Processo n.º 219/2012
(Recurso de Decisões Jurisdicionais em Matéria Administrativa)
Relator: João Gil de Oliveira
Data : 11/Abril/2013
ASSUNTOS:
- Revogação tácita do acto
- Licença industrial
SUMÁRIO:
1. Se uma dada actividade industrial foi alvo da actuação da Administração que determinou a cessação da actividade e objecto de multa por laboração industrial não licenciada, mas posteriormente sobreveio uma licença industrial precária, admitindo todas as partes que se tratou de uma revogação parcial tácita do primitivo acto que fora contenciosamente impugnada e nada se requerendo em termos de consideração dos efeitos autónomos produzidos pela primitiva ordem de encerramento, é de declarar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide naquela parte em que se pedia a anulação do acto de encerramento.
2. Verifica-se o pressuposto da aplicação da multa, se ao tempo da autuação a Companhia em causa laborava sem licença industrial em edifício que ainda não estava licenciado como industrial, não obstante implantado num lote descrito no Registo Predial para fins Industriais.
Relator,
João Gil de Oliveira
Processo n.º 219/2012
(Recurso de decisões jurisdicionais em matéria administrativa)
Data : 11 de Abril de 2013
Recorrente: B Betão, Limitada
Entidade Recorrida: Director dos Serviços de Economia, Substº
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
1. "B BETÃO, LIMITADA", vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo (TAM) que:
- Indeferiu o pedido de suspensão da instância formulado pela recorrente;
- Indeferiu o pedido de inquirição de testemunhas por si formulado;
- Confirmou a decisão do Senhor Director dos Serviços de Economia (DSE) que havia sido impugnada pela recorrente, no sentido de a condenar no pagamento de uma multa no montante de MOP$60.000,00 e na pena de imediata cessação da sua laboração.
- Não se pronunciou quanto ao pedido para que a entidade recorrida fosse condenada a emitir uma licença industrial a favor da recorrente.
2. Para tanto, alegou em síntese conclusiva:
I - Por despacho proferido em 2 de Junho de 2010, o Exmº Senhor Director dos Serviços de Economia, Substituto, aplicou uma multa no valor de MOP$60.000,00 e determinou a imediata cessação de actividade da Recorrente, por funcionamento sem licença industrial na Zona ...... de ...... de Coloane, Lote "XX".
II - Porém, após tal decisão e na pendência da instância de recurso no TAM, a Direcção dos Serviços de Economia (DSE) abriu novo processo para emissão da licença industrial em falta.
III - Presentemente, aguarda-se pela decisão da DSE relativamente a este novo processo de licenciamento.
IV - A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre o mérito e efeitos desta matéria superveniente por ter entendido que era irrelevante.
V - Esta decisão torna-se tanto mais inesperada e difícil de compreender, quanto é verdade que anteriormente o Distinto Tribunal recorrido havia entendido precisamente o oposto a fls. 223 dos autos.
VI - Ora, salvo melhor opinião, a matéria é de todo relevante.
VII - Com efeito, se, como se espera, a DSE decidir favoravelmente, estará a autorizar a Recorrente a exercer a sua actividade, pelo que, parece-nos, a decisão recorrida resultará revogada de facto, quanto à manutenção da medida de cessação de actividade.
VIII - Por outro lado, tendo o tribunal recorrido sancionado a cessação de actividade da Recorrente e vindo a DSE a emitir a licença industrial no processo pendente supra descrito, configurar-se-á uma situação em que a Recorrente encerra a sua actividade para ulteriormente ser autorizada a exercê-la.
IX - Tornando inútil a sentença proferida pelo Distinto Tribunal a quo, quanto a esta parte.
X - Acresce que, a cessação da actividade por parte da Recorrente ditaria a sua falência, tornando inviável a retoma da sua laboração que, eventualmente, vier a ser autorizada por via de decisão favorável no novo processo de licenciamento.
XI - Dir-se-ia que, aqui, seria o ulterior deferimento de licença industrial que se tornaria inútil.
XII - Por todo o exposto, deveria o Distinto Tribunal a quo ter decidido pela suspensão da instância ao abrigo do n° 1 do art. 223° do CPC, conforme se requerera, sob pena de errada (não) aplicação da lei.
XIII - Nas alegações facultativas apresentadas pela Recorrente, esta requereu a inquirição de duas testemunhas relativamente aos factos supervenientes por si deduzidos naquela peça, os quais fundamentavam a suspensão da instância de recurso supra referida.
XIV - Todavia, o Distinto Tribunal a quo indeferiu tal pedido de inquirição de testemunhas por considerar que o mesmo se destinava a fazer prova sobre factos irrelevantes.
XV - Como atrás se alega, tais factos são, no entender da Recorrente, relevantes.
XVI - O indeferimento da inquirição requerida viola as garantias de defesa da Recorrente e o Princípio da investigação, bem como, o Princípio da Legalidade previsto no artigo 3° do Código do Procedimento Administrativo e o Princípio da Imparcialidade previsto no artigo 7° do mesmo código.
XVII - Consequentemente, a douta decisão recorrida padece do vício de violação de lei.
XVIII - O acto administrativo impugnado foi praticado ao abrigo da al. b) do artigo 82° e do artigo 85° do Decreto-Lei n° 11/99/M, de 22 De Março.
XIX - Ora, a decisão ora colocada em crise interpreta este normativo, como vinculando a entidade administrativa ali referida (director da DSE) a determinar sempre a imediata cessação da actividade nos casos de infracções previstas nas als. b) e c) do artigo 82°.
XX - Partindo desta interpretação do citado artigo 85°, a decisão recorrida abstém-se de analisar a imputação ao acto impugnado pela Recorrente, do vício de ilegalidade com base na violação do Princípio da Proporcionalidade, previsto no n.º 2 do artigo 5° do CPA.
XXI - Efectivamente, a Recorrente insurgiu-se contra a medida de cessação da actividade por a considerar desadequada, desajustada e desequilibrada e invocou diversos factos, tendo junto abundante documentação em suporte da sua posição.
XXII - Ora, salvo o devido respeito, uma tal interpretação daquele normativo está em flagrante contradição com a sua própria letra e com o espírito da lei em que ele se insere.
XXIII - Na verdade, a parte final do n° 1 do artigo 85° menciona expressamente que, em vez da imediata cessação da laboração, o director da DSE pode "fixar um prazo findo o qual tal cessação deve ter lugar se, entretanto, a situação constitutiva da infracção não for regularizada" (sic).
XXIV - Aliás, o n° 2 do mesmo normativo vem mesmo referir-se à duração do prazo e aos critérios para decidir da mesma.
XXV - A própria decisão recorrida acaba por reconhecer, em nota de rodapé, que a entidade administrativa tem à sua discrição escolher a imediata cessação ou a fixação de um prazo para regularização - o que contradiz frontalmente a interpretação do preceito que adopta.
XXVI - Mas acrescenta, na mesma nota, que a Recorrente não invoca tal situação, pelo que não se debruça sobre tal possibilidade.
XXVII - Salvo o devido respeito, a verdade é que a Recorrente a invoca (cfr. Conclusão 28ª do recurso contencioso e Conclusão 28ª das alegações facultativas).
