打印全文
Proc. nº 801/2012
(Recurso Contencioso)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 18 de Julho de 2013
Descritores:
-Renovação de autorização de residência
-Alteração da situação jurídica relevante
-Conceitos indeterminados
-Justa causa

SUMÁRIO:

I - Se a renovação de autorização de residência pressupõe geralmente a manutenção na pessoa do interessado dos requisitos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial (art. 19º, nº2), já uma das excepções a este dispositivo-regra consiste, precisamente, na circunstância de os técnicos especializados e quadros dirigentes não estarem dependentes da manutenção do vínculo contratual que tenha fundamentado o pedido inicial, desde que seja feita prova de novo exercício profissional por conta de outrem e do cumprimento das respectivas obrigações fiscais (art. 19º, nº2, al.2)).

II - Mas o facto de qualquer técnico especializado ou quadro dirigente poder mudar de emprego durante o período da autorização de residência concedida em tais condições - desde que a nova contratação seja feita por empregador local, tal como o impõe o art. 1º, al.3) do diploma - não o dispensa de fazer a comunicação a que se refere o art. 18º, nº3, na medida em que o art. 19º não exclui o dever além plasmado.

III - “Justa causa” é conceito indeterminado que, embora se não resolva pela discricionariedade, se pauta por uma densificação que à Administração cumpre efectuar perante a situação real através de uma tarefa de intelecção e interpretação.
A “justa causa” é toda a ocorrência fáctica que retira censurabilidade à acção ou omissão e lhe confere desculpabilidade, enquanto a negligência e falta de cuidado, mesmo que lhe mitigando o grau, não excluem a culpa, nem a censurabilidade da conduta.

IV - A “Desburocratização” e “eficiência” administrativas” reportadas no art. 12º do CPA são princípios programáticos que devem nortear a actuação da Administração em ordem a uma melhor eficácia da sua acção. Em cada procedimento, no seu dia-a-dia funcional, nas suas relações com os administrados, toda a Administração deve procurar ser pronta, ágil e combater a morosidade (celeridade), ser prática e optimizar a sua acção com simplicidade e com o menor recurso de meios (economia), dotar as suas decisões, internas e externas, do melhor grau de resolução dos problemas e dificuldades que tenha que enfrentar (eficiência).


Proc. nº 801/2012
(Recurso Contencioso)

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A, portador do BIRNPM nº XXXXXX, residente na Rua de XX, nº XXX, edif. XX, Torre X, Xº andar X, Taipa, recorre contenciosamente do despacho de 8/08/2012 do Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças, que lhe indeferiu o pedido de renovação da autorização de residência temporária em Macau.
Na respectiva petição formulou as seguintes conclusões:
“1. O presente recurso contencioso é tempestivo e o Douto Tribunal é competente.
2. No dia 13 de Junho de 2007, o recorrente pediu a autorização de residência temporária em Macau, na qualidade de quadro dirigente e técnico especializado. O número do seu processo é P1658/2007 e foi-lhe concedida, em 4 de Junho de 2008, a autorização de residência temporária que validou até 4 de Junho de 2011.
3. O recorrente formulou o pedido acima referido com o fundamento de ser vice-presidente de vendas e de marketing da região do Nordeste da Ásia (sic) da “Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited)” a partir de 22 de Março de 2007, recebendo um salário anual de HKD2.462.400,00.
4. Depois de cessar a relação laboral com a “Melco PBL Hotel (Crown Macau) Limited” que fundamentou a autorização inicial, o recorrente foi contratado, em 4 de Janeiro de 2010, pela “XX Hong Kong Limited” para o cargo de vice-presidente executivo de marketing de casino, com um salário mensal de USD36.265 (correspondente a HKD282.508,00), o que perfez um salário anual de HKD3.390.096,00. Uma das suas funções era gerir as actividades desenvolvidas pela referida sociedade em Hong Kong e Macau.
5. A “XX Hong Kong Limited” é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, continuada nas Bermudas (百慕達持續經營的獲豁免有限責任公司 public limited liability company continued into Bermuda), bem como uma sociedade listada da “The Stock Exchange of Hong Kong Limited”, exercendo actividades em Macau através duma companhia conexa com ela.
6. Em 23 de Agosto de 2010, o requerente foi nomeado, pela “XX Hong Kong Limited”, para o cargo de administrador da “Companhia de XX Limitada XXX有限公司)”, empresa que tem conexão com a “XX Hong Kong Limited” e registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o nº 32329(SO). Esta possui também a licença de promotor de jogos pessoa colectiva nº E188.
7. De acordo com o artº 8º da Lei nº 6/2002 (sic), a nomeação de administrador do promotor de jogo que seja uma sociedade comercial é sujeita à aprovação da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos que é responsável pela verificação da idoneidade do nomeado. A nomeação do recorrente foi autorizada pela dita entidade em 27 de Outubro de 2010.
