessão não era, nem poderia ser, automática e dependeria sempre de uma decisão da B - que, caso a não respeitasse, ficaria sujeita às consequências do incumprimento do Contrato de Concessão.
    Não se conformando com a decisão de resolução do Contrato de Subconcessão, deverá a Recorrente demandar apenas a B, noutra sede, como autora (única e exclusiva) da decisão de resolver o Contrato de Subconcessão.
    A causa da decisão da B de resolver o Contrato de Subconcessão não foi, como pretende fazer demonstrar a Recorrente, o acto do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
     A causa que está na base da resolução (com justa causa) do Contrato de Subconcessão por parte da B prende-se com a violação, por parte da Recorrente, das obrigações previstas no Contrato de Subconcessão e das obrigações de interesse público decorrentes do serviço público que a partir de 26 de Março deixou de (poder) prestar.
    É certo que a informação da Autoridade de Aviação Civil de Macau veiculando a opinião da Administração vertida no acto opinativo do Senhor Secretário no sentido de ser de fazer cessar os efeitos do Contrato de Subconcessão foi entendida pela B como uma aprovação e um apoio da Administração a essa decisão, caso a B a viesse a adoptar, mas não teve, por si só, a faculdade de determinar a B a resolver o Contrato de Subconcessão sem o seu próprio raciocínio crítico e a sua ponderação de todos os factos.
    A B já há muito que pretendia fazer cessar o Contrato de Subconcessão, facto que a Recorrente não desconhece, pelo constante incumprimento de todas as obrigações da Recorrente para com a B, mas absteve-se de o fazer por presumir que existiria algum interesse público na manutenção da subconcessão já que era público o apoio financeiro da Administração à Recorrente.
    No dia em que a Administração concluiu que o interesse público estava irremediavelmente comprometido, prejudicado e abalado pela conduta da Recorrente e que a Recorrente já não tinha condições para cumprir as obrigações mínimas de subconcessionária do serviço público que lhe tinha sido confiado, a B viu finalmente reunidas as condições para resolver o Contrato de Subconcessão, pelos motivos referidos pelo senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, com os quais a B concordou e aderiu, e pelas constantes violações do Contrato de Subconcessão.
    A causa para a resolução do Contrato de Subconcessão está relacionada com o facto de a B ter percebido que existiam outros credores da Recorrente, para além da B, com créditos mal parados e que o constante incumprimento pela Recorrente da obrigação de entrega de documentos contabilísticos e financeiros tinha estado na base de abusos desmedidos e de um escalar de uma situação financeira que colocava em causa não apenas a B, mas também terceiros e a própria Administração, enquanto entidade concedente - que veio a ser confirmada pela declaração de falência da Recorrente e da extensa lista de centenas de credores.
    Mesmo que o acto do senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas venha a ser anulado, tal decisão não produzirá quaisquer efeitos sobre a decisão da B de resolver o Contrato de Subconcessão.
     Nos presentes autos não se discute, ou não se deveria discutir (por não ser o processo nem a sede próprios), a legalidade do processo de resolução do Contrato de Subconcessão.
    A Recorrente já interpôs contra a B um recurso contencioso de anulação do acto de resolução do Contrato de Subconcessão, estando os seus termos a correr no Tribunal Administrativo da RAEM.
    A Recorrente esqueceu-se de referir as causas de resolução do Contrato de Subconcessão, as dívidas avultadas que acumulou (centenas de milhões de patacas), a suspensão de fornecimento de combustível por parte do respectivo fornecedor, o incumprimento constante do Contrato de Subconcessão, o cancelamento repetido de voos, os prejuízos e incómodos causados a milhares de passageiros, nomeadamente residentes de Macau literalmente abandonados em aeroportos estrangeiros, os danos causados à imagem da Região Administrativa Especial de Macau enquanto destino turístico e cuja economia depende, quase exclusivamente, do serviço (e da idoneidade) dos seus operadores turísticos (onde se incluía a Recorrente), etc.
    A resolução do Contrato de Subconcessão foi efectuada no dia 28 de Março de 2010 pela B quando o presidente do Conselho de Administração comunicou, depois de contactos informais com vários administradores da B, que a B resolveu o Contrato de Concessão, concordando com os fundamentos referidos na carta enviada pela Autoridade de Aviação Civil de Macau e contando com o apoio da Administração da Região Administrativa Especial de Macau.
    A própria atitude da Recorrente e a resposta que enviou à B no dia 30 de Março são também absolutamente concludentes no sentido de que a Recorrente, como declaratária daquela declaração de resolução, percebeu o seu conteúdo, o seu alcance, a sua finalidade e o seu objecto, apesar de não ter concordado com ela.
    No entanto, uma vez que o Conselho de Administração da B tinha uma reunião anteriormente agendada para o dia 30 de Março, antes mesmo de todos os eventos que aconteceram no dia 26 de Março e nos dias seguintes, o senhor presidente do Conselho de Administração decidiu, nessa reunião, relatar todos os factos e decisões ao Conselho de Administração propondo o sancionamento e ratificação formais de todas as decisões que formalmente assumira, nomeadamente a de resolver o Contrato de Subconcessão, após realização de contactos informais com os administradores
    As decisões do presidente do Conselho de Administração foram ratificadas por unanimidade pelo que foi confirmada pelo Conselho de Administração a decisão de resolução do Contrato de Subconcessão no dia 28 de Março de 2010.
     A questão suscitada pela Recorrente parece ser irrelevante para a boa decisão da presente causa, na medida em que a B está vinculada pela decisão do presidente do conselho de administração de, nessa qualidade, resolver o contrato de concessão, nos termos das normas imperativas constantes do artigo 236º do Código Comercial.
    Discutir se uma deliberação dos administradores da B que pretendeu apenas apoiar a decisão do presidente do conselho de administração é válida ou inválida torna-se irrelevante porque, independentemente desse juízo, a verdade é que a B se encontra irremediavelmente vinculada pela decisão do presidente do conselho de administração.
    O vício que a Recorrente aponta à deliberação do conselho de administração de 30 de Março de 2010 resulta do facto de ter recaído sobre matéria que não constava da ordem de trabalhos.
    A verdade é que todos os administradores presentes ou representados na reunião do conselho de administração aceitaram, expressamente, deliberar sobre a matéria da resolução do contrato de subconcessão com a Recorrente e a administradora que esteve ausente aceitou.
     Uma vez que não existe qualquer acto simulado, percebendo-se tal alegação apenas no quadro de litigância de má-fé, deverá tal alegação ser julgada improcedente, como é de elementar justiça.
    Mesmo que se entenda, o que por mero dever de patrocínio se admite, sem se conceder, que existiram irregularidades no processo de resolução do Contrato de Subconcessão, constitui manifesto abuso de direito a sua alegação, se tivermos em conta a gravidade das violações do Contrato de Subconcessão, as sérias consequências que daí advieram e que se encontram sumariadas no acto controvertido, e se tivermos em atenção a urgência e a pressão com que a Administração e a B, num fim-de-semana, tiveram que lidar com o incumprimento das obrigações da Recorrente.
    Abuso de direito que não pode, naturalmente, deixar de se invocar, caso se venha a decidir, como pretende a Recorrente, que a resolução do Contrato de Subconcessão teve irregularidades.
    Alega a Recorrente que o Recorrido errou nos pressupostos de facto.
     Dizendo respeito certas alegações sobre erro nos pressupostos de facto a ocorrências nos dias 26, 27 e 28 de Março, bem como nos dias seguintes em que actuou o "Gabinete de Gestão de Crises do Turismo" do Governo da RAEM, que foram amplamente divulgados e constituem factos públicos e notários que, como tal não deveriam carecer de alegação e prova.
    O facto é que, nos dias 26, 27 e 28 de Março de 2010, foram vários os voos cancelados pela Recorrente e milhares os passageiros afectados pelo cancelamento dos voos: passageiros em Macau que pretendiam sair para outros destinos e passageiros noutros destinos que pretendiam regressar a Macau, muitos deles residentes de Macau.
    Sendo a RAEM uma região dependente do turismo e das suas instituições turísticas, em todas as suas vertentes, facilmente se percebe que o processo de cancelamento repetido de voos, sem soluções alternativas oferecidas a milhares de passageiros espalhados em diversos aeroportos internacionais, a par de notícias de dívidas milionárias da Recorrente, são suficientemente alarmantes para abalar a sensível indústria turística da Região.
    De forma que a Recorrente pretende agora branquear todas as suas acções e omissões, todos os seus incumprimentos contratuais para com clientes, fornecedores, concedente, Governo, financiadores, proprietários de aviões e outros credores, menosprezando, designadamente, o impacto negativo que causou na indústria e imagem da RAEM, culpando os fornecedores (nomeadamente a C) por não quererem agravar mais os défices financeiros que lhes causou a Recorrente por força dos seus incumprimentos constantes e culpando o Governo da RAEM por ter socorrido milhares de passageiros.
    Tal atitude demonstra não apenas a má-fé da Recorrente no relacionamento substantivo com os seus contratantes, com o Governo e com a B, enquanto entidade concedente dos direitos de transporte aéreo de carga e de passageiros, como um claro desrespeito da objectividade adjectiva e dos Tribunais, com litigância de má-fé, querendo demonstrar que cumpriu com os seus deveres e que os fornecedores é que são culpados por não quererem continuar a fornecer a Recorrente (e que o Governo é que falhou por não ter conseguido conseguir convencer a C a vender mais combustível sem qualquer pagamento da Recorrente), que os passageiros contaram sempre com trabalhadores suficientes da Recorrente ou ainda que a B é que está equivocada, errando em todos os seus fundamentos.
    A própria Recorrente confessa o cancelamento de voos nos artigos 84.°, 87.°, 88.°, 154.° e 155.° da sua petição de recurso.
    A própria Recorrente confessa o atraso e adiamento de voos nos artigos 74°, 75°, 76° e 78° da sua petição de recurso.
    138. A própria Recorrente confessa o incumprimento da obrigação de pagamento de combustível à sociedade fornecedora de combustível, que motivou a suspensão do fornecimento.
    A própria Recorrente confessa que não colocou no aeroporto funcionários que permitissem fazer face aos cancelamentos e que, nomeadamente, pudessem prestar assistência às centenas de passageiros afectados pelos voos adiados e cancelados que, previsivelmente, iriam necessitar de apoio, conforme resulta claro do afirmado no artigo 111.° da petição de recurso (apenas 5 funcionários divididos entre o aeroporto e o escritório da Recorrente e divididos entre o Flight Dispatch e contactos com agências de viagem).
    Face às próprias confissões da Recorrente e aos factos públicos e notórios que ocorreram nos dias 26 e seguintes de Março e em Abril de 2010, é absolutamente injustificada a alegação de que a decisão do Recorrido de emitir um acto opinativo e a decisão da B de resolução do contrato de subconcessão padeceu de vícios na fundamentação ou erros sobre os pressupostos de facto.
    No que à B diz respeito, recorde-se que, ao invés do que a Recorrente pretende fazer crer, a resolução do contrato de subconcessão não se ficou a dever, apenas, aos acontecimentos ocorridos nos dias 26 a 28 de Março de 2010, os quais constituíram apenas o culminar de um processo, pelo que não foi determinante a decisão opinativa da entidade B.
    Resulta claro dos termos da acta da deliberação do conselho de administração da B de 30 de Março de 2010 que, na base da resolução, estava, em primeira linha, o incumprimento sistemático e constante das obrigações contratuais da Recorrente, ao abrigo do contrato de subconcessão, designadamente das obrigações de informação.
    Também a dívida da Recorrente à B, há muito vencida e mal parada, de USD 2,9 Milhões, a que se somam muitas outras dívidas da Recorrente de que a B veio posteriormente a tomar conhecimento no processo de falência da Recorrente, demonstrava a sua total incapacidade financeira para continuar a operar normalmente.
    Motivo pelo qual deverá também ser julgada improcedente a arguição de erro sobre os pressupostos de facto.
    Termos em que, conclui, deve o presente recurso contencioso de anulação ser indeferido, com todas as consequências legais.
    