XXVIII - O referido artigo 85° consagra, pois, expressamente, poderes discricionários e não, poderes vinculados.
XXIX - É aliás a filosofia subjacente a todo o diploma (DL 11/99/M, de 22/03,), sublinhada na parte final do seu preâmbulo.
XXX - Deste modo, salvo melhor opinião, a douta decisão recorrida incorre no vício de errada aplicação da lei, a qual teve ainda por consequência a não apreciação da violação do Princípio da Proporcionalidade imputada pela Recorrente ao acto administrativo por si impugnado, com a consequente omissão de pronúncia, prevista na 1ª parte da al. d) do n° 1 do artigo 571º do CPC, aplicável ex vi dos artigos 1º e 149º do CPAC, o que acarreta a sua nulidade.
XXXI - A Recorrente invocou que o acto por si impugnado no tribunal recorrido padecia de erro nos pressupostos de facto que haviam ditado a decisão.
XXXII - A douta decisão recorrida considerou ser irrelevante pronunciar-se porque apenas interessaria apurar se a Recorrente possuía ou não licença industrial para exercer a sua actividade no momento em que foi alvo das inspecções realizadas pela DSE.
XXXIII - A Recorrente considera que o momento relevante não é o das inspecções, mas o da prática do acto impugnado.
XXXIV - A Recorrente alegou factos supervenientes demonstrativos de que ocorreu uma alteração essencial nos pressupostos de facto em que se baseavam os resultados daquelas inspecções e que a DSE tinha conhecimento desta alteração quando praticou o acto impugnado.
XXXV - Não tendo sido valorados os novos factos na altura em que praticou o acto impugnado, tal acto padece do vício de violação de lei por erro de facto quanto aos pressupostos da decisão.
XXXVI - Salvo melhor opinião, o Distinto Tribunal a quo deveria ter apreciado tais factos e revogado o acto impugnado.
XXXVII - Não o tendo feito, incorre no mesmo vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, de que padece o acto impugnado e, por outro lado, tal erro teve por consequência o vício de omissão de pronúncia, previsto na 1ª parte da al. d) do n° 1 do artigo 571º do CPC, aplicável ex vi dos artigos 1º e 149º do CPAC.
XXXVIII - Apesar de documentalmente provado que o terreno em questão se encontra registado na Conservatória do Registo Predial como destinado a fins industriais e de, na sua fundamentação, a douta sentença recorrida admitir que as instalações da Recorrente nesse terreno sitas preenchem o conceito legal de “edifício industrial” constante da al. d) do artigo 2° do DL 11/99/M,
XXXIX - a douta decisão recorrida entende que apenas releva a existência ou inexistência de licença de utilização emitida pela DSSOPT definindo o destino do terreno, ao tempo das inspecções realizadas pela DSE em 11/09/08, 03/12/08 e 11/12/09.
XL - Inexistindo acto da administração que altere o fim a que se destina este terreno descrito na CRP, tal fim mantém-se, para todos os efeitos legais.
XLI - De qualquer modo, mesmo que assim se não entenda, afigura-se à Recorrente que à douta sentença recorrida não assiste razão.
XLII - Efectivamente, o momento que releva não é o daquelas inspecções, mas o da prática do acto administrativo impugnado.
XLII - Ora, conforme resulta dos factos dados por provados, a Recorrente requerera à DSSOPT a emissão daquela licença em 28/02/2007 e aquela entidade veio a legalizar as instalações e a sancionar a laboração da Recorrente no terreno em causa em 06/03/2009 (cfr. Factos n.ºs 3 e 28), isto é, cerca de um ano e 3 meses antes da prática do acto impugnado.
XLIII - Pelo que, ao decidirem, quer a Administração, quer o Distinto Tribunal recorrido, deveriam ter considerado que o terreno se destinava a fins industriais.
XLIV - E, logo por aqui, ressalta que a douta sentença recorrida padece do mesmo erro nos pressupostos de facto que o aa impugnado, com o inerente vício de violação de lei.
XLV - Acresce que, as sanções aplicadas pelo acto impugnado estão reservadas para os casos de terrenos não afectos a fins industriais.
XLVI - A DSE fundamentou a sua aplicação precisamente na al. b) do artigo 82° do DL 11/99/M, de 22-3, a qual apenas abrange terrenos não industriais.
XLVII - Todavia, no momento em que foi praticado o acto impugnado, a DSSOPT já havia classificado o terreno em causa como industrial.
XLVIII - Donde que, salvo diversa opinião, a douta sentença recorrida incorre numa incorrecta aplicação do direito.
XLIX - O terreno em causa sempre se destinou a fins industriais e, como tal, as sanções previstas na al. b) do artigo 82° e no artigo 85° do mencionado DL 11/99/M, não poderiam ser aplicadas no caso vertente.
L - A sua efectiva aplicação deve, pois, ser revogada por não se encontrarem reunidos os necessários pressupostos de facto e de direito.
Disposições violadas: Artigos 223°/1 e 571°/1/al. d), 1ª parte, ambos do Código de Processo Civil; Princípio da Investigação, artigos 3º, 5° / 2 e 7 ° do Código do Procedimento Administrativo; e, artigos 82° / al. b) e 85° do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março.
Nestes termos requer seja revogada a douta sentença recorrida e em consequência seja anulado o acto administrativo impugnado.
Para a hipótese de assim se não entender, requer-se seja a mesma sentença anulada e determinada a suspensão da instância até decisão de emissão ou não de licença industrial no processo administrativo que para este efeito está em curso na DSE.
Subsidiariamente, se assim se não entender, seja ordenado o reenvio dos autos ao tribunal recorrido para conhecimento das questões de que não conheceu e que deveria ter conhecido, invocadas pela recorrente.
3. Não foram oferecidas contra alegações.
4. O Exmo Senhor Procurador Adjunto emite o seguinte douto parecer:
Se bem atentamos no alegado pela recorrente, prendem-se grande parte dos vícios assacados ao acto (não devida pronúncia sobre a requerida suspensão da instância, falta de audição de testemunhas e erro nos pressupostos de facto) com a pretensa ocorrência de “factos supervenientes” decorrentes da circunstância de, na pendência da instância do recurso contencioso, a recorrente ter procedido a algumas alterações e a DSE ter aberto novo processo para a emissão de licença industrial em falta, aguardando-se a decisão relativa a este novo processo de licenciamento.
Como é bom de ver, tal tipo de argumentação carece de qualquer fundamento.
O objecto do recurso contencioso é o despacho de 2/6/10 do director dos Serviços de Economia que, em processo de transgressão e anuindo a relatório final do inspector, determinou a aplicação à recorrente de uma multa de MOP 60.000 e ordenou a imediata cessação da sua actividade industrial, por a mesma exercer a actividade de produção de betão sem título de licença industrial, tudo nos termos dos artigos 9º, n.º 1 e 85º, nº 1, ambos do Dec Lei 11/99/M de 22/3.
Nestes parâmetros, resulta evidente que, mesmo dando-se de barato que, posteriormente, se tenham efectuado alterações, se tenha iniciado novo procedimento com vista ao pretendido licenciamento industrial e se aguarde decisão respectiva, tal matéria em nada contende nem poderá contender com a validade intrínseca do acto sob escrutínio, não se antevendo como possível a ocorrência de inutilidade pelos motivos invocados.
