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Processo CV3-12-0040-CRJ
  
  
  I – RELATÓRIO
  

  
  BRITISH AMERICAN TOBACCO ITALIA, S.p.A., sociedade comercial com sede em Roma – Itália, na via Amsterdam 147, 00144 Roma, Itália,
  
  inconformada com a decisão da Direcção dos Serviços de Economia que deferiu a concessão da marca N/56584, vem, invocando o artº275º a), em conjugação com o artº230º nº1 al.b), ambos do RJPI, pedir a respectiva anulação.

  A substanciar o seu douto recurso alega factos através dos quais procura demonstrar que a sua marca (MS) é uma marca notória e reconhecida internacionalmente, de imediato argumentando com dados com os quais procura evidenciar a reprodução ou imitação da sua marca pela registanda SMS.
  
  Num outro bloco de argumentos invoca a impossibilidade de registo da marca SMS por corresponder a uma expressão de uso generalizado, outrossim a nulidade da decisão por falta de fundamentação.

  
  Concentra o seu recurso através das seguintes e competentes conclusões:

1. A Recorrente é actual titular da marca de produtos «MS», relativa a tabaco, cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34, cujo registo se encontra efectuado a seu favor em diversos países e regiões, nomeadamente junto do Registo Internacional de Marcas (no âmbito do Protocolo de Madrid), na Europa Comunitária, no Canadá e na Austrália;
2. A Recorrente é também titular da marca nominativa, figurativa ou mista de produtos «MS ETI», relativa aos mesmos produtos e classe, tendo procedido ao seu registo na Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai;
3. Na Ásia – nomeadamente na Coreia e na República Popular da China – a Recorrente é titular a expressão “MS” e cujo sinal essencial é precisamente essa expressão, todas relativas aos mesmos produtos de tabaco, incluídos na classe 34;
4. O sinal e a marca “MS” foram criados em 1969, e atingiram desde então carácter distintivo, notoriedade e prestígios internacionais;
5. Uma marca pode dizer-se notória, ou notoriamente conhecida, desde que tenha alcançado notoriedade, ou conhecimento geral, no círculo dos produtores, dos comerciantes, ou dos prestadores de serviços, ou no meio dos consumidores, ou utilizadores, dos respectivos produtos ou serviços, bastando que a marca se tenha divulgado de modo particular no círculo de pessoas que, na linguagem comum, se usa designar por «meio interessados», relativamente a determinados produtos ou serviços;
6. A marca «MS» é de tal forma notória e tão amplamente reconhecida, que qualquer pessoa, e em especial os meios interessados (i.e., os fumadores), a reconhecem;
7. Em Macau, devido à sua geografia e afinidade com a República Popular da China – na qual a marca se encontra registada, sendo amplamente comercializada e sobejamente conhecida – não há virtualmente qualquer cidadão fumador, pelo menos de etnia chinesa e oriundo da República Popular da China, que a não conheça;
8. A difusão e o reconhecimento desta marca encontram-se suficientemente estabelecidos nesta região, de modo a propiciar uma associação entre os diversos produtos que a Recorrente comercializa sob a marca «MS», por um lado, e a marca requerida «SMS», por outro;
9. A marca «SMS» lembra tão intimamente a marca «MS» da Recorrente, que sugere falsamente uma conexão com esta, pois mais não é do que uma imitação da marca «MS», através da simples adição da letra “S” antes da expressão “MS”;
10. As referidas marcas apresentam tais semelhanças gráficas e fonéticas, que o consumidor poderá facilmente ser induzido em erro ou confusão, correndo mesmo o risco de estabelecer uma equivocada associação entre elas;
11. A apreciação da confundibilidade da marca deve fundar-se num exame rápido e sintético da marca no seu todo e ser feita com referencia à impressão geral suscitada no consumidor médio dos produtos em questão;
12. A decisão sob recurso consente no aproveitamento ilícito, pela requerida “SMS”, do prestígio alcançado ao longo dos anos pela marca “MS”, que irá deste modo parasitar a implantação internacional desta última para assim conquistar mais facilmente uma quota de mercado;
13. Tal situação constitui uma evidente prática de concorrência desleal perante a Recorrente e face a todos os operadores de mercado do sector tabaqueiro;
14. Pretendendo-se registar uma marca confundível com uma marca de grande prestígio, registada internacionalmente, nomeadamente na República Popular da China, existe a possibilidade real de a requerida, para além da mera intenção, vir a fazer concorrência desleal;
15. Em sede de constituição das marcas, vigora o princípio fundamental da novidade ou da especialidade, impondo este que a marca (nomeadamente para efeitos de registo) seja nova, ou seja, que não constitua ela a reprodução ou imitação total ou parcial de marca anteriormente já registada por outrem, para o mesmo produto ou produto semelhante, e que possa assim induzir um erro ou confusão no mercado;
16. Haverá risco de erro ou confusão em sentido restrito sempre que a semelhança possa dar origem a que um sinal seja tomado por outro; mas há também risco de associação ou confusão em sentido lato, sempre que o público considere que há identidade de proveniência entre os produtos;
17. A decisão recorrida padece de falta de fundamentação ao não explicar quais os critérios médios de apreciação que utilizou, para concluir pela existência de uma diferença significativa entre as marcas em apreço, fazendo outrossim um raciocínio ligeiro e desprendido de séria e ponderado consideração jurídica;
18. Para se saber se há imitação releva mais a semelhança que pode resultar do conjunto dos elementos de uma marca do que a dissemelhança de certos pormenores. É por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação das marcas;
19. A marca recorrida não poderá deixar de ser vista como uma tentativa de apropriação do nome da entidade criadora e originalmente titular da marca «MS», induzindo o consumidor interessado em erro, ou pelo menos criando-lhe confusão, sugerindo que os produtos “SMS” são uma nova gama/marca dos produtos de tabaco “MS” e criando falsamente uma conexão ao grupo British American Tabacco;
20. O registo da marca recorrida configura ainda apropriação de acrónimo de uso generalizado – SMS – que significa “short message service”, que vai muito além de um simples recurso tecnológico disponibilizado por operadoras de telecomunicações;
21. Não são susceptíveis de protecção os sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio, devendo as marcas ter aptidão para distinguir um produto, que provém de uma determinada empresa, dos produtos que provém de outras empresas;
22. O motivo de recusa do registo de expressão de uso generalizado assenta não só na falta da sua capacidade distintiva, como na necessidade de preservar e possibilitar o seu uso por todo o comércio;
23. A decisão recorrida limitou-se uma apreciação subjectiva individual do técnico responsável, que não curou de se colocar no lugar do consumidor médio de produtos de tabaco, para captar qual seria a sua reacção aos produtos assinalados com a chancela “SMS”;
24. O despacho recorrido ao deferir o registo da marca «SMS», violou o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º e, bem assim, nas alíneas b) e c) do n.º 1 e nas alíneas a) e b) do n.º 2, ambos do artigo 214.º, bem como o disposto no artigo 215.º, todos RJPI.

