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Processo nº 397/2013 Data:11.07.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Defensor Oficioso.
Honorários.
Advogado Estagiário.



SUMÁRIO

1. Os honorários pelos serviços prestados no âmbito de um processo da competência do Tribunal Colectivo por um Advogado nomeado Defensor Oficioso devem ser fixados entre os limites de MOP$7.500,00 e MOP$50.000,00.

2. Tratando-se de Advogado Estagiário os honorários a atribuir são reduzidos a dois terços.

3. A remuneração em questão deve ter presente a dignidade dos profissionais forenses, (e com isto a da própria administração da justiça), sendo adequada para que os serviços prestados sejam qualificados e eficazes, ponderando-se, sempre, o volume e complexidade do trabalho produzido e o dispêndio do tempo que terá implicado.

O relator,

__________________
José Maria Dias Azedo



Processo nº 397/2013
(Autos de recurso penal)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão proferido em 13.05.2013 no Processo Comum Colectivo nº CR1-12-0252-PCC, fixou-se, a título de honorários ao Exm° Defensor nomeado ao arguido dos autos, Ilustre Advogado Estagiário A, o montante de MOP$1.500,00; (cfr., fls. 139 a 196).

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Inconformado, do assim decidido vem o referido Defensor recorrer.

Em sede de conclusões, afirma o que segue:

“a. Por despacho a fls. 118 verso dos presentes autos, o ora Recorrente foi nomeado como defensor do arguido B;
b. Em 23 de Abril de 2013, o ora Recorrente compareceu e participou da audiência de julgamento e, bem assim, assistiu, em 13 de Maio de 2013, à leitura da sentença proferida no âmbito dos presentes autos, na qual lhe foi arbitrada a quantia de MOP$1.500,00 a título de honorários, sendo este adiantado pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância;
c. Nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 75.° do Regime das Custas nos Tribunais, são abrangidas nas custas no processo penal os honorários atribuídos aos defensores nomeados;
d. Conforme o comando legal contido no n.° 1 do artigo 76.° do mesmo diploma, "os advogados ou advogados estagiários são remunerados nos termos da legislação sobre o apoio judiciário.";
e. O que implica quanto aos honorários o seguimento da nova Tabela de honorários no âmbito do apoio judiciário aprovada pelo Despacho do Chefe Executivo n.° 59/2013, que entrou em vigor no dia seguinte da sua publicação e com os seus efeitos retroagem ao dia 1 de Abril de 2013;
f. Segundo o ponto 5.1 da referida Tabela determina que a intervenção num processo da competência do tribunal colectivo é remunerada com honorários a fixar entre um mínimo de MOP$7.500,00 e um máximo de MOP$50.000,00;
g. Assim sendo, seguindo a Tabela, deveria ter sido fixado ao ora Recorrente a título de honorários, um mínimo de MOP$5.000,00, isto é, o mínimo do ponto 5.1 da Tabela em processo de competência do tribunal colectivo reduzindo a dois terços;
h. Tinha decidido o Tribunal de Segunda Instância em questão semelhante e pronunciando-se sobre a norma (artigo 76.° n.° 1 do Regime das Custas dos Tribunais) que manda aplicar a Tabela em questão à fixação dos honorários do defensor oficioso "É uma norma vinculativa para o juiz competente na fixação de honorários e o juiz só tem liberdade ou poder discricionário a determinar um montante concreto dentro desses limites, cabendo neste último caso a censura do tribunal de recurso apenas com fundamento de manifesta desproporcionalidade", e ainda, ''Afixação de honorários não pode deixar de alcançar a finalidade de "estimular os profissionais do foro neste domínio da sua actividade";
i. Salvo o devido respeito, na parte em que fixou ao ora Recorrente honorários no montante de MOP$1.500,00 violou o Tribunal a quo o disposto no n.° 1 do artigo 76.° do Regime das Custas dos Tribunais e o artigo 34.° da Lei n.° 13/2012, conjugado com o ponto 5.1 e a nota 1) da Tabela aprovada pelo Despacho do Chefe Executivo n.° 59/2013, de 26 de Março de 2013”; (cfr., fls. 151 a 158).

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Em resposta, entende o Exmº Representante do Ministério Público que se deve julgar procedente o recurso; (cfr. fls. 83 a 86).

