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Processo n.º 128/2013
(Recurso cível)

Relator: João Gil de Oliveira
Data : 4/Julho/2013


ASSUNTOS:
- Marcas;
- Carácter distintivo
- Sã concorrência.
- Denominação geográfica, COTAI

SUMÁRIO :
     1. A marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços propostos ao consumidor.
  2. Os interessados no registo de uma marca não podem deixar de gozar, na sua constituição, de uma grande liberdade que terá, contudo, como limite a margem de manobra e de iniciativa que os outros operadores do mercado não podem perder através do registo de uma "marca" de tal forma genérica e abrangente de atributos ou qualidades comuns que restrinjam uma livre e sã concorrência.
    
    3. Ficam muitas dúvidas quanto à utilização exclusiva de uma denominação geográfica em vista de uma eventual concorrência desleal. As denominações de origem e as indicações geográficas são instrumentos ao serviço das empresas. São meios de identificação dos produtos no mercado.
    
     4. Uma denominação geográfica pode integrar uma marca, mas deve revestir uma natureza neutra. Quando essa neutralidade não existir e houver o risco da marca induzir em erro o público acerca da proveniência geográfica do produto ou serviço, o seu registo deve ser recusado, por aplicação do disposto na alínea b) do nº 2 do art. 214º do RJPI. Não havendo esse risco, nada obsta a que uma marca geográfica seja registada, desde que não ofenda direitos prioritários.
    
    5. A marca “COTAI STRIP COTAIExpo” não é registável porquanto se presta a engano e confusão em relação aos produtos comercializados numa zona geográfica perfeitamente delimitada e identificada como Cotai - faixa entre Coloane e Taipa -, para mais se é destinada a serviços de viagens, especialmente se se evidencia uma vontade de apropriação dessa denominação geográfica num espaço concorrencialmente disputado por outras empresas e operadoras de jogo.
              O Relator,
              João A. G. Gil de Oliveira


Processo n.º 128/2013
(Recurso Cível)
Data : 4/Julho/2013

Recorrentes : Direcção dos Serviços de Economia da R.A.E.M.
A

Recorrida : B

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I – RELATÓRIO
    1. A Direcção dos Serviços de Economia da Região Administrativa Especial de Macau, na pessoa do seu Director, Sou Tim Peng, entidade recorrida, nos autos à margem identificados, inconformada com a douta sentença que determinou a recusa do registo de marca que fora admitido por aquela entidade – registo de marca n.º N/377586 (“COTAI STRIP COTAIExpo”), veio recorrer e apresentou as suas alegações de recurso, dizendo em síntese conclusiva:
    Como se verifica existem duas interpretações judiciais em relação a estas marcas, uma, elabora uma análise dissecando a marca palavra por palavra e assim conclui que não existe capacidade distintiva e, por outro lado, o carácter enganoso da marca e a outra segundo a qual a marca deve ser analisada no seu todo e assim adquirir capacidade distintiva e não se trata de marca enganosa porque, a localização geográfica é usada sem conduzir os consumidores a pensar que esses produtos / serviços, que lhe andam associados, têm essa proveniência, no sentido de ali serem fabricados / prestados, sendo, por sua vez, a localização geográfica verdadeira.
    A marca registanda é uma designação de fantasia, tem capacidade distintiva, não contem nenhuma falsa indicação de proveniência e o seu registo não ocasiona actos de concorrência desleal, pelo que, é de manter o despacho de concessão e revogar-se a sentença recorrida.
    
    2. A ("LVS"), também recorre da mesma sentença, dizendo, em termos úteis:
    A marca N/37756 COTAI STRIP COTAIExpo é uma marca nominativa complexa, em cuja composição surge apenas uma palavra que pode ser considerada descritiva, já que constitui um topónimo, COTAI, e uma outra alusiva aos serviços marcados, TICKETING.
    Tanto STRIP como EXPO constituem, na marca em causa, expressões de fantasia, o que confere à marca um carácter geral de fantasia.
    A STRIP correspondem as palavras portuguesas tira, faixa, pista.
    EXPO é também uma expressão de fantasia, já que, mesmo que se aceite que se trata de vocábulo que se reporta a uma actividade normalmente ligada a conferências e exposições, conforme consta da fundamentação da decisão recorrida, a marca em causa, destinada a assinalar serviços diversos da classe 39.ª, nada tem que ver com aquela actividade de conferências e exposições.
    Ao considerar que a marca COTAI STRIP COTAIExpo é, toda ela, composta por sinais que designam apenas características de bens, isto é, a sua natureza e a sua proveniência geográfica, a decisão recorrida incorre num manifesto erro de julgamento e faz uma errada aplicação das normas contidas no artigo 197.° e na alínea b) do n.º 1 do artigo 199.° do RJPI.
    Termos em que, afirma, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a sentença recorrida revogada, substituindo-se por outra que conceda o registo da marca N/37756.
    