Daí que bem tenha decidido o julgador "a quo" ao entender que mesmo que a recorrente venha a obter o almejado licenciamento, a eficácia do mesmo não poderá retroagir à ocorrência da infracção, não inibindo a consumação da mesma e não detendo a virtualidade de a revogar, revelando-se o externado nesse douto aresto pronúncia suficiente e clara sobre a matéria e a partir da qual bem se vê não fazer qualquer sentido a pretendida suspensão da instância por pretensa ocorrência de factos supervenientes, como nenhum sentido faria a pretendida inquirição de testemunhas, precisamente sobre esses mesmos factos, revelando-se, a esse propósito, caricato esgrimir com pretensa ofensa da legalidade, imparcialidade e garantias de defesa.
De igual forma, se mostra irrelevante que, eventualmente, após a detecção da infracção e porventura antes da prática do acto sancionatório, a recorrente tenha procedido, ao que a própria cognomina de "alteração essencial dos pressupostos de facto" em que se basearam os resultados da inspecção da DSE : os pressupostos factuais em que o acto se estribou são os constantes do auto de transgressão e respectivo relatório e esses - essencialmente, que a recorrente exercia a actividade de produção de betão sem o necessário licenciamento industrial - correspondem à realidade e não são, verdadeiramente, atacados, revelando-se inócua a esgrima, nos parâmetros referidos, com a possibilidade "técnica" para tal licenciamento.
As possíveis alterações a que a recorrente alude, podendo relevar face ao posterior processo de licenciamento, não tinham que ser contempladas no acto sancionatório proferido.
Finalmente, merece-nos algumas reservas o entendimento assumido pelo julgador relativamente à natureza do poder conferido à luz do na 1 do art° 85º do Dec Lei 11/99/M : pela mera leitura do texto respectivo, facilmente se apreende que a Administração se não encontrava vinculada à determinação da imediata cessação da laboração por parte da recorrente, podendo ter fixado um prazo findo o qual tal cessação deveria ter lugar se, entretanto, a situação constitutiva da infracção não fosse regularizada e isto, independentemente do argumentado a esse propósito pela recorrente, já em sede do recurso contencioso.
De modo que, a problemática da proporcionalidade da medida poderia, de facto, colocar-se.
Mas, a verdade é que o julgador não deixou de se pronunciar sobre a mesma, ao consignar, nomeadamente, que " ... o regime de licença industrial visa garantir que a Administração Pública possa proceder à apreciação prévia duma determinada actividade, evitando, sempre que possível, a incompatibilidade entre a actividade em causa e os interesses públicos, pelo que, nos termos da lei, a DSE não pode deixar de sancionar a recorrente pelo exercício da actividade industrial, sem licença industrial, nem pode deixar de rectificar activamente a infracção, caso contrário torna-se impossível a concretização da pretensão do legislador, no sentido de proteger os interesses públicos por meio do regime de licença especial", fazendo ainda questão de acrescentar que, não obstante ter sido notificada por várias vezes pela DSE no sentido da imediata cessação da laboração, a recorrente "... nunca respeitou o conselho da DSE, mantendo-se o exercício de actividade", tudo a configurar, pois, a adequação e necessidade da medida tomada, asserção que, de resto colhe validade nos elementos carreados para os autos e respectivo instrutor.
Tudo razões por que, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, somos a entender não merecer provimento o presente recurso.
5. Sobrevindo a emissão de uma licença industrial precária e tendo o Digno MP suscitado a possibilidade de desistência de recurso face a uma revogação tácita do acto, a recorrente pronunciou-se nos seguintes termos:
"B BETÃO, LIMITADA", Recorrente no processo supra epigrafado e aí melhor identificada, notificada da douta promoção dactilografada do Exmº Magistrado do Ministério Público de 13/09/2012, vem expor e requerer o seguinte:
1 - Na douta promoção supra referida, considera-se que não existe base legal para o pedido de suspensão da instância formulado pela Recorrente e, em consequência, sugere-se que esta venha "esclarecer se pretende, face à licença provisória emitida desistir ou não do meio processual que accionou".
2 - Na sequência do que, o Meritíssimo Juiz-Relator, proferiu o despacho de fls. 381, ordenando a notificação da Recorrente para se pronunciar nos termos promovidos.
3 - Salvo o devido respeito, apesar de o presente recurso se tratar de um recurso jurisdicional, entendemos que o pedido de suspensão da instância tem base legal.
4 - A base legal resulta da aplicação subsidiária do n.º 1 do artigo 223° do Código de Processo Civil (aplicável ex vi do artigo 1° do Código do Procedimento Administrativo Contencioso - CPAC) .
5 - Com efeito, nos termos do artigo 1º do CPAC, o processo do contencioso administrativo rege-se subsidiariamente pela lei de processo civil.
6 - Por seu turno, o n.° 1 do artigo 223° do Código de Processo Civil, dispõe que o tribunal pode suspender a instância sempre que surja um motivo justificado.
7 - In casu, a emissão de licença industrial provisória é, parece-nos, um motivo plenamente justificativo da suspensão da instância.
8 - Já quanto à competência para o ordenar da suspensão, resulta a mesma do disposto na al. d) do n.° 1 do artigo 15º do CPAC, nos termos da qual, o Meritíssimo Juiz-Relator tem competência para decidir a suspensão da instância.
9 - Assim, salvo melhor opinião, pode a presente instância resultar suspensa por decisão de V. Exa., nos termos e pelas razões constantes do respectivo requerimento da Recorrente, onde a mesma vem pedida e sobre o qual se debruçou a douta promoção supra referida.
10 - Questão conexa é a de se saber se emissão da licença industrial provisória vem revogar a decisão recorrida.
11 - Parece-nos que sim.
12 - Com efeito, já esse entendimento foi defendido pela Recorrente nos nºs. 4 a 27 e nas conclusões I a XII das suas alegações de Recurso, mais concretamente, no n.° 16 e na Conclusão VII da referida peça processual.
13 - Se esse Venerando Tribunal entender, como nós, que a decisão recorrida se encontra tacitamente revogada pela prática, pelo mesmo autor, do acto administrativo consubstanciado na emissão de licença industrial provisória a favor da Recorrente, então, naturalmente, o pedido de suspensão da instância resulta prejudicado.
14 - Não podemos, todavia, assumir, com toda a certeza, se foi por esta razão, que a douta promoção supra referida pretende que a Recorrente esclareça se pretende ou não desistir do recurso que interpôs.
15 - Não podemos, tão-pouco, ter a certeza de que ao mencionar "meio processual que accionou", a douta promoção se refere ao recurso propriamente dito, ou apenas ao pedido de suspensão de instância.
16 - Aliás, no nosso modesto entendimento, nesta última hipótese, incumbiria a esse Venerando Tribunal apreciar oficiosamente essa questão superveniente, uma vez que decidiria o caso vertente, sem necessidade de conhecimento da matéria de recurso.
17 - Deste modo, a presente resposta da Recorrente tem que abranger as várias interpretações possíveis da douta promoção em causa.
18 - Assim, se a douta promoção pretende que a Recorrente esclareça se pretende desistir do pedido de suspensão da instância, por falta de base legal, vem esta esclarecer que, na sua opinião, tal base legal pode ser encontrada nos normativos referidos nos nºs. 1 a 9 que precedem.