6. A Autoridade de Aviação Civil de Macau, contra-interessada nos autos, contesta, dizendo, no essencial:
    De acordo com o disposto no artigo 39.º do CPAC, "Têm legitimidade para intervir no processo como contra-interessados, as pessoas a quem o provimento do recurso possa directamente prejudicar".
    Na presente situação, e uma vez que não existiu qualquer acto administrativo praticado pela Autoridade de A viação Civil de Macau no âmbito e com relevo para o acto administrativo ora impugnado, o provimento do recurso em nada interfere com esta entidade.
    Razão pela qual a Contra-interessada se encontra numa situação de ilegitimidade passiva,
    Importando, consequentemente, a sua absolvição da instância.
    Caso assim não se entenda, o que apenas se admite por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que:
    Através do presente Recurso Contencioso, pretende a Recorrente ver declarado nulo/anulado um alegado acto administrativo pretensamente praticado pelo Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes do Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), em 28 de Março de 2010.
     Este mesmo acto, segundo a Recorrente, terá levado a que a Autoridade de Aviação Civil de Macau tenha revogado o Certificado de Operador de Transporte Aéreo anteriormente atribuído à Recorrente.
    Ou seja, na tese da Recorrente, o Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes da RAEM comunicou à Autoridade de Aviação Civil de Macau para que esta, por sua vez, comunicasse à Companhia de Transportes Aéreos B S.A.R.L (B), e esta última comunicasse à A, que o Contrato de Sub-concessão entre as últimas deveria ser rescindido.
    Para que, em consequência, a Autoridade de Aviação Civil de Macau pudesse revogar o Certificado de Operador de Transporte Aéreo (AOC) n.º AOC/04/09, anteriormente atribuído à A.
    Ora, o Certificado de Operador de Transporte Aéreo n.º AOC/04/09 foi atribuído à ora Recorrente com base no contrato de subconcessão celebrado em 31 de Março de 2006 entre a Recorrente e a B.
    Apenas as entidades concessionárias e sub-concessionárias poderão ser titulares dos referidos Certificados de Operador de Transporte Aéreo.
    Nos termos do próprio Certificado atribuído à Requerente em 30 de Novembro de 2009, faz-se referência ao contrato de Sub-concessão, enquanto conditio sine qua non de atribuição do referido certificado.
    A actuação da Contra-interessada coadunou-se perfeitamente com o estatuído nos preceitos legais, na medida em que, no dia 28 de Março de 2010, quando a Autoridade de Aviação Civil de Macau foi formalmente informada pela B de que o contrato de Sub-concessão que a unia à A havia sido extinto, tendo tomado a medida que legalmente lhe era exigida, a revogação imediata do Certificado de Operador de Transporte Aéreo.
    Assim, contrariamente ao alegado pela Requerente no artigo n.º 11. da petição inicial de Recurso Contencioso, a revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo não decorreu de uma "relação directa de causa-efeito" posterior ao alegado acto administrativo do Senhor Secretário para as Obras Públicas, mas sim da própria lei (RA 10/2004).
    Deverá, assim, concluir-se que a Autoridade de Aviação Civil de Macau, ao revogar o Certificado de Operador de Transporte Aéreo n.º AOC/04/09 em virtude da comunicação formal de rescisão do contrato de Sub-concessão entre a B e a ora Requerente, não existindo qualquer nulidade ou irregularidade nessa actuação administrativa, ao contrário do que pretende fazer crer a Recorrente.
    Nestes termos, conclui, deve considerar-se parte ilegítima a Autoridade de Aviação Civil de Macau e, em consequência, declarar-se extinta a presente instância, com todos os efeitos legais e ainda deve ser considerado válido, eficaz e legalmente conforme, o acto praticado pela Autoridade de Aviação Civil de Macau de revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo n.º AOC/04/09, aderindo também esta Autoridade a tudo o que seja alegado pelo Senhor Secretário Para os Transportes e Obras Públicas no presente Recurso, seguindo-se os ulteriores.

    7. A massa falida da sociedade A - SOCIEDADE DE AVIAÇÃO, LIMITADA, recorrente nos autos acima cotados, notificada do douto despacho que a convidou a pronunciar-se sobre a questões e excepções suscitadas pelo recorrido e contra-interessadas na suas contestações veio dizer o seguinte:
    
    RELATIVAMENTE À CONTESTAÇÃO DO SENHOR SECRETÁRIO PARA AS OBRAS PÚBLICAS E TRANSPORTES
    
    A. Ilegitimidade passiva do Recorrido (artigos 79º a 85º da contestação)
    1. A Entidade Recorrida pugna pela sua ilegitimidade passiva com o fundamento de que não foi praticado um acto administrativo.
    2. Ora, o modo como a Recorrente configura o litígio é determinante neste particular; trata-se de discutir se o Recorrido praticou ou não um acto administrativo lesivo dos interesses da Recorrente e se esse acto é nulo ou anulável.
    3. Sendo assim, o Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes não pode deixar de ser parte legítima nesta instância.
    
    B. Incompetência do Tribunal (artigos 86º a 93º)
    4. Esta excepção baseia-se no pressuposto incorrecto de que o acto recorrido tem que ser analisado no quadro do contrato de concessão que foi celebrado entre a R.A.E.M. e a B, cuja cláusula 32.1 dispõe que as questões sobre a sua interpretação, validade e execução devem ser submetidas a tribunal arbitral em Macau.
    5. Todavia, ressalta claramente da leitura do requerimento inicial que não é isso que está em causa, mas sim um acto administrativo que, por interposição meramente aparente ou instrumental da B, pôs fim à sub-concessão e cancelou o AOC da Recorrente.
    6. Nestes termos, improcede a excepção de incompetência do Tribunal.
    
    RELATIVAMENTE À CONTESTAÇÃO DA AUTORIDADE DE AVIAÇÃO CIVIL DE MACAU
    Ilegitimidade da Autoridade de Aviação Civil de Macau
    7. A excepção é arguida com o fundamento de que não foi praticado pela Autoridade de Aviação Civil de Macau um acto administrativo consequente do acto administrativo do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, objecto do presente recurso, porque este último não tem a natureza de acto administrativo.
    8. Este ponto de vista não se atém à perspectiva traçada pela Recorrente no requerimento inicial; reclama-se ar a nulidade ou anulação dum acto administrativo praticado pela Entidade Recorrida, acto de que a revogação do AOC da Recorrente, pela Autoridade de Aviação Civil de Macau, é mera consequência; por esse motivo, pede-se a intervenção da Autoridade de Aviação Civil de Macau como contra-interessada, visto que um provimento do recurso acarretará a caducidade ou revogação do próprio acto da Autoridade de Aviação Civil de Macau.
    9. Nesta conformidade, a Autoridade de Aviação Civil de Macau é parte interessada nos presentes autos e tem, por isso, legitimidade passiva.
    
    RELATIVAMENTE À CONTESTAÇÃO DA B
    
    A. Ilegitimidade da Recorrente por o acto administrativo ter sido praticado no âmbito do contrato de concessão (artigos 64º a 69º da contestação)
    10. A Contra-Interessada Companhia de Transportes Aéreos B, S.A.R.L. invoca a ilegitimidade activa da Recorrente com o fundamento de que a acto administrativo recorrido, na hipótese de ser contenciosamente recorrível, sempre deverá entender-se como praticado no âmbito do contrato de concessão que tem como partes a R.A.E.M. e a B e ao qual a Recorrente é estranha, pelo que só a B poderia tê-lo impugnado.
    11. Acontece que o requerimento inicial já contém matéria que contraria esta posição, designadamente a alegação de que o acto recorrido se projectou directamente na esfera da Recorrente, pois que determinou a rescisão do contrato de sub-concessão por intermédio da B, a qual se limitou a cumprir a ordem ínsita no referido acto, o que teve como consequência a revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo ("AOC", na designação internacional) da Recorrente, por acto administrativo da Autoridade da Aviação Civil de Macau.
    12. Pelas razões então aduzidas, em que se destaca a da ilegalidade do aviso rescisório dado pelo Presidente do Conselho de Administração da B em 28 de Março de 2010 e a nulidade da deliberação desse Conselho de 30 de Março, a Recorrente entende que a perda da sua sub-concessão e do seu AOC é um efeito directo do acto administrativo recorrido que, por conseguinte, a lesou directamente.
    13. Reivindica, por isso, legitimidade para agir, e pugna pela improcedência da invocada excepção.
    
    B. Inutilidade da lide (artigos 70º a 80º)
    14. A B argumenta também que a ofensa de direitos em que a Recorrente fundou o seu recurso, a ter acontecido, teria sido causada autonomamente por declaração negocial da B, produzida no domínio do contrato de sub-concessão e ditada por uma decisão comercial, inexistindo qualquer nexo de causalidade entre o acto do Recorrido e a dita decisão comercial, de sorte que, ainda que o acto recorrido fosse declarado nulo ou anulado, não seria repristinado o contrato de sub-concessão.
    15. Embora não explicitamente, a B invoca aqui a inutilidade da lide e consequentemente a ausência dum pressuposto da manutenção da instância.
    16. Ora, a Recorrente invocou no seu requerimento inicial a invalidade jurídica do anúncio singular de rescisão do contrato de sub-concessão emitido pelo Presidente do Conselho de Administração da B em 28 de Março de 2010 e, bem assim, a nulidade, por simulação, da deliberação de rescisão, supostamente adoptada pelo mesmo Conselho de Administração em 30 de Março, por não reconhecer nesses actos uma manifestação de vontade própria, mas tão só o propósito de cumprir o que o Recorrido ordenou à B. A nulidade é de conhecimento oficioso e pode ser suscitada em qualquer processo, por via de acção ou excepção. Se proceder a arguição da Recorrente e for concorrentemente declarado nulo ou anulado o acto recorrido, nem o contrato de subconcessão terá sido rescindido nem o AaC terá sido retirado à A.
    17. Obviamente que, mesmo nesse cenário, um hipotético relançamento da actividade da A estaria provavelmente fora de cogitação, dado que, entretanto, a A se apresentou em juízo a requerer a sua falência, a qual veio a ser decretada, e que os credores da massa poderiam não ter interesse em suspender a falência e continuar o negócio da empresa. Seja como for, com ou sem uma retoma de actividade, uma procedência da acção constituirá na esfera jurídica da Recorrente um direito a ser indemnizada por perdas e danos. Daí a evidente utilidade da lide, motivo por que improcede a questão ou excepção de inutilidade suscitada pela B.
    
    C. Abuso de direito (artigos 81.° a 129.°)
    18. Sob esta epígrafe, a B trata, não o acto administrativo recorrido, mas aquilo que designa por processo de resolução do contrato de sub-concessão, ou seja, os actos que a B praticou para executar a vontade do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, concluindo que, ainda que possa eventualmente assistir alguma razão à Recorrente quando alega a irregularidade desse processo, há abuso de direito em tal alegação porque a A cometeu violações graves do contrato de subconcessão e exerceu a sua actividade em moldes que prejudicaram o interesse público.
    19. A sustentação factual das aludidas violações contratuais e ofensa do interesse público é muito insuficientemente alinhada no artigo 84.0 da contestação e, de todo o modo, é contrariada por factos alegados e a respectiva valoração feita pela Recorrente no requerimento inicial; para lá remete, pois, a Recorrente a sua defesa quanto a este ponto.
    20. Não obstante, ainda que a A tivesse prestado um serviço sem qualidade a Macau em termos que prejudicassem o interesse público, nunca o exercício do seu direito de reagir judicialmente contra uma interrupção administrativa ilegal das suas operações poderia preencher o critério apertado do artigo 326.° do Código Civil, que versa precisamente o exercício abusivo do direito.
    
    D. Ilegitimidade da Recorrente para arguir a nulidade da deliberação do Conselho de Administração de 30 de Marco de 2010 (artigos 103.°, 106.°, 109.°, 116. ° e 117.°)
    21. A este respeito, a B alega que a nulidade duma deliberação do órgão de administração duma sociedade comercial por ter sido tomada em matéria não contemplada pela ordem de trabalhos constante da convocatória da reunião é assunto privado da sociedade e só pode ser arguida pelos seus administradores, órgão de fiscalização e sócios.
    22. No entanto, o interesse de que uma sociedade cumpra internamente as regras de funcionamento que os seus estatutos e a lei lhe impõem no tocante à formação da sua vontade é um interesse público em termos gerais e não apenas quando essa sociedade está cotada em bolsa.
    23. Se, com atropelo dessas regras, a sociedade projectar exteriormente uma vontade malformada lesiva dos interesses doutrem, é pacífico que o lesado pode evitar o dano impugnando o valor jurídico dessa manifestação de vontade.
    24. Observe-se, a este respeito, que a norma do artigo 236.°, n.º 1, do Código Comercial visa proteger terceiros, não a sociedade, vinculando-a a actos externos que tenham, aos olhos do destinatário, a aparência de ter sido regularmente praticados, ainda que isso não seja verdade; são os terceiros quem, com base no artigo 236.°, n.º 1, pode resistir a uma tentativa da sociedade de se desvincular dum acto externo irregularmente praticado por um seu administrador e não a sociedade que, escudando-se na mesma norma, pode evitar a invalidade de acto que afectou os interesses de terceiros praticado em seu nome por quem não a obrigava.
    
