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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 03/04/2014 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 166/2014
(Autos de recurso penal)



Relatório

1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Macau (E.P.M.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no artº 56º do C.P.M.; (cfr., fls. 116 a 118 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).

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Em resposta, pugna o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 121 a 126).

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer, considerando também que o recurso não merecia provimento; (cfr., fls. 133 a 133-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.

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Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):

– por Acórdão do T.J.B. de 16.06.2009, foi, A, natural da XX, sem residência fixa em Macau e ora recorrente, condenado na pena de 9 anos de prisão pela prática de 1 crime de “tráfico de estupefaciente”;
– o mesmo recorrente, deu entrada no E.P.M. em 05.02.2008, e em 05.02.2014, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 05.02.2017;
– durante a sua reclusão, em 08.05.2009, foi disciplinarmente punido;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá regressar ao seio da sua família, na Nigéria.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Vejamos.

— Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:

   “1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
   
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.

3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
   
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).

“In casu”, atenta a pena que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 05.02.2008, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.

Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.

Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).

Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 11.04.2013, Proc. nº 177/2013, de 25.04.2013, Proc. nº 213/2013 e o de 20.06.2013, Proc. n.° 350/2013).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Cremo que de sentido negative deve ser a resposta, nenhuma censura merecendo o decidido, e sendo o presente recurso de rejeitar dada a sua manifesta improcedência; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).

De facto, (e independentemente do demais), atento o tipo de crime pelo ora recorrente cometido, o de “tráfico de estupefaciente”, (e no âmbito de uma conjuntura de criminalidade transfronteiriça), e tendo presente a pena aplicada, adequado se nos mostra de acautelar a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico; (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).

Como – bem - nota o Mmo Juiz a quo, “a colocação do arguido em liberdade não é compatível com a paz social, uma vez que o tempo de prisão que já cumpriu, sendo considerável, aponta, em face de gravidade dos factos, para que a sua libertação nesta altura do cumprimento da pena que lhe foi aplicada se mostre rejeitada pela colectividade”; (cfr., fls. 67-v).

Assim, em face das expostas considerações, verificados não estando os pressupostos do art. 56°, n.° 1 do C.P.M., e sendo o recurso manifestamente improcedente, imperativa é a sua rejeição.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.

Custas pelo recorrente, com taxa de justice que se fixa em 4 UCs, pagando também como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.500,00.

Notifique e registe.

Macau, aos 03 de Abril de 2014

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José Maria Dias Azedo
(Relator)

Proc. 166/2014 Pág. 8

Proc. 166/2014 Pág. 9