  
  Foi cumprido o disposto no artº278º do RJPI em relação à Direcção dos Serviços de Economia e o disposto no artº279º do mesmo diploma em relação à parte contrária.


Apenas a DSE respondeu, pugnando pela legalidade da respectiva decisão.


  II - SANEAMENTO

O Tribunal é competente.

As partes têm personalidade, são dotadas de capacidade e legítimas.

O recurso é tempestivo.

*

Será legal em relação a todo o seu objecto e tendo por referência o pedido?

Vejamos, conhecendo a questão por a DSE negar ser este o meio processual de tutela do interesse da recorrente – Cfr. artº4 de fls.113 e 6ª conclusão de fls.117.


Como se infere do dispositivo do recurso, o que se pede é a anulação do registo da marca SMS, por conseguinte acção de anulação nos termos do artº230º nº1 al.b) do RJPI, (a recorrente invoca expressamente este preceito). Em coerência com este objectivo a recorrente requereu, inclusivamente, o registo da sua marca com o nº N/59 257 tal como o impõe o disposto no artº230 nº2 do RJPI para que seja possível o pedido de anulação de registo de marca (o artº214º nº4 do RJPI também o impõe ao interessado na recusa do registo).

Invoca a recorrente de substancial a notoriedade da sua marca (não registada em Macau prioritariamente em relação à registanda – artº15 do RJPI -, esta, todavia, entretanto registada), e só isso, para fundar a primeira parte do seu douto recurso, por conseguinte, tendo em vista exclusivamente o fundamento previsto no artº214 nº1 al.b) ex vi artº230 nº1 al.b), do RJPI (é ela que faz essa referência). Os demais fundamentos, como é consabido, são-nos para qualquer recurso judicial de concessão ou rejeição de marca, mas já não para fundar a causa de pedir de acção de anulação de registo.


Note-se, no entanto, com o devido respeito, que não parece certeira a invocação que se faz, quer da al.c) do nº1 referido, porque não se fala em momento algum em marca que goze de prestígio em Macau, quer a invocação que se faz da al. b) do nº2, pois não estamos perante a reacção de qualquer marca anteriormente registada da recorrente (visto o disposto no artº15 do RJPI), outrossim a referência à al.a) do nº2, uma vez que a matéria alegada a propósito da natureza usual da expressão SMS se reporta, não a este nº e al., mas sim ao nº3 e numa leitura “a contrário”.

Isto posto, com a restrição sufragada, sem prejuízo do “esforço” que a final faremos para conhecer integralmente do recurso (que nem é relevante, sendo, de resto, de direito), mas por uma questão de rigor e esclarecimento (foi a DSE que sinalizou a questão), cremos que se impõem algumas considerações a propósito de parte do objecto do presente recurso.

