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Processo n.º 106/2013
(Recurso Civil e Laboral - Aclaração)
Data: 20/Junho/2013

Recorrentes: A
B

Recorrida: C Limited

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - A e sua mulher B, recorrentes que foram nos autos à margem referenciados, tendo sido notificados do acórdão proferido por este Tribunal de Segunda Instância,, vêm, para os devidos efeitos, requerer a ACLARAÇÃO da mesma decisão.
    
    II - Invocam obscuridade da decisão.
    Não há obscuridade alguma quando se escreveu, relativamente à impugnação da decisão de facto que se prendia com a resposta ao quesito 16° da base instrutória,
    "(...) é igualmente claro que os extractos bancários (doc. 8 junto à petição inicial) incluem, relativamente a cada mês, valores separados para as prestações a título de juros e a título de capital (cfr., nomeadamente, o extracto referente ao mês de Outubro de 2008, do qual consta o valor de HKD9,882,88 em juros e o valor de HKD23,983.77 em capital), não sendo assim difícil, por mero cálculo aritmético, chegar aos valores peticionados, tal como se pode verificar pela confrontação da tabela do artigo 53º da p.i. e do referido doc. 8 junto à mesma, tendo sido esses valores indicados e reclamados a título de indemnização".
    Esta aclaração mostra bem a sem razão dos impetrantes com o presente pedido, revelando que o que os anima é a apenas uma discordância quanto ao julgamento proferido por este Tribunal, mas isso, com todo o respeito, é uma contingência de quem não vê acolhida a tese por si trazida a juízo.
    À pretensa evidência da sua argumentação diremos nós que se mostra claro que não há qualquer ininteligibilidade ou falta de clareza nesta parte do referido acórdão. Não há obscuridade alguma; a afirmação produzida é claríssima.
     Na verdade, os recorrentes simplesmente não concordam com a leitura feita do extracto bancário referente ao mês de Outubro de 2008.
    A leitura que este Tribunal fez dos elementos probatórios foi aquela que foi vertida no acórdão e o que foi consignado é claríssimo: que havia uma base probatória, aliás documentada, donde se podia retirar qual a parte de capital e a de juros.
    Tanto bastaria para que ficássemos por aqui. Mas, em todo o caso, não se deixa de referir que, com ou sem lupa, como diz acertadamente a recorrida, é perfeitamente evidente que naquele documento o valor de HKD9,882.88 corresponde aos juros e o valor de HKD23,983.77 ao capital, o que foi confirmado também mediante prova testemunhal. A conclusão de que aquela parcela, ainda que não haja uma referência expressa a juros, ainda que não haja uma palavra que o denomine, não se deixa de colher de todos os elementos probatórios e não deixa de estar implícita de uma análise do extracto.
    Só não vê quem não quer ver e por isso, para que fique claro, reproduzimos aqui a análise feita na sua globalidade, no acórdão prolatado, daí se retirando bem a clareza e as razões que justificaram a tomada de posição deste Tribunal (sendo que a falta de fundamentação já nada tem que ver com obscuridade):
    “3. Analisemos de seguida a resposta ao quesito 16º
    3.1. Resultou aí provado que: "A Autora até 29 de Janeiro de 2010, já tinha pago um total de HKD4.935,57 em juros sobre o crédito concedido para aquisição da referida quota indivisa da fracção autónoma AR/C, equivalente a MOP5.083/63, e ainda terá de pagar outros com vencimento posterior"
     Esta matéria, sustentam os recorrentes, não poderia, em caso algum, ser dada como provada na sua plenitude, não se vislumbrando qualquer suporte documental existente nos autos que permita chegar à conclusão que o valor pago pela recorrida no montante de MOP$5.053,63, com referência a esse crédito bancário, fosse exclusivamente a título de juros, crédito aquele concedido para a aquisição da referida quota parte de 1/306 avos da fracção respeitante ao parque de estacionamento.
    
    3.2. Acolhe-se aqui a argumentação expendida pela recorrida
    Os recorrentes não produziram qualquer contraprova relativamente a esta matéria.
    De acordo com a prova documental, verifica-se que a taxa de juro efectivamente acordada ao abrigo das facilidades bancárias então concedidas à Recorrida, é de 3.95% (Prime Rate - 2.8%), conforme resulta do respectivo contrato (doc. 2 junto à petição inicial) e, após revisão de 2/09/2009, de 2.2% (Prime Rate - 2.8%).
    
    3.3. Por outro lado, é igualmente claro que os extractos bancários (doc. 8 junto à petição inicial) incluem, relativamente a cada mês, valores separados para as prestações a título de juros e a título de capital (cfr., nomeadamente, o extracto referente ao mês de Outubro de 2008, do qual consta o valor de HKD9,882.88 em juros e o valor de HKD23,983.77 em capital), não sendo assim difícil, por mero cálculo matemático, chegar aos valores peticionados, tal como se pode verificar pela confrontação da tabela do artigo 53º da p.i. e do referido doc. 8 junto à mesma, tendo sido esses os valores indicados e reclamados a título de indemnização.
     Não deixa de ser legítimo pensar que o amortizado seja imputado nos juros, face até ao critério de imputação do pagamento, tal como resulta do artigo 774º, n.º 1 do CC - “Quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros ou a indemnizar o credor em consequência da mora, a prestação que não chegue para cobrir tudo o que é devido presume-se feita por conta, sucessivamente, das despesas de indemnização, dos juros e do capital.” -, donde não se ver que o Tribunal tenha errado em considerar provada essa matéria, aliás comprovada pela testemunha D que confirmou aqueles valores como pagos a título de juros (cfr. Translator 1, recorded on 24-Nov-2011 at 16.12.58 e recorded on 24-Nov-2011 at 16.04.11)
    
    3.4. De qualquer modo, trata-se de questão que não se mostra relevante, a partir do momento em que na douta sentença recorrida os réus não foram condenados nessa verba, correspondente a pagamento do capital do empréstimo, sendo que a recorrida reclama apenas as prestações mensais de juros relativas ao empréstimo contraído, pelo que perdem sentido as alegações dos recorrentes quanto a esta matéria.Assim se desatende este pedido de aclaração, dada a falta de fundamento manifesta, formal e substancial, para a sua procedência.”
    