19 - Se a douta promoção pretende que a Recorrente esclareça se desiste do recurso interposto porque considera que a decisão recorrida se encontra revogada pelo acto administrativo que deferiu o pedido de emissão de licença industrial provisória, então a Recorrente considera que a via mais correcta não é a desistência do recurso, mas a apreciação oficiosa dessa questão de direito por esse Venerando Tribunal ad quem, seguida da respectiva decisão.
20 - Consequentemente, para a hipótese de o entendimento vertido na douta promoção contemplar a superveniência da revogação da decisão recorrida, a Recorrente de novo requer a V. Exa., que seja, tal revogação, declarada por esse Venerando Tribunal.
Nestes termos e nos mais de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Exa., requer-se seja declarada revogada a decisão recorrida ou, se assim se não entender, que seja ordenada a suspensão da presente instância de recurso, nos termos já requeridos.”
6. A entidade recorrida pronuncia-se no sentido de ter havido uma revogação do acto, mas tão somente na parte respeitante à cessação da actividade.
7. O Relator pronunciou-se no sentido de o recurso dever prosseguir apenas para conhecimento da multa nos termos do despacho de fls 406.
8. Oportunamente foram colhidos os vistos legais.
II - FACTOS
Vêm provados os factos seguintes:
“Segundo as informações constantes dos autos e do processo administrativo, este Tribunal deu como provados os seguintes factos relevantes para o julgamento:
1. A recorrente “Companhia de betão “B”, Lda. (B混凝土有限公司)”, matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o n.º 24110 SO, com sede na RUA ......, LOTE XX, NA ILHA DE COLOANE, EM MACAU, iniciou a sua actividade em 12 de Abril de 2006 (vide registo comercial de fls. 18 a 20 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
2. Em 1 de Abril de 2006, a Companhia de Investimento e Fomento Predial “C”, Limitada (C置業投資有限公司) e a recorrente celebraram um contrato de arrendamento, e, a partir daquela data, a recorrente arrendou o lote XX, sito em Coloane, na Rua ......, no Parque ...... (doravante designado simplesmente por “XX”), para desenvolver a actividade de mistura de betão, num período de 10 anos (vide fls. 46 dos autos).
3. Em 15 de Fevereiro de 2007, a recorrente apresentou o requerimento à D.S.S.O.P.T., pedindo a legalização do projecto de obras do lote “XX” (vide fls. 47 dos autos e fls. 19 e 145 do processo administrativo).
4. Em 11 de Setembro de 2008, o inspector da D.S.E. deslocou-se ao referido lote “XX” para efectuar a fiscalização, onde detectou que a recorrente estava a exercer a actividade de produção, bem como encontrou lá duas linhas de produção de betão, 3 escavadoras e 11 trabalhadores da área de produção (vide fls. 10 do processo administrativo).
5. A recorrente não tinha nenhum documento ou licença industrial do referido lote “XX” (vide fls. 10 do processo administrativo).
6. Em 3 de Outubro de 2008, o inspector da D.S.E. elaborou o relatório, considerando o seguinte: a recorrente violou o disposto no n.º 1 do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, por ter exercido, sem licença industrial emitida pela D.S.E., a actividade de produção de betão no lote “XX”, e, nos termos do art.º 82º, al. b) do mesmo Decreto-Lei, é sancionado com multa de 30.000,00 a 200.000,00 patacas, o infractor de pessoa colectiva, o exercício de actividade industrial, sem título de licença válido, em local não situado em edifício industrial (vide fls. 14 do processo administrativo).
7. Perante o relatório supramencionado, o Director dos Serviços de Economia, substituto, proferiu a decisão em 10 de Outubro de 2008, ordenando à recorrente a imediata cessação de actividade (vide fls. 15 do processo administrativo).
8. Em 20 de Outubro de 2008, a D.S.E. notificou a recorrente através do ofício n.º 040491/2008/DIAE/DIIC-2ªB de que necessitasse de cessar imediatamente a actividade de produção praticada no lote “XX” e o seu incumprimento, nos termos do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, daria lugar à instauração do processo de sanção administrativa (vide fls. 16 e 17 do processo administrativo).
9. Em 23 de Outubro de 2008, a recorrente respondeu à D.S.E., referindo que não foi dolosa a violação da disposição (vide fls. 18 do processo administrativo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
10. Em 28 de Outubro de 2008, face à resposta da recorrente, o inspector da D.S.E. elaborou o relatório, concluindo o seguinte: “Embora a aludida Companhia tivesse deduzido o requerimento à D.S.S.O.P.T., exerceu actividade de produção, sem autorização da utilização do referido terreno, tornou-se uma violação do Decreto-Lei n.º 11/99/M. A Companhia referiu que a cessação de actividade iria prejudicar evidentemente os seus trabalhadores e as obras em curso. Contudo, mesmo assim, esta não podia continuar a conduta infractora. Deste modo, propõe-se a manutenção da notificação por ofício, ordenando à Companhia a imediata cessação da actividade de produção praticada na Zona ...... de ......, lote XX, em Coloane, e o seu incumprimento, nos termos do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, poderá dar lugar à instauração do processo de sanção administrativa. No caso da violação do disposto no n.º 1 do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, nos termos do art.º 82º, al. b) do mesmo Decreto-Lei, é sancionado com multa de 30.000,00 a 200.000,00 patacas, o infractor de pessoa colectiva, o exercício de actividade industrial, sem título de licença válido, em local não situado em edifício industrial.” (vide fls. 20 do processo administrativo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
11. Em 7 de Novembro de 2008, o Subdirector dos serviços de economia, substituto, concordou com a proposta formulada no relatório supramencionado e decidiu proceder novamente à fiscalização. Caso a recorrente continuasse o exercício de actividade, resultaria a imediata instauração do processo de sanção administrativa. Esta proposta do Subdirector dos serviços de economia, substituto, foi, posteriormente, admitida pelo Director dos serviços de economia, substituto (vide fls. 20v. do processo administrativo).
12. Em 3 de Dezembro de 2008, para executar o despacho do Director dos serviços de economia, substituto, o inspector da D.S.E. deslocou-se ao referido lote “XX” para efectuar a inspecção, onde detectou que a recorrente estava a exercer a actividade de produção, bem como encontrou lá duas linhas de produção de betão, 3 escavadoras, 6 trabalhadores da repartição de produção, 20 condutores das auto-betoneiras, 2 condutores das escavadoras e 2 auxiliares da fábrica. A recorrente não tinha a licença industrial do lote “XX”. Na dada altura, o inspector notificou verbalmente a recorrente de que necessitasse de cessar imediatamente a actividade de produção, e que só seria permitido o exercício da actividade de produção com a obtenção de licença legal (vide fls. 21 a 24 do processo administrativo).
13. Em 8 de Dezembro de 2008, a D.S.E. notificou a recorrente através do ofício n.º 040597/2008/DIAE/DIIC-2ªB de que necessitasse de cessar imediatamente a actividade de produção praticada no lote “XX” e o seu incumprimento, nos termos do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, daria lugar à instauração do processo de sanção administrativa (vide fls. 26 e 33 do processo administrativo).