Diremos, então, crendo não se correr qualquer precipitação no juízo que faremos, que parece ser evidente que apenas é susceptível a tutela da aparente pretensão da recorrente, de anulação, anulação de registo de marca, quando, efectivamente, tal existe porque já foi lavrado e na sequência de decisão que se tornou insusceptível de ser impugnada por via de recurso nos termos do artº275 do RJPI, ou já foi objecto dessa decisão de recurso. (vide parte final do nº5 do artº230 citado: “(….) só pode ser pedida (….) a contar da data do registo”.

Só esse, já existente registo, pode ser atacado por via de acção de anulação do registo, e na sequência da qual, a proceder, será averbada a consequente decisão no título nos termos do artº57 nº1) al.e) do RJPI: “Estão sujeitos a averbamento, através de inscrição no título e de menção no respectivo registo de concessão: as acções judiciais de nulidade ou anulação dos direitos”.

Nas demais situações em que o desiderato é a reacção a uma decisão da DSE, ao negar ou conceder um direito de propriedade industrial, a via é o recurso a que alude o artº275 do RJPI.

Neste caso o prazo é curto, de um mês, e está previsto no artº277 do RJPI.

Já para a acção de anulação de registo, exactamente porque o pressupõe, a lei concede um prazo muito mais alargado, em concreto, 5 anos a contar da sua data, sem prejuízo, todavia, do prazo a que alude o artº48º nº3 do RJPI (o legislador chama-lhe prazo de prescrição no nº4. Não estamos convencidos de que disso se trate: talvez um prazo de caducidade do direito de agir). Ou seja, a acção de anulação de registo tem de ser proposta no prazo de um ano do conhecimento do fundamento para tal (salvo havendo má fé – nº4), mas dentro dos 5 anos a computar da data do registo.

A razão de ser do que se refere, reafirma-se, tem que ver, exactamente, com o facto de a acção pressupor um registo da marca.

Doutra forma não se entenderia a razão de ser de se permitir uma acção de anulação dentro do prazo supra referido e, de seguida, exigir-se a interposição no prazo de um mês a contar da data de publicação da decisão no BO.

Na coerência do sistema, tratam-se, pois, de realidades distintas, nos termos que toscamente procurámos evidenciar: acção de anulação de registo e recurso de reacção à decisão de recusa ou concessão de direitos de propriedade industrial (em concreto do direito à marca).

Tudo isto para dizer que, numa perspectiva excessivamente formalista, rigorista, muito literal, o recurso não seria susceptível de ser por ora apreciado por não existir ainda objecto, ou seja, por ainda não existir registo em relação ao qual se possa pedir a anulação, apenas uma decisão que concedeu um direito de propriedade industrial (da marca SMS). Quiçá, aproveitar-se-iam os autos apenas em relação aos demais fundamentos invocados porque não podem ser invocados em acção de anulação.

Por outro lado, e este consubstanciaria o argumento que cremos ainda mais substancial, o meio processual não seria este mas uma acção anulação (cfr. artº49 do RJPI). – Cfr. Ac. STJ de Portugal, de 03-02-1999, in DGSI: “I - Visando os recursos apreciar e modificar decisões já tomadas, e não recriá-las sobre matérias novas, não pode o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido colocadas anteriormente no percurso impugnatório. II - A eventual declaração de invalidade de uma marca registada só poderá ser feita em acção de anulação visando esse fim, e não através de mera alegação de recurso inserida noutro processo”.

Num outro processo (CV3-12-0046-CRJ) abalançamo-nos a conhecer de similar questão e no quadro de um recurso de decisão que concedeu o registo de marca igual a uma outra de alegada notoriedade. Lá como aqui, invocou-se o disposto no artº230º nº1 al.b) e 214 nº1 al.b) do RJPI.

E se o fizemos foi exactamente porque este é também um fundamento para o recurso judicial de concessão ou recusa de marca nos termos do artº 275º al.a), em conjugação com o disposto no artº214º nº1 al.b), ambos do RJPI, e porque, estando o processo ao serviço dos interesses, o pedido dever ser entendido como o efeito jurídico pretendido, o efeito prático que se pretende retirar do processo.

A despeito de tudo que se referiu, se calhar excessivamente, deve ser nesta perspectiva que as coisas devem ser abordadas e, por isso, apesar do conteúdo literal do dispositivo, o tribunal conhecerá da totalidade do recurso.

Pelo exposto, conhecer-se-á da totalidade do recurso, nomeadamente no que concerne a matéria que a recorrente aparentemente reconduz (só em relação a essa o podia fazer) à anulação do registo da marca, ou seja, o conhecimento da natureza notória da marca da recorrente e da alegada imitação ou reprodução pela marca registanda.


*

É então próprio o processo.

Não existem excepções ou questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito da causa.



