打印全文
Processo n.º 815/2012 Data do acórdão: 2013-7-11 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– condução em estado de embriaguez
– condenação anterior
– prevenção criminal
– substituição da prisão por multa
– art.o 44.o, n.o 1, do Código Penal
– pena suspensa
– art.o 48.º, n.º 1, do Código Penal
S U M Á R I O
1. Tendo voltado o arguido ora recorrente a praticar um mesmo crime de condução em estado de embriaguez, não se pode substituir a prisão por multa, para poder prosseguir adequadamente as necessidades de prevenção criminal especial (cfr. o critério material exigido no art.º 44.º, n.º 1, do Código Penal).
2. Também é inviável a subsidiariamente rogada suspensão de execução da pena de prisão em sede do art.º 48.º, n.º 1, do Código Penal, porque, por um lado, o recorrente voltou a praticar, comprovadamente com dolo directo, aquele crime (o que demonstrou que ele não tinha interiorizado bem a lição tida na sua condenação anterior), e, por outro, são continuadamente elevadas as exigências de prevenção geral do tipo-de-ilícito penal em causa (por ser potenciador de acidentes de viação não menos graves).
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 815/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A (XXX)



ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 17v a 19 dos autos de Processo Sumário n.° CR4-12-0163-PSM do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou, como autor material, na forma consumada, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 90.o, n.º 1, da vigente Lei do Trânsito Rodoviário (Lei n.o 3/2007, de 7 de Maio) (doravante abreviada como LTR), na pena de quatro meses de prisão efectiva, e na inibição de condução por um ano e seis meses, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), tendo concluído e peticionado o seguinte, em essência, na sua motivação de recurso (apresentada a fls. 47 a 59 dos presentes autos correspondentes):
– o art.o 44.o do vigente Código Penal (CP) impõe a substituição da pena de prisão não superior a seis meses por igual número de dias de multa;
– não se trata de uma faculdade do tribunal, mas de uma imposição;
– a sentença recorrida não fundamenta, neste aspecto, a decisão de desvio do regime-regra imposto pelo art.o 44.o do CP;
– e mesmo que se entendesse que a imposição do art.o 44.o do CP também seria excepcionada por questões de prevenção especial, esta prevenção especial só entraria em jogo se o arguido se revelasse carecido de socialização, o que não é, manifestamente, o caso dele, só porque, em 2009, cometeu idêntico crime, cuja pena, aliás, já etá extinta, ao que acresce que ele é uma pessoa perfeitamente integrada do ponto de vista social, pessoal e profissionalmente;
– e subsidiariamente falando, sempre estariam reunidos, no caso, os pressupostos legais para a suspensão da execução da pena de prisão, posto que em face do princípio geral ínsito no art.o 64.o do CP, nada justifica que se remova o recorrente da comunidade onde está estavelmente inserido, para a qual tem contribuído com o seu trabalho, quebrando as suas ligações familiares e retirando-o do convívio afectivo da sua família que dele precisa, espiritualmente mas, acima de tudo, materialmente, além do que, o recorrente, à parte do crime cometido em 2009, sempre tem demonstrado boa conduta social, razão pela qual a suspensão da execução da pena cumpriria plenamente o fim da prevenção geral e especial, eventualmente acompanhada de deveres e regra de conduta, nos termos dos art.os 49.o e 50.o do CP.
Ao recurso respondeu (a fls. 61 a 64v dos autos) a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal recorrido, no sentido de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 80 a 81), pugnando pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar, corridos os vistos e realizada a audiência neste TSI, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já julgada como provada pelo Tribunal a quo (e descritos como tal a fls. 17v a 18 dos autos), é de tomar a mesma factualidade como a fundamentação fáctica do presente aresto de recurso, por aval do art.º 631.º, n.º 6, do Código de Processo Civil vigente, ex vi do art.º 4.º do actual Código de Processo Penal.
Segundo essa factualidade provada (descrita originalmente em chinês, e aqui traduzida para português pelo ora relator), e na sua essência, com pertinência à solução do recurso:
– em 9 de Setembro de 2012, cerca das 06:00 horas, o pessoal policial do Corpo de Polícia de Segurança Pública, em execução de uma operação de fiscalização de automóveis na Avenida Dr. Rodrigo Rodrigues, mandou parar, para efeitos de investigação, o veículo automóvel ligeiro com chapa de matrícula n.º MM-XX-XX, conduzido na altura pelo arguido;
– do exame de pesquisa pelo método de sopro, foi detectada ao arguido a taxa de 1,92 gramas de álcool por litro no sangue;
