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Processo n.º 357/2007
Recorrentes: A
B
C
Recorrido: Secretário para os Transportes e Obras Públicas
(運輸工務司司長)
    
    
    
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:
I – Relatorio
A e B e a sua mulher, C, todos residentes em Macau, interpuseram recurso contencioso do acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico para o Senhor Secretario para os Transportes e Obras Públicas dos despachos do Director Substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, de 16 de Agosto de 2005 (projecto de obra de construção, processo n° 210/2003/L) e do Director dos mesmos Serviços de 1 de Julho de 2005 (projecto relativo ao sistema de incêndios, parque de estacionamento), de 8 de Fevereiro de 2005 (projecto de obra n° 210/2003/L do Lote A2/i do NAPE – Galaxy Casino), de 4 de Agosto de 2004 (projectos de Escavação e contenção periférica, cravação de estação de estacas e desvio de infra-estruturas), de 4 de Agosto de 2004 (anteprojecto de obra do Lote A2/i. Processo n° 210/2003/L) que consideram “passíveis de aprovação”condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i pertencente à Sociedade GALAXY RESORTS, S.A., Proc. N° 210/2003/L, na medida em que os mesmos são incorporados por aquele alegando que:
1. O Presente recurso é apenas interposto para a hipótese de se vir a considerar inviável, mormente por razões processuais, o recurso contencioso n.º 218/2006, o que se encontra pendente no TSI;
2. O objecto da presente impugnação jurisdicional é constituído pelo acto de indeferimento resultante da omissão de pronúncia no recurso hierárquico interposto e ainda pelos despachos supra mencionados do Sr. Director Substituo dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, de 16/08/2005 e do Exmo. Director dos mesmos Serviços, de 1/7/2005, de 8/2/2005, de 4/8/2004, de 4/8/2004, na medida em que os mesmos são incorporados por aquele;
3. O acto recorrido e os despachos por este incorporado padecem do vício de violação de lei, na medida em que dão cumprimento ao despacho de Sua Excelência o Chefe o Executivo, de 8 de Julho de 2004, o qual contraria frontalmente o estabelecido no Regulamento do Plano de Intervenção Urbanística dos Novos Aterros do Porto Exterior;
4. Desde logo, violaram as normas dos artigos 34º e 38º do Regulamento Geral de Construção Urbana, que impõem na apreciação dos projectos de obras a conformidade daqueles com os planos de urbanização e respectivos regulamentos em vigor;
5. O regulamento do PIUNAPE visa disciplinar e regular o uso e a transformação do solo e da matéria edificada na zona designada por NAPE e as suas disposições têm carácter imperativo, tal como expressamente estabelece o seu artigo 1º;
6. É esse regulamento um verdadeiro regulamento em sentido material, atendendo às suas notas de generalidade, abstracção, não consumpção da sua eficácia na sua aplicação e inovação jurídica;
7. O regulamento do PIUNAPE é um regulamento eficaz e plenamente vinculativo para a Administração;
8. Contra isto não vale o argumento de que o referido regulamento, no presente momento, já não se encontra em vigor, uma vez que foi revogado pelo despacho n.º 248/2006 de Sua Excelência o Chefe do Executivo, publicado no Boletim Oficial da Região, n.º 34, de 21/8/2006;
9. Este despacho, atendendo ao facto de que tem por objecto um regulamento administrativo e atendendo ao seu conteúdo, que visa fazer cessar os efeitos daquele regulamento, não pode deixar ele de ser também um regulamento administrativo;
10. Este regulamento é ilegal, pois que procede a uma revogação, pura e simples, na sua totalidade do regulamento do PIUNAPE;
11. A revogação pura e simples de um plano urbanístico contraria a sua específica natureza e teleologia;
12. Os modos de efectivação da dinâmica de um plano urbanístico devem ser compatíveis com a natureza normativa do plano e a sua específica funcionalidade;
13. A Administração está obrigada, nas operações urbanísticas em que intervenha, a respeitar o plano urbanístico existente;
14. De acordo com o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos, a Administração não pode derrogar, em casos concretos, um regulamento administrativo;
15. Proceder à revogação pura e simples de um plano significaria criar um vazio jurídico no que respeita às regras de ocupação, uso e transformação do solo;
16. A Administração não pode proceder à revogação pura e simples do plano urbanístico, principalmente quando isso tenha por resultado abrir as operações urbanísticas à conformação exclusiva de actos individuais;
17. A revogação pura e simples de um plano urbanístico defrauda o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos;
18. Os múltiplos interesses que um plano constitui e conforma apenas são adequadamente tratados através da planificação e não de actos individuais e concretos;
19. Mesmo que estejam edificadas todas as parcelas de terreno sobre que incide um plano, o plano continua a disciplinar os sucessivos actos de edificação que se possam fazer, como também o próprio uso e manutenção dos prédios construídos, o que contraria a justificação dada para a referida revogação;
20. O plano urbanístico apenas pode ser modificado por alteração e revisão, tal como prevê, de resto, a alínea b) do artigo 38º do Regulamento do PIUNAPE;
21. A Administração tinha o dever de rever o PIUNAPE decorridos 5 anos sobre a sua publicação, o facto de o não ter revisto daí não decorre que a Administração pudesse provocar a sua revogação pura e simples;
22. O despacho de revogação do Chefe do Executivo, de 21 de Agosto de 2006, muito depois do seu despacho de 8/7/2004, que aprovou os condicionamentos urbanísticos e limites do terreno a conceder à sociedade comercial GALAXY RESORTS, S.A. e do acto ora recorrido e dos despachos que o mesmo integra, mais não é do que uma tentativa de salvar a apar6encia da legalidade de todo o processo de construção;
23. O despacho do Chefe do Executivo que procede à revogação do plano urbanístico é ilegal porque afronta o princípio constitucional da legalidade da Administração (consagrado no artigo 65º da Lei Básica, bem como no n.º 1 do artigo 3º do CPA), o princípio geral administrativo, decorrente daquele, da inderrogabilidade singular dos regulamentos (com expressão particularizada no n.º 1 do artigo 109º do CPA) e ainda o próprio Regulamento do PIUNAP, constante da Portaria n.º 68/91/M, de 18 de Abril, mormente a norma da alínea b) do 30º deste regulamento, que estabelece as formas da revisão e da actualização para a modificação do plano;
24. Sem conceder, o argumento da revogação do regulamento do PIUNAPE não obsta à validade da alegação da violação pelo acto ora recorrido e actos que o integram do referido regulamento;
25. No momento em que se verificou o acto tácito ora recorrido, assim como os despachos que aquele incorporou, estava claramente em vigor o referido regulamento do PIUNAPE;
26. Num sistema, como o nosso, de controlo da mera legalidade de actos, o momento da apreciação da legalidade de um acto é sempre o momento da sua prática e não outro, sendo que nesse momento era claramente vinculativo o referido regulamento;
27. O acto recorrido e os despachos nele incorporados, ao aprovarem os referidos projectos de obra, permitindo a construção de um prédio que ocupava parcelas do domínio público, com uma altura de 150 metros e uma área bruta (ABC), não incluindo a cave, de 90,000 m2 e isento do cumprimento da área de sombras, num lote em que o Regulamento do PIUNAPE apenas consentia uma altura máxima de 80 metros (por exigência do cumprimento da lei de sombras) e uma área bruta de construção total de 43102 m2, como resulta da Ficha de Identificação e Caracterização do Lote A2/i, violaram, entre outras, as normas dos artigos 17º, 18º, 19º, 20º, 22º, alínea a), 23º, 25º e 34º, alínea a) e b) do regulamento do PIUNAPE;
28. O acto recorrido e despachos por ele incorporados padecem ainda do vício de violação de lei por violação do princípio do respeito por direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 4º do CPA;
29. Os Recorrentes são titulares do direito à habitação com condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, necessárias à sua saúde bem-estar e conforto, tal como resulta do artigo 20º da Lei n.º 6/94/M;
30. A construção viabilizada pelo acto recorrido e pelos actos que o incorporam violou este direito dos Recorrentes, na medida em que altura descomunal do referido prédio provoca o ensombramento das fracções e a implantação do referido prédio sobre o que fazia parte da Rua Cidade de Sintra e do Jardim das Artes, eliminando o corredor de ventilação coincidente com essa rua e jardim, faz com estas fracções se tornem pouco arejadas e lúgubres;
31. Violada foi ainda a norma do n.º 4 do artigo 20º do diploma acabado de citar, dado impor o mesmo que《na elaboração dos planos de urbanização, de ocupação de solos, de ordenamento urbano e de transportes devem ser tomadas em consideração os interesses das famílias, devendo para o efeito ser ouvidas as associações relacionadas com esses interesses》e que de todo não se verificou na realidade;
32. O plano urbanístico é um instrumento de conformação e de efectivação do direito fundamental à habitação, elaborado o plano urbanístico, têm as pessoas abrangidas por ele radicadas na sua esfera jurídica um verdadeiro direito à habitação, beneficiando da tutela que resulta da legalidade do plano;
33. Violado foi ainda o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e à qualidade de vida, tal como se consagram nos artigos 3º e 12º da Lei n.º 2/91, de 11 de Março, ao ser, com a referida construção, destruído o Jardim e Artes e o que ele representava em de lazer e descanso e em termos ecológicos, e surgir em seu lugar uma pluralidade de pequenos espaços (que nem sequer relevados são), recortados por uma infinidades de vias públicas concebidas única e exclusivamente a pensar no Hotel-Casino que aí se construiu;
34. Violado resultou ainda o direito dos Recorrentes à tutela da confiança, dado que, quando compraram as suas casas e fizeram as referidas obras de remodelação, estavam convencidos de que as condições que os levaram às referidas compras e obras de remodelação se não alterariam, até porque existia um plano urbanístico que era de molde a garantir a estabilidade das suas expectativas;
35. Ao desrespeitar, de forma gravosa, os referidos direitos dos Recorrentes, o acto recorrido e os despachos que o incorporam violaram o referido princípio do respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos (artigo 4º do CPA) e, com isso, simultaneamente as normas dos artigos 20º da Lei n.º 6/94/M e dos 3º e 12º da Lei n.º 2/91/M, de 11 de Março;
36. Violaram ainda o acto recorrido e os despachos que o integram exigências procedimentais, na medida em que em que aprovaram os projectos de obra e, afinal, autorizam a construção do prédio objecto daqueles projectos em parcelas de terreno pertencentes ao domínio público, mormente o troço da via pública Rua Cidade de Sintra e parte do Jardim das Artes, contíguos ao Lote 2/i, sem se ter, previamente, procedido à competente desafectação dessas parcelas do domínio público e a subsequente integração no domínio privado do Estado e sem ter havido também o necessário parecer da Comissão de Terras;
37. É o que resulta, respectivamente, das normas do artigo 4º da Lei de Terras e das normas do artigo 121º ainda desse diploma e da alínea a) do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro (Comissão de Terras).
Nos termos e com os fundamentos expostos, e com o douto suprimento de V. Exas., requerem se dignem Vossas Excelências, na procedência da presente impugnação, determinar a anulação do acto tácito de indeferimento recorrido e dos despachos que o mesmo incorpora e que aprovaram os projectos de obra referidos, pela verificação das apontadas ilegalidades, que os tornam inválidos.
Pelo que requerem a citação da entidade recorrida para contestar, querendo, e enviar o competente processo administrativo.
Requerendo ainda a citação da contra-interessada sociedade《Hotel Starword Companhia Limitada》, na pessoa do seu Administrador D, com domicílio profissional na Alameda Dr. Carlos D’Assumpção, n.ºs 393 a 437, Edifício Dynasty Plaza, 19º andar, para contestar, querente.