    E. Deliberação de 30 de Abril de 2010 (artigos 118º a 120º)
    25. Esta deliberação não tinha sido tomada à data em que a Recorrente interpôs o presente recurso, pelo que, uma vez invocada na contestação da B, deve permitir-se à Recorrente que a aborde como uma questão nova suscitada pela parte contrária.
    26. A deliberação de 30 de Abril de 2010 do Conselho de Administração da B propõe-se re-ratificar a suposta decisão do seu Presidente, de 28 de Março, já alegadamente ratificada uma primeira vez, em 30 de Março, por esse Conselho.
    27. A figura jurídica da ratificação é desprovida dum regime jurídico definido, não se confundindo com a substituição de deliberações, tratada no artigo 231.°, n.º 6, do Código Comercial, a qual, além de não estar na disponibilidade da sociedade, mas no poder do juiz, a exercer no caso sub judice, avaliadas as circunstâncias, não é sequer aplicável às decisões do conselho de administração das sociedades anónimas porque o artigo 467.°, n.º 6, do mesmo Código, não inclui o artigo 321.° na enumeração de preceitos para que remete.
    28. Sujeito a um estudo mais aprofundado da matéria, afigura-se que são aplicáveis a esta ratificação concreta decidida pelo Conselho de Administração da B em 30 de Abril, as regras do artigo 261.° (Representação sem poderes) do Código Civil, diploma que fornece o direito subsidiário do direito comercial.
    29. O n.º 5 do referido artigo 261.° permite à outra parte no negócio revogá-lo ou rejeitá-lo, enquanto o negócio não for ratificado, salvo se, no momento da conclusão, fosse já conhecida a falta de poderes do representante.
    30. Se este preceito confere um poder de revogação ou rejeição a alguém que, voluntária e conscientemente, concorreu para a celebração do negócio, por maioria de razão se deve entender que o confere também a quem não emitiu qualquer declaração de vontade conformadora do negócio.
    31. O Presidente do Conselho de Administração da B terá praticado um acto jurídico unilateral de rescisão da sub-concessão, para o que não houve qualquer concurso de vontade da Recorrente.
    32. A Recorrente rejeitou a declaração rescisória do Presidente do Conselho de Administração da B por carta de 30 de Março, notificada no próprio dia (cf. docs. 3 e 4 do requerimento inicial).
    33. Mesmo que se entenda que a validade de tal rejeição estava dependente de a mesma se ter antecipado à ratificação pela B, o que não se concede porque essa condição do artigo 261.°, n.º 5 se justifica para aquele que quis celebrar o negócio e apenas pretende depois desistir dele (o que é a situação retratada na norma), mas não para quem não contribuiu para a sua existência e sofre os seus efeitos, e ainda que se entenda também que a deliberação de 30 de Março operou uma ratificação, o que não se aceita, mas não está agora em discussão, sempre haverá que ter em conta a eficácia dos actos jurídicos.
    34. Segundo o artigo 216.°, n.º 1, do Código Civil, a declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz quando chega ao seu poder ou é dele conhecida.
    35. Ora, a rejeição do acto do Presidente do Conselho de Administração da B pela Recorrente foi-lhe comunicada em 30 de Março, mas já a alegada ratificação do mesmo acto pelo Conselho de Administração ou os administradores da B só foi comunicada à Recorrente em 31 de Março (cf. doc. 4 do requerimento inicial).
    36. Assim sendo, deve entender-se preenchido o eventual requisito de precedência da rejeição do acto sobre a sua ratificação, pelo que o acto rescisório do Presidente do Conselho de Administração da B foi validamente rejeitado.
    37. Quer isto dizer que a re-ratificação de que nos ocupamos agora é inexistente porque visa aceitar os efeitos de acto que deixou de existir no mundo do direito, a saber, a dita declaração rescisória do Presidente do Conselho de Administração da B.
    38. Caso assim se não entenda, deve atentar-se na norma do n.º 3 do já aludido artigo 261.° que não permite que o efeito retroactivo da ratificação prejudique os direitos de terceiro.
    39. Em situação análoga à dum terceiro tem de ser considerado o destinatário do acto que o tenha impugnado e é por ele prejudicado, como foi o caso da Recorrente.
    40. Por conseguinte, ainda que existisse juridicamente, a ratificação de 30 de Abril não teria eficácia retroactiva.

8. A massa falida da recorrente A apresentou alegações facultativas, pronunciando-se no sentido da fixação da matéria de facto e das razões por que se deve considerar provado que:
    A. A Autoridade Recorrida, Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes do Governo da RAEM, ordenou à Contra-Interessada Companhia de Transportes Aéreos B, S.A.R.L.(“B”) que pusesse termo ao contrato de sub-concessão que esta celebrara com a A – Sociedade de Aviação, Limitada (“A”) para exploração da actividade de transporte aéreo comercial de passageiros e cargas.
    B. A impossibilidade de o Conselho de Administração da B ter ratificado, em reunião de 30 de Março de 2010, a suposta decisão do seu presidente, plasmada na carta de 28 de Março que constitui o doc. 1 do requerimento inicial (fls. 45)
    C. Ausência de violação constante das obrigações de serviço público, através do cancelamento de voos e da recusa em prestar apoio e informações aos passageiros portadores de bilhete válido.
    D. Ausência de danos irreparáveis aos passageiros, ao aeroporto e à imagem da RAEM.
    E. Atitude tolerante do Governo da RAEM em face de danos causados pela B à imagem do aeroporto e da RAEM.
    F. Carácter inédito da rescisão, por ter efeito imediato.

Mais dizendo:
    A. O acto recorrido não é opinativo porque, como se viu, foi formulado como uma ordem e executado como tal.
    B. Não colhe o argumento de que seria opinativo porque interpretaria cláusulas contratuais ou se pronunciaria sobre a validade do contrato administrativo, o que, por força do disposto no artigo 173.°, n.º 1, do CPA, retiraria definitividade e executoriedade ao acto, donde que, não sendo definitivo e executório, o acto tinha então que ser opinativo.
    C. Isto porque o acto recorrido não fornece uma interpretação de quaisquer cláusulas contratuais, seja do Contrato de Concessão, celebrado entre a RAEM e a B, seja do Contrato de Sub-concessão, celebrado entre a B e a A, e tão pouco se pronuncia sobre a validade quer do Contrato de Concessão, quer do Contrato de Sub-concessão.
    D. Não colhe também o argumento de que seria opinativo porque filiado no poder de fiscalização do modo de execução do contrato que o artigo 167.°, d), do CPA confere ao contraente-entidade administrativa no âmbito dos contratos administrativos, independentemente de se saber se o exercício desses poderes reveste natureza administrativa ou de acto privado contratual.
    E. Isto porque esse poder de fiscalização comporta apenas o de apreciar como boa ou má a prestação da concessionária e, julgando-a má, instar ou, no limite, exigir que a concessionária adopte padrões de qualidade ou quantidade que a Administração tenha como bons. Entre isto e resolver o contrato de concessão vai uma distância intransponível. O poder de fiscalização do contrato inclui um poder de conformação, mas não um poder de resolução, pelo que radicar no artigo 167.°, d), do CPA a possibilidade de resolver o contrato administrativo seria violentar quer a letra quer o espírito da norma.
    F. Se assim é relativamente ao contrato administrativo, por maioria de razão o é relativamente ao sub-contrato que o contraente privado tenha vindo a outorgar com terceiro e do qual o contraente-entidade administrativa nem sequer é parte. O contraente-entidade administrativa pode, na medida em que isso se reflicta na execução do contrato administrativo, instar ou, no limite, exigir do concessionário que inste ou, no limite, exija do terceiro sub-contratante que conforme a sua actuação aos tais padrões de qualidade ou quantidade, mas não ordenar-lhe que resolva o sub-contrato. Tudo porque, repete-se, o poder de fiscalizar compreende a acção conformadora a que acima aludimos, podendo e devendo ser exercido na perspectiva positiva da boa execução do contrato, mas já não a acção fulminadora, de sentido negativo, de pôr termo à relação contratual porque a execução é má.
    G. Sendo um acto administrativo em sentido próprio, e não meramente opinativo, o acto recorrido é definitivo porque define uma situação jurídica para a B - sujeita-a a obedecer à ordem de rescisão do Contrato de Sub-concessão da A.
    H. E é executório, pois que contém em si uma ordem que não está condicionada "à verificação de uma formalidade que ainda não teve lugar" (cf. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10.ª Edição, Tomo , pág. 451) ou à verificação de "condição ou requisito a que a lei subordina a sua eficácia" (cf. Mário Esteves de Oliveira, Direito Administrativo I, 1977, Faculdade de Direito de Lisboa, pág. 715). A ordem do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes não dependia doutra formalidade, condição ou requisito legal (por exemplo, um Despacho do Senhor Chefe do Executivo) para ser cumprida pela B e se tornar eficaz. Nada tinha que se interpor entre a ordem do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes e a B para que esta a cumprisse.
    I. É claro que a ordem não tinha que ser cumprida porque era ilegal, mas essa discussão interessa aos vícios do acto e nada retira à sua executoriedade, do mesmo modo que não releva para a executoriedade a necessidade de a B rescindir o Contrato de Subconcessão. Tal rescisão constituiu um acto de execução da ordem do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, que não perde a natureza executória pelo simples facto de ser um acto jurídico e não uma mera operação material.
    J. Actos de execução não se confundem, neste contexto, com formalidades que ainda não tiveram lugar ou condições ou requisitos a que a lei subordina a eficácia do acto administrativo. Doutro modo, nunca uma ordem seria um acto executório porque sempre teria que ser cumprida pelo destinatário, o que representaria um óbvio contra-senso.
    K. Estamos assim perante um acto administrativo definitivo e executório, contenciosamente recorrível porque não sujeito a impugnação administrativa necessária (cf. artigo 28.°, n.º 1, do CPAC).
    L. A tempestividade do recurso foi demonstrada no requerimento inicial (v. artigo 48.° daquela peça),
    M. A legitimidade da A resulta de a ordem se destinar a ser cumprida e esse cumprimento lesar os interesses da A, havendo uma relação de causa-efeito entre o acto recorrido e a rescisão da Sub-concessão pela B e a posterior revogação do AOC da A pela AACM, porquanto aquela cumpriu ordens e esta praticou um acto consequente (v. artigos 11.°, 13.° e 47.°, artigos 18.° a 44.°, descrevendo a conduta da B, e artigos 45.° e 46.°, explicando o acto da AACM, todos do requerimento inicial).
    N. Os vícios do acto recorrido vêm alegados no requerimento inicial. Possivelmente, o que a Recorrente classificou de incompetência (artigos 49.° a 57.°) poderá também ou mais propriamente ser classificado como um vício de violação de lei.
    O. A resposta da Recorrente às questões e excepções suscitadas pela Autoridade Recorrida e pelas Contra-Interessadas consta do seu requerimento de fls. 474 a 482 e mantém-se aqui, na íntegra.
    
Conclui:
    A. O acto do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes ordenou a rescisão e teve o efeito de rescindir o Contrato de Sub-concessão da Recorrente.
    B. A B cumpriu a ordem do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, recebida por intermédio da Autoridade de Aviação Civil de Macau, transmitindo à Recorrente que o Contrato de Sub-concessão era rescindido.
    C. A deliberação que o Conselho de Administração da B votou a esse respeito é nula porque a respectiva matéria não estava agendada para a reunião do órgão em que foi tomada e, ainda que assim se não entenda, porque foi simulada; seja como for, deve recusar-se qualquer valor probatório ao documento em que se encontra redigida, a saber, a acta n.º 50 daquele órgão social, a fls. 49 dos autos.
    D. Os fundamentos da rescisão decidida pelo Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes são a violação constante pela Recorrente das obrigações de serviço público estatuídas na cláusula 4.8 do Contrato de Sub-concessão, através do cancelamento de voos, também aludido como interrupção injustificada dos serviços, e da recusa em prestar apoio e informações aos passageiros portadores de bilhetes válidos, bem como os danos irreparáveis causados aos passageiros, ao aeroporto e à imagem da RAEM pela actuação da Recorrente.
    E. Além de ter tido o efeito de rescindir o Contrato de Sub-concessão, o acto em questão provocou a revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo ("AOC") da Recorrente, por acto da Autoridade de Aviação Civil de Macau, porquanto essa revogação teve como fundamento exclusivo a perda da sub-concessão pela Recorrente.
    F. O acto administrativo do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes é nulo porque estranho às atribuições do seu autor, ou anulável por incompetência, dado exceder essas atribuições ou violar os seus limites, é nulo ainda por violação da formalidade essencial de audiência prévia do interessado, é anulável por erro nos pressupostos de facto, e é ainda anulável por violação de lei, dado que afronta os princípios da igualdade, da imparcialidade e da proporcionalidade.
    G. A Recorrente mantém integralmente a resposta que já deu, a fls. 474 a 482 dos autos, às questões e excepções suscitadas pela Autoridade Recorrida e pelas Contra-Interessadas nas respectivas contestações.
    