III - MOTIVAÇÃO

A. DE FACTO


É a seguinte a matéria com releve para a projectada decisão:

a) – Por decisão de 14 de Junho de 2012, de fls. 140 e ss, cujo teor aqui se reproduz para os legais e devidos efeitos, a DSE deferiu o pedido de concessão da marca nº N/56584 a “SMS Tobacco Trading”.
b) – Tal marca é constituída pelo sinal .
c) - Tal marca foi concedida para assinalar os produtos da classe 34ª: “tabacos; tabaco de mastigação, cigarros com sucedâneos de tabaco de uso não medicinal; charutos; cigarros; cigarrilhas; rapé; papel para enrolar cigarros; filtros para cigarros; cigarreiras; boquilhas de cigarros; pontas de boquilhas de cigarros; vasilhas de cigarros; bolsas para tabaco; cachimbos; aparelhos de bolso para enrolar cigarros; isqueiros para fumar; fósforos”.
d) - A recorrente é uma sociedade comercial que se dedica, entre outras, às actividades de produção, importação, exportação e comercialização de tabaco.
e) - Sendo uma afiliada do grupo tabaqueiro mundial – a British American Tabacco p.l.c..
f) - Por deliberação tomada em 29 de Março de 2004, a Recorrente incorporou, por fusão, a Sociedade Comercial denominada ETI – Ente Tabacchi Italiani – S.p.A.
g) - A Recorrente tornou-se assim titular da Marca de produtos relativa a tabaco, cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34º.
h) – (….) cujo registo se encontra efectuado a seu favor em diversos países e regiões, nomeadamente junto do Registo Internacional de Marcas (no âmbito do protocolo de Madrid), na Europa Comunitária, no Canadá e na Austrália.
i) - A recorrente é também titular da marca “MS ETI” (a expressão “ETI” vem do acrónimo de outrora “ETI – Ente Tabacchi Italiani – S.p.A.), relativa a tabaco, cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34º.
j) – (…) tendo o seu registo sido efectuado na Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai.
k) -A recorrente é titular da marca de produtos “100’s MS INTERNATIONAL”, concernente a cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34º, registada em Itália.
l) - Na Ásia, a recorrente é titular registada de mais de vinte marcas nominativas ou mistas de produtos incluindo a expressão “MS”, todas referentes a produtos de tabaco, fósforos, isqueiros e outros produtos para fumadores, incluídos na classe 34º, nomeadamente na Coreia e na República Popular da China, tais como:
a) Alfa Filtro MS; l) MS Nazionale Box;
b) MS 100’s Deluxe; m) MS Red Box;
c) MS Alfa Box; n) MS Stop Filtro;
d) MS Brera Slim; o) MS Zenith 100’s Triplo Filtro;
e) MS Club Leggera; p) MS Club Slim;
f) MS Filtro King Size; r) MS Italia;
g) MS Linda Leggera; s) MS Napoli;
h) MS Miscela Aromatica; t) MS Firenze;
i) MS Miscela Classica; u) MS Roma;
j) MS Miscela Delicata; v) MS Venezia;
k) MS Mundial; w) MS Mild Extra Slim
m) – A recorrente com a marca “MS” vem apoiando, desde há muitos anos, grandes eventos desportivos internacionais, através da promoção da marca “MS”, em especial em competições automobilísticas e de motociclismo.
n) – A marca “MS” vem sendo exibida durante competições desportivas oficiais, quer de Fórmula 1, quer de circuitos Moto GP (a classe Moto GP ou Moto Grand Prix destina-se aos motociclos de 800cc de cilindrada, englobando as provas máximas do Grande Prémio de Motociclismo, organizado pela Federação Internacional de Motociclismo). Estas competições são presenciadas por milhares de fãs e vistas por milhões de telespectadores em todo o mundo.
o) Na década de 80, a marca “MS” foi a grande patrocinadora da escuderia Osella, da Fórmula 1, cujo piloto principal era então o americano Eddie Cheever .
p) - A partir de 2001, a Recorrente fez novos investimentos em publicidade e na promoção da marca “MS”, à escala internacional, assumindo-se como patrocinadora oficial da escuderia Aprilia, de motociclos, para o campeonato internacional de Moto GP.
q) - Vários canais de televisão vêm transmitindo integralmente, desde há vários anos, os grandes prémios de motociclismo, ou informam e passam imagens sobre tais eventos.
r) A recorrente não comercializa directamente produtos da marca “MS” em Macau, mas é conhecida não só entre as tabaqueiras, entrepostos comerciais, e vendedores de tabaco, mas também reconhecida entre os consumidores.



B. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
  

No alinhamento dos factos provados relevantes para a decisão de mérito, o tribunal socorreu-se do suporte documental existente, como não podia deixar de ser e em face do tipo de processo em causa, sendo que em relação à reputação, conhecimento e comercialização dos produtos da recorrente, o conteúdo dos documentos foram conjugados com as regras da experiência e do conhecimento comum.

Na medida do esforço possível, tentou o tribunal colocar-se no lugar de um consumidor médio dos produtos específicos objecto da indústria e comércio da recorrente, perscrutando (com os conhecimentos que tem e coadjuvados pela prognose que se operou do “sentir” das pessoas da comunidade, igualmente relevando a característica da população chinesa de grande apreciadora de tabaco), se se tratam de produtos do conhecimento geral ou de sector específico em Macau.