Citada a entidade recorrida, esta contestou alegando que:
1. O objecto do presente recurso contencioso é a anulação do acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto para o Secretário para os Transportes e Obras Públicas dos despachos do director e do director substituto do Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, melhor identificados na petição de recurso, que consideraram “passíveis de aprovação” condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i concedida à Galaxy Casino S.A., Proc. nº 210/2003/L, da DSSOPT.
2. Os Recorrentes alegam interesses que dizem respeito a todos os residentes da RAEM.
3. genericamente tutelados pelo direito mas que não têm um titular singular, não sendo direitos ou interesses especialmente personalizados;
4. Donde, os Recorrentes só poderão invocar a legitimidade decorrente da alínea b) do artigos 33º, em conexão com o artigo 36.°, ambos do CPAC, demonstrando ser titulares do direito de acção popular e só nessa titularidade poderão prosseguir no presente recurso contencioso.
5. De acordo com o registo do livro de obra, relativo ao Lote 3 (A2/i) do NAPE, o edifício em construção ultrapassou os 80 metros, altura alegada pelos Recorrentes como a máxima estabelecida no Regulamento do PIUNAPE, em 30 de Novembro de 2005. Tinha já atingido a altura de 81.050 metros, a que corresponde o piso 15 (LI5).
6. Os recorrentes só numa fase bastante adiantada da obra é que decidiram intervir no processo, solicitando a sua consulta apenas em 9 de Março de 2006, quando o edifício já tinha de 119.400 metros, a que corresponde o piso 26 (L26).
7. O recurso hierárquico foi interposto em 4 de Maio de 2006;
8. Fora do prazo, face ao disposto no n.º 1 do artigo 155.° do CPA que estabelece o prazo de 30 dias para a interposição do recurso hierárquico necessário, que devem ser contados da data do conhecimento dos factos.
9. O presente recurso contencioso deve ser rejeitado por caducidade do direito de recurso – alínea h) do n.º 2 do artigo 46.° do CPAC.
10. Os despachos recorridos são actos conformativos do despacho do Chefe do Executivo, de 8 de Julho de 2004.
11. São actos que se limitaram a por em prática os novos alinhamentos e condicionalismos urbanísticos previamente estabelecidos através daquele despacho.
12. Quando surgem eventuais lesões de direitos de terceiros que mereçam tutela jurídica assumem, esses terceiros, uma posição de contra-interessados no licenciamento da obra.
13. E foi nesta situação que os ora recorrentes decidiram impugnar os despachos do director substituto e do director da DSSOPT, relativos à aprovação dos projectos e à emissão das licenças de obra, ao mesmo tempo que recorreram do despacho do Chefe do Executivo.
14. O despacho de aprovação final dos projectos é, no fundo, o acto que concede o licenciamento da obra, e é este, portanto, o acto constitutivo de direitos.
15. À falta de um despacho de aprovação final tem-se entendido que o acto que aprova o último projecto de obra é, com efeito, o acto que consubstancia o licenciamento da obra.
16. Nesta conformidade, o despacho que aprovou o último projecto de obra - despacho de 16 de Agosto de 2005 - deve ser considerado o acto final e eventualmente lesivo de direitos ou interesses legalmente protegidos dos contra interessados no licenciamento, sendo todos os outros que o antecedem actos meramente preparatórios da decisão final, incluindo-se o despacho do Chefe do Executivo de 8 de Julho de 2004.
17. Não se vislumbra a ilegalidade do Despacho do Chefe do Executivo n.º 248/2006 que revogou a Portaria n.º 68/9l/M, de 18 de Abril, que aprovara o Regulamento do Plano de Intervenção Urbanística dos Novos Aterros do Porto Exterior (PIUNAPE), como tão peremptoriamente se afirma no artigo 99.° da petição.
18. No ordenamento jurídico da RAEM não existem regras para a elaboração e aprovação de Planos Urbanísticos juridicamente eficazes e genericamente vinculantes;
19. Pelo que, a vinculação dos particulares às soluções urbanísticas que a Administração pretende ver consagradas, não se faz tanto pela publicação de Planos Urbanísticos mas sim pela emissão da Planta de Alinhamento a definir para o local e, no que se refere a terrenos do domínio privado da RAEM, também através de contratos de concessão, nos dos artigo 99.°, 103.° e 104.° da Lei de Terras (Lei n.º 6/80M, de 5 de Julho, e sucessivas alterações).
20. O Regulamento do PIUNAPE não veio desenvolver ou complementar a disciplina jurídica constante de lei anterior, não proveio de qualquer norma legal, o que conduz à possibilidade legal da sua revogação por via geral e abstracta;
21. Não faz qualquer sentido, no caso, a invocação do princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos para sustentar a pretendida ilegalidade da revogação da Portaria n.º 68/91/M, de 18 de Abril.
22. A revogação do Regulamento do PIUNAPE não foi efectuada, sem mais, para um caso concreto, isolado (até porque naquela zona existem outros lotes de terreno cujo aproveitamento ainda não foi realizado), mas sim em termos gerais e abstractos, sob a forma de despacho do Chefe do Executivo de natureza regulamentar, como aliás os próprios Recorrentes reconhecem.
23. Além de que o referido despacho procedeu ainda à revogação dos Regulamentos dos Planos de Reordenamento da Baía da Praia Grande - Portaria n.º 69/91/M, de 18 de Abril.
24. A revogação do Regulamento do PIUNAPE e dos Regulamentos dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande só poderia ser posta em causa se os Planos Urbanísticos estivessem expressamente previstos na lei, face ao princípio da legalidade da Administração, consagrado no artigo 65.° da Lei Básica da RAEM, e de igual modo no artigo 3.°, n.º 1 do CPA.
25. A escassez de solos disponíveis obrigou à canalização, para a zona do NAPE, onde ainda existiam lotes de terreno não aproveitados, de grandes empreendimentos ligados ao sector dos jogos e do turismo, nomeadamente de novos hotéis, possibilitando o agarrar das oportunidades de desenvolvimento económico e social hoje proporcionadas pelas indústrias de turismo e entretenimento.
26. O interesse individual deve, em nome do desenvolvimento económico e social e de uma sociedade harmoniosa, transigir perante o interesse colectivo.
27. Continua em vigor o Regulamento Geral da Construção Urbana (conhecido por RGCU), aprovado pelo Diploma Legislativo n.º 1600, com as alterações que lhe foram introduzidas.
28. Não se compreende o pretendido pelos Recorrentes com os artigos 92.° e 93.° quando se referem a “despacho ora impugnado”.
29. Não se vê como é que o PIUNAPE poderia acautelar perfeitamente os interesses dos recorrentes porquanto a alínea b) do artigo 38.° do Plano, sob a epígrafe “Condições de aplicação e prazos de vigência do PIUNAPE” expressamente determinava a sua revisão e actualização decorridos 5 anos sobre data da sua aplicação, data que se reporta a 1991 (Portaria nº 68/91/M, de 18 de Abril).
30. Quando os Recorrentes compraram as suas habitações, em 2003, estavam cientes de que o PIUNAPE poderia ser revisto a qualquer momento, pelo que detinham uma mera expectativa sobre as condicionantes urbanísticas da zona, mormente do terreno confinante, o qual tinham perfeito conhecimento que se encontrava vago.
31. O PIUNAPE estabelecia para aquela área não um jardim mas um sistema de canais (cfr. alínea g) do ponto 4.6 da Memória Descritiva do Plano e Planta da Malha Urbana que integra aquele Plano, a páginas 1616 do 2.° Suplemento do Boletim Oficial de Macau n.º 15, e artigos 4.° e 35.° do Regulamento do PIUNAPE).
32. sendo de salientar que o Plano já tinha sido objecto de alterações (de sistema de canais inicialmente previsto e construído, transformou-se, em 1999, no Jardim das Artes), aquando da aquisição das referidas fracções.
33. Logo, os Recorrentes não poderiam ter assim tantas certezas quanto ao futuro daquele Jardim.
34. Invocam ainda a violação do artigo 20.° da Lei n.º 6/94/M, de 1 de Agosto, que estabelece que cada família deve poder dispor de uma habitação que, pelas suas dimensões e demais requisitos, corresponda adequadamente às exigências de uma vida familiar normal.
35. Ora os Recorrentes detêm uma habitação condigna e adequada aos seus agregados familiares, satisfazendo em plenitude as exigências de uma vida familiar normal - vide artigos 120º e 123º da petição.
36. Não se vê, concretamente, em que medida o despacho ora impugnado conduza a que a fracção habitacional dos Recorrentes deixe de ter arejamento e luminosidade natural, sendo que, devido à conhecida escassez de terrenos e à própria latitude de Macau, a que acresce o clima subtropical desta zona do globo, grande parte das habitações ficam completamente sombrias durante toda a parte da tarde e muitas mesmo durante todo o dia.
37. A reformulação do Jardim das Artes veio permitir aos Recorrentes o rápido acesso da sua habitação a novas infra-estruturas viárias, com maior fluidez do trânsito e facilidade de deslocação, sendo que, ainda assim, não representou a perda definitiva da estrutura verde que aquele jardim público representa.
38. Consequentemente, o despacho ora impugnado não padece do vício de violação de lei que os Recorrentes lhe pretendem assacar.
39. É manifesta a improcedência do último dos vícios assacados ao acto recorrido – violação de lei/vício de procedimento - por violação das normas dos artigos 4.° e 121.° da Lei nº 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de Terras) e da alínea a) do artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro (Comissão de Terras).
40. Não há impedimento a que a desafectação do domínio público e subsequente integração no domínio privado da RAEM de estradas, arruamentos e outras vias públicas ou parte das mesmas, bem como dos jardins ou parte destes, seja feita mediante despacho do Chefe do Executivo ou do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (mediante delegação de poderes), despacho esse a publicar no Boletim Oficial.
41. Também não é verdade que a Lei de Terras e o Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro, contenham qualquer norma que se refira à exigência de pronúncia da Comissão de Terras, através de parecer obrigatório, para a desafectação dum bem do domínio público e subsequente integração no domínio privado da RAEM (cfr. a título de exemplo os Decretos-Lei nº 56/97/M, de 15 de Dezembro e n. ° 36/98/M, de 17 de Agosto).
42. O despacho recorrido não padece de vício de procedimento por violação do artigo 4º e 121.º da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho, e da alínea a) do artigo 3.° do Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro.
Termos em que requer a V. Exª se digne considerar o presente recurso contencioso de anulação improcedente, mantendo-se os actos recorridos.

Foi citado a parte contra-interessada, Hotel StarWorld Companhia Limitada, esta contestou, alegando que:
I. A CI partilha do entendimento do Recorrido quando este salienta a falta de legitimidade dos ora Recorrentes para interpor o presente recurso caso não comprovem a sua residência em Macau.
II. Resulta comprovado dos autos que a altura do edifício in questio - Hotel Starworld - ultrapassou a barreira dos 80 metros no dia 30 de Novembro de 2005.
III. Ora, apenas no dia 9 de Março de 2006 os Recorrentes solicitaram a consulta do processo administrativo relativo à construção do Hotel e o competente recurso hierárquico necessário apenas foi interposto no dia 4 de Maio de 2006, pelo que, sendo de 30 dias a contar do conhecimento do acto recorrido o prazo prescrito por lei para a interposição do respectivo recurso hierárquico necessário, o direito de usar deste expediente há muito que havia caducado.
IV. Logo, também o direito dos Recorrentes de interporem o presente recurso caducou.
V. O acto recorrido e os despachos que o integram que constituem o objecto do presente recurso mais não são do que actos preparatórios do despacho que consubstancia o licenciamento da obra in questio - a obra de construção do Hotel Starworld.
VI. O RGCU permite a entrega de projectos de obra por fases, faculdade que a CI utilizou, e razão pela qual os seus projectos foram sendo faseadamente considerados passíveis de aprovação.
VII. O RGCU prevê determinados prazos para a aprovação de projectos de obra, sendo de 30 dias o prazo para a aprovação de projectos entregues por fases.
VIII. Tem sido entendimento unânime que, na ausência de um despacho de aprovação de um projecto de obra ou de quaisquer das suas fases, o acto que aprova o último projecto de obra é o acto de emissão da licença de obras.
IX. Sendo que a tónica da recorribilidade contenciosa assenta no facto de o acto ser ou não lesivo, conclui-se que os despachos de que os Recorrentes recorrem nos presentes autos mais não são do que actos preparatórios ou instrumentais do acto que titula o licenciamento de obras, logo, o presente recurso, porque interposto contra tais actos preparatórios, não poderá ser atendido.
X. O artigo 109º, nº 1, do CPA, onde se estatui que “Os regulamentos necessários à execução das leis em vigor não podem ser objecto de revogação global sem que a matéria seja simultaneamente objecto de nova regulamentação.”.
XI. Ora, PIUNAPE não consubstancia um regulamento necessário à execução de qualquer lei anterior ao mesmo, logo, nada impedia que o mesmo fosse livremente alterado ou mesmo revogado a qualquer momento.
XII. Aliás, o próprio PIUNAPE previa que a revisão e actualização desse mesmo diploma deveria ser efectuada decorridos 5 anos após a sua publicação.
XIII. Acresce que a desactualização e desadequação do PIUNAPE foi por diversas vezes verificada ao longo do tempo, desde logo com a aprovação, em 1999, da construção do Jardim das Artes, num local onde o PIUNAPE previa a existência de canais de água, e, mais recentemente, com as alterações introduzidas por diversos documentos não publicados, nomeadamente pelo PRPINO, e, bem assim, com a construção de diversos hotéis e casinos, tais como, para além do Hotel Starworld, o Sands, o Wynn, o MGM, para não falar de outros edifícios com diferentes finalidades.
XIV. Note-se que todas estas construções foram aprovadas e iniciadas antes mesmo da revogação do PIUNAPE, que viria a correr apenas em 16 de Agosto de 2006, através de Despacho do Chefe do Executivo;
XV. Aliás, este despacho do Chefe do Executivo fundamenta a revogação do PIUNAPE com várias evidências que há muito são do conhecimento público, a saber: a versão actualizada de tais Planos não foi publicada; as condições que estiveram na origem da implementação daqueles Planos foram sendo alteradas ao longo do tempo e estão hoje completamente desajustadas em relação ao actual desenvolvimento sócio-económico de Macau; a escassez de terrenos e as repercussões da liberalização e desenvolvimento da indústria do jogo, nomeadamente no que se refere à criação das condições necessárias à concretização dos projectos de investimento das concessionárias.
XVI. Ora, inexistindo uma lei geral e abstracta que obrigue à existência de um plano de urbanização, significa que um plano criado por vontade governamental pode ser pontualmente alterado, podendo ser inclusivamente revogado sem que, em nenhum desses casos, se possa considerar haver violação de lei.
XVII. E não obstante o PIUNAPE ter sido revogado, tal não significa uma total ausência de regulamentação na actividade de construção: tal actividade rege-se não só pelo RGCU, pelas plantas de alinhamento a definir para cada local, e, ainda, no domínio das relações privadas, pelos contractos de concessão.
XVIII. Relembre-se que, ao contrário da zona do NAPE e da Baía da Praia Grande, muitas outras zonas há em Macau cuja construção não está nem esteve regulamentada por planos de urbanização, sendo o exemplo mais notário disso o caso do COTAI.
XIX. assim, não é aplicável in casu o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos administrativos, princípio este que não proíbe uma revogação geral e abstracta de um regulamento administrativo, mas antes e apenas uma derrogação, num caso concreto, sem qualquer justificação - o que não foi o caso;
XX. Assim, é forçoso concluir pela absoluta e inquestionável legalidade tanto do Despacho do Chefe do Executivo que revogou o PIUNAPE como dos actos de aprovação da construção do Hotel Starworld posto que a derrogação do PIUNAPE que os mesmos consubstanciaram não representaram uma derrogação sem mais do PIUNAPE, tendo sido devidamente justificados por razões genéricas e abstractas, tratando-se de actos concertados com outras decisões tomadas relativamente a diferentes projectos de construção, como os casos do Sands, do Wynn, do MGM e de outros projectos de diferente natureza construídos ou ainda em construção no NAPE.
XXI. Em suma, há que concluir que tanto aquando das autorizações pontuais de construções conflituantes com o PIUNAPE como aquando da revogação do próprio PIUNAPE, interesses particulares tiveram de ceder perante o interesse público!
XXII. Mas mesmo que assim não se entenda, sempre teria de se concluir pela inutilidade superveniente dos presentes autos porquanto não faria sentido anular os despachos que aprovaram a construção do Hotel Starworld porque estavam feridos de ilegalidade à data da sua prática, quando, na presente data, após a revogação do PIUNAPE, tal construção se encontra plenamente de acordo com a lei em vigor, pelo que nenhuma consequência poderia advir de tal anulação relativamente a tal edifício.
XXIII. O art. 20° da LBPF não consagra de modo algum a protecção do direito à habitação com condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, pelo que esta disposição não foi violada;
XXIV. O nº 4 do art. 20° da LBPF impõe que na elaboração dos planos de urbanização sejam tomados em conta, entre outros, os interesses das famílias, devendo para o efeito ser ouvidas as associações relacionadas com esses interesses; porém, nem o acto recorrido nem os despachos que o integram estão relacionados com a elaboração de planos de urbanização, pelo que também esta norma não foi violada.
XXV. A LBA consagra que todos têm direito a um nível de luminância convenciente à sua saúde, bem-estar e conforto na habitação, mas em parte alguma se consagra qualquer direito ao arejamento das habitações.
XXVI. No momento em que os Recorrentes compraram as suas fracções, o lote onde viria a ser construído o Hotel Starworld encontrava-se vago, sendo possível que as ditas fracções gozassem de óptimas condições de luminosidade solar, arejamento e salubridade.
XXVII. O PIUNAPE previa a construção de um Hotel no Lote A2/i com uma altura de 80 metros, sendo certo que o projecto de construção do Hotel Starworld que viria a ser aprovado permitiu uma altura de 150 metros;
XXVIII. Porém há que considerar que o perfil transversal (l.e., largura) previsto pelo PIUNAPE para a rua que separa o edifício do qual fazem parte as fracções dos Recorrentes e o Hotel é de 24 metros e que a altura prevista para o edifício do qual fazem parte as fracções dos Recorrentes é de 50 metros;
XXIX. Ora, a existência de um edifício de 80 metros ou 150 metros é totalmente irrelevante no que concerne às condições de iluminância, arejamento e salubridade de que goza um edifício de 50 metros que confronta com o primeiro edifício.
XXX. Donde se conclui que da construção do Hotel Starworld não resulta a violação dos alegados direitos a iluminância, arejamento e salubridade dos Recorrentes, enquanto titulares de fracções de um edifício contíguo ao mencionado Hotel na medida em que as condições de que as referidas fracções beneficiavam sempre se perderiam uma vez construído um edifício com as dimensões previstas no PIUNAPE!
XXXI. A continuidade do corredor verde do Jardim das Artes não foi interrompida com a construção do Hotel Starworld, mas antes com a construção de vias púbicas.
XXXII. Por outro lado, a construção de um jardim ao longo da Rua Cidade de Sintra e da Avenida da Amizade não se encontrava prevista no PIUNAPE pois para esse local estava prevista a existência de um canal de água, logo, com a construção do Hotel Starworld não foi violado o PIUNAPE.
XXXIII. Mesmo admitindo que a construção do Jardim das Artes consubstanciou uma excepção válida ao PIUNAPE, isto não conferiu quaisquer direitos ou expectativas ao Recorrentes de que tal jardim ali deveria permanecer para sempre.
XXXIV. Nada na lei impede que a desafectação de terrenos do domínio público e a sua concessão a privados sejam executados através de um só acto, tendo sido isso que sucedeu no caso sub judice
XXXV. Nada na lei exige a pronúncia da Comissão de Terras, através de parecer obrigatório, previamente à desafectação do terrenos do domínio público e integração no domínio privado da RAEM.
XXXVI. Não obstante, a desafectação terrenos do domínio público e integração no domínio privado da RAEM dos terrenos que viriam a ser anexados ao Lote A2/i e concedidos à ora CI foi, juntamente com todo o processo, objecto de parecer favorável (não vinculativo) da Comissão de Terras, o qual foi homologado por Despacho do Chefe do Executivo em 31 de Agosto de 2006, exarado sobre parecer favorável do SATOP.
XXXVII. Donde se conclui que qualquer eventual vício de que padecessem o acto recorrido e os despachos que o integram foi devidamente sanado com o parecer da Comissão de Terras homologado por Despacho do Chefe do Executivo.