14. Em 11 de Dezembro de 2008, o inspector da D.S.E. voltou a efectuar inspecção no lote “XX”, onde detectou que a recorrente estava a exercer a actividade de produção, bem como encontrou lá duas linhas de produção de betão, 3 escavadoras, 1 trabalhador que estava a escavar terras com escavadora e 1 trabalhador que estava a conduzir uma auto-betoneira, parando ao pé da linha de produção para introduzir o betão. O inspector voltou a notificar verbalmente a recorrente de que necessitasse de cessar imediatamente a actividade de produção, e que só seria permitido o exercício da actividade de produção com a obtenção de licença legal (vide fls. 27 a 30 do processo administrativo).
15. Em 16 de Dezembro de 2008, o Subdirector dos serviços de economia, substituto, decidiu instaurar o processo de sanção administrativa contra a recorrente (vide fls. 31 e 31v. do processo administrativo).
16. Em 18 de Dezembro de 2008, a D.S.E. notificou a recorrente através do ofício n.º 040620/2008/DIAE/DIIC/2B de que a mesma foi suspeita da infracção do disposto no n.º 1 do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, por ter praticado a actividade de produção de betão, sem título da licença industrial, pelo que a D.S.E. instaurou o processo de sanção administrativa n.º 85/2008/DIAE/DIIC/2ªB (vide fls. 32 e 34 do processo administrativo).
17. Em 19 de Dezembro de 2008, a recorrente recebeu o supramencionado ofício (vide fls. 34 do processo administrativo).
18. No mesmo dia, a recorrente reafirmou perante a D.S.S.O.P.T. o pedido da legalização de obras que tinha deduzido em 15 de Fevereiro de 2007 (vide fls. 48 a 50 dos autos).
19. Em 23 de Dezembro de 2008, a recorrente apresentou o requerimento da licença industrial provisória do lote “XX” à D.S.E. (vide fls. 51 dos autos).
20. Em 31 de Dezembro de 2008, por meio do ofício n.º 82086/DLIC, a D.S.E. pediu à recorrente que apresentasse a licença de utilização de edificação legalizada aprovada pela D.S.S.O.P.T. e a licença de ocupação provisória válida emitida pela Comissão de Terras, para efeito de prosseguimento do pedido de licença provisória, se não resultaria o termo do processo de requerimento ao abrigo do art.º 20º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 11/99/M (vide fls. 52 dos autos).
21. Em 8 de Janeiro de 2009, por recorrente ser suspeita da infracção do disposto no n.º 1 do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, a D.S.E. decidiu notificá-la de que deduzisse oposição escrita no prazo de 10 dias (vide fls. 35 a 36v. do processo administrativo).
22. Em 9 de Janeiro de 2009, a recorrente solicitou à D.S.E. que suspendesse o processo de sanção administrativa, contudo, a D.S.E. indeferiu a referida solicitação (vide fls. 37 e 37v. do processo administrativo).
23. Em 13 de Janeiro de 2009, a D.S.E. notificou a recorrente através do ofício n.º 040087/2009/DIAE/DIIC/2B de que pudesse apresentar àquela Direcção a defesa escrita no prazo de 10 dias úteis, contados a partir da notificação (vide fls. 38 e 39 do processo administrativo).
24. Em 14 de Janeiro de 2009, a recorrente recebeu o supramencionado ofício (vide fls. 39 do processo administrativo).
25. No mesmo dia, o Director dos serviços de economia, substituto, proferiu o despacho no processo de sanção administrativa n.º 104/2007/DIAE/DIIC/2ªB que determinou a aplicação da multa de MOP30.000,00 à recorrente, uma vez que a mesma violou o disposto no n.º 1 do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, por ter exercido actividade industrial, sem título da licença industrial, no lote XY, sito em Coloane, no Parque ...... (doravante designado simplesmente por “XY”), e, nos termos do art.º 85º, n.º 1 do mesmo Decreto-Lei, notificou-a de que precisasse de cessar imediatamente a actividade industrial exercida no lote “XY” (vide fls. 66 a 67 do processo administrativo).
26. A recorrente pagou a referida multa, no montante de MOP30.000,00 (vide fls. 66v. do processo administrativo).
27. Em 23 de Janeiro de 2009, a recorrente apresentou a defesa escrita à D.S.E. (vide fls. 40 a 53v. do processo administrativo).
28. Em 13 de Março de 2009, a D.S.S.O.P.T. notificou a recorrente através do ofício n.º 2366/DURDEP/2009 de que, por força do despacho de 6 de Março de 2009 do Director daqueles serviços, foi aprovado o projecto de obras do estabelecimento de mistura de betão, sito no lote “XX”. Mais, a D.S.S.O.P.T. notificou-a de que as respectivas obras só seriam legalizadas com o pagamento de impostos articulados na guia de pagamento de impostos n.º 143/2009/DUR dentro do prazo de 15 dias, contados a partir da recepção do aludido ofício (vide fls. 54 a 55 dos autos e fls. 152 a 153 do processo administrativo).
29. A recorrente pagou os referidos impostos em 19 de Março de 2009 (vide fls. 64 a 65 dos autos e fls. 162 a 163 do processo administrativo).
30. Em 16 de Abril de 2009, por meio do ofício n.º 80582/DLIC, a D.S.E. pediu novamente à recorrente que apresentasse a licença de utilização de edificação legalizada aprovada pela D.S.S.O.P.T. e a licença de ocupação provisória válida emitida pela Comissão de Terras, para efeito de prosseguimento do pedido de licença provisória, se não, nos termos do art.º 9º, n.º 1 e art.º 82º, al. b) do Decreto-Lei n.º 11/99/M, seria a mesma sancionada (vide fls. 53 dos autos).
31. Em 2 de Junho de 2010, o Director dos serviços de economia, substituto, proferiu o despacho que concordou com o teor do relatório final do inspector, bem como determinou a aplicação da multa de MOP60.000,00 à recorrente, uma vez que a mesma violou o disposto no n.º 1 do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, por ter exercido actividade de produção de betão, sem título da licença industrial, no lote “XX”, e, nos termos do art.º 85º, n.º 1 do mesmo Decreto-Lei, ordenou-lhe a imediata cessação da actividade industrial exercida no local em apreço (vide fls. 22 a 24 dos autos e fls. 68 a 70 do processo administrativo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
32. Em 8 de Junho de 2010, a D.S.E. notificou a recorrente através da notificação n.º 16/2010 da decisão supramencionada (vide fls. 21 e 21v. dos autos e fls. 71 a 72 do processo administrativo).
33. Em 8 de Julho de 2010, a D.S.S.O.P.T. remeteu à recorrente o ofício n.º 8347/DURDEP/2010 (vide fls. 144 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
34. Em 12 de Julho de 2010, a recorrente, por meio do seu mandatário judicial, interpôs o presente recurso contencioso para este Tribunal.
35. Em 13 de Julho de 2010, a D.S.E. notificou a recorrente através do ofício n.º 80871/DLIC-CV de que, nos termos do art.º 33º do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, a Comissão de Vistoria da D.S.E. iria realizar a vistoria inicial no lote “XX”, no dia 20 de Julho de 2010, das 09H45 às 12H30 (vide fls. 175 dos autos).”