     III - Da ambiguidade da decisão
    Consideram ainda os recorrentes que a decisão está ferida de ambiguidade, na parte em que este TSI teria argumentado que o erro era cognoscível, alegando que, por um lado, se admite que perante a certidão predial não era possível saber, à data da compra e venda, se a quota adquirida pela recorrida estava abrangida pela penhora, enquanto, por outro, se concluiu que essa verificação era, afinal, possível.
    Quanto à referida diatribe diga-se que a expressão foi usada no seu sentido etimológico grego, com referência a uma argumentação extensa, crítica e vigorosa, invectivando e discordando da decisão proferida, mas sem qualquer carga de censura pessoal, entendendo-se até que a douta peça em que se traduziu a alegação dos recorrentes não deixou de se situar dentro do maior rigor técnico e deontológico. E com o exemplo com que pretendemos ilustrar a nossa argumentação, com a história do ouro e pechisbeque, não conseguimos infelizmente abrir a caixa de Pandora de forma a prevenir as ambiguidades que aos olhos dos recorrentes o acórdão terá provocado.
    Mas não há ambiguidade.
    Quando se refere o despacho da Mma Juíza de fls. 84 e 85, que determinou o alcance da adjudicação à exequente E (Hong Kong), esclarecendo que a quota ideal de 131/306 corresponde às quotas inscritas a favor dos titulares descriminados a fls 1216 a 1217, onde se inclui a quota de 1/306 inscrita a favor da autora, aqui recorrida, ainda que esse despacho tenha sido posterior à venda e adjudicação, o que se pretendeu foi evidenciar que, não obstante, pelo registo, não se poder dizer quais os espaços de estacionamento que estavam penhorados, tal não seria impossível, tanto assim que até houve um despacho que procedeu a essa correspondência.
    Com referência à impugnação das respostas positivas dos quesitos 3º, 4º e 8º da base instrutória, pode ler-se no acórdão ora em análise o seguinte:
    "Como se disse já, e repete-se, o registo não se mostra decisivo a partir do momento em que por aí não se sabe, estando registado apenas uma parte de quotas ideais, se a que foi transmitida integra ou não aquele elenco".
    Isto é verdade e foi afirmado, mas daí não se partiu para uma impossibilidade de determinação da correspondência em termos de facto e isso não deixou de ser afirmado, enquanto se disse "(...) era possível detectar a existência de uma penhora sobre uma quota indivisa da fracção autónoma AR/C" através da inscrição n.º 26008 do Livro F, que constava claramente da certidão predial extraída para a outorga da escritura ("PENH"), para verificar que a penhora abrangia a quota parte transmitida à recorrida".
    Na verdade, não se deixou de afirmar que era possível identificar as quotas penhoradas, se bem que tal não resultasse directamente do registo, mas a partir dele, desse alerta, sempre seria possível proceder a essa correspondência, bastando pensar que se fossem perseguir os títulos com base nas quais se procedeu ao registo das penhoras logo se verificaria quais os parques penhorados e a quem pertenciam.
    É isto que resulta do acórdão, não se reconhecendo que haja aqui ambiguidade alguma.
    Não é verdade que se tenha afirmado que só a partir do despacho da Mma Juíza, de 9 de Setembro de 2009, é que ficou definitivamente esclarecido quais as quotas partes que estavam efectivamente abrangidas pela penhora, designadamente a quota de 1/306 inscrita a favor da recorrida. Já se explicou acima a alusão ao dito despacho posterior. À conclusão a que o Tribunal chegou posteriormente bem se podia ter chegado em momento anterior, para mais evidenciando-se a existência de uma penhora, importando jogar pelo seguro e determinar qual o âmbito da sua incidência.
    
    Assim se conclui que o acórdão não comporta dois ou mais sentidos distintos.
    Aliás. o facto de não ser possível, perante a referida certidão, saber se aquela quota específica se encontrava penhorada nunca foi controvertido. A própria recorrente o disse, o Tribunal a quo confirmou-o, tal como o fez o Tribunal ad quem em sede de recurso.
    O que se afirmou é que, apesar dessa impossibilidade concreta, não se podia ignorar que o registo mencionava genericamente a existência de uma penhora sobre parte da fracção "AR/C" e é precisamente por ser impossível aferir naquele documento sobre quais fracções a penhora incidia, que deveriam ter sido feitas mais averiguações no sentido de prevenir uma situação de venda de bem penhorado.
    
    IV - Termos em que se indefere o pedido de aclaração, por falta de fundamento legal quanto à pretensa obscuridade e por se entender não haver lugar a qualquer ambiguidade.
    Custas incidentais pelos requerentes.
     Macau, 20 de Junho de 2013,

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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Relator)

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Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)
106-2013-Aclaração 1/10