Nos termos das alegações facultativas, vieram respectivamente os recorrentes, a entidade recorrida e a parte contra-interessada apresentaram as suas alegações, concluindo respectivamente que:

Os recorrentes:
1. O objecto da presente impugnação jurisdicional é constituído pelo acto de indeferimento resultante da omissão de pronúncia no recurso hierárquico interposto e ainda pelos despachos supra mencionados do Sr. Director Substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, de 16/08/2005 e do Exmo. Director dos mesmos Serviços, de 1/7/2005, de 8/2/2005, de 4/8/2004, de 4/8/2004, ma medida em que os mesmos são incorporados por aquele;
2. O presente recurso contencioso foi interposto tempestivamente, quer porque se observou na sua interposição o prazo que a lei estabelece, quer porque foi cumprido o prazo na interposição do recurso hierárquico necessário, que constitui requisito de procedibilidade deste meio jurisdicional;
3. Os factos determinantes do início da contagem do prazo de interposição do recurso hierárquico são os que o legislador estabeleceu no artigo 149º do CPA, aplicável por analogia ou até por maioria de razão ao recurso hierárquico necessário;
4. O momento determinante da contagem do prazo para a interposição do recurso hierárquico necessário, requisito processual do presente recurso contencioso, foi o da data em que os Alegantes tiveram conhecimento efectivo dos despachos de aprovação dos projectos de obra, o que se verificou quando os ora Alegantes obtiveram a certidão emitida pela DSSOPT contendo os referidos despachos, o que se verificou no dia 26/4/2006;
5. Tendo os Alegantes afirmado e provado que a construção do prédio da Contra-Interessada afectou, por razões da sua latura, área de implantação, área bruta de construção e dos seus alinhamentos, os interesses da luminosidade (solar), arejamento e salubridade das suas fracções e ainda as condições de lazer, recreio e descanso que o jardim público contíguo lhes dava, isso é suficiente para que tenham legitimidade processual activa para estarem na presente acção, por virtude da titularidade de posições jurídicas subjectivas;
6. Sempre que haja uma notória qualificação do interesse do recorrente, que se encontre numa posição que não é comum a uma multiplicidade de sujeitos, já estaremos no campo das posições jurídicas subjectivas protegidas, configurando-se tal posição, senão como direito subjectivo, ao menos como interesse legítimo;
7. A posição dos Recorrentes no que respeita ao acto impugnado é completamente distinta da posição da generalidade os residentes de Macau e até daqueles que vivem num outro bloco do mesmo edifício, mas que não sofram a incidência da referida construção;
8. Os interesses dos Recorrentes relativos à tutela da confiança, à habitação (com condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, necessárias à saúde, bem-estar e conforto do seu agregado familiar, ao ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente, não são interesses difusos, interesses ”sem dono”, mas antes interesses subjectivados, o que resulte do facto de se encontrarem numa situação particular, distinta da generalidade dos residentes, relativamente ao prédio em causa;
9. As regras do regulamento do PIUNAPE não visam tutelar directamente os interesses dos Recorrentes, mas como os seus interesses estão numa relação de dependência com o interesse público que aquelas normas visam proteger, resulta que os interesses dos Recorrentes beneficiam de uma protecção indirecta ou reflexa de norma jurídica, obtendo tutela jurisdicional através da tutela da legalidade;
10. Os recorrentes têm legitimidade processual activa ao abrigo da norma da alínea a) do artigo 33º do CPAC e não ao abrigo da norma da alínea b) do mesmo preceito;
11. O acto recorrido e os despachos por ele incorporados padecem do vício de violação de lei, na medida em que dão cumprimento ao despacho do Chefe do Executivo, de 8 de Julho de 2004, o qual contraria frontalmente o estabelecido no Regulamento do PIUNAPE;
12. Desde logo, violaram as normas dos artigos 34º e 38º do Regulamento Geral de Construção Urbana, que impõem na apreciação dos projectos de obras a conformidade daqueles com os planos de urbanização e respectivos regulamentos em vigor;
13. O regulamento do PIUNAPE é um verdadeiro regulamento administrativo em sentido material, atendendo às suas notas de generalidade, abstracção, não consumpção da sua eficácia na sua aplicação e inovação jurídica;
14. O regulamento do PIUNAPE é um regulamento eficaz e plenamente vinculativo para a Administração;
15. Contra isto não vale o argumento de que o referido regulamento no presente momento, já não se encontra em vigor, uma vez que foi revogado pelo despacho n.º 248/2006 do Chefe do Executivo, publicado no Boletim Oficial da Região, n.º 34, de 21/8/2006;
16. Este despacho, atendendo ao objecto sobre que incide, um regulamento administrativo, e ao seu conteúdo, que visa fazer cessar os efeitos daquele regulamento, não pode deixar também de ser qualificado como regulamento adminstrativo;
17. Este regulamento é ilegal, pois que procede a uma revogação, pura e simples, na sua totalidade, do regulamento do PIUNAPE;
18. A revogação pura e simples de um plano urbanístico a natureza e a teleologia específicas deste;
19. Os modos de efectivos da dinâmica de um plano urbanístico devem ser compatíveis com a natureza normativa do plano e a sua específica funcionalidade;
20. A Administração está obrigada, nas operações urbanísticas em que intervenha, a respeitar o plano urbanístico existente;
21. De acordo com o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos, a Administração não pode derrogar, em casos concretos, um regulamento administrativo;
22. Proceder à revogação pura e simples de um plano significaria criar um vazio jurídico no que respeita às regras de ocupação, uso e transformação do solo;
23. A Administração não pode proceder à revogação pura e simples do plano urbanístico, principalmente quando isso tenha por resultado abrir as operações urbanísticas à conformação exclusiva de actos individuais.
24. A revogação pura e simples de um plano urbanístico defrauda o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos;
25. Os múltiplos interesses que um plano constitui e conforma apenas são adequadamente tratados através da planificação e não de actos individuais e concretos;
26. Mesmo que estejam edificadas todas as parcelas de terreno sobre que incide um plano, o plano continua a disciplinar os sucessivos actos de edificação que se possam fazer, como também o próprio uso e manutenção dos prédios construídos, o que contraria a justificação dada para a referida revogação;
27. O plano urbanístico apenas pode ser modificado por alteração e revisão, tal como prevê, de resto, a alínea b) do artigo 38º do Regulamento do PIUNAPE;
28. A Administração tinha o dever de rever o PIUNAPE decorridos 5 anos sobre a sua publicação, do facto de o não ter feito não decorre que a Administração pudesse provocar a sua revogação pura e simples;
29. O despacho de revogação do Chefe do Executivo, de 21/8/2006, muito depois do seu despacho de 8/7/2004, que aprovou os condicionamentos urbanísticos e limites do terreno a conceder à sociedade comercial GALAXY RESORTS, S.A., mais não é do que uma tentativa de salvar a aparência da legalidade de todo o processo de construção;
30. O despacho do Chefe do Executivo que procede à revogação do plano urbanístico é ilegal porque afronta o princípio constitucional da legalidade da Administração (consagrado no artigo 65º da Lei Básica, bem como no n.º 1 do artigo 3º do CPA), o princípio geral administrativo, decorrente daquele, da inderrogabilidade singular dos regulamentos (com expressão particularizada no n.º 1 do artigo 109º do CPA) e ainda o próprio Regulamento do PIUNAPE, constante da Portaria n.º 68/91/M, de 18 de Abril, mormente a norma da alínea b) do 30º deste regulamento, que estabelece as formas da revisão e da actualização para a modificação do plano;
31. Sem conceder, o argumento da revogação do regulamento do PIUNAPE não obsta à ilegalidade do despacho Chefe do Executivo, de 8/7/2004, assim como do acto recorrido bem como dos despachos por ele incorporados;
32. No momento em que foi exarado o despacho do Chefe do Executivo, de 8/7/2004, assim como no momento em que se verificou o acto tácito ora recorrido, como no momento em que fora exarados os despachos que este incorporou, estava claramente em vigor o referido regulamento do PIUNAPE;
33. Se assim não fosse, não se perceberia a razão de ser do despacho do Chefe do Executivo, de 21/8/2006, que intentou proceder à sua revogação;
34. De acordo com a função classicamente atribuída ao recurso contencioso e com a função desempenhada pelo juiz administrativo na garantia da legalidade administrativa, o momento relevante para o juízo de apreciação da validade de acto administrativo e o momento da data da conclusão do procedimento administrativo, não sendo de atender as alterações de facto ou de direito superveniente, ainda que ocorridas antes do encerramento da discussão d processo jurisdicional;
35. O acto recorrido, os despachos por ele incorporados, assim como o despacho do Chefe do Executivo de 8/7/2004 que os possibilitou, ao aprovarem os referidos projectos de obra, permitindo a construção de um prédio que ocupava parcelas do domínio público, com uma altura de 150 metros e uma área bruta (ABC), não incluindo a cave, de 90,000 m2 e isento do cumprimento da área de sombras, num lote em que o Regulamento do PIUNAPE apenas consentia uma altura máxima de 80 metros (por exigência do cumprimento da lei de sombras) e uma área bruta de construção total de 43102 m2, violaram, entre outras, as normas dos artigos 17º, 18º, 19º, 20º, 22º, alínea a), 23º, 25º e 34º, alínea a) e b) do regulamento do PIUNAPE;
36. O acto recorrido e despachos por ele incorporados padecem ainda do vício de violação de lei por violação do princípio do respeito por direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 4º do CPA;
37. Os Recorrentes são titulares do direito à habitação com condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, necessárias à sua saúde bem-estar e conforto, tal como resulta do artigo 20º da Lei n.º 6/94/M;
38. A construção viabilidade pelo acto recorrido e pelos actos que o incorporam, o que foi possibilidade pelo despacho do Chefe do Executivo de 8/7/2004, violou este direito dos Recorrentes, na medida em que prédio, pela sua altura descomunal, pela sua área de implantação, pela sua área de construção e pelos seus novos alinhamentos, provoca o ensombramento da fracções, uma vez que se encontra a poente do prédio em que os Alegantes têm as suas casas;
39. A implantação do referido prédio sobre o que fazia parte da Rua Cidade de Sintra e sobre grande parte do Jardim das Artes, eliminando o corredor de ventilação coincidente com essa rua e jardim, faz com que as fracções dos Alegantes se tornassem pouco arejadas e lúgubres.
40. Violada foi ainda a norma do n.º 4 do artigo 20º do diploma acabado de citar, dado não se ter respeitado a exigência de que《na elaboração dos planos de urbanização, de ocupação de solos, de ordenamento urbano e de transportes devem ser tomadas em consideração os interesses das famílias, devendo para o efeito ser ouvidas as associações relacionadas com esses interesses》;
41. O plano urbanístico é um instrumento de conformação e de efectivação do direito fundamental à habitação, elaborado o plano urbanístico, têm as pessoas abrangidas por ele radicadas na sua esfera jurídica um verdadeiro direito à habitação, beneficiando da tutela que resulta da legalidade do plano;
42. Violado foi ainda o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e à qualidade de vida, tal como se consagram nos artigos 3º e 12º da Lei n.º 2/91, de 11 de Março, ao ser, com a referida construção, destruído o Jardim e Artes e o que ele representava em termos de lazer e descanso e em termos ecológicos, e surgir em seu lugar uma pluralidade de pequenos espaços (que nem sequer relevados são), recortados por uma infinidades de vias públicas concebidas única e exclusivamente a pensar no Hotel-Casino que aí se construiu.
43. Violado resultou ainda o direito dos Recorrentes à tutela da confiança, dado que, quando compraram as suas casas estavam convencidos de que as condições que os levaram às referidas compras se não alterariam, até porque existia um plano urbanístico que era de molde a garantir a estabilidade das suas expectativas;
44. AO desrespeitar, de forma gravosa, os referidos direitos dos Recorrentes, o acto recorrido e os despachos que o incorporam violaram o referido princípio do respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos (artigo 4º do CPA) e, com isso, simultaneamente as normas dos artigos 20º da Lei n.º 6/94/M e dos artigos 3º e 12º da Lei n.º 2/91/M, de 11 de Março.
45. Violaram ainda o acto recorrido e os despachos que o integram exigências procedimentais, na medida em que em que aprovaram os projectos de obra e autorizam a construção do prédio objecto daqueles projectos em parcelas de terreno pertencentes ao domínio público, mormente o troço da via pública Rua Cidade de Sintra e parte do Jardim das Artes, contíguos ao Lote 2/i, sem se ter, previamente, procedido à competente desafectação dessas parcelas do domínio público e a subsequente integração no domínio privado do Estado e sem ter havido também o necessário parecer da Comissão de Terras, como determinam, respectivamente, as normas do artigo 4º da Lei de Terras e as normas do artigo 121º desse diploma e da alínea a] do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro (Comissão de Terras);
46. Violaram ainda os referidos despachos exigências de forma, na medida em que, por força da lei, a desafectação de bens dominiais e a sua inclusão no domínio privado da Região é feita através de uma especial forma de acto normativo, o acto legislativo, e, no caso dos autos o que houve foi apenas um mero despacho;
47, Sem conceder, violaram exigências relativas à competência, dado que o acto normativo de desafectação de um bem do domínio público deve ser da competência indelegável do Chefe do Executivo.
Requerimento: Tendo suscitado a Entidade Recorrida e a Contra-Interessada a ilegitimidade activa dos Recorrentes, por considerar não serem os mesmos titulares de posições jurídicas subjectivas substantivas, com o que não se concorda; no entanto, e com vista a garantir, de toda a forma, a observância do pressuposto da legitimidade processual activa, vêm, respeitosamente, requerer se digne V.Exa. autorizar a junção aos autos dos seus Bilhetes de Identidade de Residentes Permanentes de Macau, através de fotocópia simples.
Termos em que, deve acto impugnado ser anulado nos termos supra referidos.