– depois, a pedido do arguido, este foi levado ao Centro Hospital Conde de São Januário, onde lhe foi detectada a taxa de 1,75 gramas de álcool por litro no sangue;
– o arguido sabia claramente que era proibido conduzir em vias públicas com taxa de álcool no sangue que ultrapassasse o limite, sob pena de ficar sujeito à punição. Contudo, depois de beber bebidas alcoólicas, conduziu em via pública;
– o arguido, ao praticar os acima acima referidos, agiu de modo consciente, livre e voluntário, sabendo claramente que esse tipo de conduta era proibida e punível por lei;
– o arguido tem por habilitações literárias o 3.o ano do ensino secundário elementar, declara trabalhar em relações públicas de casino, com cerca de dezasseis a dezassete mil patacas de rendimento mensal, é solteiro, sem filhos, e paga cinco a sete mil patacas por mês aos pais como despesas de sobrevivência;
– o arguido já não é delinquente primário: em 14 de Dezembro de 2009, foi condenado, no Processo Sumário n.º CR2-09-0392-PSM, pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, do art.º 90.º, n.º 1, da LTR, em quatro meses de prisão, suspensa na sua execução por dezoito meses, e na inibição de condução por um ano, tendo a sentença respectiva transitado em julgado em 6 de Janeiro de 2010, e a pena sido declarada extinta por despacho de 14 de Novembro de 2011.
Conforme a acta da audiência de julgamento em primeira instância (lavrada a fls. 16 e seguintes), o arguido confessou integralmente e sem reservas os factos imputados.
E na fundamentação jurídica da sua sentença, a M.ma Juíza a quo chegou a afirmar materialmente o seguinte (ora concretamente a fl. 18v): Considerando o registo criminal do arguido, e em prol das necessidades de prevenção criminal, não se substitui a pena por multa (art.o 44.o do CP).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Começou o arguido por pretender a substituição da pena de prisão por multa, tendo assacado até ao Tribunal recorrido a falta de fundamentação da decisão de não susbstituição da pena por multa.
Pois bem, ante os elementos já referidos na parte II do presente acórdão de recurso, vê-se que ainda que em termos sintéticos, a M.ma Juíza recorrida chegou a fundamentar a sua decisão de não substituir a prisão por multa.
E quanto ao mérito dessa fundamentação, entende o presente Tribunal de recurso que a mesma é acertada, porquanto tendo voltado o arguido a praticar um mesmo crime de condução em estado de embriaguez, não se pode substituir a prisão por multa, para poder prosseguir, in casu, e de modo adequado, as necessidades de prevenção criminal especial (cfr. o critério material exigido no art.º 44.º, n.º 1, do CP).
Outrossim, também é inviável a subsidiariamente rogada suspensão de execução da pena de prisão, porque, por um lado, o recorrente voltou a praticar, comprovadamente com dolo directo (cfr. a matéria de facto já dada por assente na sentença recorrida), um mesmo crime de condução em estado de embriaguez (o que demonstrou que ele não tinha interiorizado bem a lição tida na sua condenação anterior em Dezembro de 2009), e, por outro, são continuadamente elevadas as exigências de prevenção geral desse tipo-de-ilícito penal (por ser potenciador, como ensinam as regras da experiência da vida humana, de acidentes de viação não menos graves). Com efeito, em sede do art.º 48.º, n.º 1, do CP falando, a mera censura dos factos e a ameaça de execução da prisão já não conseguem, de facto, realizar de forma suficiente e adequada as finalidades da punição, ainda que ele tenha confessado integralmente e reservas os factos (circunstância essa que tem muito pouco valor, porque o crime foi praticado em flagrante delito) e tenha encargos familiares.
Improcede, assim, o recurso in totum, sem necessidade de indagação, por prejudicada, do mais alegado pelo arguido na motivação.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com doze UC de taxa de justiça.
Macau, 11 de Julho de 2013.
_______________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
_______________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
_______________________ (segue declaração)
José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)

Processo nº 815/2012
(Autos de recurso penal)



Declaração de voto


Atenta a factualidade provada, em especial, o tempo decorrido entre a 1a condenação e a ora objecto de recurso, (quase 3 anos), e ponderando nos “prós” e “contras” das penas de curta duração, decidia pela suspensão da execução da pena decretada, por um período mais próximo do seu limite máximo, condicionando a mesma suspensão ao dever de pagamento de uma quantia monetária a uma instituição de solidariedade social, pois que se me afigura que com tal “pena (suspensa)” e “dever imposto”, (sem esquecer a pena acessória de inibição de condução por 1 ano e 6 meses decretada pelo T.J.B.), atingir-se-ia o enunciado no art. 40° do C.P.M.

Macau, aos 11 de Julho de 2013
José Maria Dias Azedo



Processo n.º 815/2012 Pág. 3/10