    3. Foram colhidos os vistos legais.
    
    II - FACTOS
    Vêm provados os factos seguintes:
    Em 30 de Julho de 2008, a recorrida A requereu o registo da marca N/37756 para a classe de produtos n° 39 a qual consiste em
    "COTAI STRIP COTAIExpo"
    A marca destina-se aos mediação de serviços de viagens para indivíduos e para grupos; serviços de reserva de bilhetes de viagem e de passeios; organização de excursões, passeios turísticos, férias, visitas guiadas e viagens; organização de viagens de barcos; facultar bases de dados computorizadas, on-line, de informações sobre viagens; planeamento de viagens e de passeios; serviços de guia turístico; transporte por autocarro e limusina; transporte de passageiros; serviços de transporte e entrega, incluindo recolha, transporte e entrega de volumes e cartas por diversas formas de transporte.
    Foi publicado no B.O., n.º 40 da II Série de 3 de Outubro de 2008, o pedido de registo de marca.
    O registo foi concedido por despacho da Srª Chefe substituta do Departamento da Propriedade Intelectual de 13 de Dezembro de 2011 e publicado no B.O. n.º 1, II Série, de 4 de Janeiro de 2012.
    
    III - FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso passa por indagar se se deve manter o registo da marca em apreciação n.° N/37756 (COTAI STRIP COTAIExpo) para a classe de produtos n.° 39, tal como admitido pela Direcção dos Serviços de Economia ou, ao invés, se se deve manter a sentença recorrida que determinou a recusa do registo.

    2. Vamos seguir o argumentário já aqui anteriormente utilizado pela similitude das situações.1
    A marca é um sinal distintivo de produtos ou serviços propostos ao consumidor.2
    É essa noção para que aponta o Regime Jurídico da Propriedade Industrial, doravante designado por RJPI, no seu artigo 197º, ao prescrever que “só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.”
    Traduz-se, pois, a marca num sinal apto a diferenciar os produtos ou serviços, distinguindo-os de outros da mesma espécie, possibilitando assim a identificação ou individualização do objecto da prestação colocado no mercado. A partir de tal conceito, enquanto fenómeno socioeconómico, retirar-se-ão as suas funções e, assim, desde logo, se alcança a primordial função distintiva relativamente ao seu objecto.
    Nesta função divisam-se duas vertentes: uma, que se traduz na diferenciação, na destrinça em relação aos outros produtos da concorrência; a outra, qual seja a da individualização por referência a uma origem, à sua proveniência, à fonte da sua produção.3
    Serve ainda a marca para sugerir o produto e angariar clientela. Procura-se através dela, cativar o consumidor por via de uma fórmula que seja apelativa e convide ao consumo.
    Pode até constituir uma garantia4, procurando-se assim atestar a qualidade ou a excelência do produto oferecido, bastando pensar nas denominadas “marcas de grande prestígio”.
    Daqui decorre que a marca, como sinal distintivo, deve, acima de tudo, ser dotada de eficácia ou capacidade distintiva.
 