A entidade recorrida:
1. O objecto do presente recurso contencioso é o acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto para o Secretário para os Transportes e Obras Públicas dos despachos do direito e do director substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, melhor identificados na petição de recurso, que consideraram “passíveis de aprovação” condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i concedida à Galaxy Casino S.A., Proc. n.º 210/2003/L, da DSSOPT.
2. A legitimidade processual activa dos Recorrentes advém-lhes da alínea b) do artigo 33º, conjugado com o artigo 36º, do CPA.
3. Os Recorrentes alegam interesses que dizem respeito a todos os residentes da RAEM, genericamente tutelados pelo direito mas que não têm um titular singular, não sendo direitos ou interesses especialmente personalizados.
4. Assim é, que requerem “a junção aos autos dos seus Bilhetes de Identidade de Residentes Permanentes de Macau através de fotocópia simples” – fls. 462 dos presentes autos.
5. De acordo com o registo do livro de obra, relativo ao Lote 3 (A2/i) do NAPE, o edifício em construção (Hotel-Casino) atingiu, em 30 de Novembro de 2005, a altura de 81.050 metros, a que correspondia o piso 15 (L15).
6. Os Recorrentes – contra-interessados no licenciamento – só numa fase bastante adiantada da obra é que decidiram intervir no processo, solicitando a sua consulta apenas em 9 de Março de 2006, quando o edifício já tinha atingido a altura de 119.400 metros, a que correspondia o piso 26 (L26).
7. O recurso hierárquico foi interposto em 4 de Maio de 2006.
8. De acordo com o n.º 1 do artigo 155º do CPA é de 30 dias o prazo para a interposição do recurso hierárquico necessário.
9. O artigo 149º do CPA, invocado pelos ora Alegantes, diz respeito ao “prazo da reclamação”.
10. Dos actos cabia “recurso hierárquico necessário” – artigo 154º, n.º 1 do CPA, n.º 2 do artigo 6º e Anexo VI do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, artigos 2º, alínea j) e 4º, alínea c) do Decreto-Lei n.º 29/97/M, de 7 de Julho, e Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 17 de Agosto (Regulamento Geral da Construção Urbana).
11. A execução da obra revestiu-se de publicidade e mais ainda quando, por via dela, se iniciou a demolição de parte do Jardim das Artes.
12. Não estando os despachos sujeitos nem a publicação nem a notificação dos Recorrentes – não eram eles os destinatários -, o prazo para a impugnação graciosa teria de contar-se do começo da execução do acto, pois através da obra iniciada se revelaria a potencialidade de violação de direitos de terceiros, os ora Recorrentes.
13. Intempestivo o recurso hierárquico, intempestivo o recurso contencioso – artigo 155º, n.º 1, do CPA.
14. O que, por força da alínea h) do n.º 2 do artigo 46º, do CPAC, conduz à rejeição do recurso contencioso.
15. Os despachos recorridos são actos conformativos do despacho do Chefe do Executivo, de 8 de Julho de 2004.
16. São actos que se limitaram a por em prática os novos alinhamentos e condicionalismos urbanísticos previamente estabelecidos através daquele despacho.
17. O despacho de aprovação final dos projectos é, no fundo, o acto que concede o licenciamento da obra – cfr. n.º 2 do artigo 40º, do RGCU – sendo que à falta de um despacho de aprovação final se entenda que o acto que aprova o último projecto de obra é, com efeito, o acto que consubstancia o licenciamento da obra.
18. O despacho de 16 de Agosto de 2005 – que aprovou o último projecto de obra – é o acto final e eventualmente lesivo de direitos ou interesses legalmente protegidos dos contra interessados no licenciamento, sendo todos os outros que o antecedem actos meramente preparatórios da decisão final.
19. Foi na qualquer de contra-interessados que os Recorrentes decidiram impugnar os despachos do director substituto e do director da DSSOPT, relativos à aprovação dos projectos e à emissão das licenças de obra.
20. A aprovação do regulamento do PIUNAPE não teve por base a execução de qualquer lei que se refira à existência daquele ou de outros planos.
21. A vinculação dos particulares às soluções urbanísticas que a Administração pretende ver consagradas, não se faz tanto pela publicação de Planos Urbanísticos mas sim pela emissão da Plana de Alinhamento a definir para o local e, no que se refere a terrenos do domínio privado da RAEM, também através de contratos de concessão, nos termos dos artigo 99º, 103º e 104º da Lei de Terras (Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho, e sucessivas alterações).
22. A revogação do Regulamento do PIUNAPE não foi efectuada, sem mais, para um caso concreto, isolado, mas sim em termos gerais e abstractos, sob a foram de despacho do Chefe do Executivo de natureza regulamentar, como aliás os próprios Recorrentes reconhecem, além de que o referido despacho procedeu ainda à revogação dos Regulamentos dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande – Portaria n.º 69/91/M, de 18 de Abril.
23. As razões que determinaram a revogação dos mencionados Planos relacionam-se com o facto destes estarem completamente desajustados em relação ao actual desenvolvimento sócio-económico da RAEM.
24. A liberalização da actividade dos jogos antevia o desenvolvimento da indústria do turismo e, consequentemente o crescimento económico de outros sectores e o desenvolvimento social.
25. A escassez de solos disponíveis obrigou à canalização, para a zona do NAPE, de grandes empreendimentos ligados ao sector dos jogos e do turismo, nomeadamente de novos hotéis.
26. A revogação do Regulamento do PIUNAPE, e dos Regulamentos dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande, só poderia ser posta em causa se os Planos Urbanísticos estivessem expressamente previstos na lei, face ao princípio da legalidade da Administração, consagrado no artigo 65º da Lei Básica da RAEM, e de igual modo no artigo 3º, n.º 1 do CPA.
27. Não faz qualquer sentido, no caso, a invocação do princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos para sustentar a pretendida ilegalidade da revogação da Portaria n.º 68/91/M, de 18 de Abril.
28. Continua em vigor o Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU), aprovado pelo Diploma Legislativo n.º 1600, com as alterações que lhe foram introduzidas.
29. A alínea b) do artigo 38º do Plano, sob a epígrafe “Condições de aplicação e prazos de vigência do PIUNAPE” expressamente determinava a sua revisão e actualização decorridos 5 anos sobre data da sua aplicação, data que se reporta a 1991 (Portaria n.º 68/91/M, de 18 de Abril).
30. O PIUNAPE estabelecia, não um jardim mas, um sistema de canais (cfr. alínea g) do ponto 4.6 da Memória Descritiva do Plano e Planta da Malha Urbana que integra aquele Plano, a páginas 1616 do 2º Suplemento do Boletim Oficial de Macau n.º 15, e artigos 4º e 35º do Regulamento do PIUNAPE), sendo de salientar que o Plano já tinha sido objecto de alterações (de sistema de canais inicialmente previsto e construído, transformou-se, em 1999, no Jardim das Artes).
31. O acto recorrido não padece de vício de violação de lei por violação do princípio do respeito por interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 4º do CPA, somenos violação do artigos 20º da Lei n.º 6/94/M, de 1 de Agosto, ou dos artigos 3º e 12º da Lei n.º 2/91/M, de 11 de Março.
32. É manifesta a improcedência de qualquer dos últimos dos vícios assacados ao acto recorrido – de forma, de procedimento e incompetência – por violação das normas dos artigos 4º e 121º da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de Terras) e da alínea a) do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro (Comissão de Terras).
33. Não há impedimento a que a desafectação do domínio público e subsequente integração no domínio privado da RAEM de estradas, arruamentos e outras vias públicas ou parte das mesma, bem como dos jardins ou parte destes, seja feita mediante despacho do Chefe do Executivo ou do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (mediante delegação de poderes), despacho esse a publicar no Boletim Oficial.
34. A Lei de Terras e o Decreto-Lei n.º 60/99/M, de 18 de Outubro, contêm qualquer norma que se refira à exigência de pronúncia da Comissão de Terras, através de parecer obrigatório, para a desafectação dum bem o domínio público e subsequente integração no domínio privado da RAEM (cfr. a título de exemplo os Decretos-Lei n.º 56/97/M, de 15 de Dezembro e n.º 36/98/M, de 17 de Agosto).
    Nestes termos o recurso contencioso deve ser rejeitado por caducidade do direito de recurso, de acordo com o disposto na alínea h) do artigo 46º do CPAC, ou, quando assim não for entendido.