8. Em 1 de Março de 2011, o recorrente foi contratado pela “Companhia de XX Limitada” como empregado remunerado, exercendo o cargo de presidente do conselho de administração da companhia e auferindo um salário mensal de HKD168.805,28.
9. Desde 4 de Janeiro de 2009 até à presente, o recorrente trabalha e reside sempre em Hong Kong e Macau, com finalidade de gerir as actividades das “XX Hong Kong Limited” e “Companhia de XX Limitada” em Macau.
10. Embora a “XX Hong Kong Limited” não tenha criado um sucursal em Macau, ela tem uma empresa conexa (“Companhia de XX Limitada”) que foi criada na Região para exercer actividades em Macau. Tal companhia é gerida pelo recorrente.
11. Mesmo assim, o recorrente foi contratado directamente pela “Companhia de XX Limitada”, empresa que tem conexão com a “XX Hong Kong Limited”, para desempenhar as funções de gerente.
12. Ademais, o novo trabalho actual do recorrente é melhor do que o antigo, quer nas condições de trabalho, quer na área e natureza funcional, quer na importância na gestão, preenchendo os requisitos para o pedido de residência temporária como quadro dirigente e estando em conformidade com as disposições do artº 1º, nº 3, da Lei nº 3/2005.
13. O recorrente tem mantido, desde a concessão da autorização de residência temporária até à data, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência, estando a empenhar o trabalho de quadro dirigente em Macau.
14. Por outro lado, o requerente não conhece bem a legislação de Macau, nem dominam uma das duas línguas oficiais da Região, o que impossibilita-o de ler o teor do campo “Observações” no verso da Notificação de Deferimento nº 10606/GJFR/2008, de 11 de Junho de 2008, que foi mencionado no referido despacho.
15. Por isso, o recorrente não tinha intenção de infringir a norma, apenas não sabia que deve comunicar, por escrito, ao IPIM a extinção ou alteração da situação juridicamente (profissão) no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração, tal como é previsto pelo Regulamento Administrativo nº 3/2005.
16. Apesar de o recorrente não ter cumprido a obrigação de comunicação, ele entregou imediatamente a declaração de alteração da profissão e o documento comprovativo do trabalho aquando do tratamento da renovação da autorização, bem como apresentou a sua justificação, sendo justa e aceitável a sua causa e que merece ser considerada e reunindo o disposto no artº 4º do Regulamento Administrativo nº 3/2005. Assim deve a comunicação tardia ser aceite.
17. Importa referir que o cargo de presidente do conselho de administração que o recorrente está a desempenhar tem uma natureza especial e exige determinada qualificação. A nomeação para o referido cargo é sujeita à aprovação da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos que é responsável pela verificação da idoneidade do nomeado. A idoneidade e a nomeação do recorrente para tal cargo foram aprovadas pela dita entidade
18. Combinadas as características mencionadas com as condições do cargo que o recorrente está a desempenhar actualmente, verifica-se o preenchimento das disposições do artº 1º, nº 3, e do artº 7º, als. (2) a (5) do Regulamento Administrativo nº 3/2005, e todos dos requisitos para o pedido de autorização de residência temporária como quadro dirigente, estabelecidos pelo mesmo Regulamento Administrativo, assim devendo lhe ser autorizada a renovação de residência temporária com base no mesmo diploma legal.
19. No entanto, o despacho não ponderou a justificação e a situação do recorrente (tal como a profissão actual do mesmo já satisfaz todas as exigências para o pedido de autorização de residência temporária em Macau por quadro dirigente), tomando, ao contrário, uma decisão de indeferimento por o recorrente não ter mantido o pressuposto para a autorização inicial e não ter cumprido a obrigação de comunicação no prazo legal, o que violou as disposições do Regulamento Administrativo nº 3/2005, nomeadamente, o artº 1º, nº 3, o artº 7º, als. (2) a (5) e o artº 18º, nº 4.
20. O indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária terá de conduzir à apresentação de novo pedido pelo recorrente, o que implica a repetição do mesmo procedimento administrativo.
21. Salvo o devido respeito, o recorrente acha que isso está a gastar os recursos e tempo do Governo da RAEM, diminuindo, desta forma, a eficiência de trabalho e retardando o andamento do processo, o que violou os princípios da boa fé e da desburocratização e da eficiência estabelecidos nos artºs 8º 12º do CPA.
22. Em face de todo o exposto e conforme o artº 124º do CPA e o artº 21º, nº 1, al. d) do CPAC, o acto administrativo no despacho violou os artigos 8º e 12º do CPA e o Regulamento Administrativo nº 3/2005, nomeadamente, o artº 1º, nº 3, o are 7º, als. (2) a (5) e o are 18º, nº 4, por isso, é anulável por enfermar do vício de violação de lei. Deste modo, a entidade recorrida deve levar em consideração o direito atribuído por lei ao recorrente e anular o referido acto administrativo.