    9. Ainda em sede de alegações facultativas diz a entidade recorrida, Exmo Senhor Secretário para os Transportes e Obras públicas, em síntese:
    i. Não existiu qualquer acto administrativo definitivo e executório praticado pela Entidade Recorrida, pelo que o acto objecto do recurso contencioso é inexistente.
    ii. A Entidade Recorrida não podia proferir qualquer decisão de rescisão do Contrato de Sub-Concessão, porquanto não estava na esfera das suas competências ou atribuições.
    iii. Por força das relações jurídicas estruturadas de acordo com os Contratos de Concessão e de Sub-Concessão, tal decisão cabia única e exclusivamente à Contra-Interessada B, parte desse mesmo contrato.
    iv. Resultou provado que a Contra-Interessada B, parte no contrato de Sub-Concessão, tinha créditos face à Recorrente que, entre outros incumprimentos contratuais, não pagou as quantias devidas mensalmente à Contra-Interessada B, por força desse mesmo contrato.
    v. Qualquer que seja o entendimento, ficou provado que as instruções alegadamente referidas no documento 1 junto com a Petição de Recurso não foram da ora Entidade Recorrida.
    vi. Resultou também provado que os acontecimentos do fim-de-semana de 26, 27 e 28 de Março de 2010, no Aeroporto de Macau, se deveram única e exclusivamente ao reiterados incumprimentos por parte da Recorrente,
    vii. Reputou-se provado ainda o facto de, milagrosamente, os responsáveis da Recorrente, terem desaparecido do Aeroporto de Macau nesse mesmo fim-de-semana, deixando os passageiros afectados abandonados à sua própria sorte.
    viii. Ora, ficou amplamente demonstrado que a conduta da Recorrente foi, a partir de certa altura, violadora das obrigações a que estava adstrita por mor do Contrato de Sub-Concessão que celebrou.
    ix. Incluindo o facto de ter sido a Recorrente a única e exclusiva responsável pela bola de neve de incumprimentos que tiveram como consequência os acontecimentos do fim-de-semana de 26, 27 e 28 de Março de 2010, no Aeroporto de Macau, que culminaram na rescisão do contrato pela B.
    x. Por outro lado, os danos para a imagem da Região Administrativa Especial de Macau - que são tão óbvios que mesmo que não tivessem sido alegados, poderia qualquer homem médio imaginá-los - foram nefastos!
    xi. Vejamos, em qualquer País ou Região do mundo, se existe uma companhia aérea que, de um momento para o outro, deixa de transportar passageiros, embarcando-os e desembarcando-os do avião, desaparecendo sem dar informações, satisfações, enfim, sem mais ... fácil será de perceber que a imagem da Região foi forte, negativa e irremediavelmente afectada!
    xii. Tal resultou provado pelos diversos testemunhos prestados.
    xiii. Mesmo que qualquer dos factos alegados pela Recorrente seja dado como provado, fácil será concluir que a não existir acto administrativo, o que é notório, fica prejudicada qualquer pretensão da Recorrente, devendo, a final, julgar-se improcedente o pedido.
    Nestes termos, deverá ser proferido acórdão que julgue improcedente a pretensão da recorrente.
    
    10. A AAMC, em sede de alegações facultativas, conclui:
    a. A Revogação do AOC por parte da Contra-Interessada AACM mais não foi do que o resultado da aplicação do Regulamento Administrativo n.º 10/2004, de 5 de Abril de 2004.
    b. Dispõe o n.º 1 do artigo 2.° do referido Regulamento que "O exercício da actividade de transporte aéreo comercial na RAEM pode ser atribuído em regime de concessão de serviço público para o transporte aéreo de passageiros, bagagem, carga e correio da e para a RAEM, quando esteja em causa a satisfação de necessidades públicas individualmente sentidas".
    c. Ora, tendo a Recorrente deixado -de ser parte no Contrato de Sub-Concessão, deixou automaticamente de ser uma entidade susceptível de ser titular de um AOC,
    d. O que, por aplicação estrita da lei (Regulamento Administrativo n.º 10/2004, de 5 de Abril de 2004), levou a que a AACM, Contra-Interessada nos presentes autos, revogasse o AOC à Recorrente.
    e. O acto de revogação do AOC foi um acto totalmente vinculado, tendo a Contra-Interessada AACM apenas aplicado a Lei.
    Nestes termos, deverá julgar-se improcedente a pretensão da recorrente.

    11. A B, alega facultativamente, em síntese:
    a. Conforme referido na carta da B de 31 de Março de 2010 endereçada à Recorrente (Doc. 4 junto pela Recorrente com a sua petição), a decisão da B de resolver o Contrato de Subconcessão teve por fundamento a violação, nos dias 26 a 28 de Março de 2010, das obrigações de serviço público mencionadas na cláusula 4.8 do Contrato de Subconcessão, o cancelamento repetido de voos e a recusa da Recorrente em providenciar apoio e informação aos passageiros possuidores de bilhetes válidos;
    b. Esses factos foram provados pelos documentos carreados para os autos e pelas testemunhas inquiridas.
    c. Todavia, a decisão de resolver o Contrato de Subconcessão teve também por base outros fundamentos, conforme referido na mesma carta da B de 31 de Março de 2010, relacionados com o incumprimento pela Recorrente de obrigações para com a B resultantes do Contrato de Subconcessão, desde logo:
    i. O não pagamento de um montante superior a 20 milhões de patacas em taxas já vencidas (2.9 milhões de dólares dos Estados Unidos);
    e
    ii. A não entrega de dados financeiros e operacionais - se a Recorrente tivesse cumprido esta obrigação, a B poderia ter fiscalizado a actividade e capacidade financeira da Recorrente e posto cobro ao Contrato de Subconcessão em devido tempo, tendo-se evitado o desfecho de Março de 2010.
    
    d. Foi com base nesses fundamentos que o presidente do conselho de administração da B obteve instruções dos seus "patrões em Pequim" e dos demais administradores para resolver o Contrato de Subconcessão.
    e. A decisão da entidade Recorrida não foi, portanto, vista pela B como uma ordem, nem de facto nem de direito, a que a B tivesse que obedecer acriticamente, mas tão somente como uma demonstração inequívoca de apoio a essa decisão por parte da entidade Recorrida.
    f. Tanto assim, que a decisão de resolução do Contrato de Subconcessão, como foi provado, surgiu de instruções da accionista D (os "patrões de Pequim") e que os fundamentos da decisão de resolução extravasaram aqueles que constavam do ofício enviado pela Autoridade de Aviação Civil de Macau à B.
    
    DO DIREITO
    O acto da entidade Recorrida que a Recorrente pretende que seja anulado ou declarado nulo consistiu apenas na interpretação de diversas cláusulas contratuais do Contrato de Subconcessão e na extrapolação de uma opinião por parte do seu autor.
    Se essa interpretação tivesse tido por base cláusulas do Contrato de Concessão com a B, estaríamos claramente perante um acto opinativo previsto no artigo 173º do Código do Procedimento Administrativo, que dispõe que "Os actos administrativos que interpretem cláusulas concratuais ( ... ) não são definitivos e executórios, pelo que na falta de acordo do co-contratante! a Administração só pode obter os efeitos pretendidos através de acção a propor no tribunal competente."
     No caso presente, a Administração nem sequer interpretou o contrato administrativo propriamente dito, já que as cláusulas contratuais sobre as quais opinou dizem respeito ao Contrato de Subconcessão outorgado entre a B e a Recorrente, a que é alheia a Administração.
    No entanto, se um acto opinativo da Administração relativamente a cláusulas de um contrato administrativo é insusceptível de produzir efeitos definitivos e executórios, um acto opinativo da Administração relativamente a um contrato a jusante desse contrato administrativo não deverá também, por maioria de razão, produzir efeitos definitivos e executórios.
    O acto administrativo em questão limitou-se a mandar informar (" I hereby inform you") a B que esta deveria resolver o contrato de subconcessão nos termos das cláusulas contratuais que o senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes considerou pertinentes.
    A comunicação com a ref.ª 0658/DATIR/10, de 28 de Março de 2010, que a Autoridade de Aviação Civil de Macau dirigiu B, em lado nenhum refere, insta, instrui ou ordena à B para resolver o Contrato de Concessão, estando destituído, portanto, da autoridade pública - própria dos actos administrativos.
    Pelo contrário, o senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes apenas determinou que a Autoridade de Aviação Civil informasse a B que, de acordo com a interpretação que fez das cláusulas do Contrato de Subconcessão, estariam reunidos os pressupostos para resolver o Contrato de Subconcessão e que, para proteger e prosseguir o interesse público, a B deveria resolver o contrato.
    A decisão da B veio a ser concordante com o acto administrativo opinativo do senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes, apesar de os seus fundamentos apenas coincidirem parcialmente com os fundamentos da entidade Recorrida (tendo-lhe acrescido os resultantes do incumprimento pela Recorrente dos termos do Contrato de Subconcessão no que diz respeito ao pagamento de taxas e entrega de dados operacionais e financeiros à B), mas o acto opinativo não teve, nem poderia ter tido, qualquer efeito definitivo e executório.
    Aliás, a própria Autoridade de Aviação Civil só veio a revogar o Certificado de Operador de Transporte Aéreo depois de a B lhe ter informado que resolvera o Contrato de Subconcessão com a Recorrente.
    Até esse momento, a Autoridade de Aviação Civil absteve-se, e bem, de retirar quaisquer efeitos jurídicos ou administrativos do acto recorrido por estar ciente da sua inocuidade decorrente da ausência de definitividade e executoriedade.
    A regra, no domínio dos contratos administrativos, é no sentido de que os actos da Administração não assumem a natureza de actos administrativos porque, nos termos do artigo 173.° do Código do Procedimento Administrativo, "É só a contrario sensu que se afirma, neste preceito, o princípio de que ao contraente "público" é ( ... ) dado praticar actos administrativos que têm por objecto a sua relação contratual administrativa com terceiros e que vinculam estes, enquanto parte nesse contrato." Isto porque "Os actos ou declarações do contraente administrativo sobre a interpretação ou validade de cláusulas contratuais, não vinculam B contraparte e não podem ser operados, sem o seu consentimento, senão através de acção (e decisão) judicial prévia. O que é o mesmo que dizer que, nestas matérias, o contraente administrativo não tem poderes para praticar actos administrativos ( ... ) face ao seu contraente" (sublinhado nosso) (Cfr. Mário Esteves Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, em Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª Edição, Almedina, pág. 850) .
    Termos em que deve o presente recurso contencioso de anulação ser indeferido, com todas as consequências legais.

    12. O Exmo Senhor Procurador Adjunto emite o seguinte douto parecer:
    Não se questionando, a partir da prova produzida nos autos, a violação por parte da recorrente, designadamente nos dias 26 a 28 de Março de 2010, das obrigações de serviço público com reflexo na cláusula 4.8 do contrato de subconcessão, com cancelamento repetido de voos e recusa em providenciar apoio e informação aos passageiros possuidores de bilhetes válidos, criando-se, naquelas datas, um estado caótico no Aeroporto Internacional de Macau, com evidente impacto negativo para a imagem e credibilidade dos operadores turísticos da RAEM e mesmo desta, já que é notório constituir o turismo um pilar fundamental da sua actividade económica, a verdade é que se tratará tudo de matéria a cujo escrutínio não vemos necessidade ou razão para proceder nesta sede.
    Convirá não esquecer pretender a recorrente, “A – Sociedade de Aviação, Lda.” impugnar acto do Secretário para as Obras Públicas e Transportes de 28/3/10 que, através de comunicação pela Autoridade de Aviação de Macau (“A.A.C.M.”) terá imposto à “Companhia de Transportes Aéreos B SARL” a cessação imediata do contrato de subconcessão que celebrou com a requerente em 31/3/06, mediante o qual se subconcederam, parcialmente e em regime de exclusividade, direitos e deveres relativos à oferta e exploração de ligações aéreas de passageiros, bagagens, carga, correio e encomendas postais de e para Macau.
    Do que se tratou foi que, na sequência da criação da situação a que supra se aludiu, a entidade recorrida determinou que a A.A.C. informasse a "B" que, de acordo com a interpretação que efectuou das cláusulas do contrato de subconcessão, estariam reunidos os pressupostos para resolver tal contrato e que, para protecção e prossecução do interesse público, aquela concessionária deveria resolver o contrato.
    E certo que a "B" acabou mesmo por resolver o contrato de subconcessão.
    Porém, não o fez por que tivesse que obedecer, cega e acriticamente a um comando unilateral, mas por que, no seu próprio escrutínio entendeu por bem anuir àquela indicação, àquela sugestão, sendo que a resolução não se limitou aos motivos anunciados pela recorrida na sua comunicação à A.A.C., fundando-se ainda em razões próprias, específicas dos interesses da "B", como a falta de pagamento a esta de taxas já vencidas e falta de fornecimento à mesma de relatórios financeiros e operacionais, resultando ainda claramente do acervo probatório carreado que aquela decisão se terá também ficado a dever, em grande medida, a instruções recebidas da "D", accionista com o controle do maior número de votos e administradores da "B".
    Desta forma, afigura-se-nos que a prova entretanto produzida no domínio dos presentes autos só veio corroborar a justeza do entendimento já assumido no nosso anterior "Parecer" constante de fls. 467 a 470, cujo essencial tomamos a liberdade de reproduzir :
    "Nos termos do n° 1 do art. 173°, CPA "Os actos administrativos que interpretem cláusulas contratuais ou se pronunciem sobre a respectiva validade não são definitivos e executórios, pelo que na falta de acordo do co-contratante, a Administração só pode obter os efeitos pretendidos através de acção a propor no tribunal competente" (sublinhado nosso)
    Nestes parâmetros, afigura-se-nos que o acto em causa da entidade requerida apenas poderá ser enquadrado como mero acto opinativo, no conceito da norma citada, praticado no âmbito dos poderes de fiscalização conferidos à Administração nos termos da al. d) do art. 167º do mesmo diploma legal, poder esse que, permitindo acompanhar a actividade do contratante privado (apreciação dos actos de gestão, acompanhamento operacional, exames, vistorias, reclamações, etc.), constatando eventuais insuficiências ou deficiências e possibilitando mesmo a formulação de exigências ao co-contratante quanto ao modo de execução do contrato, se enquadra, de todo o modo, no âmbito do poder contratual de fiscalização do contrato de concessão, não podendo, porém, ser visto como verdadeiro acto administrativo, com os necessários requisitos de definitividade e executoriedade.
    Na verdade, no caso, o Secretário para as Obras públicas e Transportes, no âmbito do poder contratual de fiscalização do cumprimento do contrato de concessão, detinha a possibilidade de, na interpretação própria do clausulado, formular exigências à concessionária "B".
    No entanto, caso não obtivesse desta a concordância no pretendido sentido da resolução do contrato de subconcessão, não teria qualquer possibilidade de coercivamente executar essa resolução, até por que, como é evidente, a Administração não detém a qualidade de parte nesse contrato.
    Com efeito, as ordens da Administração no domínio dos contratos administrativos não podem ser entendidos como verdadeiros actos administrativos, sendo que se tais pretensões não forem acatadas, aquela não dispõe de meios coercivos que lhe permitam impor as obrigações em causa, só podendo obter essa execução forçada através dos tribunais administrativos (n° 1 do art. 174º CPAC), lançando mão da "acção sobre os contratos administrativos" consignada nos artigos 113° e sgs. do CPAC e, só no caso de esse tribunal, em consequência de não cumprimento das prestações contratuais, condenar o co-contratante à prestação de um facto ou à entrega de coisa certa, pode a Administração, mediante acto definitivo e executório, promover a execução coerciva da sentença, por via administrativa (2 do art. 174º, CPAC, já referenciado).
    Donde, em síntese, poder concluir-se que a decisão controvertida, da autoria do SOPT, não produzindo, por si, efeitos jurídicos na esfera jurídica do requerente, necessitando, para tal, de decisão conformadora da concessionária, "B", não consubstanciando, pois, acto administrativo definitivo e executório, não é passível do recurso contencioso interposto."
    E, se é verdade que, no caso, a entidade recorrida não interpretou o contrato de concessão propriamente dito, já que as cláusulas contratuais sobre que se debruçou dizem respeito à subconcessão, contrato a que a Administração é alheia, não é menos certo que, como bem adianta a concessionária "... se um acto opinativo da Administração relativamente a cláusulas de um contrato administrativo é insusceptível de produzir efeitos definitivos e executórios, um acto opinativo da Administração relativamente a um contrato a jusante desse contrato administrativo não deverá também, por maioria de razão, produzir efeitos definitivos e executórios",
    Tudo razões, pois, por que, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, somos a manter o entendimento já assumido, quer nesta sede, quer na suspensão de eficácia, onde, aliás, foi, no essencial, sufragado pelo douto Colectivo, no sentido da irrecorribilidade do acto questionado.
    Uma última nota sobre a assacada nulidade de deliberação tomada pelo conselho de administração da "B" : tratando-se, como se trata, de requerimento atinente a declaração de nulidade de deliberação social tomada por pessoa colectiva de direito privado, toma-se evidente que nunca seria este o meio e instância os próprios para a apreciação respectiva, não correspondendo, aliás, a qualquer acto ou decisão da autoria do aqui recorrido, o SOPT, pelo que haverá, sem mais, que rejeitar tal pretensão.
    