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Nesta Instância, juntou a Ilustre Procuradora-Adjunta o seguinte Parecer:

“Dr. A, advogado estagiário, ora defensor oficioso nomeado para o arguido nos presentes autos, tendo-lhe sido arbitrado uma quantia de MOP 1500 a título de honorários pelo Tribunal a quo, no acórdão proferido em 13 de Maio de 2013.
Inconformado com a decisão acima referida, vem recorrer para o Tribunal de Segunda Instância, invocando violação dos art.° 76 n.° 1 do Regime das Custas dos Tribunais e do art.° 34 da Lei n.° 13/2012, conjugado com o ponto 5.1 e a nota 1) da Tabela aprovada pelo Despacho do Chefe Executivo n.° 59/2013, de 26 de Março de 2013, e, solicitando o arbítrio de honorários dentro dos valores mínimos e máximos constantes da dita tabela.
Entendemos que, em completa sintonia com o Digno Magistrado do M.P. na sua resposta à motivação do recurso, se deve julgar procedente o recurso, fixando-se os honorários dentro dos limites legalmente previstos.
Efectivamente, a questão a apreciar já não é nova mesmo que se relacione à disposição legal já revogada, devendo nós prosseguirmos o mesmo espírito e princípio respectivamente ilustrado nos doutos Acórdãos dos Processos n.°s 64/2007 de 08/02/2007, 135/2006 de 08/06/2006, 440/2006 de 16/11/2006, 592/2006 de 25/01/2007, 36/2007 de 01/02/2007, tudo do T.S.I..
In casu, o recorrente foi nomeado como defensor oficioso do arguido C, tendo assegurado a defesa do arguido durante o prosseguimento de todo o procedimento dos presentes autos.
Não vemos nenhum impedimento de arbítrio de honorários, na esteira do art.° 76 n.° 1 do Regime das Custas dos Tribunais.
Tal nomeação foi decidida pelo douto despacho da Exma. Juíza titular, no dia 19/12/2012, data em que se encontrava vigente o Decreto-Lei n.° 41/94/M, revogado pela Lei n.° 13/2012 de 01/04/2013.
O acórdão recorrido foi proferido no dia 13/05/2013 em que a lei vigente n.° 13/2012, especialmente o art.° 34 da Lei n.° 13/2012, conjugado com o ponto 5.1 e a nota 1) da Tabela aprovada pelo Despacho do Chefe Executivo n.° 59/2013, onde se eleva o montante dos limites dos honorários para o defensor nomeado.
Em conformidade com a digna resposta à motivação de recurso, concordamos que a nova disposição se trata de uma “disposição directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas”, retroagindo-se as novas disposições legais, nos termos da 2.a parte do art.° 11 n.° 2 do C.C.M..
Caso como o presente, deve-se fixar o montante entre MOP7500 e MOP50000 que são limites dos honorários para o defensor nomeado para os processos da competência do Tribunal Colectivo, reduzindo a dois terços na esteira do art.° 1 das notas anexadas ao Despacho n.° 59/2013.
Pelo exposto, deve ser julgado procedente o recurso” ; (cfr. fls. 176 a 177).

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Colhidos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos, vieram os autos à conferência.

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Cumpre decidir.

Fundamentação

2. A questão a apreciar – do montante a fixar a título de “honorários dos Defensores Oficiosos” – não é nova, tendo já sido por várias vezes objecto de pronúncia deste T.S.I.; (cfr., v.g., os Ac. de 08.06.2006, 16.11.2006, 25.01.2007 e 01.02.2007 e 08.02.2007, Proc. n.° 135/2006, 440/2006, 592/2006, 36/2007 e 64/2007, respectivamente).

–– “Questão prévia”.
  
   Suscitou o Exmo. Colega 1° Juiz-Adjunto a questão da “irrecorribilidade da decisão objecto do presente recurso”, considerando que o meio próprio para o recorrente obter a sua alteração era a “reclamação” nos termos do art. 49° do “Regime das Custas nos Tribunais”, (D.L. n.° 63/99/M de 25.10), invocando também o art. 51° deste mesmo diploma legal para justificar a mencionada irrecorribilidade.
  
   Após (nova) reflexão sobre a questão, (pois que este T.S.I., em 2006 e 2007 decidiu julgar procedentes idênticos recursos; cfr., os Acs. deste T.S.I. supra citados), não se mostra de acolher tal entendimento.
  
   Eis, em síntese, o porque desta nossa posição.
  