  3. Embora marcada pelo princípio da liberdade, a composição da marca sofre excepções de variada ordem, sejam elas de natureza intrínseca, tais como as que decorrem do artigo 199º, nº1 do RJPI, v.g. a própria designação do produto, as suas qualidades, a proveniência geográfica, as cores, ou de natureza extrínseca, quando resultem da necessidade de respeitar direitos anteriores, situações previstas nas alíneas b) a f) do artigo 214º do citado diploma, v.g. marcas anteriormente registadas, medalhas, brasões, firma a que o requerente não tenha direito ou sinais que constituam infracção de direitos de autor ou de propriedade industrial. Os interessados no registo de uma marca não podem deixar de gozar, na sua constituição, de uma grande liberdade que terá, contudo, como limite a margem de manobra e de iniciativa que os outros operadores do mercado não podem perder através do registo de uma "marca" de tal forma genérica e abrangente de atributos ou qualidades comuns que restrinjam uma livre e sã concorrência.
Um sinal, para poder ser registado, como marca, como já se disse, deve possuir a necessária eficácia ou capacidade distintiva, não sendo admissíveis o que a doutrina designa normalmente como sinais descritivos, tais como denominações genéricas que identificam os produtos ou os serviços, expressões necessárias para indicação das suas qualidades ou funções e que, em virtude do seu uso generalizado, como elementos da linguagem comum, não devem poder ser monopolizados.
Não fosse este o entendimento unânime na doutrina e na Jurisprudência,5 sempre o disposto no nº 1, al. a) e b) do artigo 199º supracitado não deixa de ser claro: “ Não são susceptíveis de protecção: a) Os sinais constituídos exclusivamente pela forma imposta pela própria natureza do produto, pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou pela forma que confira um valor substancial ao produto; b) Os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;”
Donde decorre, importando reter, como pertinente no caso “sub judice”, a conclusão de que o registo de uma marca tem como restrição o não ter, ela própria, carácter distintivo.

4. Feito este enquadramento somos a ratificar aqui o entendimento vertido na douta sentença recorrida que concluiu:
    “Sustenta a recorrida que a expressão "Cotai Strip" é uma designação de fantasia, criada pela Sands e que possui um significado próprio e associado ao projecto concebido pela Sands para a zona do Cotai que lhe foi destinada, sob influência da Strip de Las Vegas.
    Com efeito, a palavra "strip" em inglês tem vários sentidos, sendo um deles que é "a long, narrow area of land", corresponde-se em português uma faixa de terreno estreita e cumprida, e, outro "a main road in or leading out of a town that is lined with shops, restaurants, and other facilities", significa, em português, a rua principal ao longo da qual se instalam lojas, restaurantes e outras facilidades", como o exemplo mais conhecido "The Las Vegas Strip", sendo este último mais usado nos E.U.A..
    A palavra "Cotai" é o nome que indica a zona entre a ilha de Coloane e Taipa, enquanto a "Strip" tem o sentido de terreno estreito e cumprido. Na realidade, a zona de aterro de Cotai tem a forma estreita e comprida. Assim, a combinação dessas duas palavras não pode deixar de sugerir ao público o nome e situação física dessa zona de aterro entre a ilha de Coloane e Taipa. É essa ideia que a população em geral, percebe da expressão "Cotai Strip". Ou seja, as duas palavras em conjunto não criam uma ideia nova com valor distintivo para os consumidores. Não pode qualificar o termo "Cotai Strip" como sinal de fantasia.
    Por outro lado, conforme o segundo sentido da "Strip", a expressão Cotai Strip tem outro sentido de a avenida com hotéis, casinos e outras facilidades de turismo e entretenimento. Por coincidência, a zona de Cotai também é uma zona nova que o Governo de Macau pretende que aí sejam instalados e concentrados os hotéis luxuosos, acompanhados de todas as facilidades de entretenimento, incluindo casinos, restaurantes e lojas, com vista a criar um centro de entretenimento e turismo de natureza semelhante com a de Las Vegas. Portanto, Cotai Strip é, ao mesmo tempo, sinal descritivo das actividades económicas dessa zona.
    Quer num sentido quer outro, o termo Strip ou a expressão conjunta de "Cotai Strip" são sinais sugestivos, com o sentido de descrever a faixa de terreno ou zonal avenida concentrados com lojas e restaurantes, que é conhecido e aceite pelo público em geral.
    Cotai Strip é uma designação da zona específica situada entre a ilha de Coloane e Taipa, expressão comummente utilizada pelo público em geral. Assim, o conjunto das palavras Cotai e Strip não é sinal de fantasia, não podendo atribuir força distintiva com aptidão para designar os produtos ou serviços dos empresários que produzem.
    O facto de a recorrente e a recorrida serem titulares de registo de marca em que se integra a palavra Cotai não tem relevância, no presente processo, para classificar a natureza descritiva desse sinal nem lhe deve atribuir, só per si, a força distintiva. (cfr. fls.49 e 50 dos autos)
    Sendo os dois elementos Cotai e Strip sinais genéricos, resta averiguar se estes sinais, em combinação com outro sinal nominativo, a palavra "Expo", conseguir adquirir, no global, a capacidade distintiva.
    A palavra "Expo" é uma abreviatura comummente utilizada da palavra "Exposição" para indicar, de forma genérica, o género dos produtos ou serviços, ligado ao sector de conferência e exposições. Essa palavra por si é também sinal genérico, não tendo força distintiva para assinalar a origem dos produtos e serviços. Porém, os produtos a que a marca pretende distinguir não se pertencem ao ramo do comércio em causa.
    Deste modo, a marca registanda é, na sua totalidade, composta por sinais que indicam a proveniência geográfica e o género dos produtos ou serviços.
    Poderá argumentar-se que a justaposição de duas palavras "Cotai" e a abreviatura "expo" na escrita em itálico deste último vocábulo formam uma outra palavra diferente e sem significado preciso. De facto, segundo o uso comercial, o termo "Expo" como abreviatura da exposição já é uso generalizado e conhecido pelo público. A combinação da COTAIExpo não dá outro significado senão o significado literal de descrever o local geográfico e da natureza da actividade.
    É de lembrar para determinar se os sinais integrantes da marca têm força distintiva para diferenciar os bens a que a marca se assinala dos provenientes doutros empresários, há-de tomar em consideração os sinais no seu conjunto e não apenas em cada um dos elementos em separado. Portanto, a avaliação da aptidão distintiva da marca é feita no seu conjunto e não por dissecção analítica.
    Considerando globalmente a marca, salta à vistos do consumidor médio, são sinais predominantes da marca registanda, indubitavelmente, as duas palavras "Cotai" e Strip". De facto, a combinação dos elementos COTAI STRIP e a expressão COTAIExpo não altera muito a impressão que cria na mentalidade dos consumidores em geral de que os produtos ou serviços a que se refere com a proveniência geográfica de Cotai. Continuam serem os sinais relevantes da marca é a expressão COTAI STRIP" e "COTAI", a palavra Expo tem pouca relevância de modo a atribuir um valor autónomo para a marca. Ou seja, no conjunto dos elementos descritivos não permite, realmente, dar uma impressão autónoma e distintiva à empresa que produz os produtos ou serviços a que se assinala a marca.
    (…)
    Pelo que não deve ser concedido o registo com a atribuição de direito de uso exclusivo desses sinais, ficando assim prejudicado o conhecimento de outro fundamento alegado pela recorrente”
    