O tribunal socorreu-se igualmente à internet para ver esclarecidos e ou confirmados alguns aspectos que foram assentes, alguns deles indiciariamente documentados.


C. DE DIREITO


Comecemos pela questão formal objecto do recurso e tratada na sua última parte, questão que a DSE entende não poder ser conhecida por este tribunal.

Alega a recorrente, chamando à colação o CPA, que a decisão a sindicar está eivada de vício por não estar devidamente fundamentada.

Vejamos, iniciando-se, antes de mais por essa polémica questão relacionada com a natureza da decisão da entidade que concede ou recusa um direito de propriedade industrial.

Se para alguns autores tal decisão corresponde a um acto administrativo, para outros tal natureza deve ser negada.

Entre aqueles está Afonso Queiró que argumenta da seguinte forma: “os direitos de propriedade industrial são direitos de natureza privada para cuja constituição e extinção se exige a intervenção ou ingerência do poder público, no exercício da chamada administração pública do direito privado. Esse poder público é, pelo que respeita à constituição dos referidos direitos, em princípio, a Administração. É esta, em regra, realmente que, após a observância de um certo processo administrativo, concede ou recusa a concessão de patentes (….), marcas. Esta concessão e esta recusa são actos administrativos e constituem, portanto, manifestações da função administrativa do estado.” - Cfr. RLJ, ano 98, p.14 e 15.

Entre quem nega a natureza de acto administrativa à decisão predita está Mário Esteves de Oliveira.

A ideia subjacente a esta posição tem que ver com o facto de que neste caso não se visa a satisfação concreta de necessidades colectivas, antes, como refere o citado Professor, se produz, apenas, “numa relação jurídica privada e, por isso, essa intervenção não contende com interesses públicos secundários, quando muito com o interesse da “paz jurídica” e da “justa composição concreta de conflitos de interesses” alheios à administração. (….) o órgão estadual não define os direitos ou deveres do estado no confronto de outros sujeitos de direitos, limita-se a criar ou a reconhecer direitos e deveres de um particular perante um ou outros; a Administração não é parte na relação jurídica (….) e portanto a sua intervenção não se consubstancia na prática de actos administrativos” - . Cfr. Direito Administrativo, VI, 1980, p.392 e 393

Convergem no entanto as duas posições no que concerne ao Tribunal competente para apreciar o recurso da decisão citada, referindo Afonso Queiró que a isso não obsta a circunstância de se tratar de um acto administrativo, uma vez que os “Tribunais Comuns não intervêm aqui no exercício da função jurisdicional, intervêm ocasionalmente no desempenho da função administrativa” – Cfr. A., op. e loc. cit.

A questão é delicada.

Com efeito, se a decisão for um acto administrativo, cabendo a competência a este Tribunal Comum, não há dúvidas, a apreciação dos seus aspectos formais terá de ser sindicado de acordo com estabelecido legalmente no CPA. Quanto aos motivos de recusa ou concessão não há dúvidas: a competência está deferida por Lei para os Tribunais Comuns.

Se não for um acto administrativo, então, e quanto às formalidades da decisão, exigência de fundamentação, atende-se ao estabelecido no CPC (artº556 nº2).

Parece-nos ver aquela posição na jurisprudência do TSI, ao firmar o seguinte: “1. As decisões por que se concederam ou recusaram direitos de propriedade industrial (….), por serem emanadas por uma autoridade competente da AP de Macau no exercício do seus ius imperium na matéria (….), e dotados de natural força de estatuição própria de qualquer acto administrativo com efeitos externos, são decisões autenticamente administrativas. / 3. Daí decorre lógica e necessariamente que o recurso previsto no artº282 do RJPI, da decisão judicial proferida no recurso judicial do tipo de decisões administrativas em causa, deve ser visto como dotado também da referida natureza contenciosa administrativa que o faz equiparar a um recurso jurisdicional da decisão judicial proferida em sede do recurso contenciosa de um acto administrativo” - Cfr. Ac. TSI de 25 de Julho de 2002, proc.28/2002.

Esta posição, embora o douto acórdão não o justifique, parece ter arrimo na posição que entende que estamos perante um acto administrativo, mas que, apesar disso, em face dos valores que importa tutelar, a competência para conhecer do acerto legal (substantivo e formal) de tais decisões caberá, não ao Tribunal Administrativo, como seria normal em face da matéria em jogo, mas sim aos Tribunais Comuns, impondo-se, desta forma, um sistema de plena jurisdição e não de mera anulação. Cfr. Ac. STJ de 12.1.99, in BMJ, nº483, ano 1999, p.214: “I - A concessão ou a recusa do registo de uma marca é um acto administrativo, constituindo manifestação da função administrativa. II - O CPI, ao cometer ao Tribunal da Comarca de Lisboa a competência para rever o acto da Administração e pronunciar um acto administrativo de "declaração constitutiva", fá-lo intervir não no exercício da função jurisdicional mas ocasionalmente no desempenho da função administrativa. III - Se, por um lado, os tribunais comuns intervêm aqui, por força do artigo 203 CPI, no desempenho de função administrativa, por outro, os recursos para eles não são recursos de mera legalidade mas de plena jurisdição (o próprio tribunal procede à justa composição dos litígios que lhe são submetidos, contra a resistência dos litigantes)”