A contra-interessada:
I. Segundo acórdão deste Venerando Tribunal de Segunda Instância “Todos os “direitos subjectivos” e “interesses legalmente protegidos” alegados [pelos Recorrentes noutro processo mas idênticos aos alegados nos presentes autos], a existirem, são apenas direitos ou interesses doutrinalmente apelidados de difusos, cuja tutela legal é processualmente possível graças exclusivamente ao mecanismo de acção popular (...)”.
II. Logo, os presentes autos só podem prosseguir sob a égide da acção popular, ao abrigo da al. b) do art. 33º, conjugado com o art. 36º, ambos do CPAC.
III. Resulta comprovado dos autos que a altura do edifício in questio – Hotel Starworld – ultrapassou a barreira dos 80 metros no dia 13 de Setembro de 2005.
IV. Ora, apenas no dia 9 de Março de 2006, numa altura em que a construção do Hotel Starworld havia atingido os 150 metros, estando a ser ultimada a conclusão da cobertura, os Recorrentes solicitaram a consulta do processo administrativo relativo à construção do Hotel, consulta que foi autorizada no dia 4 de Abril de 2006.
V. O competente recurso hierárquico necessário apenas foi interposto no dia 4 de Maio de 2006.
VI. Se o prazo para a interposição do recurso se contasse apenas a partir de 4 de Abril 2006, sucederia que o prazo para a interposição de recuso dos despachos in questio passaria a depender exclusivamente da iniciativa dos potenciais lesados, sendo que a certeza e a segurança do comércio jurídico não se compadecem com tal interpretação!
VII. Se os despachos recorridos não tinham de ser notificados aos Recorrentes, uma vez que eles não eram os destinatários de tal acto, a eficácia de tal acto perante terceiros terá de se contar a partir do começo da sua execução, ou, pelo menos, do começo da sua execução prejudicial para tais terceiros, por força do disposto na parte final do n.º 1 do art. 121º do CPA.
VIII. Pelo que, sendo de 30 dias o prazo prescrito por lei para a interposição do respectivo recurso hierárquico necessário, o direito de usar deste expediente há muito que havia caducado.
IX. Logo, também o direito dos Recorrentes de interporem o presente recurso caducou.
X. o acto recorrido e os despachos que o integram que constituem o objecto do presente recurso mais não são do que actos preparatórios do despacho que consubstancia o licenciamento da obra in quesito – a obra de construção do Hotel Starworld.
XI. O RGCU permite a entrega de projectos de obra por fases, faculdade que a CI utilizou, e razão pela qual os seus projectos foram sendo faseadamente considerados passíveis de aprovação.
XII. O RGCU prevê determinados prazos para a aprovação de projectos de obra, sendo de 30 dias o prazo para a aprovação de projectos entregues por fases.
XIII. Tem sido entendimento unânime que, na ausência de um despacho de aprovação de um projecto de obra ou de quaisquer das suas fases, o acto que aprova o último projecto de obra é o acto de emissão da licença de obras.
XIV. Sendo que a tónica da recorribilidade contenciosa assenta no facto de o acto ser ou não lesivo, conclui-se que os despachos de que os Recorrentes recorrem nos presentes autos mais não são do que actos preparatórios ou instrumentais do acto que titula o licenciamento de obras, logo, o presente recurso, porque interposto contra tais actos preparatórios, não poderá ser atendido.
XV. O artigo 109º, n.º 1, do CPA, onde se estatui que “Os regulamentos necessários à execução das leis em vigor não podem ser objecto de revogação global sem que a matéria seja simultaneamente objecto de nova regulamentação.”.
XVI. Ora, PIUNAPE não consubstancia um regulamento necessário à execução de qualquer lei anterior ao mesmo, logo, nada impedia que o mesmo fosse livremente alterado ou mesmo revogado a qualquer momento.
XVII. Aliás, o próprio PIUNAPE previa que a revisão e actualização desse mesmo diploma deveria ser efectuada decorridos 5 anos após a sua publicação.
XVIII. Acresce que a desactualização e desadequação do PIUNAPE foi por diversas vezes verificada ao longo do tempo, desde logo com a aprovação, em 1999, da construção do Jardim das Artes, num local onde o PIUNAPE previa a existência de canais de água, e, mais recentemente, com as alterações introduzidas por diversos documentos não publicados, nomeadamente pelo PRPINO, e, bem assim, com a construção de diversos hotéis e casinos, tais como, para além do Hotel Starworld, o Sands, o Wynn, o MGM, para não falar de outros edifícios com diferentes finalidades.
XIX. Note-se que todas estas construções foram aprovadas e iniciadas antes mesmo da revogação do PIUNAPE, que viria a ocorrer apenas em 16 de Agosto de 2006, através de Despacho do Chefe do Executivo;
XX. Aliás, este despacho do Chefe do Executivo fundamenta a revogação do PIUNAPE com várias evidências que há muito são do conhecimento público, a saber: a versão actualizada de tais Planos não foi publicada; as condições que estiveram na origem da implementação daqueles Planos foram sendo alteradas ao longo do tempo e estão hoje completamente desajustadas em relação ao actual desenvolvimento socio-económico de Macau; a escassez de terrenos e as repercussões da liberalização e desenvolvimento da indústria do jogo, nomeadamente no que se refere à criação das condições necessárias à concretização dos projectos de investimento das concessionárias.
XXI. Ora, inexistindo uma lei geral e abstracta que obrigue à existência de um plano de urbanização, significa que um plano criado por vontade governamental pode ser pontualmente alterado, podendo ser inclusivamente revogado sem que, em nenhum desses casos, se possa considerar haver violação de lei.
XXII. E não obstante o PIUNAPE ter sido revogado, tal não significa uma total ausência de regulamentação na actividade de construção: tal actividade rege-se não só pelo RGCU, pelas plantas de alinhamento a definir para cada local, e, ainda, no domínio das relações privadas, pelos contractos de concessão.
XXIII. Relembre-se que, ao contrário da zona do NAPE e da Baía da Praia Grande, muitas outras zonas há em Macau cuja construção não está nem esteve regulamentada por planos de urbanização, sendo o exemplo mais notário disso o caso do COTAI.
XXIV. E, assim, não é aplicável in casu o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos administrativos, princípio este que não proíbe uma revogação geral e abstracta de um regulamento administrativo, mas antes e apenas uma derrogação, num caso concreto, sem qualquer justificação – o que não foi o caso;
XXV. Assim, é forçoso concluir pela absoluta e inquestionável legalidade tanto do Despacho do Chefe do Executivo que revogou o PIUNAPE como dos actos de aprovação da construção do Hotel Starworld posto que a derrogação do PIUNAPE que os mesmos consubstanciaram não representaram uma derrogação sem mais do PIUNAPE, tendo sido devidamente justificados por razões genéricas e abstractas, tratando-se de actos concertados com outras decisões tomadas relativamente a deferentes projectos de construção, como os casos do Sands, do Wynn, do MGM e de outros projectos de diferente natureza construídos ou ainda em construção no NAPE.
XXVI. Em suma, há que concluir que tanto aquando das autorizações pontuais de construções conflituantes com o PIUNAPE como aquando da revogação do próprio PIUNAPE, interesses particulares tiveram de ceder perante o interesse público!
XXVII. Neste sentido, decidiu o Supremo Tribunal Administrativo de Portugal que “Por obediência ao princípio da proporcionalidade a Administração deverá escolher dentro dos diversos meios ou medidas idóneas e congruentes de que disponha aqueles que sejam menos gravosos ou que causem menos danos. Estamos aqui no domínio do principio da intervenção mínima por forma a que se consiga compatibilizar o interesse publico e os direitos dos particulares, de modo a que o princípio da proporcionalidade jogue como um factor de equilíbrio garantia e controlo dos meios e medidas.”
XXVIII. Mas mesmo que assim não se entenda, sempre teria de se concluir pela inutilidade superveniente dos presentes autos porquanto não faria sentido anular os despachos que aprovaram a construção do Hotel Starworld porque estavam feridos de ilegalidade à data da sua prática, quando, na presente data, após a revogação do PIUNAPE, tal construção se encontra plenamente de acordo com a lei em vigor, pelo que nenhuma consequência poderia advir de tal anulação relativamente a tal edifício.
XXIX. O art. 20º da LBPF não consagra de modo algum a protecção do direito à habitação com condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, pelo que esta disposição não foi violada;
XXX. O nº 4 do art. 20º da LBPF impõe que na elaboração dos planos de urbanização sejam tomados em conta, entre outros, os interesses das famílias, devendo para o efeito ser ouvidas as associações relacionadas com esses interesses; porém, nem o acto recorrido nem os despachos que o integram estão relacionados com a elaboração de planos de urbanização, pelo que também esta norma não foi violada.
XXXI. A LBA consagra que todos têm direito a um nível de iluminância conveniente à sua saúde, bem-estar e conforto na habitação, mas em parte alguma se consagra qualquer direito ao arejamento das habitações.
XXXII. No momento em que os Recorrentes compraram as suas fracções, o lote onde viria a ser construído o Hotel Starworld encontrava-se vago, sendo possível que as ditas fracções gozassem de óptimas condições de luminosidade solar, arejamento e salubridade.
XXXIII. O PIUNAPE previa a construção de um Hotel no Lote A2/i com uma altura de 80 metros, sendo certo que o projecto de construção do Hotel Starworld que viria a ser aprovado permitiu uma altura de 150 metros;
XXXIV. Porém há que considerar que o perfil transversal (i.e., largura) previsto pelo PIUNAPE para a rua que separa o edifício do qual fazem parte as fracções dos Recorrentes e o Hotel é de 24 metros e que a altura prevista para o edifício do qual fazem parte as fracções dos Recorrentes é de 50 metros;
XXXV. Ora, a existência de um edifício de 80 metros ou 150 metros é totalmente irrelevante no que concerne às condições de iluminância, arejamento e salubridade de que goza um edifício de 50 metros que confronta com o primeiro edifício.
XXXVI. Donde se conclui que da construção do Hotel Starworld não resulta a violação dos alegados direitos a iluminância, arejamento e salubridade dos Recorrentes, enquanto titulares de fracções de um edifício contíguo ao mencionado Hotel na medida em que as condições de que as referidas fracções beneficiavam sempre se perderiam uma vez construído um edifício com as dimensões previstas no PIUNAPE!
XXXVII. Os Recorrente não provaram (nem o poderiam fazer, face ao que ficou sito acima) que da construção do Hotel Starworld resultou a perda das condições de iluminância, arejamento e salubridade ou mesmo uma redução dessas condições que permitam ao Tribunal ad quem concluir pela violação dos direitos consagrados no art. 20º da LBPF e nos arts. 3º e 12 da LBA.
XXXVIII. A continuidade do corredor verde do Jardim das Artes não foi interrompida com a construção do Hotel Starworld, mas antes com a construção de vias públicas.
XXXIX. Por outro lado, a construção de um jardim ao longo da Rua Cidade de Sintra e da Avenida da Amizade não se encontrava prevista no PIUNAPE pois para esse local estava prevista a existência de um canal de água, logo, com a construção do Hotel Starworld não foi violado o PIUNAPE.
XL. Mesmo admitindo que a construção do Jardim das Artes consubstanciou uma excepção válida ao PIUNAPE, isto não conferiu quaisquer direitos ou expectativas ao Recorrentes de que tal jardim ali deveria permanecer para sempre.
XLI. Nada na lei impede que a desafectação de terrenos do domínio público e a sua concessão a privados sejam executados através de um só acto, tendo sido isso que sucedeu no caso sub Júdice.
XLII. Nada na lei exige a pronúncia da Comissão de Terras, através de parecer obrigatório, previamente à desafectação do terrenos do domínio público e integração no domínio privado da RAEM.
XLIII. Não obstante, a desafectação terrenos do domínio público e integração no domínio privado da RAEM dos terrenos que viriam a ser anexados ao Lote A2/i e concedidos à ora Cl foi, juntamente com todo o processo, objecto de parecer favorável (não vinculativo) da Comissão de Terras, o qual foi homologado por Despacho do Chefe do Executivo em 31 de Agosto de 2006, exarado sobre parecer favorável do SATOP.
XLIV. Donde se concluir que qualquer eventual vício de que padecessem o acto recorrido e os despachos que o integram foi devidamente sanado com o parecer da Comissão de Terras homologado por Despacho do Chefe do Executivo.
Nestes termos, deve o presente recurso ser rejeitado por intempestivo ou, se assim não se entender, o que apenas por cautela de patrocínio se admite, deve o mesmo ser julgado improcedente, por não provado.

O Digno Magistrado do Ministério Público apresentou o seu douto parecer que se transcreve o seguinte:
“Vêm Catarina Coelho Ruas, B e C impugnar o acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto para o Secretário para os Transportes e Obras Públicas dos despachos do director e director substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, que consideraram passíveis de aprovação condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i concedido à “Galaxy Casino, SA”, Proc. 210/2003/L da DSSOPT, assacando-lhe uma vasta panóplia de vícios, que nos permitimos sintetizar com o enquadramento em 3 vertentes essenciais:
- afrontas da inderrogabilidade singular dos regulamentos, da legalidade da Administração e do Regulamento do PIUNAPE, decorrentes da revogação do plano urbanístico;
- atropelos de normativos vários do mesmo Regulamento, do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos, do direito à habitação em condições adequadas de iluminância, arejamento e salubridade necessárias à saúde, bem estar e conforto, do direito a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado e à qualidade de vida e ainda à tutela da confiança, decorrentes directamente do acto recorrido e despachos nele incorporados que permitiram a aprovação da obra e, finalmente,
- vícios de forma, por falta de exigências procedimentais, por ocupação de parcelas de terrenos afectas ao domínio público sem prévia desafectação desse domínio e subsequente integração no domínio privado da RAEM, sem parecer da Comissão de Terras, ao que acresce que tais procedimentos só poderiam ter sido levados a cabo através de acto normativo e não por simples despacho, assacando-se ainda incompetência, dado que o acto de desafectação de bem do domínio público é da competência indelegável do Chefe do Executivo.
Analisando:
Uma primeira nota, não poderá deixar de se reportar às excepções aduzidas – a ilegitimidade dos recorrentes e a caducidade do direito ao recurso.
Cremos, porém, não proceder qualquer delas.
Desde logo, no que tange à legitimidade, é matéria sobre a qual existiu já pronúncia por este Tribunal, no âmbito do proc. 218/2006, por acórdão datado de 20/7/06, onde tal problemática foi douta e profusamente abordada, havendo que, em nosso critério, assumir, a esse nível o enquadramento, os parâmetros ali enunciados, não se divisando qualquer outra consideração útil a tecer a tal propósito.
Quanto à tempestividade, aceitamos que, nos contornos factuais apontados, tenha existido alguma displicência por parte dos recorrentes ao não terem providenciado, mais cedo, pelos elementos atinentes à aprovação da obra em questão uma vez que, habitando fracções situadas no último e penúltimo andares do prédio virado, em toda a sua extensão, para aquela obra, é crível que se devessem ter apercebido dos contornos da mesma que agora contestam, designadamente a altura, em momento muito anterior ao que se propuseram indagar e obter elementos.
Só que, à míngua de norma específica do CPA àcerca do momento concreto a partir do qual se deverá contar o prazo para a interposição do recurso hierárquico necessário no caso de inexistência de publicação ou notificação do acto, não descortinamos forma mais adequada de suprir tal falta que não seja pela aplicação analógica do previsto, a tal propósito, para a Reclamação (art.º 149º, al c)), ou seja, a data em que os interessados tiveram conhecimento do acto.
Inexistindo qualquer dado ou elemento válido que permitam infirmar o alegado pelos recorrentes àcerca dessa data, no caso a do conhecimento concreto e efectivo dos despachos de aprovação dos projectos de obras, com o acesso e consulta ao processo de licenciamento de obras em 4/4/06, ter-se-á que concluir ter o recurso hierárquico sido interposto em tempo.
Passemos, pois, ao mérito do recurso.
A revogação do Regulamento, embora em termos gerais e abstractos, que não reportados a qualquer caso concreto, foi efectuada sob a forma de despacho do Chefe do Executivo, de natureza regulamentar, sendo que, aquando do mesmo despacho, se procedeu também à revogação dos Regulamentos dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande.
Independentemente das razões avançadas pela recorrida, que terão determinado tais revogações (razões de ordem técnica e política de que aqui nos não incumbe cuidar) as mesma só poderiam ser postas em causa se os planos urbanísticos em questão estivessem expressamente previstas na lei. O que não é o caso.
Daí que não faça muito sentido em falar-se de inderrogabilidade singular dos regulamentos ou na afronta do princípio da legalidade da Administração consagrado no artº 65º LBRAEM e 13º, n.º 1 do CPA, como o não faz esgrimir-se com o facto de o próprio Regulamento do PIUNAPE, na al b) do seu artº 38º, prever a sua modificação por alteração e revisão: tais normas, tendo acuidade e pertinácia enquanto o Regulamento em vigor, não impediam, nem o poderiam fazer, a revogação do próprio diploma em que estavam enquadrados.
Quanto à tutela da confiança, fazem-na os recorrentes assentar, no essencial, precisamente na existência de plano urbanístico, cujo regime lhes garantiria a estabilidade das suas expectativas aquando da compra da casa, dada até a dominialidade pública da zona em questão.
Só que tal asserção se revela algo contraditória com a invocação, pelos próprios, da possibilidade de revisão e actualização desse plano, decorridos 5 anos, nada obstando, em princípio, mesmo que aquele plano não fosse revogado, a que os recorrentes não pudessem ver alterado o “panorama” do “Jardim das Artes” em frente às suas habitações, tanto mais que o plano, na sua originalidade, não estabelecia para a zona qualquer jardim, mas um sistema de canais.
Daí que as “expectativas” invocadas não pudessem ter raízes tão profundas nem tutela tão assinalável, sob pena de, num território tão pequeno e com tanta escassez de terrenos como Macau, não poder o adquirente de uma fracção junto ao mar esperar que, quiçá, por força de necessidade de solos, à sua frente possa surgir um novo aterro com as construções inerentes. A ser assim, não existiria o próprio NAPE...
No que tange à protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos, como o direito à habitação em condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, a protecção de tais interesses, no que ao domínio das construções toca há-de pautar-se pelos dispositivos legais aplicáveis, designadamente do RGCU actualmente em vigor, não se vislumbrando, contudo, a invocação de qualquer atropelo a esse nível.
Aliás, bem vistas as coisas, do que se trata é de construção de edifício, é certo, com altura bastante superior à cota do edifício habitado pelos recorrentes mas deste separado pelo menos pela largura da Av. Sir Anders Ljungstedt.
Ora, se tal significa, “per se”, a afronta à saúde, bem estar e conforto e ambiente dos recorrentes, o mínimo que se poderá concluir é que, a grande maioria dos residentes de Macau se encontra privado do acesso a tais direitos fundamentais, o que constituiria uma verdadeira desgraça...
Percebe-se, que, porventura, a “qualidade de vida” a que aqueles se arrogam possa, de alguma forma, ter sofrido evolução negativa com a aprovação dos projectos em causa, na medida em que, de facto, sempre servirá melhor tais propósitos a existência, em frente da habitação, de um jardim, que de um casino: contudo, nem esses interesses têm correspondência com eventuais normativos que hajam sido postergados, nem, como se viu, podem corresponder a expectativas reais e juridicamente tuteladas.
Finalmente, também se não alcança atropelo a nível da forma, já que por um lado, inexiste qualquer impedimento em que a desafectação do domínio público e a integração no domínio privado da RAEM, designadamente de vias públicas e jardins, ou de parte deles, possa ser efectuada por despacho de concessão do Chefe do Executivo ou da entidade recorrida, mediante delegação de poderes, nesse despacho se integrando as duas fases do processo anteriormente separadas, a desafectação e a concessão e, por outro, também se não vislumbra que a Lei de Terras e o Dec Lei 60/99/M de 18/10 contenham qualquer norma que se refira à exigência de pronúncia da Comissão de Terras através de parecer obrigatório para os efeitos em questão.
Donde, por não ocorrência de qualquer dos vícios assacados, ou de qualquer outro de que cumpra conhecer, sermos s pugnar pelo não provimento do presente recurso.”