    13. Foram colhidos os vistos legais.
    
    II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    É a hora de conhecer das excepções que foram suscitadas nos autos.
1. Da incompetência do Tribunal
    Na configuração da recorrente a rescisão do contrato de subconcessão entre a B e a A aconteceu por determinação de acto do Senhor Secretário, entidade aqui recorrida, sendo o acto praticado por este último o objecto do pedido de anulação, se não de nulidade.
    Nos termos da Cláusula 32.1 do contrato de concessão, as questões sobre a interpretação, validade e execução do mesmo contrato devem ser submetidas a julgamento de um tribunal arbitral, com funcionamento em Macau.
    Na Cláusula 4.1 do contrato de sub-concessão ficou estipulado que "A Subconcessionária deve cumprir integralmente o disposto no Contrato de Concessão".
    Nos termos do n.º 2, do artigo 31.° do CPC (aplicável ex vi do artigo 1.º do CPAC) "a incompetência fundada na violação de pacto privativo de jurisdição ou na preterição de tribunal arbitral voluntário só pode ser arguida pelo réu, sendo o prazo para a arguição o fixado para a contestação, oposição ou resposta".
    Desta forma e conforme o n.º 3 do artigo 33.° do CPC, também por este motivo deveria a entidade recorrida, defende esta, ser absolvida da instância, por preterição do tribunal arbitral.
    A RAEM é apenas parte contratante no contrato de concessão e, apesar de o ter autorizado, não é parte do contrato de sub-concessão, o qual foi apenas celebrado entre a B e a recorrente.
    Não tem razão a entidade recorrida quando, ainda que em sede subsidiária, argui a incompetência deste Tribunal, pela razão simples de que não é o contrato de concessão ou subconcessão que está em causa, mas sim um pretenso acto de um membro do Governo, pretensamente definitivo e executório, dotado de poderes de autoridade pública que teria sido determinante de uma rescisão levada a cabo por uma das partes contratantes.
    
    2. Da ilegitimidade da recorrente por o acto administrativo ter sido praticado no âmbito do contrato de concessão
    A contra-interessada Companhia de Transportes Aéreos B, S.A.R.L. invoca a ilegitimidade activa da recorrente com o fundamento de que a acto administrativo recorrido, na hipótese de ser contenciosamente recorrível, sempre deverá entender-se como praticado no âmbito do contrato de concessão que tem como partes a R.A.E.M. e a B e ao qual a recorrente é estranha, pelo que só a B poderia tê-lo impugnado.
    
    Não assiste qualquer razão à arguente, na medida em que o pretenso acto, tal como configurado foi, não deixa de se projectar directamente na esfera da recorrente, pois que terá determinado a rescisão do contrato de sub-concessão por intermédio da B, a qual se teria limitado a cumprir a ordem ínsita no referido acto, o que teve como consequência a revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo ("AOC", na designação internacional) da recorrente, por acto administrativo da Autoridade da Aviação Civil de Macau.
    A recorrente, com ou sem razão, entende que a perda da sua sub-concessão e do seu AOC é um efeito directo do acto administrativo recorrido que, por conseguinte, a lesou directamente.
    Assiste-lhe pois legitimidade activa no presente recurso contencioso.
    
    3. Da Ilegitimidade Passiva do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes do Governo da RAEM e da AMCM
    De acordo com o disposto no artigo 37.º do CPAC, "Considera-se como entidade recorrida o órgão que tenha praticado o acto, ou que, por alteração legislativa ou regulamentar, lhe tenha sucedido na respectiva competência".
    Neste contexto, defende o contestante, na presente situação, não existiu qualquer acto administrativo recorrível praticado pelo Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, ora recorrido, o que, no seu entendimento, configura uma situação de ilegitimidade passiva, importando, consequentemente, a absolvição da instância da entidade recorrida – al. d) do artigo 413.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 1º do CPAC, o que levaria que a que, nos termos da alínea d), do n.º 1, do artigo 230.° do CPC, o juiz deva abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância perante os casos de ilegitimidade passiva.
     Sobre esta questão, perante a configuração do recorrente, o Exmo Senhor Secretário terá praticado um determinado acto, com os contornos acima descritos.
    Ora a irrecorribilidade do acto não se pode confundir com legitimidade. Ele não deixa de ser parte legítima, ainda que o recurso porventura venha a ser ser rejeitado por irrecorribilidade do acto.
    Parece não haver dúvida que o seu direito e interesse foi lesado e atingido directamente na imputação que atribui à actuação daquele membro do Governo como determinante e condicionadora da rescisão verificada.
    Daí que, sem necessidade de grandes desenvolvimentos, somos a considerer a recorrente dotada de legitimidade activa.
    
    4. Ilegitimidade da Autoridade de Aviação Civil de Macau
     A excepção foi arguida com o fundamento de que não foi praticado pela Autoridade de Aviação Civil de Macau um acto administrativo consequente do acto administrativo do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, objecto do presente recurso, porque este último não tem a natureza de acto administrativo.
    Sobre esta excepção não tem razão a contra-interessada AACM, pois que não leva em conta a perspectiva traçada pela recorrente no requerimento inicial; reclama-se a nulidade ou anulação dum acto administrativo praticado pela entidade recorrida, acto de que a revogação do AOC da recorrente, pela Autoridade de Aviação Civil de Macau, é mera consequência; por esse motivo, pede-se a intervenção da Autoridade de Aviação Civil de Macau como contra-interessada, visto que um provimento do recurso acarretará a caducidade ou revogação do próprio acto da Autoridade de Aviação Civil de Macau, situação que a própria contestante reconhece ao considerar que a revogação do certificado de operações aéreas se ficou a dever ao facto de a recorrente deixar de ser sub-concessionária.
    Nesta conformidade, a Autoridade de Aviação Civil de Macau é parte interessada nos presentes autos e tem, por isso, legitimidade passiva.
    
    
    5. Inutilidade da lide
    A B argumenta também que a ofensa de direitos em que a recorrente fundou o seu recurso, a ter acontecido, teria sido causada autonomamente por declaração negocial da B, produzida no domínio do contrato de sub-concessão e ditada por uma decisão comercial, inexistindo qualquer nexo de causalidade entre o acto do Recorrido e a dita decisão comercial, de sorte que, ainda que o acto recorrido fosse declarado nulo ou anulado, não seria repristinado o contrato de sub-concessão.
    Entende a recorrente que, embora não explicitamente, a B invoca aqui a inutilidade da lide e consequentemente a ausência dum pressuposto da manutenção da instância.
    Ora, a recorrente invocou no seu requerimento inicial a invalidade jurídica da rescisão/resolução unilateral do contrato de sub-concessão emitido pelo Presidente do Conselho de Administração da B em 28 de Março de 2010 e, bem assim, a nulidade, por simulação, da deliberação de rescisão, supostamente adoptada pelo mesmo Conselho de Administração em 30 de Março, por não reconhecer nesses actos uma manifestação de vontade própria, mas tão só o propósito de cumprir o que o recorrido ordenou à B.
    Se proceder a arguição da recorrente e for concorrentemente declarado nulo ou anulado o acto recorrido, nem o contrato de subconcessão terá sido rescindido nem o AOC seria sido retirado à A.
    É a própria recorrente que reconhece que, mesmo nesse cenário, um hipotético relançamento da actividade da A estaria provavelmente fora de cogitação, dado que, entretanto, a A se apresentou em juízo a requerer a sua falência, a qual veio a ser decretada, e que os credores da massa poderiam não ter interesse em suspender a falência e continuar o negócio da empresa.
    Enfoca então o seu interesse resultante da procedência do recurso na esfera jurídica da recorrente em termos de um direito a ser indemnizada por perdas e danos.
    Daí, reconhece-se, a evidente utilidade da lide, motivo por que improcede a questão ou excepção de inutilidade suscitada pela B.
    
6. Assim se conclui ser este Tribunal o competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.

    III - FACTOS
1. Respiga-se, com pertinência, dos autos, documentos juntos e da prova testemunhal produzida, a factualidade seguinte:
    Foi enviada da B à A a seguinte carta:
    
    “28th March, 2010
    Mr. E
    Chairman, A Limited
    Avenida XX
    No. XX, XX Tower, XXth Floor
    Macau
    Dear Mr. E,
    We are sorry to inform you that with the official correspondence received from the Civil Aviation Authority this evening ref. no. 06581DATIR/IO (kindly please refer to the attachment), with our deepest regret, we are instructed to terminate with immediate effect, the Sub-concession Contract being signed with your esteemed company on 31st March, 2006.
    Thanks and with our best regards,
    
    F
    Chairman, Board of Directors cum
    Chief Executive Officer
    28th March, 2010 “
    
Tal como foi enviada da AAMC à B a carta seguinte:
    
    “Mr F
    Chairman ofthe Board of Directors
    B Company
    28 March 2010
    Assunto (Subject): A Sub-concession Termination
    Dear Mr. F,
    According to the decision of the Secretary for Public Works and Transports of today I hereby inform you that company B must terminate immediately the Sub-concession Contract with A according to Clause 14.4 and 4.1 of the Sub-concession Contract. This decision was based on the fact that A has been constantly violating its public service obligations stated on Clause 4.8 of the Sub-concession Contract, by canceling flights and refusing to provide support and information for passengers carrying valid tickets. These violations have caused irreparable damages to passengers, airport and the image of Macau SAR. As such, considering the seriousness and repetition of the violations and the refusal by A to provide the public service and the unjustified interruption of services and considering that in accordance with Clause 27.2, in case of sub-concession B maintains all its obligations under the Concession Contract, B must terminate the Sub-concession contract immediately.
    