    5. Mas esta ratificação do acima doutamente explanado não pode passar sem alguma complementação, no que aos argumentos que vêm invocados pelos recorrentes concerne.
    Argumenta-se, dizendo que há capacidade distintiva, padecendo a decisão recorrida de “contradição”, pois que não relevaria aqui a palavra Expo, ligada a uma ideia de exposições, convenções, feiras, certames, já que o registo se destina a outros bens, tais como serviços de viagens, reservas de bilhetes, organização de excursões, etc.
    Desde logo, ainda que se possa vislumbrar alguma proximidade entre estas actividades e aquela de exposições, não deixa de se evidenciar a confundibilidade da expressão, pois que, se por um lado, naquela zona perfeitamente delimitada haverá vários pretendentes a organizarem exposições e certames de variada ordem nos empreendimentos ali desenvolvidos pelas diferentes empresas e operadoras, por outro, o certo é que o registo destina-se a bens diferentes dos de exposições e sua organização.
    Não deixa de se mostrar algo enganador o facto de se pretender uma marca que inculca para exposições e pretendê-la para serviços de viagens.
    Na verdade, não podem ser registadas as marcas que possam causar engano ao consumidor, nomeadamente a respeito da natureza, das qualidades, da utilidade ou da proveniência do produto ou do serviço, ainda que se possa admitir alguma conexão entre ambos ao serviços.
    Por isso mesmo não deixaremos de empolar a argumentação que se segue.
    