III - FUNDAMENTOS
1. O acto praticado sob escrutínio, objecto do recurso contencioso, sendo a sentença proferida objecto de recurso jurisdicional desdobra-se em duas vertentes: aplicação de uma multa de MOP60.000,00 e a ordenação da imediata cessação da actividade industrial, solicitando a anulação do acto recorrido e a emissão da licença industrial pela entidade recorrida.
2. Da pretensa suspensão da instância
2.1. Pretendia a recorrente, na pendência do processo, face a uma vistoria por parte dos Serviços e na perspectiva da obtenção de uma licença, a suspensão da instância recursória.
Após a realização da vistoria inicial, a Comissão de Vistoria não emitiu qualquer proposta de decisão, positiva ou negativa, mas apenas pedidos de documentação suplementar e sugestões técnicas de pequena relevância, o que terá sido satisfeito pela recorrente.
A verificar-se o licenciamento industrial que estaria em curso, tal decisão resultaria numa revogação de facto, pelo menos, quanto à medida de cessação de laboração.
Invocando catastróficos prejuízos, que não deixou de concretizar, a recorrente, face ao encerramento decretado, justifica assim o pedido de suspensão.
2.2. Não tem razão a recorrente.
Mesmo que estivesse em curso um novo processo de licenciamento industrial e se aguardasse a decisão respectiva, tal matéria em nada contenderia com a validade intrínseca do acto sob escrutínio, não se antevendo como possível a ocorrência de inutilidade.
Se não vejamos.
Desde logo não se alcança em que medida haveria interesse na suspensão do processo já que tal suspensão não acarretaria a suspensão da eficácia do acto. A multa e a ordem de encerramento permaneciam erectas e o protelamento da decisão poderia até trazer maiores prejuízos, bastando imaginar que a recorrente tivesse ganho de causa.
Depois, nada nos diz que o novo procedimento de licenciamento fizesse alterar o quadro do circunstancialismo que esteve subjacente à decisão administrativa tomada ou que se viesse a considerar que daí resultava uma base errada na decisão, nada que não pudesse ser averiguado no recurso em tramitação.
Acresce que não havia garantias de que o novo procedimento administrativo chegasse ao fim ou que fosse tomada uma decisão que abalasse ou pusesse em causa a anterior decisão tomada.
Tudo a justificar o acerto da decisão tomada de não suspensão da instância, enquanto se entendeu que mesmo que a recorrente viesse a obter o pretendido licenciamento, a eficácia do mesmo não poderia retroagir à ocorrência da infracção, não impedindo a consumação da mesma e não detendo a virtualidade de a revogar.
2.3. De todo o modo, se estas razões não fossem suficientes, o certo é que a questão, neste momento está ultrapassada e mostra-se prejudicado o seu conhecimento, na medida em que, agora sim, sobreveio, uma licença precária de licenciamento industrial (n.º 11/2012), o que enquadra a laboração que a recorrente vem desenvolvendo. Assim, na medida em que se autoriza a laboração, não mais faz sentido ir apreciar se a instância nesta lide, seja na fase do recurso contencioso, seja na fase do recurso jurisdicional, deve ou não ser suspensa, até porque o acto, na vertente em que pretendia a sua anulação, no segmento da ordem de encerramento, já não tem qualquer utilidade. A Administração autorizou a actividade industrial e mesmo que se trate de uma licença precária não nos esqueçamos que o que está em causa é um acto que se traduz num encerramento. Ora, a autorização de laboração, mesmo precária, é incompatível com o encerramento e daí que seja a própria entidade recorrida que vem reconhecer que nessa parte se operou até uma revogação do acto praticado (cfr. fls. 401). O que se pretende é a anulação do acto que determinou o encerramento, facto esse que deixa já de ter interesse apreciar, não só porque se permite agora a laboração, como não se invocam razões que ditem o seu conhecimento, nomeadamente pela produção de efeitos autónomos já produzidos e/ou prejuízos advindos de uma paralisação que tivesse ocorrido, sendo que nada se nos dá conta nesse sentido, para mais quando tanto a recorrente, como o MP, como a entidade recorrida todos estão de acordo que sobreveio uma revogação do acto na parte que ditou a cessação da actividade.
Acontece que perante essa configuração, de revogação parcial do acto, donde resulta por força da lei a extinção da instância, nos termos do artigo 87º, a) do CPAC, prevenindo eventual necessidade de prosseguimento dos autos, face ao disposto no artigo 80º do CPAC, o certo é que nada se requereu nesse sentido, tendo tido todas as partes oportunidade de se pronunciarem sobre essa possibilidade, quer face às posições das contra partes, quer face ao despacho do Relator proferido a fls 406.
Embora não seja a caracterização jurídica do acto sobrevindo, feita pela Administração, que há-de conformar a natureza do mesmo retira-se que, independentemente dessa caracterização, este novo facto gera por si uma inutilidade superveniente da lide, ao abrigo do disposto no artigo 229º, e) do CPC, ex vi art. 1º do CPC, na parte do acto em que se determinava o encerramento da laboração industrial e como está bem de ver prejudica igualmente o conhecimento de uma alegada e nova suspensão de instância que a recorrente pretende já nesta sede.
Não se vê, a partir do momento em que a fábrica pode estar aberta, que interesse há em discutir a anulação do acto que a mandou fechar, a não ser para eventual prosseguimento, em vista dos efeitos já produzidos, face ao disposto no artigo 80º, n.º 2 do CPAC, mas nesse caso a recorrente não devia deixar de tomar posição sobre esse interesse, o que não se verificou. O que fez foi continuar a pugnar por uma suspensão de instância que não tem fundamento, como se viu.
2.4. Na parte respeitante à multa também não se acolhem as razões da recorrente pelas razões já acima aduzidas, não fazendo prever que o processo de licenciamento porventura não precário faça de algum modo inverter os pressupostos em que a Administração se baseou para sancionar a recorrente ou que no processo se não possa produzir prova ou aí se possam carrear elementos que se mostrem indispensáveis para um bom julgamento da causa.
Nem se argumente com o facto de a Mma Juíza ter solicitado elementos sobre o estado do licenciamento. Nada disso é revelador de uma intenção de suspensão, antes o podendo ser de uma inutilidade superveniente, tal como agora se julga.
Assim sendo, julgar-se-á extinta a instância por inutilidade superveniente da lide na parte respeitante à ordem de cessação de actividade industrial, mas não já na parte relativamente ao conhecimento da multa que foi aplicada.
3. Da preterição das garantias de defesa e da não ponderação de interesses relevantes
Nas alegações facultativas apresentadas pela recorrente, esta requereu a inquirição de duas testemunhas relativamente aos factos supervenientes por si deduzidos naquela peça, visando a comprovação de existência de causa prejudicial justificativa da aludida suspensão de instância.
Invoca, de rajada, a violação do princípio da investigação, do princípio da legalidade previsto no artigo 3° do Código do Procedimento Administrativo e da imparcialidade, previsto no artigo 7° do mesmo código.
Note-se que o que está em causa foi um despacho da Mma Juíza não se vendo como esse despacho, em princípio, ofenda os direitos defendidos pelos bons princípios do procedimento administrativo na relação Administração - Administrados.
