Processo nº 219/2013 Data: 25.04.2013
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “uso de documento falso”.
Erro notório.
SUMÁRIO
1. O vício de “erro notório na apreciação da prova”, apenas ocorre “quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.
É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.
O relator,
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José Maria Dias Azedo
Processo nº 219/2013
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Em audiência colectiva no T.J.B. respondeu B (B), com os sinais dos autos, vindo a ser condenado pela prática, em autoria material, de 1 crime de “uso de documento falso”, p. e p. pelo art. 244°, n.° 1, al. c) do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por um período de 2 anos, na condição de pagar, no prazo de 30 dias, o montante de MOP$10.000,00 à “Associação Internacional de XXX”; (cfr., fls. 152 a 159 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu para, em síntese, imputar (apenas) à decisão recorrida o vício de “erro notório na apreciação da prova”; (cfr., fls. 164 a 168).
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Respondendo, considera o Exmo. Magistrado do Ministério Público que nenhuma razão tem o arguido recorrente, pugnando pela integral confirmação da decisão recorrida; (cfr., fls. 176 a 180).
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Admitido o recurso, vieram os autos a este T.S.I. onde, em sede de vista juntou a Ilustre Procuradora Adjunta o douto Parecer, opinando também pela manifesta improcedência do recurso; (cfr., fls. 189).
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Nada obstando, resta decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido, a fls. 156 a 157, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Vem o arguido recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou pela prática em autoria material de 1 crime de “uso de documento falso”, p. e p. pelo art. 244°, n.° 1, al. c) do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por um período de 2 anos, na condição de pagar, no prazo de 30 dias, o montante de MOP$10.000,00 à “Associação Internacional de XXX”.
Entende, (apenas), que incorreu o T.J.B. no vício de “erro notório na apreciação da prova”, pedindo o reenvio do processo para novo julgamento nos termos do art. 418° do C.P.P.M..
Cremos porém que nenhuma razão tem o recorrente, sendo o recurso de rejeitar dada a sua manifesta improcedência; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).
Passa-se a expor este nosso ponto de vista.
Ora, em essência, diz o recorrente que em sede da audiência de julgamento manteve-se silente, e que nenhuma testemunha prestou depoimento, pelo que não podia o Colectivo a quo dar como provada a sua autoria do crime de “uso de documento falso” pelo qual foi condenado.
Pois bem, o vício de “erro notório”, como repetidamente temos vindo a afirmar, apenas ocorre “quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 21.03.2013, Proc. n.° 113/2013 do ora relator).
No caso, é verdade o que afirma o recorrente quanto ao que ocorreu em sede de audiência de julgamento, pois que no próprio Acórdão recorrido não deixou o Colectivo a quo de o consignar.
Todavia, tal não significa que se tenha incorrido no assacado vício de “erro”.
Com efeito, e como também se deixou escrito no Acórdão recorrido, a convicção do Colectivo resultou da análise dos documentos juntos aos autos, e como pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público foi adequadamente observado em sede de Resposta, os ditos documentos “são completamente elucidativos da falsificação do documento usado pelo arguido e de que este não podia ignorar tal falsidade pela razão evidente de que atestava a frequência escolar (e aprovação) do arguido, durante um determinado período de tempo, em estabelecimento de ensino, que o arguido não frequentou…”; (cfr., fls. 178).
E, constatando-se que assim é efectivamente, clara sendo também a solução que se deixou adiantada, mais não é preciso dizer para se decidir pela rejeição do presente recurso, dada a sua manifesta improcedência.
Decisão
4. Em face do exposto, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).
Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).
Macau, aos 25 de Abril de 2013
(Relator)
José Maria Dias Azedo
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng
(Segunda Juiz-Adjunta)
Tam Hio Wa
Proc. 219/2013 Pág. 8
Proc. 219/2013 Pág. 1