Processo nº 606/2013
(Autos de Suspensão de Eficácia)
Data: 10 de Outubro de 2013
ASSUNTO:
- Suspensão de eficácia
- Acto negativo com conteúdo positivo
- Requisitos legais
SUMÁRIO:
- Só há lugar a suspensão de eficácia quando os actos tenham conteúdo positivo, ou tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
- O acto administrativo que consiste no indeferimento do pedido da renovação da autorização da fixação de residência temporária, é um acto negativo.
- Contudo, não é um acto puramente negativo, por ter uma vertente positiva, já que ao indeferir renovação da autorização da fixação de residência temporária, altera-se a situação jurídica preexistente, ferindo-se as expectativas de conservação de efeitos jurídicos da autorização anterior.
- Para decretar a suspensão, é necessário verificar-se, cumulativamente, os seguintes requisitos:
“a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultam fortes indícios de ilegalidade do recurso.” (nº 1 do artº 121º do CPAC).
O Relator,
Processo nº 606/2013
(Autos de Suspensão de Eficácia)
Data: 10 de Outubro de 2013
Requerente: A
Entidade Requerida: Secretário para a Economia e Finanças
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
A, melhor identificado nos autos, vem requerer a suspensão da eficácia do despacho do Secretário para a Economia e Finanças, de 30/07/2013, pelo qual se indeferir a sua renovação da autorização de fixação de residência temporária.
Alega para tanto, no essencial, que a execução deste acto lhes causará prejuízos de difícil reparação; a suspensão da execução não acarreta qualquer prejuízo para o interesse público; e inexistem indícios de ilegalidade na interposição do recurso.
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Devidamente citada, a Entidade Requerida nada se pronunciou.
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O Mº Pº é de parecer da procedência do pedido.
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O Tribunal é o competente.
As partes possuem a personalidade e a capacidade judiciárias.
Mostram-se legítimas e regularmente patrocinadas.
Não há questões prévias, nulidades ou outras excepções que obstam ao conhecimento do mérito da causa.
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Factos provados:
- No início do ano de 2007 foi concedido ao Requerente e estendida aos seus familiares, conjûge B e filho menor C a autorização de residência temporária na RAEM.
- E em 28/10/2008, nasceu a sua filha mais nova D.
- O Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau emitiu a Notificação nº 08504/GJFR/2013 comunicando a decisão de indeferimento da Renovação da Residência ao Requerente e ao seu agregado família.
- O Requerente é casado e tem actualmente dois filhos menores, estando a sua mulher grávida do terceiro filho.
- Os seus filhos estão ambos a estudar, sendo que o seu filho mais velho de 6 anos está a frequentar o 2º ano do ensino primário no Colégio Anglicano de Macau e a sua filha mais nova de 4 anos está a frequentar o 3º ano do ensino infantil no Colégio Anglicano de Macau.
- A esposa do Requerente está grávida do 3º filho, encontrando-se no 5 mês de gestação.
- Os seus filhos estão a estudar e iriam interromper o ano curricular com a execução imediata do acto.
- A sua esposa que está grávida, não é aconselhável viajar nas condições de saúde em que se apresenta.
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Enquadramento jurídico:
Dispõe o artº 120º do CPAC que só há lugar a suspensão de eficácia quando os actos tenham conteúdo positivo, ou tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
No caso em apreço, o acto administrativo em causa consiste no indeferimento da renovação a fixação de residência temporária do agregado familiar do Requerente, daí que é um acto negativo.
Contudo, não é um acto puramente negativo, por ter uma vertente positiva, já que ao indeferir renovação da autorização da fixação de residência temporária, altera-se a situação jurídica preexistente, ferindo-se as expectativas de conservação de efeitos jurídicos da autorização anterior.
Pelo exposto, se conclui que o acto em causa é susceptível de suspensão da eficácia.
No mesmo sentido, vejam-se os Ac. do TUI (Proc. nº 15/2010, de 14/05/2010) e deste TSI (Proc. nº 328/2010/A, de 03/06/2010 e Proc. nº 304/2011, de 19/05/2011).
Para a procedência do pedido, não basta ser um acto positivo, ou sendo negativo, com conteúdo positivo.
É ainda necessário reunir outros requisitos legais, a saber:
“a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultam fortes indícios de ilegalidade do recurso.” (nº 1 do artº 121º do CPAC).
Tais requisitos devem verificar-se cumulativamente para que o requerimento seja procedente (Acórdãos do Tribunal de Última Instância, de 25.4.2001, Proc. nº 6/2001, do Tribunal de Segunda Instância, de 22.2.2001, Proc. nº 30-A/2001, e do Supremo Tribunal Administrativo de Portugal, de 1.7.2003, Proc. nº 975/03), salvo os casos excepcionais previstos nos n.ºs 3 e 4 do artº 121º do CPAC.