De todo o modo, ao indeferir como indeferiu aquela pretensa prova sobre factos inúteis, na medida em que se visava uma suspensão de instância que não tinha cabimento, a decisão judicial proferida pautou-se por critérios estritos de legalidade e de economia processual, razão por que não merece qualquer censura.
Note-se que não estava em causa a comprovação de factos comprovativos e integrantes dos vícios assacados ao acto, mas sim de factos que se entendeu e bem serem irrelevantes para suspender a instância.
O que importaria - mas não foi isso que foi pedido - era convencer que os pressupostos, ao tempo do levantamento do auto, que conduziram à prolação da decisão, se não verificavam.
Em suma, concluindo-se pela falta de fundamento para a suspensão da instância, sempre seria de concluir pela inutilidade de comprovação da factualidade que lhe estaria subjacente.
4. Do vício de violação de lei por violação do artigo 85° do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março e suas consequências.
4.1. A decisão foi tomada ao abrigo da al. b) do artigo 82° e do artigo 85° do Decreto-Lei n.° 11/99/M, de 22 De Março.
Insurge-se a recorrente porquanto diz que na sentença recorrida se partiu do entendimento que o acto foi praticado no exercício de poderes vinculados quando não seria assim, pois que a lei daria uma margem de liberdade à Administração no que respeita à obrigatoriedade de imediata cessação da actividade nos casos de infracções previstas nas als. b) e c) do artigo 82°.
Pelo que a medida de cessação da actividade violaria o princípio da proporcionalidade por a considerar desadequada, desajustada e desequilibrada, para mais tendo invocado diversos factos, tendo junto abundante documentação em suporte da sua posição e não deixaria de incorrer numa errada aplicação da lei.
Avança ainda, como consequência deste erro, ao abster-se de apreciar a violação do princípio da proporcionalidade imputada pela recorrente ao acto por si impugnado, com uma nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, nos termos da 1ª parte da al. d) do n.º 1 do artigo 571º do CPC, aplicável ex vi dos artigos 1º e 149º do CPAC.
4.2. Para que se perceba o alcance da argumentação aduzida transcreve-se o teor do referido artigo 82º, al. b):
“Quando não devam ser consideradas infracções mais graves, constituem infracções administrativas, sancionadas com multa de:
(…)
b) 10 000,00 a 100 000,00 patacas, ou de 30 000,00 a 200 000,00 patacas, consoante o infractor seja pessoa singular ou colectiva, o exercício de actividade industrial, sem título de licença válido, em local não situado em edifício industrial, bem como a existência na unidade industrial de substâncias perigosas em quantidade superior à indicada no pedido ou fixada na licença;
(…)”
O referido artigo 85° tem a seguinte redacção:
"1. O despacho do director da DSE que determine a sanção das infracções referidas nas alíneas b) e c) do artigo 82.º determina igualmente a imediata cessação da laboração ou fixa um prazo findo o qual tal cessação deve ter lugar se, entretanto, a situação constitutiva da infracção não for regularizada.
2. O prazo referido na parte final do número anterior, que não pode exceder 3 meses, é fixado tendo em consideração a necessidade de salvaguardar as condições de segurança inerentes ao funcionamento dos estabelecimentos industriais e o impacto presumível quer na situação de emprego dos trabalhadores que lhe estejam afectos, quer na cadeia produtiva."
4.3. Como se vê está em causa o segmento do despacho relativo ao encerramento da laboração, à cessação da actividade industrial, questão que foi já ultrapassada, sabendo-se que, neste momento, a recorrente está autorizada a laborar.
Tal facto conduziu ao entendimento supra explanado de que estaremos perante uma situação de inutilidade superveniente da lide, razão por que não se conhecerá deste fundamento do recurso.
5. Dos pressupostos de facto
5.1. Não assiste razão à recorrente enquanto sustenta que as instalações em causa não careciam da aprovação da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), por um lado, e, por outro, que não se destinavam a fins industriais.
5.2. Não contraria a recorrente o facto de que ao tempo da elaboração do auto de notícia, em 03/10/2008, a recorrente ainda não possuía licença industrial, mas brande que no relatório elaborado a este propósito pela DSE em 28/10/08 se reconhece que está pendente um pedido de legalização das instalações em causa na DSSOPT (Direcção se Serviços de Obras Públicas e Transportes) e, discordando do entendimento perfilhado na douta sentença recorrida, afigura-se-lhe que na base da decisão impugnada no TAM (Tribunal Administrativo de Macau), não esteve somente a circunstância da ora recorrente não possuir licença industrial, pelo que o Tribunal a quo deveria ter apreciado a primeira questão levantada pela Recorrente e decidido pela revogação do acto administrativo impugnado.
Quanto à segunda questão, apesar de documentalmente provado que o terreno em questão se encontra registado na Conservatória do Registo Predial como destinado a fins industriais, e de, na fundamentação da sentença, não se discordar de que as instalações da recorrente nesse terreno sitas preenchem o conceito legal de "edifício industrial" constante da al. d) do artigo 2° do DL 11/99/M, apenas se fazendo relevar ali a inexistência de licença de utilização emitida pela DSSOPT, definindo o destino do terreno, ao tempo das inspecções realizadas pela DSE em 11/09/08, 03/12/08 e 11/12/09, na perspectiva da recorrente, inexistindo acto da administração que altere o fim a que se destina este terreno descrito na CRP, tal fim mantém-se, para todos os efeitos legais.
5.3. Como bem acentua o Exmo Senhor Procurador Adjunto, irrelevante se mostra que “após a detecção da infracção e porventura antes da prática do acto sancionatório, a recorrente tenha procedido, ao que a própria cognomina de "alteração essencial dos pressupostos de facto" em que se basearam os resultados da inspecção da DSE : os pressupostos factuais em que o acto se estribou são os constantes do auto de transgressão e respectivo relatório e esses - essencialmente, que a recorrente exercia a actividade de produção de betão sem o necessário licenciamento industrial - correspondem à realidade e não são, verdadeiramente, atacados, revelando-se inócua a esgrima, nos parâmetros referidos, com a possibilidade "técnica" para tal licenciamento.”
As possíveis alterações a que a recorrente alude, podendo relevar face ao posterior processo de licenciamento, não tinham que ser contempladas no acto sancionatório proferido.
5.4. Quanto à segunda questão inserta no vício do erro nos pressupostos de facto lançada pela recorrente de forma a saber se o terreno em causa é ou não um “local não situado em edifício industrial”, somos a sufragar o desenvolvimento vertido na douta sentença, aí se dizendo:
“De facto, esta não é simplesmente uma questão de facto, mas sim uma questão relativa à aplicação da lei.
A recorrente entendeu que o terreno em causa devia ser considerado um edifício industrial, já que o registo predial mostrou que o referido terreno tinha finalidade industrial, estavam ali instaladas fábrica e linhas de produção, os cidadãos sabiam que havia lá a fábrica, bem como a D.S.S.O.P.T. aprovou o projecto de obras realizadas naquele terreno.
Antes de iniciar a análise, este Tribunal necessita de apontar o seguinte: a decisão sancionatória do acto recorrido foi proferida contra o desenvolvimento do estabelecimento industrial pela recorrente, sem título de licença válido, ocorrido em 11 de Setembro de 2008, 3 de Dezembro de 2008 e 11 de Dezembro de 2008, pelo que, ao analisar o respectivo estabelecimento para o fim de o qualificar se é um “edifício industrial” ou “local não situado em edifício industrial”, é necessário atender à condição do mesmo no momento da prática do acto ilícito.
