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Processo n.º 429/2013 Data do acórdão: 2013-12-05 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– revogação da pena suspensa
– violação do dever de sujeição ao tratamento de toxicodependência
– art.º 54.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal
S U M Á R I O

À luz do art.º 54.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, é de revogar a pena suspensa do condenado recorrente, porquanto o facto de ele ter violado, por repetidas vezes, e por vontade sua, o seu dever de satisfazer o programa de tratamento de toxicodependência como condição da concessão da pena suspensa, revela que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 429/2013
(Recurso em processo penal)
Recorrente: B (B)




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I - RELATÓRIO
Inconformado com o despacho judicial proferido em 4 de Junho de 2013 a fl. 174 dos autos de Processo Comum Colectivo n.o CR4-12-0147-PCC do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB) que lhe revogou, nos citados termos do art.o 54.o, n.o 1, alínea a), do Código Penal (CP), a suspensão da execução da sua pena única de um ano e um mês de prisão, veio o arguido condenado B (B), já melhor identificado nesses autos, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir a revogação do despacho revogatório da pena suspensa, alegando, para o efeito, e na sua essência, que esse despacho judicial violou o disposto no n.º 1 do art.º 54.º do CP, por não obstante a não aprovação do próprio arguido no regime de prova, a conduta dele na violação desse regime não ser tão grave em termos de revelar que “as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”, até porque sendo um delinquente primário, com cerca de 30 anos de idade, e sendo também pilar da economia da sua família, com o pai, a mãe (uma doente mental), a mulher e um filho de oito anos de idade a seu cargo, deveria ser prorrogado o período da pena suspensa (cfr. o teor da motivação, apresentada a fls. 189 a 195 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal recorrido no sentido de improcedência da argumentação do recorrente (cfr. o teor da resposta de fls. 232 a 235v).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 244 a 245), pugnando também pela manutenção da decisão recorrida.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Com pertinência à solução do objecto do recurso, é de coligir dos autos os seguintes dados:
– Por acórdão de 23 de Novembro de 2012 (que já transitou em julgado em 3 de Dezembro de 2012) do Processo Comum Colectivo n.o CR4-12-0147-PCC do 4.º Juízo Criminal do TJB, subjacente à presente lide recursória, o arguido ora recorrente B foi condenado como autor material, na forma consumada, de um crime de consumo ilícito de estupefaciente, p. e p. pelo art.o 14.o da Lei n.o 17/2009, de 10 de Agosto, na pena de um mês e quinze dias de prisão, e de um crime de resistência e coacção do art.º 311.º do CP, na pena de um ano de prisão, e, em cúmulo jurídico destas duas penas, na pena única de um ano e um mês de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, com condição de sujeição ao regime de prova, destinado ao tratamento de toxicodependência (cfr. o teor do acórdão de fls. 96 a 101v dos presentes autos correspondentes);
– Posteriormente, em face da não aprovação do arguido em três testes de urina de detecção de substância estupefaciente, a M.ma Juíza titular do subjacente processo decidiu, em 12 de Março de 2013 – e após ouvido o próprio arguido que lhe declarou que “já sentiu remorso”, com pedido de “concessão de mais uma oportunidade” – em prorrogar, por um ano, o prazo inicial de suspensão da execução da pena de prisão, com advertência do arguido de que ele tinha que colaborar com o pessoal assistente social no tocante à forma de tratamento da toxicodependência, com sujeição, se fosse o caso, ao tratamento em internamento a ser julgado como necessário pelo pessoal assistente social (cfr. o teor do auto de fls. 141 a 142);
– Posteriormente, o Departamento de Reinserção Social da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça informou o Tribunal de que o arguido não obteve aprovação nos testes de urina feitos nos dias 19, 23 e 29 de Abril e 14 de Maio de 2013 e de que o arguido declarou a não consideração do tratamento em internamento (cfr. o teor do relatório de fls. 153 a 154);
– e mais tarde, em 30 de Maio de 2013, o mesmo Departamento informou o Tribunal de que o arguido faltou aos testes de urina de 16, 21 e 28 de Maio de 2013, tendo o arguido justificado que no dia 21 de Maio de 2013, não tinha conseguido voltar a Macau, por motivo do falecimento do seu avô (cfr. o teor de fls. 168 a 171);
– Perante isso, e após nova audição do arguido, a mesma M.ma Juíza acabou por decidir, em 4 de Junho de 2013, em revogar, nos citados termos do art.º 54.º, n.º 1, alínea a), do CP, a suspensão da execução da pena única de prisão anteriormente imposta ao arguido (cfr. o teor do auto de fls. 173 a 174v).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Na sua motivação, o recorrente assaca concreta e materialmente ao impugnado despacho judicial de 4 de Junho de 2013, a violação do disposto no art.o 54.o, n.º 1, do CP.
Assim sendo, é de aquilatar da rectidão, ou não, da decisão de revogação da pena suspensa, como resposta em concreto àquela única questão objecto do recurso, sendo certo que está em causa tão-só a norma da alínea a) do n.º 1 do art.º 54.º do CP, unicamente citada no despacho judicial ora recorrido para suportar a decisão revogatória da pena suspensa.
Dos dados acima coligidos dos autos, resulta claro que mesmo depois de ver prorrogado, em 12 de Março de 2013, o período inicial da suspensão da execução da sua pena de prisão, o arguido voltou a não ser aprovado nos testes de urina feitos nos dias 19, 23 e 29 de Abril e 14 de Maio de 2013, e faltou até aos testes de urina de 16, 21 e 28 de Maio de 2013 (tendo justificado que no dia 21 de Maio de 2013, não tinha conseguido voltar a Macau, por motivo do falecimento do seu avô).
Tirando a falta do dia 21 de Maio de 2013, é de notar, assim, que o arguido, com a actuação acima descrita, não honrou efectivamente tal “mais uma” oportunidade concedida, a seu pedido, pela M.ma Juíza ora recorrida na audição de 12 de Março de 2013, pois violou realmente, por repetidas vezes, e por vontade sua, o seu dever de satisfazer o programa de tratamento de toxicodependência (com recusa até do tratamento em internamento), como condição da concessão da pena suspensa.
Ante este quadro das coisas, é de confirmar o juízo de valor formado pela M.ma Juíza recorrida, no sentido de que perante tal postura do arguido, fica revelado que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, pelo que é de manter a decisão revogatória da pena suspensa, à luz do art.º 54.º, n.º 1, alínea a), do CP, ainda que o arguido seja delinquente primário, tenha cerca de 30 anos de idade e tenha encargos familiares.
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pelo recorrente, com quatro UC de taxa de justiça.
Comunique ao Departamento de Reinserção Social.
Macau, 5 de Dezembro de 2013.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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