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Processo nº 549/2013 Data: 14.11.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “burla”.
Pena.



SUMÁRIO

1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 549/2013
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão do Colectivo do T.J.B. decidiu-se condenar B (B) e C (C), (1° e 3°) arguidos com os sinais dos autos, como co-autores de 1 crime de “burla qualificada”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) do C.P.M., na pena individual de 4 anos e 9 meses de prisão; (cfr., fls. 2012 a 2043).

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Inconformados, os arguidos recorreram.
Motivaram, (em peça única) e, a final, afirmam, em sede de conclusões e em síntese, que o Colectivo a quo incorreu em vícios na decisão da matéria de facto e erros de direito; (cfr., fls. 2061 a 2091).

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Em Resposta e posterior Parecer, entende o Ministério Público que os recursos não merecem provimento; (cfr., fls. 2094 a 2099 e 2130).

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Nada obstando, cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 2033 a 2041, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem os (1° e 3°) atrás identificados arguidos recorrer do Acórdão do T.J.B. que os condenou como co-autores de 1 crime de “burla qualificada”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) do C.P.P.M., na pena individual de 4 anos e 9 meses de prisão.

Assacam ao veredicto recorrido os vícios de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, “contradição insanável da fundamentação” e “erro notório na apreciação da prova”, considerando que no mesmo aresto se fez também “errada aplicação do direito”, em sede de qualificação jurídico-penal da factualidade provada e determinação da medida da pena.

Vejamos.

–– Como de forma algo abundante tem este T.S.I. vindo a decidir:

O vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”; (cfr., v.g., o Acórdão de 09.06.2011, Proc. n.°275/2011 e de 21.03.2013, Proc. 113/2013), sendo também que só ocorre o vício de “contradição insanável” quando “se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão; (cfr., v.g. no Acórdão deste T.S.I. de 18.04.2013, Proc. n° 185/2013).

Por sua vez, “o vício do erro notório”: “O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”

De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 30.07.2013, Proc. n.° 485/2013 do ora relator).

No caso dos autos, e como bem salienta o Ministério Público em sede da sua Resposta de recurso e posterior Parecer, não incorreu o Colectivo a quo em nenhum vício na decisão da matéria de facto, pois que não omitiu pronúncia sobre a matéria objecto do processo, tendo no Acórdão recorrido elencado a matéria de facto provada, identificando a que não se provou, fundamentando adequadamente esta sua decisão, apresentando-se a mesma decisão clara e lógica na sua exposição e sentido, sem qualquer obscuridade ou incompatibilidade, não se tendo igualmente incorrido em violação das regras sobre o valor de prova tarifada, as regras de experiência ou legis artis.

Improcede assim, o recurso na parte em questão.

–– Quanto à “qualificação jurídico-criminal”.

Entendem os recorrentes que a sua conduta integra apenas a prática do crime de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M.

Também aqui é opinião (da maioria) deste Colectivo que não se mostra de reconhecer razão aos ora recorrentes, bastando, para tal, ver que a conduta dos arguidos integra também a prática de um crime de “burla” já que verificados estão todos os seus pressupostos – cfr., art. 211° do C.P.M. – e sendo a pena para este crime mais elevada, nesta conformidade se deve qualificar a sua conduta dado ser a norma que melhor tutela o interesse ofendido; (neste sentido, cfr., v.g., o recente Ac. do Vdo T.U.I. de 13.11.2013, Proc. n.° 57/2013)

–– Por fim, quanto à “pena”.

Pois bem, o crime em questão – “burla qualificada” – é punido com a pena de 2 a 10 anos de prisão; (cfr., art. 211°, n.° 4, al. a) do C.P.M.).

No caso, ponderando na factualidade dada como provada, em tal moldura penal e no estatuído nos art°s 40° e 65° do C.P.M., fixou o Colectivo a quo a pena de 4 anos e 9 meses de prisão a cada 1 dos arguidos ora recorrentes.

Tem este T.S.I. entendido que “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 30.05.2013, Proc. n° 293/2013).

E, nesta conformidade, atento o dolo directo e intenso dos arguidos, o avultado prejuízo causado ao ofendido e as necessidades de prevenção criminal, considerando também que a pena em questão, ainda assim, está a 1 ano e 3 meses do meio da sua moldura, legal, (6 anos), cremos que excessiva não é a mesma, sendo, assim, de se julgar improcedentes os recursos, (notando-se também que, face ao estatuído no art. 28° do C.P.M., onde se prescreve que “cada comparticipante é punido segundo a sua culpa, independentemente da punição ou do grau de culpa dos outros comparticipantes”, adequado não é invocar-se a pena aplicada a 1 co-arguido para justificar uma pretensão de redução da pena).

Decisão

4. Nos termos que se deixam expendidos, acordam negar provimento aos recursos.


Pagarão os arguidos a taxa individual de justiça de 8 UCs.

Macau, aos 14 de Novembro de 2013

(Relator)
José Maria Dias Azedo [Parcialmente vencido na fundamentação dado que se me mostra de considerar que a conduta dos arguidos não integra o tipo de crime de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6° da Lei n.° 8/96/M, uma vez que este crime está inserido na secção respeitante aos “Ilícitos de jogo fora dos locais autorizados”, e o crime dos autos ocorreu numa sala de jogo de um casino local].

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng

(Segunda Juiz-Adjunta) Tam Hio Wa

Proc. 549/2013 Pág. 10

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