*
Na contestação, a entidade recorrida apresentou as seguintes conclusões:
“I. O Recorrente foi contratado pela Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited) na qualidade de técnico especializado, e assim foi autorizada a sua residência.
II. A relação de trabalho estabelecida entre o Recorrente e a Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited) é a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência.
III. Ao abrigo dos dispostos no art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, o interessado deve comunicar à autoridade administrativa a alteração da situação jurídica no prazo de 30 dias, contados desde a data da alteração, sob pena do cancelamento da autorização de residência.
IV. A relação de trabalho entre o Recorrente e a Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited) extinguiu-se em 31 de Dezembro de 2009, mas o Recorrente não cumpriu o dever de comunicação no prazo legal, isso constitui o fundamento do despacho recorrido de indeferimento da renovação da autorização de residência do Recorrente.
V. O despacho recorrido não tem erro no reconhecimento dos factos.
VI. De facto, os factos de quem contratar o Recorrente e qual ser o cargo deste após a extinção da relação de trabalho entre a Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited) e o Recorrente não são importantes para o despacho recorrido, porque o despacho recorrido não se fundamentou nesses factos.
VII. Também é de mencionar que não cabe ao Recorrente decidir se a sua nova situação de emprego satisfaz o disposto no art.º 1.º, al. 3) do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, mas a referida situação deve ser apreciada e confirmada pela autoridade administrativa.
VIII. O facto de o Recorrente ser contratado pela XX Hong Kong Limited não foi apreciado e autorizado pela autoridade administrativa, pelo que não se pode concordar com o que o Recorrente disse, ou seja que este tem mantido a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência após a extinção da relação laboral com a Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited).
IX. O Recorrente explicou a falta de cumprimento do dever de comunicação com a ignorância da lei, isso não é razoável porque a ignorância da lei não justifica a falta do seu cumprimento (art.º 5.º do Código Civil).
X. Além disso, por um lado, o Recorrente alegou que tem mantido a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência, mesmo depois de exercício do seu novo cargo; mas por outro lado, o Recorrente alegou que a declaração de exercício de novo cargo no requerimento de renovação justifica a falta de cumprimento do dever de comunicação de alteração da situação jurídica, isso é contraditório.
XI. A verdade é que o Recorrente nunca explicou a falta de cumprimento do dever de comunicação durante o procedimento administrativo de renovação da autorização de residência. A declaração de exercício de novo cargo, na melhor das hipóteses, pode ser considerada como comunicação da alteração de situação jurídica, mas não como explicação da falta de cumprimento do dever de comunicação, porque não se mencionou as razão da falta de cumprimento do dever de comunicação no prazo de 30 dias.
XII. Quer a simples extinção da anterior relação de trabalho, quer a substituição da anterior relação de trabalho com nova relação, são alterações de situação jurídica e objectos do dever de comunicação. Constitui-se a falta de cumprimento do dever de comunicação sempre que não se comunica o exercício do novo cargo no prazo de 30 dias.
XIII.O Recorrente só prestou à autoridade administrativa a declaração de reconversão profissional quando apresentou o requerimento de renovação da autorização de residência mais de 1 ano após a reconversão profissional, tal facto já constitui a falta de cumprimento do dever de comunicação no prazo de 30 dias contados desde a data de reconversão profissional, mas o Recorrente ainda tentou utilizar este facto para explicar a falta de cumprimento do dever de comunicação, isso é ridículo.
XIV.O Recorrente alegou repetidamente que o seu novo cargo reúne os requisitos previstos no Regulamento Administrativo n.º 3/2005, e que é ilegal o despacho recorrido de indeferimento do seu requerimento de renovação.
XV. Aqui reiteramos que não cabe ao Recorrente decidir se a sua nova situação de emprego reúne os requisitos legais, e a referida situação deve ser apreciada e confirmada pela autoridade administrativa, mas o Recorrente não comunicou à autoridade administrativa de acordo com a disposição legal e no prazo de 30 dias, contados desde a data do estabelecimento da nova relação laboral.
XVI.O despacho recorrido de indeferimento da respectiva renovação assentou na falta de cumprimento do dever de comunicação por parte do Recorrente. Se a nova relação de trabalho do Recorrente satisfaz os critérios de apreciação e autorização não é importante para o despacho recorrido, pelo que é infundamentado o entendimento de que o despacho recorrido viola os artigos 1.º, al. 3), 7.º, al.s 2) a 5) e 18.º, n.º 4 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
XVII.O Recorrente também entende que o despacho recorrido violou os princípios da boa fé, da desburocratização e da eficiência, por razões de que o despacho recorrido de indeferimento da renovação da autorização de residência causou-lhe a apresentar de novo o requerimento de renovação. Isso é inaceitável porque o Recorrente tenta fundamentar a violação dos referidos princípios com base num facto que possa acontecer ou não acontecer no futuro, o que se revela ridículo”.