   Desde logo, dado que, como nos parece que se pode (e deve) retirar do teor do invocado art. 49° do R.C.T., (assim como da sua epígrafe: “Reclamação e reforma da conta”), o que em causa está no mencionado preceito legal é a “conta que não estiver de harmonia com as disposições legais”, portanto, uma (eventual) correcção do “acto de contagem” – cfr., v.g., S. da Costa, in “C.C.J. Anot. e Comentado”, pág. 343) – efectuado pela Secretaria do Tribunal, e não uma “decisão judicial” proferida por um Magistrado, como é a ora recorrida.
  
   Por sua vez, para o caso dos autos, e seja como for, também não nos parece válido o argumento no sentido de o “valor” (dos honorários) em questão não exceder a “metade da alçada do Tribunal onde a conta foi elaborada”, (cfr., art. 51° do R.C.T.), pois que de olvidar também não é que, nos termos do art. 18°, n.° 4 da L.B.O.J., (Lei n.° 9/1999), “em matéria penal (…)não há alçada”, (certo sendo que não releva o estatuído no art. 390°, n.° 2 do C.P.P.M., onde se estatui que “o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil é admissível desde que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal recorrido”).
  
De facto, e ainda que se mostre de considerar os “honorários” como parte integrante dos “encargos”, e, assim, a ter em conta em sede de “custas”, (cfr., art 75°, n.° 1, al. b) do R.C.T.), inegável nos parece a “natureza penal da questão” trazida à apreciação deste T.S.I., já que não deixa de ser uma questão suscitada em matéria de “custas em processo penal”, (e daí, aliás, em nossa opinião, a redacção do art. 81° do mesmo R.C.T., que ressalva, expressamente, a aplicação do mencionado art. 51°).
  
   Nesta conformidade, tendo presente o “princípio geral” estatuído no art. 389° do C.P.P.M., onde se preceitua que “é permitido recorrer dos acórdãos, sentenças e despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei”, e sendo que nos termos do seu art. 391°, n.° 1, al. d), deste mesmo Código, “tem legitimidade para recorrer, aqueles que (…) tiverem a defender um direito afectado pela decisão”, passa-se a conhecer do recurso; (neste sentido, e entre muitos, cfr., v.g., o Ac. do S.T.J. de 04.12.1996, Proc. n.° 96P1030 in, B.M.J. n.° 462, pág. 227 e o da R. L. de 14.02.1995, Proc. n.° 8124, in C.J., Ano XX T.II, pág. 133, aqui citados como mera referência).

–– Do “recurso”.

Resulta dos autos que por despacho proferido em 19.12.2012, (cfr., fls. 118-v), foi o ora recorrente nomeado Defensor do arguido, e, como tal, assegurou a defesa deste, comparecendo na audiência de julgamento realizada em 23.04.2013, tendo também comparecido à leitura do Acórdão em 13.05.2013.

  Nos termos do art. 55°, n.° 5, do C.P.P.M., “o exercício da função de defensor nomeado é sempre remunerado”, sendo que preceitua também o art. 76°, n.° 1 do “Regime de Custas nos Tribunais que “os defensores que sejam advogados ou advogados estagiários são remunerados nos termos da legislação sobre o apoio judiciário”.

Em conformidade com o art. 34° da Lei n.° 13/2012, (que actualmente regula o “sistema de apoio judiciário”):

“1. Pelos serviços prestados, os patronos nomeados têm direito a receber honorários fixados pela Comissão, assim como a serem reembolsados das despesas realizadas que devidamente comprovem, não podendo exigir ou receber quaisquer outras quantias.
2. Na fixação dos honorários, deve ter-se em conta o tempo gasto, o volume e a complexidade do trabalho produzido, os actos ou diligências realizados e o valor da causa, devendo, para o efeito, o patrono nomeado apresentar à Comissão o respectivo relatório, que é assinado pelo juiz que conhece o processo judicial para o qual tenha sido concedido o apoio judiciário caso o respectivo processo tenha já sido iniciado.
3. Os honorários fixados pela Comissão não podem exceder os valores máximo e mínimo constantes da tabela de honorários aprovada por despacho do Chefe do Executivo, a publicar no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau.
4. Os valores máximo e mínimo dos honorários constantes do despacho do Chefe do Executivo referido no número anterior são fixados e actualizados, ouvida a Associação dos Advogados de Macau”.

E, por sua vez, por Despacho do Chefe do Executivo n.° 59/2013, (foram revogadas as Portarias n.° 265/96/M de 28.10 e n.° 60/95/M de 31.03, e) aprovou-se uma nova “tabela de honorários”, (tal como referido no transcrito art. 34°, n.° 3 da Lei n.° 13/2012), fixando-se, o montante de MOP$7.500,00 a MOP$50.000,00 para os processos da competência do Tribunal Colectivo.