  II - Pressupostos processuais
1. Este tribunal é o competente.
2. O processo é o próprio.
3. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias.

4. Quanto à legitimidade das partes, a entidade recorrida na sua contestação levantou, a priori, as questões de legitimidade activa dos recorrentes.
Quanto à esta questão, tal como referiu o douto parecer do Ministério Público, “é matéria sobre a qual existiu já pronúncia por este Tribunal, no âmbito do proc. 218/2006, por acórdão datado de 20/7/06, onde tal problemática foi douta e profusamente abordada, havendo que, em nosso critério, assumir, a esse nível o enquadramento, os parâmetros ali enunciados, não se divisando qualquer outra consideração útil a tecer a tal propósito”.
A decisão final daquele processo n° 218/2006 tinha sido causa da prejudicialidade pela qual foi ordenada a suspensão da instância do presente recurso.
Nos presentes autos, os recorrentes levantaram a questão de violação pelo acto recorrido pelo vício de violação da lei, por um lado, a violação da lei, por violação de normas do regulamento geral da construção urbana e do regulamento PIUNAPE, por outro, a violação do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos recorrentes, essencialmente, pelos factos de ter a construção provocado o ensombramento das fracções, eliminado o corredor de ventilação coincidente com a rua e jardim, fazendo com que as fracções dos recorrentes se tornassem pouco arejadas e lúgubres.
Sobre a questão idêntica, no acórdão proferido no processo n° 21/2010, de 07 de Dezembro de 2011, tomou-se a seguinte consideração:
“Qualquer pessoa que se considere titular de direito subjectivo ou interesse legalmente protegido que tenha sido lesado pelo acto em causa goza de legitimidade para dele recorrer (art. 33°, do CPAC).
Por outro lado, e como é sabido, a legitimidade é um pressuposto processual aferível pela forma como a situação é descrita na petição inicial, pela marca como é invocado o direito e pelo modo como é materializada a ofensa a este, independentemente do exame sobre o fundo ou mérito do recurso (J. Castro Mendes, in Direito Processual Civil, II, pago 153).
Terá que ser um interesse directo, pessoal e legítimo (art.33°, al. a), do CPAC).
Directo, na medida em que do provimento do recurso lhe advenha um proveito imediato e objectivo. Directo, na medida também em que o provimento implique a anulação do acto que esteja a constituir um obstáculo à satisfação de uma pretensão ou seja causa imediata de um prejuízo (M. Caetano, Estudos de Direito Administrativo, edições Ática, n° 46, pago 240 e Manual de Direito Administrativo, 10a ed., II, pago 1356; Fermiano Rato in Revista de Direito Administrativo; F. Amaral, Direito Administrativo, IV, 1988, pago 168/170; Ac. STA de 28/4/94, in AD n° 394/1111). E esse interesse directo haverá de traduzir-se numa verosímil posição de utilidade ou vantagem, independentemente de ficar ou não eliminada a causa da lesão que motive o recurso (Ac. do STA de 22/02/93, Rec. N° 25 160). Nesta perspectiva, a legitimidade não é a legitimidade condição, ligada ao fundo da causa, mas como se disse mero pressuposto processual (Ac. do STA de 17/11/96, Rec. N° 38005 e 1/10/98, Rec. N° 43 423, entre outros).
Pessoal, no sentido da existência de um relação de titularidade entre a pessoa do recorrente e a pretensão por cuja vitória pugna ou o prejuízo causado pelo acto cuja anulação pretende obter (M. Caetano, in «Estudos…», pago 242 e «Manual ... », II, 1357).
Legítimo, supondo-se estar em sintonia com a ordem jurídica estabelecida e por esta não reprovada (M. Caetano, «Manual…» cit, II, pago 1357; F. Amaral, ob. cit. pago 171; Guilherme da Fonseca, in «Condições de procedibilidade» na obra Contencioso Administrativo, Livraria Cruz, Braga, pago 201).
Portanto, não está em causa a titularidade da relação jurídica como fundamento para a legitimidade, mas a lesão que possa advir do acto para a esfera do recorrente. E nessa apreciação, não temos que chamar à colação argumentos que se prendem com o fundo ou o mérito da causa (legitimidade-condição), mas sim toda uma série de razões que explicam a atitude processual do recorrente e exibam bem o motivo pelo qual se insurge contra determinado acto. Saber se do ponto de vista da substância ele é procedente, isso já escapa à noção adjectiva e processual que se deve ter presente na análise da legitimidade-pressuposto.
Ora, o recorrente invocou na petição uma série de razões pelas quais entende estar afectada a sua esfera jurídica, enquanto proprietário de prédio habitacional fronteiriço. Assim, considera-se, neste aspecto, reconhecido o interesse directo e pessoal, não havendo por outro lado qualquer factor que tome ilegítima a pretensão reactivo / contenciosa que aqui demonstra.
Em suma, a recorrente goza de legitimidade activa.”
Com os mesmos fundamentos, são considerados os recorrentes legítimos.