*
Seguiu o processo para alegações, tendo-as o recorrente apresentado em termos iguais aos das conclusões da petição inicial.
*
Nas suas alegações, a entidade recorrida defende a manutenção do acto sindicado em termos aqui dados por reproduzidos.
*
O digno Magistrado do MP opinou no sentido da improcedência do recurso.
*
Cumpre decidir.
***
II - Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
***
III - Os Factos
1 - Ao recorrente, na ocasião vice-presidente de vendas e de marketing da região do Nordeste da Ásia da Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited) desde 22/03/2007, com um salário anual de HKD 2.462.400,00, foi concedida em 4 de Junho de 2008 autorização de residência temporária pedida em 13/06/2007, com validade até 4 de Junho de 2011.
2 - O recorrente cessou a relação laboral com a “Melco” em 31 de Dezembro de 2009.
3 - Em 4 de Janeiro de 2010 foi contratado pela “XX Hong Kong Limited” para o cargo de vice-presidente executivo de marketing de casino, com um salário mensal de USD 36.265 (correspondente a HKD 282.508,00), sendo uma das funções a exercer a gestão das actividades desenvolvidas pela referida sociedade em Hong Kong e em Macau.
4 - Em 23 de Agosto de 2010 o recorrente foi nomeado pela “XX Hong Kong Limited”, não sedeada em Macau, para o cargo de administrador da “Companhia de XX Limitada”, empresa criada e registada em Macau, que possui a licença de promotor de jogos E188, e conexionada com a “XX Honh Kong Limited”.
5 - A “XX Hong Kong Limited” é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, continuada nas Bermudas (百慕達持續經營的獲豁免有限責任公司 public limited liability company continued into Bermuda), bem como uma sociedade listada da “The Stock Exchange of Hong Kong Limited”, exercendo actividades em Macau através duma companhia conexa com ela.
6 - Em 1 de Março de 2011 foi contratado directamente pela “Companhia de XX Limitada”, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Mõveis de Macau, exercendo o cargo de presidente do conselho de administração com o salário mensal de HKD 168.805,28.
7 - O Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau alertou o recorrente, através do Ofício nº 10606/GJFR/2008 (Notificação de deferimento do pedido de residência temporária de quadros dirigentes), datado de 11 de Junho de 2008, que, caso o contrato de trabalho caducasse, deveria o interessado comunicar por escrito ao IPIM, no prazo de 30 dias a contar do dia de caducidade do contrato, e fornecer os documentos comprovativos relativos ao exercício da nova actividade profissional, podendo o não cumprimento da exigência implicar o cancelamento da autorização de residência temporária (o anexo em fl. 31).
8 - Em 23 de Junho de 2011, o requerente apresentou, através do seu advogado, o pedido de renovação da autorização de residência temporária, indicando ter cessado a relação laboral com a “Melco PBL Hotel (Crown Macau) Limited” em 31 de Dezembro de 2009, (vd. o documento em fls.32).
9 - Houve lugar à audiência escrita.
10 - O referido Instituto, através da sua técnica, apresentou a Informação nº 1658/Residência/2007/OIR, com o seguinte teor:
“Tendo-se analisado o documento de renovação e da declaração apresentados pelo requerente, conclui-se de seguinte foram:
1. O requerente foi contratado em 4 de Janeiro de 2010 pela “XX Hong Kong Limited” para o cargo de vice-presidente executivo de marketing de casino, desempenhando essencialmente as funções de gestão e supervisão das actividades da companhia em Hong Kong e Macau. Mas o requerente não foi contratado por instituição comercial de Macau, não reunindo assim o requisito estabelecido no artº 1º, al. (3) do Regulamento Administrativo citado;
2. Segundo os dados no registo comercial, em 23 de Agosto de 2010 o requerente adquiriu, através da cessão de quotas, a quota no valor de MOP12.500,00 da Companhia de XX Limitada, tomando-se no sócio que detém 50% do capital daquela empresa registada em Macau e, no mesmo dia, foi nomeado membro do órgão de administração (administrador) da companhia. No entanto, só até 1 de Março de 2011 é que o requerente celebrou um contrato de trabalho com a sociedade referida para exercer o cargo de presidente do conselho de administração com um salário mensal de HKD 168.805,28;
3. Importa referir que já notificámos de forma expressa o requerente através de “Observações” no verso da Notificação de Deferimento na 10606/GJFR/2008, datada de 11 de Junho de 2008, de que, nos termos do artº 18º do Regulamento Administrativo na 3/2005, O requerente devia comunicar, por escrito, a este Instituto a extinção ou alteração da situação juridicamente que fundamentou a concessão da autorização no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração, “caso contrário, seria cancelada a sua autorização de residência temporária”.
4. Apesar de o advogado do requerente ter apontado que o requerente e a companhia que o contratou não conhecem bem a legislação de Macau, nem dominam uma das duas línguas oficiais da Região, pelo que o requerente não apresentou ao IPIM a declaração de alteração de profissão e os respectivos documentos comprovativos, mas isto não quer dizer que o requerente não precisa de observar as normas jurídicas de Macau.
