Processo nº 102/2013
Data do Acórdão: 25ABR2013
Assuntos:
Marca
Capacidade distintiva da marca
SUMÁRIO
A marca nominativa COTAI STRIP COTAIArena, por consistir em sinais nominativos que servem apenas para designar a espécie e a proveniência de serviço a que se destina, carece da capacidade distintiva.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 102/2013
Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I
No âmbito dos autos do recurso jurisdicional na matéria de propriedade industrial, registado sob o nº CV2-12-0014-CRJ, do 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, foi proferida a seguinte sentença:
I - RELATÓRIO
A Corp., sociedade comercial com sede nos Estados Unidos da América requereu o registo da marca “COTAI STRIP COTAIArena para produtos da classe 35.
Tal registo foi-lhe concedido por decisão da Senhora Directora do Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos serviços de Economia.
B Limited, sociedade comercial com sede nas Ilhas Caimão, interpôs o presente recurso daquele despacho de concessão por entender que ocorre motivo de recusa de registo, designadamente não ter a marca registanda capacidade distintiva, uma vez que apenas designa a proveniência geográfica e outra característica dos serviços e produtos que se destina a marcar e é composta por sinais usuais no comércio.
Além disso, a recorrente diz que o registo deve ser recusado porquanto a marca registanda pode induzir em erro quanto à origem dos produtos marcados.
Responderam a entidade Recorrida e a Requerente da marca batendo-se pela manutenção da decisão recorrida por entenderem que não se verificam os motivos de recusa que fundamentam o recurso e afirmando a marca registanda como tendo capacidade distintiva e não sendo enganosa.
Além disso, a entidade recorrida veio dizer que a marca, tendo elementos descritivos genéricos, tem também elementos de fantasia “STRIP” e “Arena”, sendo, no seu conjunto, distintiva e não sendo de utilização exclusiva os elementos genéricos. Referiu ainda que a marca não contém falsa indicação de proveniência e, em tese geral, que é registável a marca descritiva que adquiriu capacidade distintiva.
II - SANEAMENTO
O Tribunal é competente.
O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas1.
Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
III . FUNDAMENTAÇÃO
A) – DE FACTO
Dos elementos existentes nos autos apurou-se a seguinte factualidade:
a) Em 30.07.2008 a Recorrente requereu o registo da marca N/37802 para a classe de produtos nº 35 a qual consiste no seguinte:
COTAI STRIP COTAIShuttle
b) Por despacho de 13.12.2011 proferido a fls. 1 dos autos de Processo Administrativo apensos, foi concedido o registo da marca N/37802.
c) Tal Despacho foi publicado no Boletim Oficial da RAEM, nº 1, II Série, de 04.01.2012.
d) Em 03.02.2012 foi apresentado neste tribunal o presente recurso.
B) – DE DIREITO
Cumpre, pois, apreciar e decidir.
E, em primeiro lugar, cabe dizer que a questão a decidir, tendo em conta que este é um recurso de plena jurisdição, consiste em saber se ocorre motivo de recusa do registo concedido. Assim, caso se conclua que ocorre um motivo de recusa, procederá o recurso, ficando prejudicada a necessidade de decidir se se verificam outros motivos de recusa, não estando o tribunal impedido de conhecer de qualquer dos motivos de recusa do registo ainda que não façam parte da fundamentação da decisão recorrida, pois o facto de se tratar de recurso de plena jurisdição impede a limitação dos poderes de cognição do tribunal pelos fundamentos da decisão recorrida e pela motivação e conclusões do recurso2.
Tendo a recorrente colocado em discussão a falta de carácter distintivo e a existência de carácter enganoso da marca, é por estas questões que se deve começar.
Do carácter distintivo da marca registanda (“COTAI STRIP COTAIArena”).
Resulta do disposto no art. 197º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, doravante designado por RJPI, que só são susceptíveis de registo como marcas os sinais adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
Temos, pois, um primeiro limite para que os sinais possam ser registados como marca de comércio: a sua adequação para distinguir bens.
E resulta da al. b) do nº 1 do art. 199º do mesmo diploma legal que os sinais constituídos apenas por indicações de características de bens (produtos e serviços) não são adequados a distinguir esses bens em função das suas empresas ou da sua origem comercial e, por isso, não são adequados a desempenhar a função de marca, sendo insusceptíveis de registo para protecção.