5. Invocaram ainda a questão de tempestividade do recurso.
Tal como os fundamentos das respostas da entidade recorrida e do contra-interessado, entenderam que uma vez que em 9 de Março de 2006 os recorrentes foram consultar o procedimento relativo à construção do Hotel Starworld e só no dia 4 de Maio de 2006 interposto o recurso hierárquico necessário, ficou assim caducado o direito de recurso, por ter decorrido mais de 30 dias após o conhecimento do acto.
Concordamos também nesta parte o douto parecer do Ministério Público, que se dá por reproduzido para a decisão do presente, ter-se-á que concluir ter o recurso hierárquico sido interposto em tempo.
*
III. Saneados os pressupostos processuais, conhecemos as questões de fundo.
1. De facto
São os seguintes factos que se afiguram relevantes para a decisão do presente recurso contencioso de anulação:
1.1. Por despacho de Sua Excelência o Chefe do Executivo, de 8 de Julho de 2004, exarado na Informação n.º 097/DPU/2004, através do despacho de “concordo”, aprovou os condicionamentos urbanísticos e limites do terreno novo a conceder conforme o que vem indicado nos pontos 5. 5) a.) 5. 5) f.) da referida Informação e no Estudo da Planta de Alinhamento e Condicionamentos Urbanísticos apresentada em anexo à referida Informação (cfr. fls. nºs 145 a 148 e ainda 141 a 144 do vol. 3 do processo administrativo apenso aos presentes autos);
(Nota: no que respeita ao processo administrativo, serão sempre indicados apenas os n.ºs dactilografados que se encontram impressos nas respectivas folhas)
1.2. A referida Informação, continha, além do mais, o seguinte:
《3. Face ao presente planeamento do hotel a ser construído no terreno em causa, foi sucessivamente elaborado por este Departamento 3 informações para a análise e estudo do assunto (respectivamente nº 81/DPU/2003, de 12 de Maio de 2003, n.º 165/DPU/2003, de 1 de Dezembro de 2003 e n.º 22/DPU/2004, de 29 de Janeiro, de 2004), contudo, não foi ainda obtido o despacho superior relativamente aos requisitos de planeamento no âmbito da concessão do terreno e da cércea máxima.... (sublinhados nossos).
《4. A saber, os dados técnicos arquitectónicos do presente estudo:
1) Área do terreno pretendida: 6.864 m2
(A área do terreno do Lote era de: 2.916m2, sendo solicitado o acréscimo de uma área de 3.948m2, perfazendo uma área total de 6.864 m2) (vide planta anexa 1).
2) Altura do edifício: 148 m (151,5m), 2 caves afectas ao parque de estacionamento e 35 pisos acima do solo (incluindo 2 pisos de refúgio).
(...)
《5. Análise do estudo prévio:
(...)
3) A área ocupada pelo piso térreo é de 53,30m x 63m e a área ocupada pelos pisos superiores é de 60m x 98m (incluindo hotel e a parte afecta à finalidade comercial e às instalações diversas) (vide planta anexa 2).
4) De acordo com a análise realizada, o projecto do casino e hotel ocupa parte do terreno do Jardim das Artes e da área dos passeios da Rua Cidade de Sintra e da Avenida 24 de Junho, com vista a aumentar a área do terreno a desenvolver ....
5) Os dados técnicos, nomeadamente o IUS e a disposição do trânsito, obedecem às instruções e às exigências em termos do planeamento urbano, logo então, para que o assunto relativo à ocupação do terreno possa ser superiormente analisada e decidida, está a ser elaborado o respectivo PAO e fixado o âmbito de desenvolvimento do terreno e as instruções inerentes ao planeamento urbano para submeter à consideração superior, nestes termos, solicitando-se que seja aprovado o seguinte:
a. Âmbito do terreno descrito na PAO (aproximadamente 6.484 m2), sendo necessário ocupar a área do Jardim das Artes e das vias públicas.
b. Limite de altura do prédio: 150m (153,5m NMM).
c. IUS: 13.5, ABC (excluindo o parque de estacionamento subterrâneo) de 90.000 m2.
d. Isenção do cumprimento do artigo 88.° do Regulamento Geral da Construção Urbana, aprovado pelo Diploma Legislativo nº 1600, com nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 42/80/M, relativamente à altura dos edifícios definida em relação à área de sombra projectada sobre a via pública, atendendo aos dados de desenvolvimento supramencionados, devendo no entanto cumprir as restantes legislações e instruções no domínio arquitectónico, nomeadamente obedecer à área de estacionamento automóvel nos edifícios, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 42/89/M.
e. Liberalização do acesso pedonal e de trânsito no piso térreo com servidão pública (conforme mostra a PAO).
f. Sob o ponto de vista do planeamento urbano, concorda-se com o estudo prévio que foi entregue e que seja apreciado de acordo com as instruções no domínio do planeamento urbano supramencionado》(cfr. fls. 147 e 148 do vol. 3 do processo administrativo apenso aos presentes autos.
1.3. O mencionado despacho de Sua Exa. o Chefe do Executivo foi contenciosamente impugnado junto desse douto Tribunal pelos mesmos ora Alegantes, recurso tramitado através do processo nº 218/2006 e no qual veio a ser proferida decisão de rejeição do referido recurso, com fundamento na irrecorribilidade do acto, por se entender que o mesmo, ainda que pudesse lesar os direitos ou interesses legalmente protegidos de terceiros, por si só, não lesou ainda nenhum desses direitos ou interesses,《por não se tratar de acto de aprovação final da construção da obra》(cfr. Ac. de 13 de Março de 2008, desse douto Tribunal, a fls. 186 a 204 dos presentes autos);
1.4. Pelo Exmo. Senhor Director Substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, foi proferido o despacho de 16/08/2005 (projecto de obra de construção, Proc. n.º 210/2003/L) e pelo Exmo. Director dos mesmos Serviços foram proferidos os despachos de 1/7/2005 (projecto relativo ao sistema de incêndios, parque de estacionamento), de 8/2/2005 (projecto de obra n.º 210/2003/L do Lote A2/i do NAPE - Galaxy Casino), de 4/8/2004 (projectos de escavação e contenção periférica, cravação de estacas e desvio de infra-estruturas), de 4/8/2004 (anteprojecto de obra do Lote A2/i, Proc. n.º 210/2003/L), os quais consideraram “passíveis de aprovação” condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i pertencente à Sociedade GALAXY RESORTS, S.A., Proc. n.º 210/2003/L e ainda pelo Exmo. Senhor Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, foi proferido o despacho de 17/9/2004, que autoriza a emissão da licença de obra n.º 405/2004, pelo Chefe de Departamento de Urbanização, Substituto, dos mesmos Serviços, foi proferido o despacho de 13/9/2005, que autoriza a emissão da licença de obra n.º 537/2005, e pelo Exmo. Secretário para os Transportes e Obras Públicas, foram proferidos os despachos de 7/10/2004 e de 21/2/2005, que autorizaram a emissão das licenças de obra nº 434/2004 e 95/2005 (cfr. fls. 166 a 204 do vol. 3 do processo administrativo);
1.5. Os despachos supra referidos constituem a totalidade dos despachos que foram certificados à 1ª Alegante em resposta a Requerimento seu, apresentado na Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, em 17 de Abril de 2006, onde pedia aos referidos Serviços que lhe fosse passada certidão de todos os despachos de aprovação de projectos de obras e de todas as licenças de obra emitidas concernentes à construção no referido lote A2/i (cfr. Doc. n° 1 junto com o requerimento de 20 de Junho de 2007, a fls. 41 a 68 dos presentes autos e fls. 205 e 166 do vol. 3 do processo administrativo apenso aos presentes autos);
1.6. A ora 1ª Alegante, mediante autorização do Exmo. Director da DSSOPT, teve acesso ao processo de licenciamento de obras relativo ao lote supra referido, constituído por 86 volumes, no dia 4 de Abril de 2006 (cfr. fl. 161 do vol. 3 do processa administrativo apenso aos presentes autos);
1.7. Em 4 de Maio de 2006,os ora Alegantes interpuseram recurso hierárquico necessário para o Exmo. Secretário para as Obras Públicas e Transportes dos despachos supra referidos, concretamente, do despacho do Senhor Director Substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, de 16/08/2005 e dos despachos do Exmo. Director dos mesmos Serviços, de 1/7/2005, de 8/2/2005, de 4/8/2004 (dois despachos), que consideraram “passíveis de aprovação” condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i pertencente à Sociedade GALAXY RESORTS, S.A., e ainda dos despachos do Exmo. Director dos Serviços de Solos e Obras Públicas, de 17/9/2004, e do Chefe de Departamento de Urbanização, Substituto, dos mesmos Serviços, de 13/9/2005, que autorizaram a emissão das licenças de obra, respectivamente, n.ºs 405/2004 e 537/2005 (momento de interposição de recurso hierárquico que se comprova por confissão, quer da Entidade Recorrida, nos artigos 1º e 17°, quer da Contra-Interessada, no artigo 4°, das suas doutas Contestações);
1.8. O Exmo. Secretário para as Obras Públicas e Transportes não respondeu ao referido recurso hierárquico, nem no prazo legal que tinha para o efeito, nem na pendência do presente recurso contencioso (o que se comprova pela douta Contestação da Entidade Recorrida);
1.9. Através do despacho n.º 248/2006, publicado no Boletim Oficial da Região, n.º 34, de 21/8/2006, sua Excelência o Chefe do Executivo procedeu à revogação do Plano de Intervenção Urbanística dos Novos Aterros do Porto Exterior (PIUNAPE) e fê-lo com base no seguinte conjunto de considerandos (cfr. Doc. nº 2 junto com o requerimento apresentado em 20 de Junho de 2007, a fls. 69 a 72 dos presentes autos):
《Considerando que decorreram mais de 15 anos desde a implementação do Plano de Intervenção Urbanística dos Novos Aterros do Porto Exterior (PIUNAPE) e dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande;
《Considerando que as condições que estiveram na origem da implementação daqueles Planos foram sendo alteradas ao longo do tempo e estão hoje completamente desajustadas em relação ao actual desenvolvimento socioeconómico da Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM;
《Considerando que a versão actualizada de tais Planos não foi publicada, apesar das actualizações que, decorridos 5 anos sobre a data da sua publicação, lhes foram progressivamente introduzidas em conformidade com a constante evolução da realidade urbanística, económica e social de Macau;
《Considerando a escassez de terrenos e tendo presentes as repercussões da liberalização e desenvolvimento da indústria do jogo, um dos principais pilares da economia da RAEM, nomeadamente no que se refere à criação das condições necessárias à concretização dos projectos de investimento das empresas concessionárias da exploração de jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino;
《Considerando que, genericamente, já foram atingidos os objectivos que presidiram à implementação dos sobreditos Planos, tendo sido, nomeadamente, assegurada a ocupação e uso dos solos de forma organizada e equilibrada e a melhoria das condições ambientais nas respectivas zonas da cidade》.
1.10. Em 27 de Setembro de 2006, foi publicado o despacho n.º 155/2006, do Exmo. Secretário para as Obras Públicas e Transportes, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau - II Série, n.º 39, de 27 de Setembro de 2006, o qual: (1.) procedeu à revisão da concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 2916 m2, situado na península de Macau, nos Novos Aterros do Porto Exterior, junto à Rua Cidade de Sintra, designado por lote A2/I, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22605; (2.) desafectou do domínio público e integrou no domínio privado da Região Administrativa Especial de Macau, como terreno vago, três parcelas de terreno com a área global de 3948 m2, que constituem parte da Rua Cidade de Sintra, da Avenida 24 de Junho, da Rua de Santarém e do Jardim das Artes; e (3.) concedeu, por arrendamento, as parcelas de terreno referidas anteriormente, destinadas a ser anexadas ao terreno identificado supra no ponto 1., de forma a constituírem um único lote com a área de 6864 m2, para ser aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade única, afecto a finalidades de hotelaria (Hotel de 5 estrelas), estacionamento e área livre (matéria alegada nos artigos 4° e 92° da p.i. e provada através de documento constante de fls. 0141 a 0149 do vol. 4° do processo administrativo apenso aos autos);
1.11. A 1° Alegante é proprietária da fracção autónoma, designada por “W-14”, do 14° andar “W”, para habitação, e os 2ª e 3º Alegantes são proprietários da fracção autónoma, designada por “W-15”, do 15° andar “W”, para habitação, ambas do prédio com os nºs 392 a 437 da Avenida Sir Anders Ljungstedt, 397 a 501 da Rua Cidade de Santarém, 394 a 506 da Rua Cidade de Sintra e 393 a 437 da Alameda Dr. Carlos D’Assumpção, em Macau, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o nº 22306, a folhas 132 do Livro nº 73086, com o regime de propriedade horizontal inscrito sob o nº 21095 do Livro F, encontrando-se os imóveis supra identificados registados definitivamente na CRP de Macau em nome dos ora Alegantes sob as inscrições, respectivamente, n.ºs 70972 e 70954, ambas do Livro G (cfr. Doc. n° 1 junta com a Contestação da Contra-Interessada, a fls. 154 a 166 dos presentes autos e Does. n. os 3 e 4 juntos com o requerimento de interposição de recurso hierárquico necessário);
1.12. O referido prédio encontra-se edificado no Lote 8 (A2/C) (cfr. Doc. n° 1 junto com a Contestação da Contra-Interessada, a fl. 155 e ainda Doc. n° 1 junto com o requerimento apresentado em 20 de Junho de 2008, a fls. 211, 212 e 213 dos presentes autos);
1.13. Este prédio tem 50 metros de altura (cfr. Ficha de Identificação e Caracterização do Lote 8 (A2/C, constante do PIUNAPE, concretamente, página 1653 do Boletim Oficial de Macau, 2° Suplemento ao n° 15).
1.14. Os Lotes 8 (A2/C), onde se encontra construído o prédio onde os ora Alegantes têm as suas fracções, e A2/i, concessionado à Contra-Interessada, encontram-se separados apenas pela Avenida Sir Anders Ljungstedt (cfr. Doc. de fls. 214 e 215 dos presentes autos);
1.15. As fracções dos ora Alegantes situam-se nos último e penúltimo andares do referido prédio (cfr. artigo 123° e 121° da p.i. e cfr. Doc. nº 1 junta com a Contestação da Contra-Interessada, a fls. 154 a 166 dos presentes autos e Docs. n.ºs 3 e 4 juntos com o requerimento de interposição de recurso hierárquico necessário);
1.16. As fracções dos ora Alegantes encontram-se viradas, em toda a sua extensão, para o Hotel-Casino construído pela Contra-Interessada (cfr. Docs. de fls. 213, 214 e 215 dos presentes autos);
1.17. As fracções dos ora Alegantes encontram-se viradas a poente (cfr. sentido do Norte geográfico constante das plantas de fls. 214 e 215 dos presentes autos);
1.18. Foi autorizado à Contra-Interessada construir um prédio com a área de implantação de 6,864m2, com a altura de 150 metros e a área bruta de construção de 90.000m2;
1.19. No momento em que os ora Alegantes compraram as suas fracções, o Lote A2/i encontrava-se desaproveitado e, segundo o PIUNAPE e o contrato de concessão que tinha por objecto esse lote, previam a construção nesse lote de um prédio destinado a hotel e com 80 metros de altura (cfr. Ficha de Identificação e Caracterização desse lote, constante do PIUNAPE, concretamente, da página 1659 do Boletim Oficial de Macua, 2° Suplemento ao n° 15);
1.20. As referidas fracções foram adquiridas pelos ora Alegantes por escrituras de 18 de Setembro de 2003 (cfr. artigo 121° da p.i. e cfr. Doc. nº 1 junta com a Contestação da Contra-Interessada, a fls. 154 a 166 dos presentes autos e Docs. n.ºs 3 e 4 juntos com o requerimento de interposição de recurso hierárquico necessário).

2. De direito
Apreciando do mérito da causa.
Como acima ficou relatado, o objecto do presente recurso contencioso é o acto de indeferimento tácito do recurso hierárquico para o Senhor Secretario para os Transportes e Obras Públicas dos vários despachos do Director ou Director Substituto dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes:
- do Director Substituto
- de 16 de Agosto de 2005 (projecto de obra de construção, processo n° 210/2003/L) e
- do Director
- de 1 de Julho de 2005 (projecto relativo ao sistema de incêndios, parque de estacionamento),
- de 8 de Fevereiro de 2005 (projecto de obra n° 210/2003/L do Lote A2/i do NAPE – Galaxy Casino),
- de 4 de Agosto de 2004 (projectos de Escavação e contenção periférica, cravação de estação de estacas e desvio de infra-estruturas),
- de 4 de Agosto de 2004 (anteprojecto de obra do Lote A2/i. Processo n° 210/2003/L) que consideram “passíveis de aprovação” condicionada os projectos de obra relativa ao Lote A2/i pertencente à Sociedade GALAXY RESORTS, S.A., Proc. N° 210/2003/L.

Os recorrentes interpuseram recurso também dos últimos 4 actos, na medida em que os mesmos são incorporados por aquele primeiro. Sendo embora duvidoso se os recorrentes têm ou não interesses directos na impugnação dos actos relativamente aos projectos relativos ao sistema de incêndios, parque de estacionamento, Escavação e contenção periférica, cravação de estação de estacas e desvio de infra-estruturas, se bem que os mesmos vieram defender os interesses públicos, podemos afirmar que não se pode tomar qualquer decisão relativa ao acto de 4 de Agosto de 2004 sobre o anteprojecto de obra do Lote A2/i. Processo n° 210/2003/L, por já haver decisão transitada em julgado.