5. Pelo exposto, entende-se que o requerente não manteve, durante o período de residência temporária autorizada (de 1 de Janeiro de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011), a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização (não foi contratado por instituição comercial de Macau), além disso, não cumpriu, sem justa causa, a obrigação de comunicação no prazo legal aquando da extinção ou alteração da situação jurídica.
Por todo acima exposto e pelo facto de que o requerente saiu da empresa em que se baseou a formulação do primeiro pedido e não manteve o pressuposto para concessão da autorização original, além disso, não cumpriu, sem justa causa, a obrigação de comunicação no prazo legal aquando da extinção ou alteração da situação jurídica, assim propõe-se que seja indeferido o pedido de renovação da autorização de residência temporária do requerente A, nos termos dos artºs 18º e 19º do Regulamento Administrativo nº 3/2005”.
11 - Foi posteriormente emitido o Parecer da Comissão Executiva do IPIM, com o seguinte teor:
“Parecer da Comissão Executiva do IPIM
Exmº Sr Secretário para a Economia e Finanças
   Tendo-se procedido à análise, propõe-se o indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária do seguinte interessado por este não ter mantido, sem causa justa, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência (não foi contratado para trabalhar por instituição comercial de Macau) durante o período de residência temporária autorizada (entre 1 de Janeiro de 2010 e 28 de Fevereiro de 2011).

Nome
Relação
1.
A
Requerente
   Submete-se a presente proposta para decisão de V. Ex”,
   Aos 12 de Julho de 2012.”
12 - Em 8/08/2012, o Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças proferiu, então, o seguinte despacho: (fls.22 do apenso “Traduções” e fls.9 do p.a.)
“Autorizo a proposta”.
***
IV - O Direito
1 - O caso é o seguinte:
Ao recorrente havia sido concedida autorização de residência em Macau por decisão administrativa de 4/06/2008. No verso da notificação dessa decisão de deferimento, na rubrica “Observações”, fora informado que o interessado deveria comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau, no prazo de 30 dias, a alteração da situação juridicamente relevante que fundamentou a autorização de residência. No entanto, o recorrente, que deixara de trabalhar para a entidade patronal inicial (Melco PBL Gaming - Altira Hotel Limited) em 31/12/2009, não fizera tal comunicação dentro do prazo e só em 23 de Junho de 2011 apresentou o pedido de renovação da autorização de residência temporária, indicando, só então, ter cessado a relação laboral com a entidade patronal em 31 de Dezembro de 2009.
Detectada por essa forma a alteração da situação jurídica relevante, o pedido de renovação foi indeferido com esse fundamento.
O recorrente, em sustentação da justificação da omissão, afirma o desconhecimento perfeito da legislação de Macau e a falta de domínio de uma das línguas oficiais da RAEM, razão pela qual não fez a apresentação tempestiva da declaração de alteração da profissão. Por isso, o não cumprimento daquela obrigação de comunicação decorre de justa causa, estando reunido o requisito do art. 4º do Regulamento nº 3/2005.
Acrescenta que as suas novas funções de quadro dirigente (vice-presidente executivo de marketing de casino da “XX Hong Kong Limited” e presidente do Conselho de Administração da “Companhia de XX Limitada”) são melhores do que as primitivas, tanto nas condições de trabalho, como na natureza funcional e na importância da gestão, pelo que preencheria os requisitos para a concessão da residência temporária como quadro residente, em conformidade com os arts. 1º, nº3, 7º, als. 2) a 5) e 18º, nº4, do referido Regulamento.
Finalmente, acha o recorrente que a actuação da entidade recorrida viola o disposto nos arts. 8º e 12º do CPA.
*
2 - Vejamos.
Antes de qualquer análise, importa que apreendamos o teor dos arts. 1º, 18º e 19º.
Artigo 1.º
Âmbito pessoal de aplicação
Podem requerer autorização de residência temporária na Região Administrativa Especial de Macau, nos termos do presente diploma, as seguintes pessoas singulares não residentes:
1) Os titulares de projectos de investimento, em apreciação nos competentes serviços da Administração, que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;
2) Os titulares de investimentos que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;
3) Os quadros dirigentes e técnicos especializados contratados por empregadores locais que, por virtude da sua formação académica, qualificação ou experiência profissional, sejam considerados de particular interesse para a Região Administrativa Especial de Macau;
4) Os adquirentes de bens imóveis que cumpram os requisitos previstos no artigo 3.º
Artigo 18.º
Alteração da situação
1. O interessado deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
2. A autorização de residência temporária deve ser cancelada caso se verifique extinção ou alteração dos fundamentos referidos no número anterior, excepto quando o interessado se constituir em nova situação jurídica atendível no prazo que lhe for fixado pelo Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau ou a alteração for aceite pelo órgão competente.