Na doutrina, encontramos o respaldo desta posição, desde logo, naquele entendimento do Professor Afonso Queiró. Refere ele a este propósito: “os interessados recorrem para o Tribunal de Lisboa (Comércio), afim deste rever o acto da Administração e pronunciar uma decisão que é, um acto administrativo de declaração constitutiva precisamente equivalente como se a lei tivesse consagrado aquela primeira via de tutela de legalidade, em cumprimento do que fosse decidido pelo Tribunal Administrativo” – Cfr. op. cit., p.15.

Reconhecemos que esta é a posição mais consistente.

Nessa medida, é este Tribunal competente, ao abrigo do artº275 do RJPI, para sindicar se o acto administrativo posto em crise padece do vício invocado.

Vejamos.

A motivação é uma imposição legal incontornável, é hoje uma regra imprescindível nas sociedades modernas: há muito que a decisão deixou de se manifestar exclusivamente como acto de autoridade, despida da exposição dos argumentos que justificam o seu sentido.

A injunção de fundamentar as decisões, em regra inscrita em textos constitucionais e na legislação ordinária, “é transversal a qualquer jurisdição ou ordem e tribunais, enquanto partes integrantes e fundamentais do estado de direito democrático, caracterizado, dentre outras coisas, pela garantia da efectivação dos direitos liberdades fundamentais, bem como pela separação e independência dos poderes”. – Joaquim Correia Gomes, “A Motivação Judicial em Processo Penal e as suas Garantias Constitucionais”, in Revista Julgar, Vol.6, página 78

A razão fundamental desta exigência de motivar as decisões pode ser decomposta em duas facetas: (1) a faceta interna, ou seja, como “meio de explicação da decisão às partes e forma de controlo efectivo da sua racionalidade e legalidade”, incluindo pelo respectivo autor; (2) a faceta externa, ou seja, como “mecanismo de legitimação do exercício do poder judicial”. - Maria Clara Calheiros de Carvalho, “A Base Argumentativa na Decisão Judicial”, in Revista Julgar, Vol.6, página 69.

É pois imperiosa a existência de competente fundamentação.

No caso vertente, cremos que não se verifica o apontado vício da falta de fundamentação, e isto apesar de também não ser uma decisão paradigmática em termos de motivação em relação à questão mais importante suscitada.

Não o é desde logo porque não analisa com a profundida exigida as razões da sua “opção”, desde logo porque não justifica o porquê de afastar todos os indícios factuais alegados que permitam qualificar a marca da recorrente como notória, socorrendo, por exemplo da Recomendação Conjunta da Assembleia da União de Paris e da Assembleia Geral da OMPI – Joint Recommendation Concerning Provisions on the Protection of Well-Known Marks, Geneva, 2000, a saber: a) - O grau de conhecimento da marca no sector do público relevante; b) - A duração, extensão e área geográfica de uso da marca; c) - A duração, extensão e área geográfica de promoção da marca, incluindo publicidade e apresentação em feiras e exposições dos produtos e ou serviços a que a marca se aplica; c) - A duração e área geográfica de quaisquer registos, e ou pedidos de registo da marca, na medida em que reflectem o uso ou o conhecimento da marca - Cfr. in http://www.wipo.int/about-ip/en/development_iplaw/pub833-toc.htm#TopOfPage.

Não obstante, justiça também tem de ser feita à decisão, qual seja, quiçá não analisou aquela leonina questão com detalhe porque, e exactamente por isso, havia concluído anteriormente que não há entre as marcas em causa imitação ou reprodução.

Refira-se, no entanto, que também neste segmento a decisão administrativa é “falha” em termos de motivação.

Diremos no entanto que, de qualquer das formas, cumpriu-se, ainda que minimamente para afastar a sua nulidade, a fundamentação da decisão nos termos em que ela é exigida pelo artº115 do CPA. Note-se que, nos termos deste preceito, esta fundamentação pode consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres.

Pelo exposto, não será pela procedência deste segmento do recurso que o tribunal não conhecerá do mérito. Relevar-se-ia, de qualquer das formas, com recurso a uma analogia atípica, o “dogma da prioridade da apreciação do mérito em detrimento da forma” (construída por Teixeira de Sousa para a inobservância dos pressupostos processuais - prevista no artº230 nº3 do C.P.C.), tudo porque a substância do presente recurso será favorável à recorrente.


*


O segundo fundamento do recurso que se conhecerá reporta-se ao facto de a marca cuja concessão foi deferida se materializar numa expressão comum, usual – SMS –, por conseguinte insusceptível de registo.