Sendo o caso, notando-se que nos termos do n.° 3 do mencionado Despacho, “os seus efeitos retroagem ao dia 1 de Abril de 2013”, que a audiência de julgamento teve lugar no dia 23.04.2013 e que a decisão recorrida foi proferida em 13.05.2013, evidente é que aquém do limite mínimo está o montante fixado pelo Tribunal “a quo”.

Cremos que a remuneração em questão deve ter presente a dignidade dos profissionais forenses, (e com isto a da própria administração da justiça), sendo uma remuneração adequada para que os serviços prestados sejam qualificados e eficazes, ponderando-se, sempre, o volume e complexidade do trabalho produzido e o dispêndio do tempo que terá implicado; (como em sede de apreciação de idêntica questão bem se notou em recente Ac. da R. de Évora de 16.04.2013, Proc. n.° 345/99, in www.dgsi.pt, “o “fair trial”, o processo justo, não é só um processo justo para com o acusado, sua origem histórica, é também um processo que deve ser justo para todos e entre todos os intervenientes”).

Dest’arte, atento o exposto, e sendo o ora recorrente “Advogado Estagiário”, o que, nos termos do dito Despacho n.° 59/2013, implica a redução dos honorários para “dois terços”, fixa-se o montante de MOP$5.500,00.

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

3. Nos termos que se deixam expostos, em conferência, acordam conceder provimento ao recurso, fixando-se, a título de honorários, o montante de MOP$5.500,00.

Sem custas.

Macau, aos 11 de Julho de 2013

José Maria Dias Azedo
Tam Hio Wa
Chan Kuong Seng (com declaração de voto vencido)

Declaração de voto ao Acórdão de 11 de Julho de 2013 do
Tribunal de Segunda Instância no
Processo n.º 397/2013
Discordo da decisão feita no Acórdão hoje proferido por este Tribunal de Segunda Instância nos presentes autos recursórios n.o 397/2013, por seguintes considerações (e não aquelas referidas menos bem entendidamente no 3.º parágrafo da página 8 desse Acórdão):
– a remuneração de defensor de que se fala no art.º 76.º, n.º 1, do vigente Regime das Custas nos Tribunais é um encargo a compor as custas no processo penal (cfr. o art.º 75.º, n.º 1, alínea b), e o art.º 61.º, n.º 1, deste diploma legal);
– de maneira que qualquer eventual inobservância pela sentença (ou acórdão) proferida pelo Tribunal Judicial de Base sobre a causa, do disposto na legislação sobre custas em matéria inclusivamente de honorários (cfr. o art.º 355.º, n.º 4, do actual Código de Processo Penal), pode ser objecto de correcção por esse Tribunal, quer oficiosamente, quer a pedido da pessoa interessada na correcção (cfr. o art.º 361.º, n.º 1, alínea a), deste Código);
– portanto, deveria a Ex.ma Pessoa Defensora Oficiosa ora Recorrente ter pedido a esse Tribunal a reforma da decisão final sobre a causa na parte relativa à matéria de fixação de seus honorários como defensor oficioso, e não ter interposto recurso dessa decisão final só por causa da discordância do montante dos seus honorários aí fixado;
– com efeito, do disposto no art.º 361.º, n.o 1, alínea a), do Código de Processo Penal, decorreria que o recurso ordinário da sentença ou acórdão do Tribunal Judicial de Base não seria o meio próprio para corrigir tão-só um eventual erro na decisão sobre as custas (inclusivamente sobre a matéria de fixação de honorários de defensor oficioso), mas sim um meio de impugnação para se reagir contra o eventual erro de julgamento feito sobre o objecto da causa (e pese embora a possibilidade, prevista no n.o 2 do mesmo art.o 361.o, de o tribunal ad quem vir proceder à rectificação da sentença no caso, e apenas no caso, de haver recurso interposto da decisão sobre o objecto da própria causa, hipótese esta que não sucedeu no caso concreto dos presentes autos);
– dest’arte, deveria ter este Tribunal de Segunda Instância proferido decisão no sentido de não conhecer do recurso, depois da feitura da notificação da Ex.ma Pessoa Recorrente para vir, querendo, pronunciar-se sobre a eventualidade de o seu recurso não ser conhecido.
Macau, 11 de Julho de 2013.
 O primeiro juiz-adjunto,
Chan Kuong Seng
Proc. 397/2013 Pág. 18

Proc. 397/2013 Pág. 1