Na verdade, os sinais que indicam apenas características de bens são descritivos desses bens, podendo servir para os distinguir de outros bens que tem outras características, mas nada distingindo em relação às empresas de uns e dos outros. O que só serve para distinguir os bens pelas suas características não deve servir para os distinguir pelas suas empresas – não é adequado a tal distinção. Destinando-se o direito de marca a proteger os sinais adequados a distinguir os bens em função das empresas, deve recusar-se a protecção decorrente do registo da marca àqueles sinais que só servem para distinguir os bens em função das características destes. De outra forma, o registo conferirá eficácia jurídica distintiva a sinais que, pela sua natureza descritiva, não a têm. Os sinais que distinguem ou designam características dos produtos e, ou, serviços não têm aptidão distintiva enquanto marca, isto é, não são aptos a distinguir produtos e serviços de um empresa dos de outra. Não são aptos a distinguir a origem comercial dos bens.
Vejamos então.
Os sinais que compõem a marca registanda são palavras: “COTAI STRIP COTAIArena”.
Não há dúvida que, em geral, as palavras têm adequado carácter distintivo da origem comercial dos produtos e serviços que assinalam. É o art. 197º do RJPI que o afirma expressamente. Assim, há que ver, em concreto, se a marca nominativa registanda, composta pelas palavras simples COTAI e STRIP e pela palavra composta COTAIArena, tem carácter e aptidão distintivos da origem comercial dos bens que se destina a assinalar, sendo certo que basta para a concessão do registo um mínimo de aptidão para distinguir no espírito do público de referência (médio) aquela origem comercial.
O método para aferir se determinado sinal tem, ou não, aptidão distintiva tem de considerar os bens que, em concreto, visa assinalar e distinguir e o público perante o qual vão ser assinalados (público de referência). Não basta a aptidão geral das palavras, sendo necessário testá-la (art. 197º do RJPI), através de tal método, em confronto com o motivo de recusa em análise (art. 199º, nº 1, al. b) do mesmo diploma legal)3. E a presença ou ausência de carácter distintivo há-de procurar-se na “imagem global” da marca e não na análise individualizada de cada um dos seus elementos. É na marca, como um todo, que há-de afirmar-se ou negar-se o carácter distintivo ou a adequação para distinguir a origem comercial dos bens que se destina a marcar.
A marca registanda contém duas palavras, uma da língua inglesa, (cotai e strip) que indicam com precisão uma localização geográfica na RAEM. Disso parece não poder duvidar-se4. E contém outra palavra que indica, de forma genérica, um espaço edificado e destinado a reunião de pessoas para diversos fins, designadamente lúdicos, artísticos e desportivos (arena5). A marca em apreciação é composta por sinais – palavras – que designam um local pela sua situação geográfica e pela utilização genérica a que está destinado. Tais palavras permitem ser utilizadas no comércio para designar a proveniência geográfica e a natureza dos bens a marcar. Deste modo, a marca registanda é, toda ela, composta por sinais que designam apenas características de bens: a sua finalidade e a sua proveniência geográfica. E acresce que a finalidade e a proveniência designadas pelos sinais que compõem a marca registanda são de bens que pertencem ao grupo daqueles que a marca se destina a assinalar – serviços de exposições, feiras, etc.
A marca registanda não tem, assim, carácter distintivo mínimo das empresas que produzem ou fornecem tais bens em relação àquelas que o não fazem, pelo que não lhe pode ser atribuída através do registo eficácia distintiva que não tem correspondência no seu carácter que é descritivo de características de bens.
O carácter distintivo de uma marca significa que essa marca permite identificar os produtos e os serviços para os quais é pedido o registo como provenientes de uma empresa determinada e, portanto, distingue esses bens dos de outras empresas. Ora, só dificilmente se concebe que o nome de um local e uma actividade/finalidade possa ter carácter distintivo intrínseco da origem comercial, antes se devendo considerar desprovido de carácter distintivo.