    6. Realça a recorrente A a natureza de marca complexa composta pelas expressões “COTAI STRIP” e “COTAIExpo”, referindo-se que a primeira indica com precisão uma localização geográfica da RAEM com menção de uma faixa dessa zona, pretendendo-se que a expressão Cotai Strip seja uma expressão de fantasia, expressão essa criada pela recorrente A
    Sobre isto diremos tão somente que a recorrente confessa aqui o que já se vem adivinhando, em face do número de processos em que reivindica tais marcas, que há da sua parte uma preocupação em apoderar-se do nome do “Cotai”, zona geográfica delimitada e perfeitamente definida, esquecendo-se que nessa faixa (trip) onde opera, há outras operadoras, donde dever ter-se um especial cuidado de forma a prevenir a monopolização do nome de uma determinada zona, não se podendo permitir que se confunda e identifique uma dada operadora, ainda que a primeira, com uma zona geográfica, o que seria muito injusto para as restantes.
    Para além de que a marca em causa não é apenas constituída por essa expressão, não é esta apenas a estar em causa, mas ainda uma outra “CotaiExpo” que padece dos apontados vícios, aqui redobrados por uma não inconfessável vontade de apropriação do nome Cotai e que aí se repete.
    
    7. Com isto não estamos a dizer que o nome de uma dada cidade, país ou região, não pode compor uma dada marca. Não, o que se diz é que esse elemento não pode ser o elemento nuclear e destrinçador dessa marca. Não podem ser registadas as marcas compostas exclusiva ou essencialmente por elementos que descrevam o produto/serviços (as suas características, qualidades, proveniência geográfica, entre outros aspectos), por elementos usuais na linguagem do comércio, por determinadas formas (forma imposta pela própria natureza do produto, forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou forma que lhe confira um valor substancial) ou por uma única cor - cfr. art. 199º, n.º 1 do RJPI.
No que às denominações de origem e às indicações geográficas respeita têm estas adquirido uma vantagem económica crescente e desempenham uma função relevante no tráfico comercial, valendo aqui uma reflexão, quando é evidente a pretensão de um determinado interessado na sua referência, ainda que em sede do regime da marca e na pretensão do seu registo.6
A indicação geográfica, de acordo com o RJPI aparenta uma fisionomia semelhante à denominação de origem. Todavia, a sua estrutura é débil quando comparada com a denominação de origem, embora mais elástica.
Na verdade, a indicação geográfica individualiza produtos originários de uma região ou localidade quando determinada qualidade, reputação ou outra característica do produto seja essencialmente atribuível à sua origem geográfica.
Expressamente, resulta do RJPI (art. 254.º/3) que, enquanto na denominação de origem as qualidades e as características dos produtos se devem essencial ou exclusivamente ao meio geográfico, compreendendo os factores naturais e humanos, na indicação geográfica, a reputação, uma qualidade determinada ou outra característica podem ser atribuídas a essa origem geográfica, independentemente dos factores naturais e humanos. Na indicação geográfica o elo que une o produto à região determinada é mais débil que na denominação de origem. Ou seja, na indicação geográfica a reputação do produto ou uma sua qualidade pode ser atribuída à região sem influência directa dos factores naturais e humanos. Por outro lado, aquela menor ligação, na indicação geográfica, do produto à região determinada resulta, igualmente, da não exigência de que todas as operações de produção, transformação e elaboração ocorram na área determinada (como se estabelece para a denominação de origem), bastando que uma delas ocorra na área delimitada.
A denominação de origem exige um vínculo acentuado do produto com a região demarcada, ao contrário da indicação geográfica que se basta com uma breve aparência de ligação com a região.
Mas ficam muitas dúvidas quanto à utilização exclusiva de uma denominação geográfica em vista de uma eventual concorrência desleal. As denominações de origem e as indicações geográficas são instrumentos ao serviço das empresas. São meios de identificação dos produtos no mercado. Num mercado intercomunicativo, caracterizado por uma acérrima concorrência entre os produtos, por uma maior consciencialização dos consumidores para o factor qualidade, a denominação de origem e a indicação geográfica podem desenvolver um importante papel enquanto afiançadores de um monopólio, podem ser elementos-chave de uma estratégia comercial visando a conquista de um lugar competitivo marcado pela tipicidade de um produto. Para o consumidor um produto com denominação de origem ou indicação geográfica significa qualidade, características determinadas, garantidas. Mas, além de satisfazer o interesse dos consumidores, a denominação de origem e a indicação geográfica são instrumentos do comércio nas mãos dos produtores e dos comerciantes. São instrumentos ao serviço de um interesse reditício: estes direitos privativos permitem às empresas uma margem de rendimento superior; a qualidade tem preço. A denominação de origem e a indicação geográfica são propriedade comum (propriedade colectivística) dos produtores e comerciantes da região determinada. Aliás, estes sinais distintivos do comércio surgiram como meios dos produtores e comerciantes de uma região conseguirem colocar os seus produtos no mercado; associaram os seus interesses comuns (e que são igualmente económicos quando se traduzem num esforço conjunto na luta contra as falsificações e imitações do que é genuíno) em volta de um sinal identificador.7
Ora, estas preocupações, tecidas ainda que a propósito do regime das denominações de origem e indicações geográficas (cap. VI do RJPI,) não devem deixar de estar presentes se, por via da sua inclusão numa determinada marca, se atingem os valores que por outra via não deixariam de ser acutelados, tais como a transparência, benefício de todos os operadores, sã concorrência, tipicidade do serviço por referência a um lugar geográfico em função de uma qualidade e excelência para que todos contribuem e não é apanágio de uma única operadora.
    