Dando por boa esta classificação, o arrimo legal de tal pretensão está vertido no disposto no artº214º nº3, a contrário, conjugado com a al.c) do nº1 do artº 199º do RJPI, e não, como parece transparecer do recurso, da conjugação deste preceito com o artº214ºnº2 al.a) do RJPI – Cfr. artº82 do douto recurso.

Vejamos então.

Nas palavras de Coutinho de Abreu “as marcas são signos (ou sinais) susceptíveis de representação gráfica destinados sobretudo a distinguir certos produtos de outros produtos idênticos ou afins” – Cfr. A. cit. in Curso de Direito Comercial, VI., 4ª ed., pag.348

Esta noção reconduz-se, ao fim ao resto, à noção de marca que se pode retirar do enunciado artº197 do RJPI.

Dispõe este preceito que “só podem ser objecto de registo ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou a respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”.

Emerge destes enunciados, doutrinário e legal, pois, que a marca deve, sendo a “pedra de toque” da mesma, por definição e no cumprimento do seu escopo, na expressão de Couto Gonçalves, ter relevantes capacidades distintivas, deve ser idónea, per si, de individualizar uma espécie de produtos ou serviços.

Note-se que, no entanto, essa capacidade distintiva deve ser perscrutada também na relação da composição da marca com os produtos ou serviços que visam identificar.

Por se exigir a dita capacidade distintiva, nega-se o registo às situações contempladas no nº1 al. a) a d) do artº199 RJPI, e para o que releva e a benefício da decisão, “os sinais (….) que se tenham tornado usuais na linguagem corrente (….)” (al.c).

Nos termos e para os efeitos da al.b) do nº1 do artº199 do RJPI, são genéricas as designações que, pelo seu significado, abrangem ou compreendem no seu âmbito o produto a que se destinam. E são usuais nos termos e para os efeitos da al.c) do nº1 do citado preceito, as designações que, não sendo necessários, se tornaram correntes na linguagem comum ou nos hábitos constantes do comércio para designar o produto ou serviço em causa – Cfr. Justino Cruz, CPI, Coimbra, 1983, p. 168.

Segundo Américo Carvalho, “pretende-se com esta disposição que não seja atribuído o exclusivo a alguém, de sinais ou denominações, cuja livre disponibilidade é necessário para que os empresários actuem eficientemente no mercado”.

Adianta ainda.

“Na verdade, os sinais que se tenham tornado correntes na linguagem ou nos hábitos leais e constantes, não diferem das marcas compostas exclusivamente por sinais que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade do produto. Estes sinais têm de ser acessíveis a todos os comerciantes e dos quais nenhum pode ter o exclusivo” – Cfr. Autor cit., in Direito de Marcas, pág.253 e 254.

No caso vertente, não há dúvida que a marca SMS corresponde à expressão, mundialmente assimilada e de igual construção, que significa, em inglês, Short Message Service (SMS).

Trata-se de um serviço de mensagens curtas  disponível para telemóveis digitais que permite o envio de mensagens curtas (até 160 caracteres) entre estes equipamentos e entre outros dispositivos de mão (handhelds), e até entre telefones fixos (linha-fixa), conhecidas popularmente como mensagens de texto.

Não há dúvida que é uma designação com relevo no quadro do artº199 nº1 al.c) do RJPI (e que o fosse no quadro da al.b)).

Todavia, como se referiu, o juízo que se faça da capacidade distintiva desta expressão (SMS) de uso generalizado deve ser perscrutada também na relação da composição da marca com os produtos ou serviços que visam identificar.

Diremos ainda: “… o registo (de sinais ou figuras comummente utilizados no mercado) deve ser negado apenas quando os sinais ou indicações de que a marca for exclusivamente composta se tiverem efectivamente tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio em relação aos produtos ou aos serviços para que tiver sido requerido o registo da referida marca, podendo ser concedido se não existir essa relação (….) ou se a marca incluir outros elementos que lhe forneçam suficiente capacidade distintiva” – Cfr. Código de Propriedade Industrial Anotado, coordenação de António Campinos e Luís Couto Gonçalves, 2010, pág.437

Ora, a marca SMS cuja concessão se deferiu, diz respeito a produtos de tabaco e afins como supra se enfatizou. O acrónimo da alocução Short Message Service tem por objecto, como também se mencionou, um serviço de telecomunicações.

Este dado é nuclear para concluir, à luz do que se disse, que a marca é registável, não caindo na previsão do preceito estruturante deste segmento da decisão.

Acresce que, também por isso mesmo, não existindo risco de confusão, ou encontrando-se ele em patamares muto reduzidos, logo está arredada a possibilidade de desvio de clientela à margem das regras leais do comércio.

Concluindo, cremos ser de direito dar por improcedente o douto e substantivamente sustentado recurso nesta parte.


*

O sobrante conjunto de argumentos da recorrente reporta-se ao facto da marca cuja concessão foi deferida corresponder à imitação de uma marca, da recorrente, por ela considerada notória nos termos e para os efeitos do artº214º nº1 al.b) do RJPI.