A marca em apreço não poderá ser registada por ser meramente descritiva. E totalmente descritiva das características de bens, consistindo apenas na designação de um local e da utilização para que está destinado. E não contém qualquer elemento de fantasia, tendo todos os seus elementos um significado literal imediato incontornável, inclusivamente os termos “strip” 6 e “Arena”. Assim, a marca em apreço não pode ser registada. Com efeito, dispõe o art. 199º, nº 1, al. b) do RJPI que “não são susceptíveis de protecção os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos”7. Ora, sendo a marca registanda exactamente um local geográfico e um equipamento de destino específico designado de forma genérica, é constituída exclusivamente por sinais que, no comércio, designam características de bens - a origem geográfica e natureza ou finalidade genérica dos bens a marcar (poderia pensar-se em “Cotai stadium”, “Cotai fair”, “Estádio do Cotai” ou “Feira do Cotai” e logo se intuiria igualmente qual a natureza dos bens a marcar, de forma genérica e contrária à exigência de singularidade do sinal a proteger como marca de comércio). Por isso, tais sinais não podem ser protegidos como marca. São destituídos de carácter distintivo tendo em conta os bens que se destinam a assinalar e tendo em conta a percepção que de tais sinais tem o público relevante, como tratando-se de um local geográfico com um destino específico.
Também não é de considerar se a marca registanda adquiriu já eficácia distintiva através de um sentido secundário distintivo (secondary meaning) diverso do sentido literal descritivo, porquanto isso não foi alegado nem demonstrado8, razão por que não ocorre a excepção do nº 3 do art. 214º do RJPI.
Para o sinal que primária e imediatamente é apreendido com como descritivo de características de bens possa ganhar carácter ou eficácia distintivos que constituem a previsão das normas insertas no art. 199º, nº 2 e 214º, nº 3, tem de “abandonar” o seu significado descritivo primário e passar a ser considerada com um outro significado diferente e que não seja também descritivo, mas que seja distintivo. É, pois, essencial que o novo significado que a marca adquiriu não padeça dos “vícios” do “velho” significado, pois, se padecer, também o registo deve ser recusado. É necessário que o sinal passe a ser apreendido e reconhecido pelo público relevante, não com o seu sentido primário descritivo, mas com um sentido de ligação a uma empresa. Ora, como no caso em apreço o sentido primário da marca em causa é descritivo e qualificativo, o secundário não poderia sê-lo para a registabilidade da marca. Assim, mesmo desconhecendo-se a existência de um significado secundário, caso exista com um sentido ainda ligado à espécie e à proveniência de um produto ou serviço, a marca não poderia ser registada por continuar exclusivamente descritiva. Impõem as boas regras da hermenêutica jurídica que se conclua que a norma que proíbe o mais, também proíbe o menos, de forma que, se se proíbe o registo de uma marca com um sentido, também se há-de proibir se a marca ganhou outro sentido com o mesmo cariz.
Conclui-se, pois, que, sendo a marca registanda constituída exclusivamente por uma expressão que pode servir no comércio, e efectivamente serve, para designar uma espécie de bens e a sua proveniência e não estando demonstrado que ela tenha qualquer outro significado ou que já tenha adquirido na prática comercial eficácia distintiva, deve ser recusado o seu registo.
Em resumo, a marca composta de elementos descritivos de género (genéricos) só pode ser registada em duas situações:
- Quando apenas alguns dos seus elementos são descritivos (art. 199º, nº 2 do RJPI)9.
- Quando todos os elementos forem descritivos, mas a marca tiver já adquirido um “secondary meaning” que lhe confira eficácia distintiva, isto é quando no seu percurso comercial a marca deixou de ser apreendida pelo público relevante, não pelo seu sentido descritivo das características dos bens marcados, mas por um qualquer outro sentido não descritivo que a liga a determinada empresa.
Ora, a marca registanda é composta exclusivamente por elementos descritivos e, quer da sua “imagem global”, quer de qualquer “secondary meaning”, que se desconhece, não se lhe descortina qualquer carácter distintivo.
Conclui-se, assim, que merece procedência o recurso e deve ser recusado o registo.
*
IV – DECISÃO.
Pelo exposto, decide-se julgar procedente o recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida e substitui-se por outra que recusa a concessão do registo da marca em apreciação nº N/37802 (COTAI STRIP COTAIArena) para a classe de produtos nº 35.
Sem custas.
Registe e notifique.
Oportunamente cumpra o disposto no art. 283º do RJPI.