    8. Podemos assim concluir, no que ao nome geográfico respeita, COTAI, que se o nome geográfico for empregue como simples denominação de fantasia não suscita quaisquer problemas. O mesmo se diga quando estivermos perante uma denominação genérica (v.g. água de Colónia). Uma marca geográfica não tem como função certificar ou sequer informar acerca da proveniência do produto ou serviço, servindo apenas o propósito de o identificar no mercado, na mesma medida que tal ocorre com marcas não geográficas: o nome da região ou localidade funcionará, nestes casos, como uma designação neutra, do ponto de vista geográfico (não tendo, em si mesma, o efeito de valorizar o produto). Mas, quando essa neutralidade não existir e houver o risco da marca induzir em erro o público acerca da proveniência geográfica do produto ou serviço, o seu registo deve ser recusado, por aplicação do disposto na alínea b) do nº 2 do art. 214º do RJPI. Não havendo esse risco, nada obsta a que uma marca geográfica seja registada, desde que não ofenda direitos prioritários.
    Em contrapartida, se a marca for constituída, exclusivamente, por indicações que possam servir para designar essa proveniência geográfica, estaremos perante uma marca inválida por falta de capacidade distintiva, cujo registo deve ser recusado ou anulado.
     Opor-se-á que, neste caso, a palavra Expo seria o tal elemento diferenciador. Só que o não é, na medida em que expo é uma denominação genérica, aplicada a um conjunto de bens que nada têm a ver com o serviço para que a palavra inculca e, enquanto marca complexa, pretensamente formada por um conjunto autónomo, não é facilmente dissociável da sua composição atomística.
    O público, na verdade, não deixaria de poder ficar confundido com a pertença de uma marca onde o elemento forte “Cotai” impera, seja pela referência geográfica, seja pela repetição do vocábulo, e o elemento fraco “Expo” não revela a actividade proposta, não deixando de ser genérico e comum a uma plêiade de serviços ali oferecidos por outras concorrentes.
    Assim se responde ao vício assacado à douta sentença proferida, ao dizer-se que padece de “contradição”, na medida em que a expressão “Expo” seria genérica e apontaria para uma indicação de produtos ou serviços ligados ao sector de conferências e exposições mas, ao mesmo tempo, não distingue o ramo do comércio em causa. Há que conciliar essa aparente contradição: o que se diz é que, por um lado, a expressão Expo é genérica enquanto significante de exposição, mas, enquanto tal, por outro lado, já não descreve ou revela por si só os serviços a que se oferece. Esta leitura que resulta claramente do texto da sentença não permite se possa dizer que a sentença é contraditória, alcançando-se bem o desiderato que se pretende que mais não é, no fundo do que evitar a confusão do consumidor, a apropriação da denominação de uma zona geográfica vital para a economia e para o desenvolvimento da indústria do jogo, preservar a livre e sã concorrência.
    