3. Para efeitos do disposto no número anterior, o interessado deve comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração.
4. O não cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação prevista no número anterior, dentro do respectivo prazo, poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.
Artigo 19.º
Renovação da autorização de residência temporária
1. A renovação de autorização de residência temporária deve ser requerida ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau nos primeiros 60 dias dos 90 que antecedem o termo do respectivo prazo.
2. A renovação, que é concedida por período igual ao da autorização inicial, pressupõe a manutenção, na pessoa do interessado, dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial, com as seguintes excepções:
1) A renovação das autorizações de residência temporária concedidas com fundamento em aquisição de bens imóveis não exige nova prova dos requisitos previstos na alínea 3) do n.º 1 e nas alíneas 1) e 2) do n.º 2 do artigo 3.º, nem do preço pago ou do valor de mercado dos bens relevantes, mas o interessado deve provar que os direitos respectivos continuam na sua titularidade e que os imóveis e depósitos bancários continuam livres dos encargos vedados pelo artigo 4.º
2) A renovação das autorizações de residência temporária dos técnicos especializados e quadros dirigentes não está dependente da manutenção do vínculo contratual que fundamentou o pedido inicial, desde que seja feita prova de novo exercício profissional por conta de outrem e do cumprimento das respectivas obrigações fiscais.
3. É aplicável à renovação, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 16.º e 17.º
Em primeiro lugar, tenhamos presente que a autorização inicial de residência, concedida em 4/06/2008, teve em consideração o cargo dirigente do então requerente e a natureza local da empresa contratante, “Melco PBL Gaming (Altira Hotel Limited)”. Cumpria, por isso, os requisitos do art. 1º, al. 3), do Regulamento nº 3/2005.
Desta vez, quando o pedido é apresentado em 23/06/2011, com vista à renovação do pedido, já o seu empregador era outro, concretamente a “XX Hong Kong Limited”, que se não mostra”empregador local”, para efeito da referida alínea 3), do art. 1º do citado Regulamento. Dizemos isto, porque a Informação nº 1659/Residência/2007/01R faz alusão a essa circunstância no ponto 1 das suas conclusões (ver transcrição acima) e o parecer que se lhe seguiu não a votou ao silêncio e, em vez disso, num breve parêntesis, a Comissão Executiva fez mesmo emergir esse fundamento ao referir “Não foi contratado para trabalhar por instituição comercial de Macau”. Quer dizer, a decisão impugnada, ao limitar-se a autorizar a proposta, acolhe o sentido do parecer e da Informação que o antecedem, dele constituindo parte integrante. E, assim sendo, este fundamento do acto, que não foi rebatido no presente recurso, acha-se intocado e incólume.
Ora, se a Informação e parecer seguinte se louvam expressamente nos artigos 18º e 19º do Regulamento, também se não poderá excluir a aplicação da alínea 2), do nº2, do art. 19º. Expliquemos: É verdade que a renovação de autorização de residência pressupõe a manutenção na pessoa do interessado dos requisitos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial (art. 19º, nº2), e verdade é também que uma das excepções a este dispositivo-regra consiste, precisamente, na circunstância de os técnicos especializados e quadros dirigentes não estarem dependentes da manutenção do vínculo contratual que tenha fundamentado o pedido inicial, desde que seja feita prova de novo exercício profissional por conta de outrem e do cumprimento das respectivas obrigações fiscais.
Todavia, isso não basta para automaticamente estar a salvo de outras condições. Assim, se qualquer técnico especializado ou quadro dirigente está dispensado da manutenção do emprego inicial que determinou a concessão inicial da autorização (al. 2), do nº2 do art. 19º), não pode essa situação juridicamente atendível, mesmo assim, deixar de ser comunicada nos termos do art. 18º. Ou seja, o art. 19º não exclui o art. 18º, porque são coisas distintas as que num e noutro estão previstas. E por outro lado, mesmo que altere a situação de emprego, o técnico especializado ou quadro dirigente também não pode escapar à condição plasmada na alínea 3) do art. 1º, que consiste na imposição de que a sua nova contratação seja feita por “empregador local”.
Por outras palavras: enquanto quadro dirigente ou técnico especializado, o interessado não precisa de se manter no vínculo contratual inicial. Pode durante o período da autorização concedida mudar de empregador, que essa alteração da situação jurídica relevante não tem na sua esfera qualquer repercussão negativa. Assim o diz a lei. Só que, para que tal aconteça, necessário é que faça a comunicação1 da alteração à entidade competente e que a pessoa para quem ele passe a trabalhar (“por conta de outrem”) reuna a mesma natureza do empregador inicial, isto é, tem que ser empregador local! A queda desta segunda condição faz ruir a aplicabilidade da excepção (alínea 2), do nº2, do art. 19º) e obriga a remeter a situação para a regra (nº2, proémio, do art. 19º cit.).