Como fundamento de prejuízo de difícil reparação, o Requerente alegou, essencialmente, os seguintes:
a) impossibilidade de manter o trabalho na RAEM;
b) Os seus filhos estão a estudar e iriam interromper o ano curricular com a execução imediata do acto.
c) A sua esposa que está grávida, não é aconselhável viajar nas condições de saúde em que se apresenta.
Repare-se, o legislador não exige a verificação efectiva do prejuízo de difícil reparação, basta a séria probabilidade, pois utiliza a palavra “previsivelmente” e não “efectivamente”.
Assim, da situação configurada, cremos que, em termos de normalidade e senso comum, não seria difícil aceitar que os prejuízos referidos nas al. b) e c) possam resultar, como consequência directa e necessária, da execução imediata do acto e, pela própria natureza dos mesmos, são, ao nosso ver, difíceis de reparação.
Não nos parece que a suspensão da eficácia do acto cause grave prejuízo para o interesse público concretamente prosseguido pelo acto. Alías, nos termos do nº 1 do artº 129 do CPAC, tal requisito considera-se verificando face à falta da sua alegação por parte da Entidade Requerida.
Também não existem indícios, muito menos fortes, da manifesta ilegalidade do recurso contencioso a interpor.
Estão assim verificados todos os requisitos da suspensão de eficácia.
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Por tudo o exposto, acordam em deferir o presente pedido de suspensão da eficácia.
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Sem custas por a Entidade Requerida gozar da isenção subjectiva.
Registe e notifique.
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RAEM, aos 10 de Outubro de 2013.
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Ho Wai Neng Mai Man Ieng
(Relator) (Estive presente)
(Magistrado do M.oP.o)
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José Cândido de Pinho
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Lai Kin Hong (Vencido nos termos do declaração de voto)
(Segundo Juiz-Adjunto)
Processo nº 606/2013
Declaração de voto de vencido
Vencido pelo seguinte:
Antes de entrar na apreciação dos vários requisitos previstos no artº 121º do CPAC, o Acórdão antecedente considera que se trata in casu de um acto de conteúdo negativo com vertente positiva.
É justamente aí reside a minha discordância.
In casu, trata-se de um indeferimento da renovação da autorização de residência de acordo com o disposto no Regulamento Administrativo 3/2005.
Mais concretamente falando, foi indeferida a renovação com fundamento no incumprimento do dever de comunicação imposto pelo artº 18º do mesmo diploma.
Nos termos do disposto do artº 17º/1-2) do Regulamento Administrativo 3/2005, a autorização de residência temporária é válida pelo prazo de 3 anos e a sua renovação está sempre sujeita à verificação dos mesmos requisitos da emissão inicial da autorização e o cumprimento dos seus deveres legalmente impostos, nomeadamente o mencionado dever de comunicar atempadamente qualquer alteração da situação determinativa da concessão inicial da autorização de residência temporária.
Assim, apesar de a lei prever a possibilidade de renovação da tal autorização, o certo é que a renovação depende sempre não só da verificação de todos os mesmos requisitos legais da emissão inicial, como também da discricionariedade do Governo da RAEM.
Não atribuindo a lei aos interessados uma expectativa firme de ser renovada a autorização da sua residência em Macau, não podemos dizer que no caso sub judice da execução do despacho de não renovação da autorização decorra um efeito ablativo de um bem jurídico detido pelos interessados, pois não se pode olvidar que o statu quo ante não era temporalmente ilimitado, mas sim com a duração previamente fixada, embora renovável.
Falando sob outro prisma, se a renovação não decorrer do exercício de poderes vinculados, mas sim de poderes discricionários, o acto de não renovação não pode deixar de ser meramente negativo sem vertente positiva.
Por outro lado, mesmo admitindo a hipótese de considerar, tal como assim entende o Acórdão antecedente, a existência de vertente positiva susceptível de suspensão, este tribunal administrativo nunca tem competência para se substituir à Administração no sentido de fazer prorrogar a autorização já caducada por forma a permitir o próprio requerente e os seus familiares a continuar a residir legalmente em Macau.
A não ser assim, ao decretar a suspensão de eficácia do despacho em causa, estaria o Tribunal a dar uma ordem à Administração de conceder uma autorização provisória de residência, substituindo-se assim à Administração no desempenho das suas funções administrativas.
Pelo exposto, entendo que é de indeferir o presente requerimento de suspensão de eficácia pela não verificação ab initio do pressuposto a que se alude o artº 120º-b) do CPAC.
RAEM, 10OUT2013
O juiz adjunto,
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606/2013