    Yours Sincerely,
    G
    President “
    
    
    Em resultado da comunicação da B, a Autoridade de Aviação Civil de Macau enviou então à Recorrente a comunicação com a ref. 0660/DFSL/10, ainda no dia 28 de Março de 2010, notificando-a de que (doc. 2):
    - fora formalmente informada pela B de que o Contrato de Subconcessão com a A tinha sido rescindido (em inglês: «This authority has been formally informed by B Company Limited that the sub-concession contract with A has been terminated»);
    - assim, a A deixara alegadamente de preencher os requisitos exigíveis ao detentor dum Certificado de Operador de Transporte Aéreo (em inglês, "Air Operator Certificate", conhecido na indústria aeronáutica pelo seu acrónimo "AOC") para o serviço público de transporte aéreo comercial (em inglês, no original: «As a result, A can no longer fulfill the requirements as an AGC holder for commercial air transport ofpublic service»);
    - pelo que a Autoridade de Aviação Civil de Macau revogava com efeitos imediatos o Certificado de Operador de Transporte Aéreo n.º AOC/04/09, da A (em inglês: «Therefore, this authority (...) hereby revokes A 's AGC n.º A GC/04/09 with immediate effect»);
    - e, por conseguinte, a A deveria terminar imediatamente as suas operações de transporte aéreo e cessar todos os meios de venda de bilhetes, incluindo através do sistema on-tine (em inglês, no original: «As such, A shall terminate immediately all commercial air transport operations and stop all means of ticket sale including on-line ticketing system»).
    Logo no dia 28 de Março, a recorrente deixou de voar e de vender bilhetes.
    A recorrente endereçou no dia 30 de Março de 2010 uma carta à B, na qual a informa, entre outras coisas, que a referida carta da B não era reconhecida como um aviso de extinção do contrato de sub-concessão válido (doc. 3).
    Em reacção à carta que lhe foi endereçada pela Recorrente, a B voltou a pôr fim ao contrato de sub-concessão, por carta datada de 31 de Março de 2010, com a ref. AMC10113c (doc. 4).
    Aí se dizendo: "por este meio rescindimos, com justa causa, o Contrato de Sub-Concessão outorgado pelas nossas companhias em 31 de Março de 2006" (em inglês, no original: «we hereby rescind, with cause, the Sub-Concession Contract executed between our companies on 31 March 2006»), mais dizendo "Os efeitos da extinção produzem-se desde 28 de Março, data em que vos informámos da nossa decisão nesse sentido" (em inglês: «The termination effects started on March 28, the date when we informed about the termination decision»).
    A carta da B dá ainda conta do que terá sido deliberado acerca da rescisão da subconcessão da recorrida na reunião do Conselho de Administração da B que teve lugar naquele dia 30 de Março (cf. respectiva acta - doc. 5).
    Segundo a dita acta, a referida deliberação diz, no essencial: "All the Board Directors ... unanimous/y resolved to terminate the Sub-concession Contract with A and ratify the termination decided by the Chairman, as well as ratifying ali relative acts and execution of the relevant notifications / documents by the Chairman for aftaining such purpose since 28MAR10.", o que se traduz como segue: "Todos os Administradores ... deliberaram por unanimidade rescindir o Contrato de Sub-concessão com a A e ratificar a rescisão decidida pelo Presidente, assim como ratificar todos os actos respectivos e a execução das relevantes notificações / documentos pelo Presidente, desde 28 de Março de 2010, com vista a atingir esse propósito."
    Na sexta-feira, 26 de Março de 2010, dia em que começou no aeroporto de Macau a sucessão de eventos que culminou com a rescisão da sub-concessão e revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo da Recorrente, a tabela de voos da Recorrente compreendia os seguintes voos, com início em Macau: um voo Macau - H (Saigão), com partida às 7:05h, um voo Macau - Jacarta, com partida às 14:30h, e um voo Macau - Narita (Tóquio), com partida às 14:35h.
    O voo Macau - H realizou-se normalmente, assim como o voo de regresso H - Macau, naquele mesmo dia.
    O voo Macau - Jacarta saiu atrasado, às 21:00h, o que importou que o regresso Jacarta - Macau só pudesse realizar-se no dia seguinte, sábado, 27 de Março.
    O voo Macau - Narita foi cancelado no dia 26 e realizou-se no dia 27, às 8:00h, a hora que a recorrente informara aos passageiros no dia 26, quando teve que comunicar-lhes o cancelamento para aquele dia.
    O regresso Narita - Macau, que normalmente aconteceria na sexta-feira, 26 de Março, também só pôde realizar-se no sábado, 27 de Março.
    O atraso do voo Macau - H e o adiamento, para a manhã do dia seguinte, do voo Macau - Narita ficaram a dever-se ao insucesso das negociações da recorrente com uma sociedade do grupo C, em vista da falta de pagamento de combustível por parte da C.ª aérea.
    No sábado, 27 de Março, a tabela de voos, com saída de Macau era a seguinte: um voo Macau - H, às 7:00h, o voo Macau - Narita (que devia ter-se realizado na véspera), às 8:00h, e um voo Macau - Hanói, às 14:30h.
    O voo Macau - H efectuou-se normalmente e o regresso H - Macau também.
    O voo Macau - Hanói foi cancelado.
    Para domingo, 28 de Março, estavam tabelados um voo Macau - H, às 7:00h, um voo Macau - Jacarta, às 14:30h, e um voo Macau - Narita às 14:35h.
Os atrasos e cancelamentos ficaram a dever-se ao problema resultante da falta de abastecimento, o que, por sua vez decorreu por falta de pagamento do combustível.
    Foram fornecidas refeições, alojamento em hotel e transporte de e para a cidade aos passageiros do voo - Narita, previsto para as 14:35h, de sexta-feira, 26 de Março, que foi cancelado e só veio a efectuar-se no dia seguinte, às 8:00h.
    Não obstante o acompanhamento e alguma assistência da recorrente em algumas situações pontuais, gerou-se uma situação caótica no aeroporto nesse fim de semana, com muitas pessoas que não foram instaladas e sem saberem quando podiam voar.
    Situação que obrigou à deslocação de técnicos dos Serviços de Turismo a deslocarem-se ao aeroporto de forma a acalmarem as pessoas e prestarem apoio e informação aos passageiros em terra.
    
    
    2. Relevar-se-á ainda a restante matéria fáctica que venha a ser invocada em sede de fundamentação, no capítulo seguinte.
    3. A restante matéria fáctica alegada ou não foi provada ou não se mostra pertinente como adiante melhor se explicitará.
    
    IV - FUNDAMENTOS
    1. A questão principal a dilucidar, reside em saber:
     - Se houve acto? Qual a sua natureza? Se é recorrível?

    2 . Do acto
    A recorrente A recorre do acto que configura nos seguintes termos (e que aqui voltamos a reproduzir para bem o podermos atingir)
    
    “O acto administrativo recorrido é da autoria do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes e foi praticado em 28 de Março de 2010; segundo o recorrido, o acto terá sido praticado oralmente; a ora recorrente teve notícia dele por uma comunicação com a ref. 0658/DATIR/10, também de 28 de Março de 2010, que a Autoridade de Aviação Civil de Macau ("AACM") dirigiu à Companhia de Transportes Aéreos B, SARL ("B"), e que esta última anexou à carta com a ref. AMC10011 c, que endereçou, na mesma data, à recorrente; os elementos essenciais do acto recorrido decorrem claramente da aludida comunicação da AACM, sendo o teor do acto o seguinte:
    - Fundamentação: "a A tem vindo a violar constantemente as suas obrigações de serviço público estatuídas na cláusula 4.8 do Contrato de Subconcessão, através do cancelamento de voos e da recusa em prestar apoio e informações aos passageiros portadores de bilhetes válidos" (em inglês: «A has been constantly violating its public service obligations stated on Clause 4.8 of the Subconcession Contract, by canceling flights and refusing to provide support and information for passengers carrying valid tickets»); estes factos são também mencionados na expressão "recusa da A de prestar o serviço público e interrupção injustificada dos serviços" (em inglês: «refusal by A to provide the public service and the unjustified interruption of services»); "danos irreparáveis aos passageiros, ao aeroporto e à imagem da RAEM" (em inglês: «irreparable damages to passengers, airport and the image of Macau SAR»); as consequências são tidas como sérias e repetidas ("considerando a seriedade e repetição das violações", em inglês, no original: «considering the seriousness and repetition ofthe violations»);
    - Conteúdo ou sentido da decisão: "a sociedade B deve terminar imediatamente o Contrato de Sub-concessão com a A de acordo com a Cláusula 14.4 e 4.1 do Contrato de Sub-concessão" (em inglês, na comunicação da AACM: «company B must terminate immediately the Sub-concession contract with A according to Clause 14.4 and 4.1 ofthe Sub-concession Contract»).”
    
    A recorrente tenta colocar em crise um alegado acto administrativo que, supostamente, fundamenta um ofício que foi enviado à AACM e que terá estado na génese da rescisão contratual operada pela B.
    
3. O cerne da questão nos presentes autos está em saber se esse acto, produzido oralmente, foi apto a produzir os efeitos de rescisão do contrato que a recorrente mantinha com a concessionária. Por outras palavras, se, devida ou indevidamente, se traduziu numa ordem de rescisão e se esta ocorreu tão somente porque a entidade recorrida emitiu tal acto oral.
    A primeira questão a apurar é saber exactamente o que foi dito e em que termos.
    E essa realidade não flui com evidência nem dos presentes autos, nem da prova produzida.
    Este é um ponto em que devemos assentar, o de que não se sabe ao certo o que efectivamente foi comunicado à AMCM e em que termos, pese embora, o relato, a referência a essa comunicação inserta no ofício da AMCM à B.
    Antes de mais, em busca deste acto perdido, como mero apontamento histórico, refira-se que já este Tribunal se debateu com esta questão em decisões anteriores, tendo até num primeiro momento dito que o acto devia ter revestido a forma escrita, tendo indeferido liminarmente o recurso (cfr. despacho de fls170, objecto de acórdão de fls 187, entendimento revogado pelo V.º TUI que douta e superiormente entendeu que o Mmo Juiz Relator, em sede apreciação liminar não estava em condições para aquilatar se o acto podia ou não ser praticado oralmente, donde ter revogado tal despacho, cfr. fls. 272 e segs ) e num outro momento, em sede de suspensão de eficácia, que se trataria de um mero acto opinativo e, como tal, insusceptível de suspensão de eficácia, vista a sua natureza (cfr. fls 321 e segs do processo em apenso respeitante à providência cautelar de suspensão de eficácia do acto).
    
    4. Uma coisa é certa: lendo, relendo e ouvindo a prova produzida atinente a tal apuramento, em ponto algum resulta claro que o Senhor Secretário tenha determinado, por si, directamente, ou através dos canais competentes, leia-se, organismos e departamentos governamentais, o encerramento das operações da A ou a rescisão do contrato de subconcessão.
    
    Ficámos até a saber pela testemunha da B, a Vice-Gerente Geral e Secretária do Conselho de Administração de circunstancialismo que precedeu a redacção da carta rescisória do contrato, de contactos havidos entre o Presidente e gerentes e administradores, de telefonemas até para Pequim, mas em lado algum se diz que houve uma ordem directa do Governo para que tal acontecesse.
    
    Tudo isto não obstante os graves incidentes que ocorreram nos dias 26, 27 e 28 de Março com os cancelamentos de voos que se iniciaram, tanto quanto apurado, inter alia, por falta de fornecimento de combustível por parte da C devido a falta de pagamento da A.
    Não vamos por agora e enquanto não se mostrar necessário escalpelizar essas ocorrências.
    
    5. A questão continua em aberto: por alguma forma o Senhor Secretário, ora recorrido, fosse porque instruído superiormente, fosse por sua auto-recriação, fosse porque instado a tal, deu uma ordem, directiva, sinal, instruções no sentido da produção de efeitos em termos de cessação da relação contratual vigente entre a concessionária e a sub-concessionária?
    Não, pelo menos com o sentido vinculativo pretendido pela recorrente. Ninguém pode comprovar que tal aconteceu, ainda que se possam tecer considerações do género de que dentro de uma certa cultura ou mentalidade o sonho de um chefe é lei. Só que, como está bem de ver, juridicamente falando, tais considerações são de todo irrelevantes.
    Sobre essa questão nenhuma prova foi produzida, ninguém transmitiu claramente o teor e conteúdo do que a entidade recorrida disse, ordenou ou determinou.
    
    6. E destaca-se bem o esforço que a recorrente faz no sentido de convencer que os termos da comunicação foram determinantes da rescisão que se verificou. É por isso que procura apenas relevar provas indirectas ou circunstanciais para convencer daquilo sobre que não há certezas: os termos usados apenas por uma entidade intermediária, um pretenso distanciamento da B dessa tomada de posição, a alegação de uma pretensa incongruência por parte da Secretária da sociedade B de que as instruções recebidas seriam de Pequim, o sentido preciso e literal das expressões utilizadas, as palavras utilizadas pelo Presidente da B de que teria recebido instruções do Governo, o depoimento da Senhora Directora do Departamento de Transporte aéreo que teria inserido a intervenção do Governo nas funções de fiscalização, tudo isso, ao contrário do que a recorrente pretende fazer valer, avoluma as incertezas quanto a uma ordem que tenha sido dada, pois que ninguém o consegue confirmar.
    