Ora, no caso em apreço, o peso decisivo da relevância da alteração jurídica no caso concreto reside, tanto na não comunicação, como nesse “pormenor” acerca da natureza da empresa contratante, que não era local. Porque o novo empregador não estava registado na RAEM (requisito, não esqueçamos, que foi invocado expressamente na fundamentação do acto “per remissionem” e que o recorrente não atacou no âmbito da sua impugnação contenciosa), nem por essa via o recorrente podia ficar dispensado de comunicar essa alteração relevante.
*
3 - Prosseguindo o que vem de ser dito, não é verdade que o recorrente tenha, desde o início, mantido inalterada a situação juridicamente relevante. A perda de emprego e posterior nova contratação é uma das causas que se podem subsumir à previsão do nº1, do art. 18º do Regulamento nº 3/2005. O recorrente pode achar que a sua situação jurídica é igualmente relevante – tanto ou mais que a primeira que esteve na base da autorização inicial de residência – mas o que é preciso que note é que ela é outra situação e não a mesma situação juridicamente relevante.
Deveria ter, portanto, comunicado a alteração ao IPCIM e não o fez. Alega agora desconhecer a lei de Macau e não dominar uma das duas línguas oficiais da RAEM, como se isso fosse «justa causa» do incumprimento da obrigação (art. 18º, nº4, do Regulamento2).
Todavia, estes argumentos não procedem. O desconhecimento da lei a ninguém pode aproveitar, face ao que preceitua o art. 5º do Código Civil, que dispõe que “ A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nelas estabelecidas”.
Também não pode colher o facto de o recorrente - quadro dirigente e, portanto, em princípio cônscio dos deveres de zelo e de responsabilidade de um alto funcionário – não dominar uma das duas línguas oficiais (tão pouco se sabe se o desconhecimento se refere à chinesa se à portuguesa). É que, em qualquer caso, sempre deveria ter sabido aconselhar-se a propósito do conteúdo total da notificação.
Será isto “justa causa”?
O Regulamento não fornece a definição de “justa causa”, pelo que só o caso concreto haverá de fornecer ao intérprete a forma como densificá-lo. Isto é tarefa que à Administração incumbe no momento da aplicação da norma em face dos factos concretos, de tal forma que o seu emprego exclui a existência de várias soluções possíveis. Quer dizer, “justa causa” é conceito indeterminado que, embora se não resolva pela discricionariedade, se pauta por uma densificação que à Administração cumpre efectuar perante a situação real através de uma tarefa de intelecção e interpretação3.
Ora, não nos parece que a actuação da Administração neste caso específico tenha saltado a fronteira da boa interpretação. Para nós, a falta de diligência não pode ser traduzida por justa causa. A “justa causa” é toda a ocorrência fáctica que retira censurabilidade à acção ou omissão e lhe confere desculpabilidade, enquanto a negligência e falta de cuidado, mesmo que lhe mitigando o grau, não exclui a culpa, nem a censurabilidade da conduta. Mesmo que o problema do recorrente fosse esse (o desconhecimento da língua em que foi transmitida a informação acerca da comunicação da alteração da situação jurídica relevante) não poderia deixar de procurar saber do conteúdo dela, pelos meios que achasse mais convenientes. Não podia era o recorrente pensar que a língua da sua nacionalidade deveria ser a adoptada na referida notificação. Se não procurou a tradução do documento, então isso se deverá a falta de diligência sua. Logo, mesmo que não houvesse intenção da sua parte de infringir a norma, o não cumprimento do seu dever de comunicação, não pode ser encarado como “justa causa”.
Aliás, a própria norma (art. 18º, nº4), mesmo nos casos em que possa verificar-se a “justa causa”, ainda consente que a situação possa implicar o cancelamento da autorização de residência temporária. Isto é, o inciso normativo não vincula a Administração num ou noutro sentido, e em vez disso permite-lhe o cancelamento no uso dos seus poderes discricionários.
Significa isto que a opção por uma ou outra das vias (cancelar ou não cancelar a autorização de residência e, por extensão à situação do art. 19º, renovar ou não renovar a autorização de residência) só ao administrador mesmo caberá, ficando o aplicador jurisdicional afastado de o fazer, salvo nos casos em que se esteja perante um flagrante, grosseiro e manifesto erro, o que não é claramente o caso. A verdade é esta, bastaria a não comunicação, para a Administração ficar dotada do poder (discricionário) de não renovar a autorização de residência. Assim o permite o diploma normativo em apreço e não pode, consequentemente, o tribunal dirigir censura à Administração na decisão que tomou no pleno respeito pelo princípio da separação de poderes.
*
4 - Claudica também o recorrente quando critica a Administração por achar que ela não ponderou a justificação e a situação do recorrente face à actual situação profissional.