    
    
    9. Este entendimento, aliás, já foi adoptado noutras decisões deste Tribunal de Segunda Instância, tomada por diferentes Colectivos, respigando-se, a título exemplificativo, das posições devidamente sumariadas, as súmulas que seguem.
    No Acórdão do TSI, de 30/5/2013, proc. n.º 25/2013:
    “A marca é um sinal distintivo de produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas, daí que o seu registo exige a capacidade distintiva.
(…) Tanto “COTAI” como “COTAI STRIP” indicam uma determinada zona específica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento.
(…) Assim, um consumidor médio, ao ver a expressão “COTAI STRIP COTAITravel”, não obstante a existência da palavra “Travel” em itálico e que tem o sentido de uma actividade ligada a transporte, deslocação e movimentos físicos, pode não saber se se tratar duma marca do produto ou duma publicidade à zona geográfica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento, bem como pode não saber, em concreto, qual a entidade exploradora desse produto ou dessas actividades, uma vez que existem diferentes entidades titulares de licença para a exploração de jogos de fortuna e azar que praticam as mesmas actividades na referida zona.
(…) Não possuindo capacidade distintiva, não pode ser objecto do registo.”
    
    No acórdão do TSI, de 30/5/2013, proc. n.º 103/2013:
    “Assim, “Cotai” e “Strip” remetem-nos para conceitos de localização geográfica, inidentificadores de nenhum produto em particular a comercializar, nenhum serviço a prestar. Têm, assim, um cunho totalmente genérico e indeterminado. Os caracteres descritivos que encerram não identificam nenhum produto, bem ou serviço, sendo certo que também não possuem nenhum sentido secundário distintivo, nenhum “secondary meaning”, senão o de que publicitam algo que nesse sítio está disponível ao público consumidor, sem se saber, no entanto, que segmento desse público quer atingir.

(…) A adição de um novo termo à marca, concretamente, “Shuttle”, formando a composição “COTAI STRIP COTAI Shuttle” nada traz de significativo no sentido de uma identificação de produto, serviço ou actividade, se a intenção é reportar-se a bens tão diversos como serviços de segurança para indivíduos ou haveres; serviços de guarda-nocturno; serviços de inspecção de bagagem; serviços de vigilância; serviços de porteiro; serviços de organização de casamentos e de festas para eventos especiais; serviços de acompanhantes; serviços de aluguer de roupa; serviços de aconselhamento e consultadoria relacionadas com os serviços mencionados acima, etc.”
    Assim se responde ao argumento utilizado pela DSE de que já foram admitidas a registo as mesmas ou marcas similares. Tal argumento, ainda que possa impressionar, não tem validade jurídica pois que é desmentido por tantas outras decisões, sempre importará saber se essas decisões foram aqui escrutinadas, não sendo despiciendo assinalar que ainda que as decisões dos tribunais devam preservar o valor da segurança e certeza, não é menos certo que elas não são vinculativas, em termos genéricos, salvaguardadas as situações de uniformização de jurisprudência nos respectivos termos legais.
    Em face do exposto o recurso não deixará de soçobrar.
    
    IV- DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
    Custas pela recorrente.
Macau, 4 de Julho de 2013,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho

    
1 - cfr. Ac. do TSI, proc. n.º 101/2003, de 27 de/6/2013
2 - Carlos Olavo, in Propriedade Industrial, 1977, pág.37

3 - António Corte Real Cruz, in Dto Industrial I, 2001, pág.81
4 - Oliveira Ascensão, in Dto Comercial II, Dto Industrial, 1988, pág.142; contra, Carlos Olavo, ob. cit. pág. 39
5 - cfr. Pinto Coelho in Lições de Dto Comercial, I, pág. 443 e Ferrer Correia, in Lições de Dto Comercial, 1973, pág..312; Ac STJ de 14/11/79 in BMJ 291,250, de 16/11/93 e 12/12/92 in www. dgsi. pt,;Ac. TSJ, CJ1998, II, pág.110 e TSI, proc. 94/2001 de 21/6/01
6 - Seguindo o texto de Alberto Francisco Ribeiro de Almeida , Indicações de proveniência, denominações de origem e indicações geográficas., www.apdi.pt , texto que corresponde à exposição feita no 5.º Curso de Pós-Graduação em Propriedade Industrial organizado pela Faculdade de Direito de Lisboa e pela Associação Portuguesa de Direito Intelectual.

7 - Sempre o mesmo texto acima citado.
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