    7. É certo que a B informa a A que de acordo com instruções recebidas pelo Regulador, a AACM, devia terminar imediatamente o contrato de sub-concessão (cfr. fls 45) e que esta, por sua vez oficiou àquela que de acordo com instruções recebidas do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas (cfr. fls 46) a sub-concessão devia terminar imediatamente por violação constante das obrigações de serviço público assumidas.
    Mas será isto suficiente para considerar que foi praticado o acto com o alcance pretendido pela recorrente? Por outras palavras, pode-se considerar, mesmo admitindo o teor da comunicação da AACM, que a rescisão se verificou por assim ter decidido a autoridade recorrida. Que a intervenção do Senhor Secretário foi absolutamente determinante, em termos de causa/efeito da resolução efectuada pela B?
    Seguramente que não ficámos cientes de que assim tenha acontecido.
    
     8. Somos aqui a sufragar o entendimento possível quanto ao que se terá passado, por parte do Digno Magistrado do MP, enquanto diz:
    “Do que se tratou foi que, na sequência da criação da situação a que supra se aludiu, a entidade recorrida determinou que a A.A.C. informasse a "B" que, de acordo com a interpretação que efectuou das cláusulas do contrato de subconcessão, estariam reunidos os pressupostos para resolver tal contrato e que, para protecção e prossecução do interesse público, aquela concessionária deveria resolver o contrato.
    E certo que a "B" acabou mesmo por resolver o contrato de subconcessão.
    Porém, não o fez por que tivesse que obedecer, cega e acriticamente a um comando unilateral, mas por que, no seu próprio escrutínio entendeu por bem anuir àquela indicação, àquela sugestão, sendo que a resolução não se limitou aos motivos anunciados pela recorrida na sua comunicação à A.A.C., fundando-se ainda em razões próprias, específicas dos interesses da "B", como a falta de pagamento a esta de taxas já vencidas e falta de fornecimento à mesma de relatórios financeiros e operacionais, resultando ainda claramente do acervo probatório carreado que aquela decisão se terá também ficado a dever, em grande medida, a instruções recebidas da "D", accionista com o controle do maior número de votos e administradores da "B".
    Desta forma, afigura-se-nos que a prova entretanto produzida no domínio dos presentes autos só veio corroborar a justeza do entendimento já assumido no nosso anterior "Parecer”(…) o acto em causa da entidade requerida apenas poderá ser enquadrado como mero acto opinativo, no conceito da norma citada, praticado no âmbito dos poderes de fiscalização conferidos à Administração nos termos da al. d) do art. 167º do mesmo diploma legal,(…)no caso, o Secretário para as Obras públicas e Transportes, no âmbito do poder contratual de fiscalização do cumprimento do contrato de concessão, detinha a possibilidade de, na interpretação própria do clausulado, formular exigências à concessionária "B".
    (…) Com efeito, as ordens da Administração no domínio dos contratos administrativos não podem ser entendidos como verdadeiros actos administrativos,
    (…)
    Donde, em síntese, poder concluir-se que a decisão controvertida, da autoria do SOPT, não produzindo, por si, efeitos jurídicos na esfera jurídica do requerente, necessitando, para tal, de decisão conformadora da concessionária, "B", não consubstanciando, pois, acto administrativo definitivo e executório, não é passível do recurso contencioso interposto.
    (…)
    
    9. Defende a entidade recorrida que o pedido da recorrente não poderá proceder, uma vez que não há qualquer acto administrativo, logo não há objecto susceptível de anulação ou declaração de nulidade. E, mesmo que assim não se entendesse, uma vez que a rescisão do contrato de subconcessão se deveu única e exclusivamente ao incumprimento do contrato por parte da recorrente, a decisão de rescisão do contrato seria sempre vinculada, carecendo de qualquer discricionariedade por parte de qualquer das entidades envolvidas, pois de acordo com a cláusula 14.4 do contrato de sub-concessão celebrado a 31 de Março de 2006, cada uma das partes tem direito de resgate e de rescisão, em caso de incumprimento do contrato.
    Deixemos por ora e enquanto não se mostrar necessário abordá-la a questão do incumprimento do contrato.
    
    Desde logo se observa, independentemente da intervenção do Senhor Secretário, que a rescisão foi um acto negocial que envolveu apenas a concessionária e a sub-concessionária, evidenciando-se que o acto lesivo foi esta declaração de uma das contratantes. Donde dever ser aí que as atenções se deviam concentrar de forma a impugnar esse acto negocial.
    E, não obstante o entendimento supra vertido, o que bastaria para nos ficarmos por aqui, ao considerarmos que não houve um acto que assuma a natureza de recorrível, não nos eximiremos, contudo a ir mais além de forma a integrar o que se passou no seu contexto real, contratual e legal.
    
    10. Do Conteúdo das Relações Contratuais
    Entre a B e o Território de Macau foi celebrado, em 8 de Março de 1995, um contrato de concessão - vide contrato de concessão já junto aos autos pela requerente.
    A ratio da referida concessão será a de "organizar, manter e explorar, de forma regular e contínua, o serviço público de transportes aéreos de passageiros, bagagem, correio e encomendas postais de e para Macau" (vide Cláusula 3 do Contrato de Concessão).
    Nos termos da Cláusula 27.1 do Contrato de Concessão "A Concessionária pode subconceder, total ou parcialmente, a concessão e celebrar qualquer negócio jurídico de efeito equivalente, desde que para tal obtenha a prévia autorização escrita do Concedente".
    Por sua vez, nos termos da Cláusula 27.2 do Contrato de Concessão "Em caso de subconcessão, a Concessionária mantém os direitos e continua sujeita às obrigações emergente do Contrato de Concessão."
    O contrato de sub-concessão entre a B e a recorrente, em que a primeira, enquanto concessionária, consente em sub-conceder à segunda "os direitos e deveres relativos à oferta e exploração das ligações aéreas de passageiros, bagagem, carga, correio e encomendas postais de e para Macau, no âmbito do Contrato de Concessão" (vide Considerando B do Contrato de Subconcessão), foi celebrado ao abrigo do clausulado já mencionado.
    Consequentemente, e ao contrário do que acontece com outros contratos da mesma natureza, tendo o contrato de subconcessão sido celebrado entre a B e a recorrente, só estas entidades têm o poder de rescindir o mesmo.
    Bastará uma leitura atenta da já supra referida Cláusula 14.4 do contrato de sub-concessão: "Este contrato atribui a cada uma das partes os direitos de resgate e de rescisão, sem prejuízo de outros direitos e compensações contemplados nesta Subconcessão" para concluir que a decisão última sobre a cessação do contrato cabia única e exclusivamente à B, não sendo necessário que essa vontade seja precedida de acto administrativo por parte do Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
    Atentemos no que nos diz a Cláusula 27.2 do contrato de concessão, "Em caso de subconcessão, a Concessionária mantém os direitos e continua sujeita às obrigações emergentes do Contrato de Concessão".
    E, também, na al. d) da Cláusula 2.1 do Contrato de Subconcessão "Nos termos do disposto na cláusula 27.2 do Contrato de Concessão, a B continua sujeita e obrigada ao cumprimento das suas obrigações e é responsável perante o Concedente pelo cumprimento do Contrato".
    
    11. Tais disposições significam que a concedente poderá e deverá continuar a zelar para que o bom cumprimento do serviço público objecto da concessão seja levado a cabo, sendo a única entidade na cadeia jurídica que deverá responder perante o Executivo, nos termos desse mesmo contrato.
    No entanto, independentemente das opiniões ou recomendações que o Governo da RAEM possa ter em relação a este assunto (desde logo permitidas pelas Cláusulas 23. e 27.2 do contrato de concessão), a B é totalmente livre de concordar ou não com o seu conteúdo.
    É que é apenas a B a única entidade responsável por avaliar do cumprimento dos contratos que celebra, nomeadamente, o contrato de sub-concessão, visto que, em última análise, é a B que responderá nos termos do Contrato de Concessão do qual é parte.
    Mas isso não significa que a RAEM ou a entidade recorrida possam legalmente substituir-se à concessionária B nas relações que esta estabeleceu contratualmente, ainda que autorizada pela tutela.
    Aliás, é a própria recorrente que reconhece o que vem sendo dito, ou seja, que cabia apenas à B realizar uma análise independente da situação e que a mesma era a única entidade com poderes para rescisão do contrato (vd. artigo 49.º da petição inicial de recurso contencioso).
    Mas só que não foi isso que se provou como acima dito e ora reafirmado.
    Não obstante esta constatação e tal como a própria entidade recorrida não nega, tinha conhecimento, por via das funções que ocupa e da tutela que exerce sobre a AACM, da forma como a recorrente levava a cabo a gestão do objecto do contrato de sub-concessão, celebrado entre a A e a B.
    E compreende-se que tenha sido perante um cenário desfavorável para a prossecução do interesse público que a entidade recorrida, seriamente preocupada com o rumo dos acontecimentos e o grave impacto que os mesmos tiveram que comunicou oralmente no dia 28 de Março de 2010 com a AACM sobre esse assunto, não sendo de esquecer que de acordo com o disposto na cláusula 4.8 do Contrato de sub-concessão, a ora recorrente tinha obrigações de Serviço Público.
    Importa reter, desde logo, que o contrato de concessão B, de 8/3/95, n.º 19, publicado no BO, II, de 10/5/1995, é muito claro ao dizer que o subconcessionário fica sujeito às mesmas obrigações que a concessionária (cláusula 2ª e 27º) e o concedente pode rescindir nas situações previstas na cláusula 30ª, onde se fala de incumprimento grave das actividades e finalidades do objecto da concessão. Normas e disposições estas que são integradas, no essencial no contrato de sub-concessão, de 31/6/2006
    Esta análise a que neste passo se procede serve apenas para compreender e localizar a intervenção do Senhor Secretário. É bem verdade que, ainda que não tivesse poderes para tal e tivesse dado aquela ordem, tendo sido na sequência do seu acatamento que a B rescindiu o contrato com a A, aí, nesse caso, não haveria dúvida que estaríamos perante um acto definidor e conformador de uma situação jurídica e como tal recorrível, porventura anulável.
    Ora, o ponto está em saber se a entidade recorrida ordenou a rescisão ocorrida entre a B e a A e sobre isso não há prova que aponte nesse sentido.
    
    12. Da competência da entidade recorrida
    Para lá de não se ter provado essa ordem, qua tale, não se deixa de enquadrar a realidade com a constatação de que a rescisão verificada nunca poderia dimanar de um acto da entidade recorrida, pois que a cláusula 21º do aludido contrato prevê que as competências direitos e obrigações atribuídos ou reconhecidos ao concedente sejam exercidos pelo CE, ou por sua delegação, pelo delegado do Governo que deve reger a sua actuação nos termos do DL13/92/M de 2 de Março.
     Neste particular aspecto da competência funcional do recorrido, somos a concordar com o expendido pela recorrente, no sentido de que a entidade recorrida não tem poderes para ordenar a rescisão, o que só reforça o entendimento de que, por isso mesmo, se afasta a convicção de que tenha praticado o acto com o alcance pretendido.
    Na verdade, o pretenso acto cuja eficácia se pretende ver suspensa estaria ferido por incompetência em razão da matéria, já que a emissão da ordem de rescisão nele alegadamente consubstanciada e a rescisão prática do contrato de sub-concessão da recorrente por ele provocada sempre seriam estranhas às atribuições, próprias ou delegadas, do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, ou então excedem essas atribuições ou violam os respectivos limites.
    É que o artigo 6.°, n.º 1., 4), do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, de 20 de Dezembro de 1999, (Organização, competências e funcionamento dos serviços e entidades públicas), determina que o Secretário para os Transportes e Obras Públicas exerce competências na área da governação dos transportes e comunicações e o n.º 2 do mesmo artigo 6.°, conjugado com o n.º 11 do Anexo VI ao dito regulamento, mais determina que, para esse efeito, a AACM fica na dependência do Secretário para as Obras Públicas e Transportes.
    O preceito, porque referido a uma pluralidade de organismos, não define o tipo dessa dependência, admitindo que ela seja hierárquica ou tutelar, conforme aplicável, mas a consulta do Decreto-Lei n.º 10/91/M, de 4 de Fevereiro de 1991, alterado pelo Decreto-Lei n.º 9/95/M, de 6 de Fevereiro de 1995, que cria a AACM com a natureza de instituto público e consagra o seu estatuto, vem esclarecer, no artigo 3.°, n.º 1 deste último, que a dependência é de tipo tutelar.
    Não se encontra na descrição dos poderes de tutela empreendida pelo artigo 3.°, n.º 2, ou em qualquer outra norma do referido decreto-lei ou doutro diploma legal, que o recorrido possa ordenar à AACM que ordene à B ou simplesmente transmita à B a sua ordem de rescisão da sub-concessão da recorrente.
    Isso também não resulta do n.º 1 da Ordem Executiva n.º 124/2009, de 20 de Dezembro de 2009, pelo qual o Chefe do Executivo delegou no Secretário para as Obras Públicas e Transportes as suas competências executivas em relação à área de governação dos transportes e comunicações e à AACM.
    Tão pouco resulta de qualquer cláusula estipulada no Contrato de Concessão, de 8 de Março de 1995, celebrado entre a RAEM e a B e publicado no B.O., II Série, n.º 19, de 10 de Maio de 1995, que tem por objecto a exploração, de forma regular e contínua, do serviço público de transporte aéreo de passageiros, bagagem, carga, correio e encomendas postais de e para Macau e também não é permitido por qualquer cláusula do contrato de sub-concessão, de 31 de Março de 2006, celebrado entre a B e a Recorrente.
    Cada acto administrativo deve exprimir o exercício de uma função, a função administrativa, na qual a entidade pública está investida. Donde a tomada de posição da entidade recorrida, com o alcance pretendido, não poder funcionalmente ser enquadrada como poder de manifestação de um poder de definição jurídica unilateral. 1
    Para além de que do conteúdo dessa comunicação, porventura oral, Cada acto administrativo nada se sabe de concreto.
    