Não se conformando com o decidido, vieram tanto a Direcção dos Serviços de Economia da RAEM, como a Requerente A Corp. recorrer da mesma.
A Direcção dos Serviços de Economia da RAEM formulou as seguintes conclusões pedindo que:
Como se verifica existem duas interpretações judiciais em relação a estas marcas: a primeira, elabora uma análise dissecando a marca palavra por palavra e assim conclui que não existe capacidade distintiva e, por outro lado, o carácter enganoso da marca; a segunda, no sentido da marca ser analisada no seu todo e assim adquirir capacidade distintiva e de não se tratar de marca enganosa porque, a localização geográfica é usada sem conduzir os consumidores a pensar que esses produtos/ serviços, que lhe andam associados, têm essa proveniência, no sentido de ali serem fabricados/ prestados, sendo, por sua vez, a localização geográfica verdadeira.
A marca registanda é uma designação de fantasia, tem capacidade distintiva, não contem nenhuma falsa indicação de proveniência e o seu registo não ocasiona actos de concorrência desleal, pelo que, é de manter o despacho de concessão e revogar-se a sentença recorrida.
Por sua vez a Requerente A motivou o seu recurso concluindo e pedindo que:
a) A marca N/37802 é uma marca nominativa complexa, em cuja composição surge apenas uma palavra que pode ser considerada descritiva, já é constitui um topónimo: COTAI.
b) Tanto STRIP como ARENA constituem, na marca em causa, expressões de fantasia, o que confere à marca um carácter geral de fantasia.
c) A STRIP correspondem as palavras portuguesas tira, faixa, pista.
d) ARENA é também uma expressão de fantasia, já que, mesmo que se aceite que se trata de vocábulo que se reporta a uma actividade normalmente ligada a actividades lúdicas, desportivas e artísticas, conforme consta da fundamentação da decisão recorrida, a marca N/37802, destinada a assinalar serviços diversos da classe 35.a, nada tem que ver com aquelas actividades lúdicas, desportivas e artísticas.
e) Ao considerar que a marca é toda ela composta por sinais que designam apenas características de bens, isto é, a sua natureza e a sua proveniência geográfica, a decisão recorrida incorre num manifesto erro de julgamento e faz uma errada aplicação das normas contidas no artigo 197.° e na alínea b) do n.º 1 do artigo 199.° do RJPI.
f) Este erro de julgamento resulta, aparentemente, de uma errada leitura do que sejam os serviços que com a marca N/37802 a Recorrente pretende assinalar.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a Sentença Recorrida revogada, substituindo-se por outra que conceda o registo da marca N/37802.
Notificada veio a responder a recorrente da 1ª instância, ora recorrida, nada disse a B Limited.
II
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do disposto no artº 282º do RJPI, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
De acordo com o alegado nas conclusões dos recursos, as questões levantadas que delimitam o thema decidendum na presente lide recursória podem ser reduzida à questão de saber se a marca registanda tem capacidade distintiva de produtos e serviços a que se destina individualizar, susceptível de protecção, face ao disposto no artº 199º/1-b) do RJPI.
Assim, passemos a debruçar-nos sobre essa única questão levantada.
A propósito de constituição da marca, o Prof. Ferrer Correia ensina que “Os interessados gozam de grande liberdade na escolha dos sinais distintivos que hão de constituir a marca. Prevalece aqui em grande escala a imaginação e a fantasia. A marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais nominativos (marca nominativa), figurativos ou emblemáticos (marca figurativa ou emblemática), ou por uma e outra coisa conjuntamente (marca mista ……)” – in Lições de Direito Comercial, Vol. I, 321 a 322.
In casu, a marca registanda COTAI STRIP COTAIArena é constituída por um conjunto de sinais nominativos.
Na óptica do Exmº Juiz a quo, sendo a marca registanda constituída exclusivamente por uma expressão que pode servir no comércio, e efectivamente serve, para designar uma espécie de bens e a sua proveniência e não estando demonstrado que ela tenha qualquer outro significado ou que já tenha adquirido na prática comercial eficácia distintiva, deve ser recusado o seu registo.
Para a Direcção dos Serviços de Economia, inconformada, a marca registanda deve ser analisada no seu todo, e não dissecá-la palavra por palavra, e assim a marca registanda é uma designação de fantasia, tem capacidade distintiva, não contém nenhuma falsa indicação de proveniência e o seu registo não ocasiona actos de concorrência desleal.