Como acima se referiu, os recorrentes teceram duas partes de fundamentos: a violação da lei, por violação de normas do regulamento geral da construção urbana e do regulamento PIUNAPE e a violação do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos recorrentes, pelos factos de ter a construção aprovada pelo acto recorrido provocado o ensombramento das fracções, eliminado o corredor de ventilação coincidente com a rua e jardim, fazendo com que as fracções dos recorrentes se tornassem pouco arejadas e lúgubres.
Com todos os fundamentos elencados no seu recurso, parece que possamos afirmar o uso pelos recorrentes de um meio processual de acção popular para a defesa dos seus interesses particulares, ou seja o direito de propriedade, coloca-se a questão de saber se é possível proceder este uso do presente contencioso para a defesa simultânea dos interesses diferentes.
Desde já, podemos afirmar que a possibilidade do uso do meio para a defesa destes interesses diferentes já não se trata dos pressupostos processuais, mas sim da condição da procedência da sua pretensão. Neste sentido, considerou o acórdão do Tribunal de Última Instância do processo nº 48/2006, de 27 de Junho de 2007.
Vejamos.
Prevê o artigo 36º do CPAC que:
“1. São titulares do direito de acção popular, para efeitos de interposição de recurso contencioso de actos que lesem bens fundamentais como a saúde pública, a habitação, a educação, o património cultural, o ambiente, o ordenamento do território, a qualidade de vida e, em geral, qualquer bem do domínio público, os residentes de Macau, as pessoas colectivas às quais cumpra defender tais bens e os municípios.
2. Os residentes de Macau são ainda titulares do direito de acção popular para efeitos de interposição de recurso contencioso de actos que lesem outros interesses públicos praticados pelos órgãos dos municípios e seus serviços públicos dotados de personalidade jurídica e autonomia administrativa.”
Apesar de que os recorrentes tenham exprimido que não pretendiam propor acção popular, face aos seus fundamentos alegados nas conclusões recursórias, em nada altera a natureza e o objecto do seu contencioso, pois, não estando o tribunal sujeito à qualificação jurídica referida pelas partes, e tendo os mesmos interposto um contencioso, meio processual do contencioso objectivo administrativo, para defesa de um bem do domínio público ou de interesses públicos ou difusos.
Na verdade, é na dimensão administrativa que a acção popular tem o seu campo principal de intervenção, pois é no âmbito das relações entre a Administração e os administrados que a acção popular faz mais sentido, desde logo, pelos valores fundamentalmente protegidos que se visam defender através dessa acção, vg, a saúde pública, a qualidade de vida, a preservação do ambiente e do património cultural, os bens do Estado etc.1
O citado artigo 36º do CPAC, como podemos claramente ver, confere aos individuais o direito de exercer e defender o direito e interesse “colectivo”.
Em termos literais a palavra “colectivo” significa: “… que se refere a muitas pessoas ou coisas ao mesmo tempo; opõe-se a individual” e “… a palavra colectivo se emprega “para designar o sentido de um termo geral quando ele se refere à colecção, quer dizer, ao conjunto dos indivíduos que pertencem à sua extensão”.2
Quando a expressão “colectivo” se reporta ao interesse tem em vista um bem jurídico protegido que é comum, que tem como co-titulares todo o universo de um grupo das pessoas, tais como os condóminos das fracções autónomas. Há, nestas situações, uma “solidariedade de interesses”, que se traduz “em a necessidade de uma pessoa não poder ser satisfeita sem que o seja também a necessidade de outrem”.3 Com efeito, “entre os interesses de várias pessoas, felizmente actua também, até mesmo em primeiro lugar, a solidariedade. (…) No campo da intersubjectividade – como pode dizer-se – a solidariedade traduz-se em a necessidade de uma pessoa não poder ser satisfeita sem que o seja também uma necessidade de outrem. Nessa hipótese, a posição favorável para a satisfação de uma necessidade determina-se ao mesmo tempo a respeito de um e do outro. Delinia-se, assim, a noção de interesse comum ou colectivo, em antítese com o interesse singular ou individual”.4
No direito comparado, o Tribunal Regional Federal do Brasil julgou no processo nº REO 9239 GO 2006.35.00.009239-8 que “a ação popular é instrumento de defesa dos interesses da coletividade, utilizável por qualquer de seus membros, por isso que, através da mesma não se amparam direitos individuais próprios, mas antes interesses da comunidade. O beneficiário direto e imediato desta ação não é o autor é o povo, titular de direito subjetivo ao governo honesto. O cidadão a promove em nome da coletividade no uso de uma prorrogativa cívica que a constituição da República lhe outorga”.
E no processo do mesmo Tribunal brasileiro nº AC 1572 CE 0001714-05 1989.4.05.0000 julgou-se também que “o interesse privado não está abrangido pelo conceito de interesse público protegido por ação popular. Esta é via processual de prestígio constitucional destinada unicamente. A se obter a invalidade de atos ou contratos administrativos – ou a eles equiparados (casos de concessão. Permissão. Autorização. Delegação) – ilegais e lesivos do património federal, estadual, municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiros.”5
MARQUES ANTUNES caracteriza os interesses colectivos, como sendo “… tal como os interesses individuais, interesses egoístas e particulares…(…).” (…) organizados por forma a adquirirem uma estabilidade unitária e organizada, de tal forma que se agregam a um determinado grupo ou categoria de indivíduos relacionados com um determinado bem jurídico”.6
Atributo dos direitos ou interesses colectivos (legalmente protegidos) é, assim, a sua indivisibilidade o que implica que se trata de um direito ou interesse de todos. Quando um direito ou interesse colectivo é exercido o bem jurídico tutelado pela norma é alcançado por todos.
E a novidade que a figura do interesse difuso traz à tutela jurisdicional é proporcionar uma tutela numa perspectiva supra-individual e não apenas baseada na defesa de posições jurídicas subjectivas, daí que tal acção possa ser intentada “independentemente de (o autor) ter interesse pessoal na demanda”.7
O pedido dos recorrentes consiste em dois fundamentos: violação da lei pelo acto recorrido por violação do Regulamento do Plano de Intervenção Urbanística dos Novos Aterros do Porto Exterior, que estava em vigor no momento da concessão da licença de construção do Hotel-Casino em causa e que depois foi revogado pura e simples pelo Despacho do Chefe do Executivo e outro a violação do direito e interesse individuais dos recorrentes, ou seja o seu direito de propriedade, com base nos alegados factos de ter a construção provocado, essencialmente, o ensombramento das fracções, eliminado o corredor de ventilação coincidente com a rua e jardim, fazendo com que as fracções dos recorrentes se tornassem pouco arejadas e lúgubres.
Perante tal, podemos afirmar que os recorrentes defendem um interesse individual, mas arvoram-se simultaneamente em autor popular.
Pergunta-se: poderá este ser admissível?
Diríamos que, teoricamente, nada o impede, desde que os pedidos sejam diferentes – maxime, em acções de efectivação de responsabilidade nas quais possa haver, para além da satisfação do interesse patrimonial, interesse na reposição do status quo ante estritamente ecológico. Neste caso, no fundo, a situação é assimilável a uma coligação consigo próprio, deduzindo pedidos diferentes contra o mesmo autor com base na mesma causa de pedir.8
Podendo embora a sentença eventualmente proferida no presente contencioso no sentido de anulação do acto recorrido aproveitar os não recorrentes – artigo 77º do CPAC, enquanto estes condóminos também entendam lesivos pelo acto administrativo, a pretensão do presente contencioso consiste tão só nos interesses individuais dos recorrentes.
Quer isto implica, enquanto os recorrentes, ao par da defesa do seu direito de propriedade, deduziram o pedido que só poderá ser alcançado na acção popular, está a criar precisamente uma situação da coligação consigo mesmo, arvorando-se simultaneamente na defesa dos interesse públicos, e com isto poderão os recorrentes se tornar ilegítimos, porque ao defender o interesse privado não pode ao mesmo tempo defender a prossecução do interesse geral – importado, como o presente caso, aferir a violação dos interesses de colectividade atingidos, com a aprovação e edificação do tal projecto.
Acresce que os recorrentes dizem expressamente que a sua legitimidade Radica na al. a) do art. 33º do CPAC e não na al. b).
Mas mesmo que se entendesse que o Tribunal é livre na qualificação Jurídica da pretensão e da sua cause, então sempre seria necessário perspectivar a indagação sobre a violação do ordenamento do território e qualidade vida (cfr. art. 36º, nº 1 do CPAC) por forca de violação do PIUNAPE e se tal violação abrange abstractamente todo e qualquer residente. Aliás, no sentido de que a defesa dos interesses de salubridade, estética e segurança, a par de defesa de interesses particulares constituem um direito reflexo.9
No entanto, em bom rigor, se bem que os recorrentes ao invocarem a ilegalidade da norma do Despacho do Chefe do Executivo que revogou o Regulamento do PIUNAPE estivessem a defender os interesses públicos ou colectivos, no presente caso, eles não estão, no fundo, a defender os interesses difusos, mas sim os interesses particulares das pessoas plurais que moram nas fracções autónomas daquela zona, distintos dos interesses da colectividade, pois para os cidadãos não vizinhos da construção edificada em causa, podem até ter interesses positivos.
Independentemente disto, vejamos concretamente os fundamentos do recurso.
Para os recorrentes, em primeiro lugar, a violação do regulamento do PIUNAPE pela construção edificada, que, vigente antes desta construção, afigurava-se ser inderrogável pelo Despacho, e em segundo dizem que foram atingidos os seus direitos à iluminação, arejamento e a salubridade das fracções de que são proprietários pela aprovação da construção edificada.
Não podemos deixar de afirmar que uma pura e simples revogação do regulamento de que a aprovação da dita construção se radicava a sua base legal, sem fazer mínima referência para casos concretos, nomeadamente atribuição da força retroactiva da revogação, ou ter deixado mecanismo transitório, nunca poderia considerar que o Despacho revogatório tinha a força retroactiva e retirou a base legal da mesma aprovação, pois, o princípio “tempus regit actum” manda aferir a legalidade do acto administrativo pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação.10
Não cumpre conhecer da questão da legalidade da dita revogação pelo despacho regulamentar, e a eventual ilegalidade da construção edificada (por ter contrariado mormente aos dispostos nos artigos 17º a 25º do PIUNAPE quanto à morfologia urbana e a tipologia dos edifícios) só se conduz a sua anulabilidade quanto tal vício vier atingir concretamente o direito e interesse de que os recorrentes invocaram, pois a próprio Plano até o Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU) não atribui o efeito de nulidade ao acto da violação dos mesmos.
Assim sendo, continuemos.
Como ficou referido, os recorrentes alegaram os factos de ter a construção provocado o ensombramento das fracções, eliminado o corredor de ventilação coincidente com a rua e jardim, fazendo com que as fracções dos recorrentes se tornassem pouco arejadas e lúgubres.
São factos que não podem deixar de terem contornos conclusivos, carecendo os dados concretos que comprovam o ensombramento das fracções, a eliminação da ventilação. Mesmo que após a inquirição das testemunhas arroladas não trousse ao juízo para este efeito nenhuns factos concretos comprovativos de qualquer ocorrência da lesão dos seus interesses na qualidade dos proprietários.
E do resto, sobre esta questão, o Digno Magistrado do Ministério Público deu o seu douto parecer a que merece a nossa adesão para o julgamento do presente recurso no sentido da sua improcedência. Pelo que não se custa transcrever o parecer nesta parte:
“…
No que tange à protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos, como o direito à habitação em condições adequadas de luminância, arejamento e salubridade, a protecção de tais interesses, no que ao domínio das construções toca há-de pautar-se pelos dispositivos legais aplicáveis, designadamente do RGCU actualmente em vigor, não se vislumbrando, contudo, a invocação de qualquer atropelo a esse nível.
Aliás, bem vistas as coisas, do que se trata é de construção de edifício, é certo, com altura bastante superior à cota do edifício habitado pelos recorrentes mas deste separado pelo menos pela largura da Av. Sir Anders Ljungstedt.
Ora, se tal significa, “per se”, a afronta à saúde, bem estar e conforto e ambiente dos recorrentes, o mínimo que se poderá concluir é que, a grande maioria dos residentes de Macau se encontra privado do acesso a tais direitos fundamentais, o que constituiria uma verdadeira desgraça...
Percebe-se, que, porventura, a “qualidade de vida” a que aqueles se arrogam possa, de alguma forma, ter sofrido evolução negativa com a aprovação dos projectos em causa, na medida em que, de facto, sempre servirá melhor tais propósitos a existência, em frente da habitação, de um jardim, que de um casino: contudo, nem esses interesses têm correspondência com eventuais normativos que hajam sido postergados, nem, como se viu, podem corresponder a expectativas reais e juridicamente tuteladas.

Donde, por não ocorrência de qualquer dos vícios assacados, ou de qualquer outro de que cumpra conhecer, sermos de pugnar pelo não provimento do presente recurso.”

Nesta conformidade, sem necessidade de mais delongas, é de julgar improcedente o recurso contencioso.

Ponderado resta decidir.
Pelo exposto, acordam neste Tribunal de Segunda Instância em julgar improcedente o presente recurso interposto por A, B e C.
Custas pelos recorrentes.
RAEM, aos 31 de Janeiro de 2013

Choi Mou Pan
João A. G. Gil de Oliveira (com declaração que junta)
Ho Wai Neng (com declaração de voto vencido)

Estive presente:
Mai Man Ieng
Proc. n.º 357/2007 - 31/Jan./2013


Declaração de voto


Não acompanho o douto entendimento vertido no acórdão e voto apenas vencido na parte relativa à questão da tempestividade, considerando que o prazo de caducidade do direito ao recurso de anulação foi em muito excedido - cfr. artigo 155º, n.º 1 do CPA e 46º, n.º 2, h) do CPAC.

Invocando os recorrentes lesão do seu direito, radicado na propriedade da fracção que possuem nas imediações, na medida em que atingidos os seus interesses, daí derivados, ao arejamento, iluminação e salubridade -, invocando-se ainda um direito aos espaços verdes, sendo que à data já não se previa a manutenção do chamado Jardim das Artes -, afigura-se-me que os interessados não podem deixar de se inteirar dessa lesão a partir do momento em que o “monstro” atingiu uma altura, a olhos vistos, que em muito excedia o Plano. O edifício ultrapassara já em 30 de Novembro de 2005 o limite de altura de 80 metros, em 9 de Março atingira já cerca de 119 metros, a que corresponde o piso 26 e os recorrentes só em Maio de 2006 reagiram. Não é pela consulta do processo que os recorrentes ficaram a saber algo mais que não devessem ter visto antes e só aí se tivessem inteirado da violação do PIUNAPE. Cientes da existência deste, como norma que era e se impunha à observância de todos, a particulares e entidades públicas, não é por consultarem o processo que ficam a saber mais que não devessem saber aquando da lesão efectiva dos seu direitos e interesses.

Se a lei devia estabelecer outro vício para essa violação, nomeadamente a nulidade, essa é outra questão. Não o fazendo, não sendo tal qualificação ou este prazo posto em crise, estabelecido um prazo de 30 dias, deve ele ser cumprido.

Tendo ficado vencido nesta questão, tendo a acção prosseguido, sou a concordar e a votar favoravelmente tudo o mais que foi expendido no acórdão.


O Juiz 1º Adjunto,

(João Gil de Oliveira)

卷宗: 357/2007
投票落敗聲明
在尊重不同的見解下,本人認為行政行為的可撤銷並不取決於是否證實了其實質侵犯了上訴人的權益,或所違反的規章有否明確制定該後果。
根據《行政程序法典》第124條之規定,“如作出之行政行為違反適用之原則或法律規定,而對此未規定撤銷以外之其他制裁,則該等行政行為均為可撤銷者”。
基於此,既然認定被訴行為違反了PIUNAPE規章之規定,則應撤銷有關行為。
申言之,應判處上訴人勝訴而非敗訴。
法官


____________________________
何偉寧
2013年01月31日

1 Neste aspecto, vide José Figueiredo Dias, in Tutela Ambiental e Contencioso Administrativo, p. 213.
2 GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA, Vol. 7, pág. 120.
3 CARNELUTTI, Teoria Geral do Direito, pág. 83/84.
4 Ob. cit. pág. 84.
5 Neste sentido o STA de Portugal também assim julgou no Ac. nº 0714/03 de 17/3/2005.
6 In Direito de Acção Popular no Contencioso Administrativo, pág. 36/37.
7 Como se fez constar do citado nº2 do artº9º do CPTA de Portugal.
8 Cfr. Carla Amado Gomes, Reflexões braves sobre a acção pública e a acção popular na defesa ambiente, publicado em “Temas e Problemas de Processo Administrativo”, organizado pelo “Instituto de Ciências Jurídico-Políticas”, pág. 217 a 218.
Isto, em Portugal, na prática, a hipótese poderá ser dificultada em razão da norma do artigo 20º da LAP, que isenta de preparos os autores populares – bem assim como problemas de alçada, e apesar da economia processual que esta solução promoveria, parece ser de afastar tal possibilidade.
9 Vide os acórdãos do STA nos Processos nº 01111/04 de 7/4/05 e nº 208/07 de 12/6/07.
10 Vide entre outros, o acórdão do STA de 19 de Abril de 2012 no processo nº 1187/11.
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TSI-357/2007 Página 1