    Assim se conclui que nos termos das relações contratuais estabelecidas (englobando a concessão e a sub-concessão) não cabe na esfera de competência da entidade recorrida praticar qualquer acto de conteúdo imperativo que pudesse conduzir à rescisão do contrato de sub-concessão, o que reforça a nossa convicção e que o recorrido não terá praticado o acto em grosseira violação da sua competência.
    
    
    13. O que importa realçar é que não estamos perante um acto administrativo definitivo e executório válido e eficaz, não sendo possível qualquer recurso contencioso perante os tribunais administrativos.
    A recorribilidade do acto prende-se com a sua definitividade em termos de estabelecimento da definição de uma situação jurídica, isto é, quando constitua uma resolução final da Administração definindo a sua situação jurídica ou a de pessoas que com ela estão, ou pretendem estar, em relação jurídica.
     Pelo que o acto administrativo definitivo há-de ser um acto pela qual a Administração define a sua esfera jurídica ou a esfera de outros sujeitos de direito que com ela estão ou pretendiam estar em relação jurídica, em termos de uma resolução final, no sentido de que com ela se põe termo a um processo gracioso ou a um seu incidente autónomo e de que é a resolução dum órgão de cujos actos não cabe recurso hierárquico necessário.
    
Nos termos do nº 1 do art.º 28º do CPAC, “são actos administrativos contenciosamente recorríveis os que, produzindo efeitos externos, não se encontram sujeitos a impugnação administrativa necessária”.
E só os actos externos, definitivos e executórios são susceptíveis de recurso contencioso.
Os actos são definitivos ou não definitivos consoante se contenham resolução final que define a situação jurídica da pessoa cujo órgão se pronunciou ou de outra que com ela está ou pretende estar em relação administrativa.
E a resolução final é o acto que ponha termo a um processo gracioso ou a um incidente autónomo desse processo e de que não caiba recurso na ordem hierárquica.
Sendo de registar ainda que a definição de situações jurídicas difere da produção de efeitos jurídicos na medida em que se traduz numa decisão que fixa os direitos da Administração ou os dos particulares, ou os respectivos deveres, nas suas relações jurídicas. 2
   Por um lado, enquanto acto de autoridade típico, nunca o mesmo poderia ter sido praticado pela entidade recorrida e sendo definitivo, teríamos forçosamente de estar perante um acto definidor de uma situação jurídica, que seria a conclusão de todo um procedimento administrativo que não existiu na presente situação.
    Nem se pode retirar a sua executoriedade da alusão que a AACM faz no seu ofício a uma manifestação de vontade do Senhor Secretário, o que a recorrente interpreta como uma ordem recebida, não sendo de excluir, para lá da impossibilidade material e formal dessa directiva, que tenha havida excesso de zelo no acatamento do que possa ter sido interpretado como uma ordem.
    Só que, uma vez mais se repete, sem se ter comprovado cabalmente o que foi dito, não é possível aquilatar do conteúdo, valor e eficácia do que quer que tenha sido transmitido à AACM.
    Contrariamente ao que a recorrente alega, não se retira com clareza que haja uma relação directa de causa-efeito entre o acto administrativo do Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes e a rescisão prática da sub-concessão e posterior revogação do Certificado de Operador de Transporte Aéreo. Não se retira com clareza que o Senhor Secretário tenha decidido a rescisão - nem o podia fazer, sendo que não tinha poderes para tal, nem era parte no contrato - quanto à pretensa ordem aludida na carta da B, o que temos é o que consta dessa carta e nada mais.
    Ainda a ausência de um qualquer procedimento que culminaria num poder jurídico de decisão3, reforça a convicção de que o quer que o Senhor Secretário tenha dito mais não se poderá enquadrar do que num acto porventura opinativo, por si só não directamente lesivo e sem virtualidade produtora do efeito rescisório
    
    14. Também não competiria à Autoridade de Aviação Civil de Macau proceder a qualquer rescisão. O que sabemos é que foi a B que rescindiu, mas se o fez em termos de causalidade determinante por ordem recebida do Senhor Secretário não podemos ter a certeza. Quanto ao facto de a Autoridade de Aviação Civil de Macau, ter revogado o Certificado de Operador de Transporte Aéreo, tal mais não é do que uma mera decorrência da rescisão operada entre a B e a A.
    É, aliás, a própria recorrente que reconhece que a rescisão foi deliberada na reunião do Conselho de Administração da B que teve lugar naquele dia 30 de Março (cf. respectiva acta - doc. 5), não se fazendo referência a que a deliberação tivesse decorrido de uma ordem recebida do membro do Governo.
    E o facto alegado desse ponto não constar da agenda, da ordem de trabalhos, vista a previsão do artigo 228.º, n.º 1, d), do Código Comercial, daí se pretendendo retirar a nulidade da deliberação, dir-se-á que tal eventual invalidade respeita a acto que não está impugnado. Realmente, tudo aponta para que o destinatário da impugnação fosse a entidade que rescindiu o contrato de sub-concessão, mas não foi assim que a recorrente configurou a acção e ao optar pelo presente recurso contencioso o que temos de divisar, o que importa focar, é o acto alvo da impugnação, o pretenso acto do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
    
    E não se podendo integrar e configurar o acto cairá por terra, corolariamente, a sua impugnabilidade.
    
    15. Como não faz qualquer sentido, face à sua insustentabilidade probatória, a alegação da recorrente de que tal deliberação sempre seria nula por simulação, por força do disposto no artigo 232.º, n.º 2, e, por remissão, no artigo 288.°, ambos do Código Civil, aplicáveis subsidiariamente nos termos do artigo 4.° do Código Comercial, porque aprovada com o intuito de enganar a recorrente, fazendo crer que aquele órgão rescindia o contrato de sub-concessão por decisão própria, quando a sua vontade real era simplesmente manter obediência à ordem dada pelo Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes e pautar-se pela situação já criada no dia 28 de Março.
    A recorrente não conseguiu demonstrar que não houve uma autonomia de vontade em relação ao Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas e que as causas de rescisão invocadas pela B não existiam, dando-se até conta no seu articulado de uma recusa da recorrente em fornecer dados sobre as suas operações e situação financeira e a sua mora no pagamento das taxas da sub-concessão, tal como previsto no contrato de subconcessão, não sendo razão de impedimento dessa invocação a existência de uma acção - autuada sob o n.º CV3-09-0024-CAO, no 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base - em que a B era autora e exigia o cumprimento de obrigações em mora, sem rescindir nem pedir a declaração de extinção da sub-concessão.
     As palavras do Presidente do Conselho de Administração da B, à saída da falada reunião de 30 de Março, apontam ainda no sentido de razões específicas e autónomas para uma relação difícil, prenunciando a ruptura deliberada, sendo meramente especulativa a tese da recorrente no sentido de ver incompatibilidade entre o afirmado e a rescisão, sendo as afirmações muito claras quanto a um incumprimento, insuficiência e deficiência de exploração por parte da sub-concessionária.
    
    16. Quanto à intervenção da AACM
    O acto da Autoridade de Aviação Civil de Macau, revogando o Certificado de Operador de Transporte Aéreo da recorrente é um acto administrativo que aquela entidade refere, praticado no exercício de poderes de autoridade, ao abrigo do artigo 59.°, n.º 2, do Regulamento de Navegação Aérea de Macau, aprovado pela Ordem Executiva n.º 25/2003, de 14 de Julho de 2003.
    Não deixa ele de estar de fora do objecto do presente recurso, sendo que o pedido de anulação não incide directamente sobre tal acto, ainda que se reconheça que, baseando-se a revogação da licença na rescisão operada com a recorrente, tal acto não deixará de ser imune ao desfecho que o presente recurso contencioso venha a ter.
    
    17. Quanto ao invocado vício de forma por preterição da audiência do interessado.
    Diremos tão somente que não se comprovando o acto com o conteúdo, alcance, efeito pretendido, não faz mais sentido em configurar este vício, pois que se não se releva a intervenção da entidade recorrida em termos determinantes da rescisão, devendo esta ser analisada apenas entre a concessionária e a sub-concessionária, não se colocava a necessidade de ter de ouvir a recorrente sobre a extinção da sua actividade de exploração de transportes aéreos.

    18. Quanto aos incidentes no aeroporto e intervenção das autoridades
Face à posição acima tomada desnecessário será ir mais além e indagar das razões da rescisão por não cobertas pelo pretenso acto impugnando.
    
    O mesmo se passando quanto à alegada violação constante das obrigações de serviço público.
     Tal como desnecessário se mostra abordar a questão relativa à irreparabilidade dos danos aos passageiros, ao aeroporto e à imagem de Macau, pela razão simples de que não sabemos se esse fundamento foi vertido na intervenção da entidade recorrida.
E na medida em que constitua fundamento para a rescisão por parte da B, não é esse o acto impugnando.
    
    19. Ilegitimidade da recorrente para arguir a nulidade da deliberação do Conselho de Administração de 30 de Marco de 2010
    A este respeito, a B alega que a nulidade duma deliberação do órgão de administração duma sociedade comercial por ter sido tomada em matéria não contemplada pela ordem de trabalhos constante da convocatória da reunião é assunto privado da sociedade e só pode ser arguida pelos seus administradores, órgão de fiscalização e sócios.
    Face à posição acima tomada é questão que se mostra prejudicada, pois que o que está em causa não é a deliberação da Administração de uma sociedade, mas sim um acto de um membro do governo.
    Independentemente de saber quais os interesses que são protegidos pela regularidade da deliberação, em conformidade com a ordem de trabalhos , o que, no fundo, se evidencia, é que, ao esgrimir com tal argumento, a recorrente mais não faz do que estar a autonomizar uma deliberação social como autónoma em relação à pretensa ordem do Senhor Secretário, o que configura uma contradição nos próprios termos.
    E quanto ao facto de sustentar com uma simulação, isto é, que a deliberação mais não teria sido do que uma farsa ou simulacro, nada se decidindo ali, afigura-se, no mínimo temerária e não suportada por qualquer elemento probatório tal afirmação, independentemente dos vícios formais que possam ter ocorrido.
    Não assiste, pois, por impertinência e falta de comprovação do alegado razão à recorrente neste particular assunto.
    
     20. Deliberação de 30 de Abril de 2010
    O mesmo se diga quanto à desnecessidade de analisar a regularidade e eficácia desta deliberação.
    A deliberação, na expressão da recorrente, de 30 de Abril de 2010, do Conselho de Administração da B, propõe-se re-ratificar a suposta decisão do seu Presidente, de 28 de Março, já alegadamente ratificada uma primeira vez, em 30 de Março, por esse Conselho.
    Mais uma vez aqui se evidencia uma situação que passa pela relação contratual entre a concessionária e a sub-concessionária, aliás, objecto de acção autónoma, como nos é dado conta, pelo que nos abstemos de tecer considerações sobre tal resolução e na medida em que não interessa para o presente caso, pois que essa deliberação não é objecto directo de anulação no presente recurso.
    Sob pena até de termos de ponderar eventual situação de litispendência.
    
    21. Quanto à violação dos princípios de igualdade, imparcialidade e proporcionalidade
    Mostram-se igualmente prejudicadas estas questões, não sem que se deixe de observar que eventual incumprimento da concessionária não justificaria o incumprimento da sub-concessionária.
    Para além de que não pode haver igualdade na ilicitude decorrente do incumprimento. É, no fundo, o velho princípio de que não há violação do princípio da igualdade na ilegalidade.
    Não nos compete emitir pronúncia sobre a causa de rescisão contratual existente.
    
    Em face do exposto, não se comprovando a existência de um acto passível de recorribilidade, prejudicadas as questões acima referenciadas nos termos vistos, prejudicado ficando tudo o que o pressuponha, a entidade recorrida e as contra interessadas não deixarão de ser absolvidas da instância.
    
    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em absolver a entidade recorrida e as contra-interessadas da instância.
    Custas pela recorrente, com 15 UC de taxa de justiça.
               Macau, 31 de Janeiro de 2013


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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira Mai Man Ieng
(Relator) (Estive presente)
(Magistrado do M.oP.o)

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Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)

1 - Mário Aroso de Almeida, Anulação de Actos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes, Almedina, 202, 90
2 - Marcello Caetano, ob. cit. 443.
3 - Vasco Pereira da Silva, Em Busca do Acto Administrativo Perdido, Almedina, 1996, 569
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403/2010 1/85