Ora bem. Se a intenção é imputar ao acto falta de fundamentação, também por essa via lhe foge a razão. É que a aludida “Informação 1658”, que foi absorvida pelo parecer subsequente e pelo despacho decisor, aflorou expressamente a questão nos pontos 1 e 2. Simplesmente, não relevou tal arguição em virtude do apreço que fez sobressair à alteração da situação não comunicada sem justa causa dentro do prazo. Por conseguinte, este argumento não pode proceder, face ao art. 115º do CPA.
Mas se o recorrente, em vez dessa intenção, está a querer dizer que reunia ao menos todos os pressupostos quando formulou o pedido em 23/06/2011, circunstância que deveria levar a Administração a deferir o pedido de autorização de residência, então mais uma vez falha no seu intento. É que a Administração limitou-se a decidir o pedido que lhe foi formulado: o de renovação de autorização de residência. Este pedido insere-se no mesmo procedimento em que a autorização fora pela primeira vez concedida. A entidade administrativa resolveu indeferir a pretensão concreta, por entender que o podia fazer com o apoio das normas invocadas.
E poderão os factos invocados (nova contratação, novo empregador, nova remuneração, etc, etc) constituir factores de concessão de autorização? Não cabe ao tribunal dizer se sim, se não; é uma tarefa que à Administração cumpre efectuar se o interessado “abrir” um novo procedimento administrativo pedindo a autorização de residência, como se de uma concessão pela primeira vez se tratasse.
Neste momento, não está em causa o indeferimento de autorização de residência, mas sim o indeferimento de uma renovação de autorização de residência.
Improcede, pois, este fundamento do recurso, baseado nos arts. 1º, nº3 e art. 7º, als. 2) a 5), que assim se julgam não violados.
*
5 - E por assim não ter considerado a Administração, isto é, por não ter procedido à decisão da pretensão como se ela fosse uma pretensão de “autorização de residência” em vez de uma “renovação da autorização anterior”, teria ela cometido a violação dos princípios da boa fé (art. 8º, do CPA) e da desburocratização e da eficiência (art. 12º do CPA)?
Não nos parece. Se o pedido formulado foi o da “renovação”, não podia o recorrente ter motivo para pensar que a Administração o iria, digamos, “convolar” e tratar como se fosse de “autorização de residência”. A Administração fez o que podia fazer e, neste sentido, não vemos como se possa formalmente imputar-se-lhe o desrespeito pela confiança que o recorrente estivesse a depositar numa diferente e contrária actuação.
Quanto à “desburocratização” e “eficiência” administrativas reportadas no art. 12º do CPA, pensamos que são princípios programáticos que devem nortear a actuação da Administração em ordem a uma melhor eficácia da sua acção. Em cada procedimento, no seu dia-a-dia funcional, nas suas relações com os administrados, toda a Administração deve procurar ser pronta, ágil e combater a morosidade (celeridade)4, optimizar com simplicidade e com o menor recurso de meios a sua acção (economia), dotar as suas decisões, internas e externas, do melhor grau de resolução dos problemas e dificuldades que tenha que enfrentar (eficiência).
Ora, nenhum destes princípios se acha vilipendiado, tendo em conta que a entidade recorrida se dignou apreciar o pedido concreto do recorrente num procedimento determinado. Não tinha ela, em bom rigor, que abrir por seu livre alvedrio um novo procedimento, não somente por este estar marcado por uma eminente iniciativa particular em defesa dos interesses privados dos administrados interessados em residir em Macau, mas também por nem sequer saber se o recorrente estaria de acordo com esse projecto de “convolação”. Na realidade, há regras de iniciativa que é preciso respeitar e os arts. 56º a 61º do CPA revelam que, para lá dos poderes administrativos ali consagrados, o respeito pelo direito de iniciativa não se compagina sempre com deveres de celeridade, desburocratização, eficiência que a Administração deve observar. Portanto, não tendo a Administração ficado aquém dos seus deveres de desburocratização e de eficiência, não se pode concluir pela violação desses princípios.
*
Pelo que se disse, o recurso sucumbe.
***

V- Decidindo
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso.
Custas pelo recorrente com taxa de justiça em 8 UC.
TSI, 18 / 07 / 2013
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan

Presente
Victor Manuel Carvalho Coelho
1 Esta comunicação tanto serve para evitar o cancelamento da autorização de residência, como para os casos de renovação, tal como é jurisprudência local: Ac. TUI, 6/04/2001, Proc. nº 55/2010; TSI, de 21/07/2011, Proc. nº 738/2009; TSI, de 7/02/2013, Proc. nº 579/2011.
2 Cremos que foi em manifesto lapso que, ao tratar desta matéria, invocou o art. 4º do Regulamento, pois certamente quereria dizer nº4, do art. 18º do Regulamento.
3 Ac. TUI, de 3/05/2000, Proc. nº 9/2000; TSI, de 17/10/2012, Proc. nº 127/2012; Na doutrina, Fernando Azevedo Moreira, Revista de Direito Público, nº1, pag. 67 e sgs.
4 Dever de celeridade que também resulta do art. 60º do CPA.
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------