Dispõem-se respectivamente nas alíneas a), b) e d) do art.º 2º do Decreto-Lei n.º 11/99/M (sublinhado nosso):
“a) Estabelecimento industrial - O conjunto de bens económicos, constituindo uma unidade funcionalmente organizada para o exercício de uma actividade produtiva susceptível de ser classificada na SECÇÃO D da CAM-Rev.1;
b) Unidade industrial - Local materialmente diferenciado e autonomizado, embora integrante do estabelecimento industrial, onde se desenvolve parte da respectiva actividade, incluindo as unidades exclusivamente afectas à armazenagem de matérias-primas e/ou mercadorias;
(…)
d) Edifício industrial - Edifício maioritariamente composto por fracções destinadas a finalidade industrial;”
Pelas disposições supracitadas, infere-se que na qualificação dum edifício como “edifício industrial”, deve atender-se à questão de se o edifício é ou não destinado a “finalidade industrial”.
Embora o lote “XX” seja destinado a finalidade industrial, não significa que as edificações instaladas naquele terreno são também destinadas a finalidade industrial, visto que as edificações instaladas devem ser aprovadas pela D.S.S.O.P.T. no processo de vistoria e recepção, pois, ainda necessitam de aguardar pela apreciação e autorização daquela Direcção para saber se as mesmas podem ou não ser destinadas a finalidade específica.
Em seguida, aprofunda-se este ponto de vista.
Dispõe-se na al. b) do n.º 1 do art.º 1º da Lei n.º 6/99/M:
“Sem prejuízo da afectação a outros fins lícitos, os prédios urbanos podem ser genericamente utilizados para fins industriais, compreendendo a actividade dos estabelecimentos industriais e das unidades industriais, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, bem como de armazenamento.”
Dispõe-se no art.º 5º da mesma Lei:
“A utilização de prédios urbanos, suas partes ou fracções, para os fins previstos no artigo anterior deve respeitar o fim ou fins constantes das respectivas licenças de utilização.”
E, dispõe-se no n.º 1 do art.º 6º:
“1. Constituem licenças de utilização, para os efeitos da presente lei:
a) (…)
b) (…)
c) As licenças de utilização emitidas ao abrigo dos artigos 50º e 51º do Regulamento Geral da Construção Urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto.”
Quanto às “licenças de utilização”, dispõem-se nos artigos 50º e 51º do Regulamento Geral da Construção Urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 79/85/M (sublinhado nosso):
Artigo 50º
(Licença de utilização)
1. Efectuada a vistoria a que se referem os artigos 47º e 48º, será emitida a licença de utilização respectiva, após homologação do respectivo auto, devendo conter expressamente o fim a que se destina a construção.
2. Quando uma construção seja destinada simultaneamente a fins diferentes, a licença de utilização deverá discriminar a parte ou fracções destinada a cada uma das referidas aplicações.
3. A licença referida nos números anteriores deverá reportar-se quanto ao fim da construção, a habitação, estabelecimentos comerciais, escritórios, indústria, indústria hoteleira e similar, e equipamentos colectivos, abrangendo-se nestes o social e outros destinados a uso do público.
4. A licença de utilização será emitida no prazo de 30 dias após a homologação do auto de vistoria.
5. A D.S.S.O.P.T. poderá autorizar que se façam vistorias parciais à medida que forem concluídas várias partes da obra, e que sejam concedidas as respectivas licenças de utilização, condicionada ao disposto nos números anteriores, desde que, de tal utilização não resultem riscos para os utentes.
Artigo 51º
(Utilização das edificações para fins diversos dos autorizados)
1. Carece igualmente de licença emitida pela D.S.S.O.P.T. a utilização de edificações ou de fracções autónomas destas para fins diversos dos autorizados, não podendo a licença para este efeito ser concedida sem que se verifique a conformidade da obra com as disposições legais e regulamentares aplicáveis.
2. Esta verificação será feita pela comissão a que se refere o artigo 48.º e de acordo com as condições aí estabelecidas.
3. A fiscalização da utilização das edificações, suas partes ou fracções compete também à entidade competente para o licenciamento da actividade aí exercida.”
Analisadas as disposições legais supracitadas, mormente o artigo 50º do Regulamento Geral da Construção Urbana, conclui-se o seguinte: os fins das edificações são regulados pela “licença de utilização”.
In casu, a recorrente apenas recebeu o ofício da D.S.S.O.P.T. em Março de 2009, onde foi autorizado o projecto de obras legalizado da edificação do lote “XX”, assim sendo, no momento em que a recorrente praticou o facto ilícito, a D.S.S.O.P.T. ainda não autorizou o projecto de obras legalizado da respectiva edificação nem emitiu a “licença de utilização” (mesmo que seja licença de utilização provisória). A recorrente também admitiu que, antes de Março de 2009, a D.S.S.O.P.T. ainda não tinha autorizado o projecto de obras legalizado, e que não possuía a “licença de utilização” (vide pontos 24 a 29 da petição inicial, designadamente o ponto 26).
Daí, vislumbra-se que a recorrente não tinha a “licença de utilização” do lote “XX”, no momento da prática do acto ilícito, ou seja, a respectiva edificação nunca foi definida pela D.S.S.O.P.T. que tinha a “finalidade industrial”, pelo que a edificação instalada pela recorrente no lote “XX” é incompatível com o disposto na al. d) do art.º 2º do Decreto-Lei n.º 11/99/M.
Assim sendo, a edificação onde a recorrente praticou a actividade de produção de betão, não é um “edifício industrial”, a par disso, a recorrente foi também sancionada no processo de sanção administrativa n.º 104/2007/DIAE/DIIC-2ªB da D.S.E., pela infracção cometida no lote “XY”, por isso, a decisão sancionatória da entidade recorrida é correcta, tanto no aspecto dos pressupostos de facto como no aspecto da aplicação da lei.
Deste modo, os fundamentos da recorrente são improcedentes.”
Não se deixa desta forma de sufragar, ainda aqui, o douto entendimento que foi devidamente explicitado na sentença recorrida, sendo bem patente a diferença entre a finalidade industrial de um lote para fins industriais e a natureza industrial das construções aí edificadas, vista a susceptibilidade de diferentes afectações, seja em função das edificações em concreto, mantendo essas características, seja a própria utilização industrial em função de diferentes actividades industriais, impondo-se como evidente a necessidade de não só de uma licença de construção como a necessidade de uma licença de utilização em vista da actividade concreta que ali venha a ser exercida.
A lei fala em edifício industrial o que difere bem de um lote para fins industriais.
Tudo visto, resta decidir.
V - DECISÃO
Pelas apontadas razões, nos termos e fundamentos expostos, acordam em julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, na parte relativa ao segmento do acto em que se ordenou a cessação da actividade ali exercida, e em negar provimento ao presente recurso jurisdicional na parte restante.
Custas pela recorrente, com 6 UC de taxa de justiça
Macau, 11 de Abril de 2013
(Relator) João A. G. Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng
(Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho
Estive presente Mai Man Ieng
219/2012 1/41