Por sua vez, a recorrente A entende que a marca registanda é uma marca nominativa complexa, em cuja composição surge apenas uma palavra que pode ser considerada descritiva, que é o topónimo COTAI, uma vez que STRIP é uma expressão de fantasia, tal como a expressão ARENA, que nenhuma relação tem com os serviços que a marca assinala.
Quid juris?
Se é verdade que, tal como ensina o Prof. Ferrer Correia, os interessados gozam de grande liberdade na escolha dos sinais distintivos que hão de constituir a marca, a liberdade de composição da marca não é, todavia, ilimitada.
Pois a lei estabelece, a este respeito, várias restrições.
Da leitura da sentença ora recorrida resulta que o fundamento legal para a recusa do registo da marca registanda é o disposto no artº 199º/1-b), ou seja, a marca registanda, na óptica do Exmº Juiz a quo, consiste nos vários sinais nominativos que servem para designar a espécie e a proveniência de serviço a que se destina a marca, carecendo da capacidade distintiva dos serviços a que se destina.
A marca nominativa é constituída por COTAI STRIP COTAIArena.
Ora, o elemento COTAI é uma designação geográfica que já surgiu na década 80 do século passado, quando a então Administração Portuguesa começou a pensar no planeamento do futuro aproveitamento da aluvião, parcialmente natural e parcialmente artificial, que se ia formando entre a Ilha de Taipa e a Ilha de Coloane.
Aliás, tal como é fácil perceber a constituição dessa designação, pois advém das primeiras duas letras de COLOANE e das primeiras três letras de TAIPA.
Assim, sem dúvida se trata de uma designação geográfica.
Quanto a palavra na língua inglesa STRIP, significa enquanto substantivo “tira”, e não poucas vezes utilizada em inglês para designar um local geográfico que tem a forma de uma extensão em sentido longitudinal, sob ponto de vista panorâmica, e.g. Las Vegas Strip, Gaza Strip, etc..
Assim, a expressão COTAI STRIP é obviamente uma expressão literal que visa identificar aquela área em forma longitudinal ao longo de ambos os lados do antigo Istmo que ligava Coloane à Taipa.
Passemos então a debruçarmo-nos sobre a expressão COTAIArena.
A recorrente A requereu o registo da marca em apreço para os serviços de classe 35, ou seja, organização de exposições para fins comerciais ou publicitários; planeamento e realização de feiras comerciais, exposições e apresentações com fins económicos ou publicitários; serviços de consultadorias relativas a feiras comerciais; locação de espaços para publicidade de balcões e cabinas, equipados, para exposição; serviços de publicidade e de promoção; serviços de consultadoria relativos a publicidade.
Não vamos repetir o que já dissemos em relação ao elemento nominativo COTAI, que já apuramos não é susceptível de protecção por ser meramente designação geográfica de uma determinada zona da RAEM.
Quanto ao elemento Arena, a forma mera itálica não comporta qualquer valor de fantasia.
Derivada da palavra latina HARENA, entrou já inter alia nas línguas portuguesa e inglesa.
Hoje em dia, a palavra ARENA adquiriu já um sentido genérico, que é um espaço para a realização de determinadas actividades, artísticas, desportivas ou comerciais.
Assim, ao contrário do que defende a recorrente A dizendo que a decisão recorrida incorre num manifesto erro de julgamento por ARENA nada ter a ver com as actividades de classe 35, a palavra ARENA é justamente para designar a espécie de serviços, mais ou menos abrangentes, mas integráveis no conjunto dos serviços que consistem na disponibilização ou na oferta de um espaço adequadamente equipado e com condições que permitem à realização das actividades artísticas, desportivas ou comerciais.
Finalmente, cabe dizer que pelas mesmas razões supra, mesmo analisada no seu todo, a marca registanda COTAI STRIP COTAIArena igualmente não adquire a capacidade distintiva dos serviços a que se destina.
Pelo que fica supra dito e face ao disposto no artº 199º/1-b) do RJPI, é de concluir que a marca registanda não é susceptível de protecção por falta de capacidade distintiva dos serviços a que se destina e consequentemente deve ser recusado o registo, e que bem andou o Exmº Juiz a quo ao julgar como julgou procedente o recurso interposto pela ora recorrida B Limited.
