Processo n.º 235/2013 Data do acórdão: 2013-6-20 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– tráfico de estupefacientes
– art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009
– medida da pena
S U M Á R I O
Na medida da pena a impor ao crime de tráfico de estupefacientes do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, é de atender a que são muito prementes as necessidades de prevenção geral deste delito, sobretudo quando praticado por pessoa turista em Macau.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 235/2013
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 385 a 389v dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR4-13-0001-PCC do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de um crime consumado de tráfico ilícito de estupefacientes, p. e p. pelo art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, de 10 de Agosto, na pena de dez anos e três meses de prisão, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar a atenuação, sobretudo especial (tal como permitida pelo art.o 18.o dessa Lei), da sua pena para menos do que seis anos de prisão, com alegado fundamento no seu acto de fornecimento voluntário de dados à Polícia tendentes a fazer captuar o indivíduo que lhe tinha mandado a transportação de droga para Macau, por um lado, e, por outro, no facto de o Tribunal Colectivo a quo, aquando da medida da pena, não ter feito ponderação ou análise suficiente do grau de culpa dele na prática dos factos (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 403 a 405v dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal a quo no sentido de improcedência da argumentação do recorrente (cfr. a resposta de fls. 407 a 409v).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 418 a 419v), pugnando também pela improcedência do recurso.
Feito o exame preliminar, corridos os vistos, e com audiência já feita nesta Segunda Instância, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada nas páginas 4 a 6 do texto do acórdão da Primeira Instância (ora a fls. 386v a 387v), é de considerar a mesma como totalmente reproduzida no presente acórdão de recurso, nos termos do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.o 4.o do actual Código de Processo Penal.
Em conformidade com essa factualidade provada, e na sua essência, com pertinência para a decisão do recurso:
– no dia 7 de Julho de 2012, o pessoal da Polícia Judiciária interceptou o arguido (com nota deste TSI: conforme os dados identificativos constantes do passaporte do arguido a que alude a fl. 7 dos autos, este tem por apelidos XX, e por nomes XX) no Terminal Marítimo do Porto Exterior de Macau para efeitos de investigação, na sequência da qual acabou por ser detectada a existência, no total, de 646,10 (331.10+315) gramas líquidos de Cocaína dentro da mochila que o arguido trazia na altura, previamente entregues a ele para serem transportados para dentro de Macau, para serem entregues depois a outros indivíduos de identidade não apurada;
– o arguido sabia da existência dessa droga dentro da mochila, e, porém, transportou-a para dentro de Macau, com o fim de obter USD15.000,00 de recompensa pecuniária;
– o arguido sabia da natureza da referida droga, e praticou os factos de modo livre, voluntário e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punível por lei;
– o arguido é delinquente primário em Macau, e declarou ter o curso secundário completo como habilitações académicas, estar desempregado, e ter a mãe e o irmão a seu cargo.
E segundo a fundamentação do acórdão recorrido:
– na audiência de julgamento, o arguido confessou francamente, e sem reservas, os factos acusados;
– a investigadora da Polícia ouvida na audiência de julgamento declarou aí que durante a investigação do caso, o arguido tinha exibido postura de colaboração.
Conforme a identificação constante do intróito do acórdão recorrido, o arguido é columbiano.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, vê-se que o arguido apenas colocou, como objecto do seu recurso, a questão da medida da pena de prisão, e para isso, alegou que tinha prestado colaboração à Polícia através de fornecimento de dados tendentes a fazer capturar o indivíduo que lhe tinha mandado a transportação de droga para dentro de Macau.
Entretanto, da consulta dos elementos constantes dos autos, não se vislumbra, pelo menos, a já captura de algum indivíduo por causa desse fornecimento de dados, pelo que sem mais outra indagação por ociosa, não é aplicável ao arguido o regime de atenuação especial da pena previsto no art.o 18.o da Lei n.o 17/2009, precisamente por falta de verificação dos seus pressupostos fácticos.
E quanto à justeza, ou não, da pena de dez anos e três meses de prisão achada no acórdão recorrido para a conduta delinquente do arguido em Macau dentro da correspondente moldura legal de três a quinze anos de prisão do art.o 8.o, n.o 1, da Lei n.o 17/2009, é de entender que ante todos os elementos fácticos pertinentes já referidos na parte II do presente acórdão de recurso, e sob a égide sobretudo dos art.os 40.o, n.os 1 e 2, e 65.o do vigente Código Penal, tal pena de prisão, imposta pelo Tribunal, já não admite mais margem para redução, precisamente porque:
– embora o arguido tenha confessado francamente e sem reservas os factos na audiência de julgamento, esta confissão tem pouco valor atenuativo em sede da medida da pena, dado que ele foi apanhado de flagrante delito pela Polícia;
– e apesar das condições pessoais e familiares modestas do arguido e da ausência de antecedentes criminais dele em Macau, é elevada a quantidade total líquida de Cocaína por ele transportada com dolo directo, quantidade essa que reflecta também um elevado grau de ilicitude desse acto ilegal;
– são, por outro lado, muito prementes as necessidades de prevenção geral do crime de tráfico de estupefacientes, sobretudo quando praticado por pessoa turista em Macau.
Há, pois, que naufragar o recurso.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo arguido recorrente, com quatro UC de taxa de justiça e quatro mil patacas de honorários a favor do seu Ex.mo Defensor Oficioso, a adiantar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 20 de Junho de 2013.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)
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