Tudo visto, resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam julgar improcedentes os recursos interpostos, mantendo na íntegra a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente A.
Notifique.
RAEM 25ABR2013
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan
João A. G. Gil de Oliveira
1 A legitimidade para recorrer depende de um de três factos: ser o recorrente o requerente do registo recusado, ter o recorrente apresentado reclamação ao pedido de concessão de registo e ter o recorrente prejuízo directo e efectivo decorrente da decisão recorrida (art. 276º do RJPI). Ora, se é certo que a recorrente não é a requerente do registo nem reclamou contra o pedido de concessão, é também certo que a recorrente não invocou qualquer prejuízo directo e imediato que para si resulte da decisão recorrida. No entanto, sendo a recorrente concorrente directa da requerente do registo e exercendo ambas actividade no mesmo local, intui-se facilmente aquele prejuízo directo e efectivo na concessão de um registo de marca alegadamente descritiva da proveniência geográfica dos bens a marcar. Assim, na presença de tal prejuízo legitimador do recurso e não sendo questionada a legitimidade da recorrente, deve a mesma ser considerada legítima, tanto mais, que a recorrente também é titular de marcas compostas pelas palavras “Cotai” e “Strip” que fundamentam a tese do recurso de que tais palavras são descritivas da proveniência geográfica dos bens a marcar. Intui-se pois, o prejuízo legitimador do recurso.
2 Cfr. Ac. do TSI de 26 de Julho de 2007, processo nº 516/2006, relator: Dr. Chan Kuong Seng, in www.court.gov.mo.
3 Cfr. Ac. do Tribunal de Justiça da União Europeia, processo C-265-P, relator M. Safjan, que apenas se conhece inédito.
4 “Ora, a verdade é que “Cotai” é vocábulo que exprime um local específico de Macau (concretamente entre as ilhas da Taipa e de Coloane), uma zona e uma área geográfica do território. Por conseguinte, este sinal parece estar incluído da norma limitativa da protecção (art. 199º, n.2, RJPI)”, lê-se no Douto Acórdão do Venerando tribunal de Segunda Instância, de 17/03/2011, proferido no Recurso Jurisdicional n. 172/2008, Relator: Dr. Cândido Pinho.
5 Arena significa, em latim, areia e designava o centro coberto de areia do local de espectáculos onde actuavam os respectivos actores, designadamente os gladiadores.
6 Devidamente ponderado o facto de ter sido concedido o registo de sinais com os termos “cotai” e “strip”, quer à recorrente, quer à recorrida (cfr. documento de fls. 5 a 8), tal facto tem valor argumentativo mínimo e não relevante dentro do presente processo no sentido de levar a concluir pela capacidade distintiva de tais termos.
7 Não tem aqui aplicabilidade o disposto no nº 2 do art. 199º (“excepto quando na prática comercial os sinais tiverem adquirido eficácia distintiva”), uma vez que se trata de marca constituída exclusivamente por indicações descritivas da espécie e proveniência geográfica, sendo pressuposto do referido nº 2 que parte da marca não seja descritiva. Com efeito, da economia da norma em apreço, confrontada com o nº 3 do art. 214º, resulta que as marcas constituídas exclusivamente por sinais descritivos não são registáveis e se contiverem outros sinais de diferente natureza, então são registáveis, mas os sinais descritivos não serão de utilização exclusiva, excepto se já tiverem adquirido eficácia distintiva na prática comercial. Não seria possível, nem teria qualquer utilidade juridicamente relevante, conceder um direito não exclusivo de utilização à totalidade dos elementos de uma marca.
8 Não parece haver lugar para dúvidas que, independentemente do meio processual em que a questão se coloque, é ao requerente do registo que cabe demonstrar que a marca adquiriu capacidade distintiva (vd. Américo da silva carvalho, Direito das Marcas, cit., pág. 259).
9 Neste caso, os elementos genéricos e descritivos da marca não são considerados de utilização exclusiva, excepto se, pela sua utilização na prática comercial já tiverem adquirido eficácia distintiva, isto é, se o publico consumidor relevante já tomar tais sinais, não pelo seu sentido literal normal, mas por uma qualquer ligação a determinado produtor ou fornecedor dos bens marcados.
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