O que diz a lei e a doutrina a propósito?

Já citamos supra o disposto no artº197º do RJIP. De igual forma também já identificamos qual a função essencial a marca: função distintiva.

E será com esse fito (distinção e garantia que os produtos ou serviços se reportam a uma pessoa que assume em relação aos mesmos o ónus pelo seu uso não enganoso – Cfr. Couto Gonçalves, in Manual de Direito Industrial, 4º ed- p.161 e ss) que as entidades e pessoas procurarão conformar as marcas que pretendem registar. E para isso são livres, vigorando no âmbito do direito das marcas o princípio da liberdade.

Todavia este princípio, como em quase tudo, além da já referida limitação - exigência de capacidade ou eficácia distintiva -, está também “comprimido” pela (e em função dela) tutela de outros princípios, quer no que concerne à composição das marcas, quer no que concerne a outros valores.

Releva o princípio da novidade ou da exclusividade da marca, traduzido, numa formulação positiva, que ela seja nova, e numa formulação negativa, no seguinte: será recusado o registo das marcas que sejam, diz a al.b do nº2 do artº214º do RJPI, “reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou compreenda o risco de associação com a marca registada”.

Como emerge deste enunciado, pressuposto da recusa, além da reprodução ou imitação (….) de uma outra marca e da sintonia dos produtos que ambas visam salvaguardar, é que exista registo anterior.

No caso em apreço, a marca que a recorrente pretende tutelar, visto o disposto no artº15 do RJPI, não tem registo anterior em Macau face à marca registanda (SMS) - se lhe for confirmada a concessão, ganha prioridade em relação à MS que, entretanto, logrou o respectivo registo -, logo não encontra protecção no quadro deste normativo.

Exactamente perante a impossibilidade de se invocar a prioridade de registo, sustenta a recorrente a sua pretensão chamando à colação o argumento de que a “sua marca” é uma marca notória conhecida em Macau e com existência anterior, é uma marca registada em outros países com muita abrangência.

A tutela por esta via da pretensão dos recorrentes está consagrada no já citado artº214º nº1 al.b) do RJPI, nos termos do qual se estabelece que “O registo de marca é recusado quando a marca constitua, no todo ou em parte, reprodução, imitação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Macau, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se, ou que esses produtos possam estabelecer ligação com o proprietário da marca notória”

Pode-se dizer que subjaz deste preceito, referente à marca notória, uma excepção ao princípio do registo constitutivo do direito à marca, cremos que previsto no nosso ordenamento jurídico (no CPI Português está previsto expressamente no artº224º) através da conjugação do artº5º e 15ºdo RJPI (este consagrando expressamente o princípio da prioridade do registo), uma vez que é protegida independentemente de registo e porque a recusa de marca conflituante é obrigatória e vinculada para a DSE. De igual modo, tal circunstância é também uma excepção ao princípio da prioridade do registo, este, de certa forma, absorvido pelo princípio anteriormente referido.

Esta classe de marca, notória, e as de prestígio, conferem ao respectivo titular a atribuição de direitos exclusivos de uso, arguíveis, defensáveis e reconhecidos pela OJ independentemente da prévia concessão definitiva de registo.

“Com efeito, quanto ao regime de protecção das marcas, há que distinguir as marcas registadas das não registadas, de facto ou livres, sendo que devendo ainda acrescentar-se que as marcas notórias e as de prestígio, mesmo não registadas, gozam de protecção especial”, ou seja, a prevista no citado preceito – Cfr. Coutinho de Abreu, in Curso de Direito Comercial, I, 4º ed. Almedina, pag354.

Uma outra excepção concedida à marca notória (e a de prestígio) é a que se reconduz ao princípio da territorialidade previsto no artº4 do RJIP e por, em regra, as marcas valerem apenas para o território do país ou região onde são reconhecidas e dentro do qual podem opor o conteúdo da sua protecção.

A questão nuclear e decisiva à sorte do recurso prende-se, em primeira mão, com a qualificação da marca reclamada pelo recorrente: marca notória ou não?

Na  base  da  classificação  de  uma  marca  como  notória  está um critério quantitativo.

Entende-se, generalizadamente, que a marca notória tem de ser conhecida de uma parte significativa do público relevante.

No entanto, enquanto parte da doutrina entende como público relevante para o efeito o público em geral, outros entendem que basta apenas o público do circuito mercantil (fornecedores, produtores, distribuidores e consumidores) do produto ou serviço comercializado sob determinado sinal distintivo. – Cfr. Neste último sentido, Américo da Silva Carvalho, Direito de Marcas, Coimbra, 2004, p. 356. No primeiro sentido, Luís Couto Gonçalves, Direito de Marcas, Coimbra, 2003, p. 146. (Veja-se, ainda, o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06 de Maio de 2003, no qual se reconhece a marca TOYS’R’US como notória, podendo, para tanto, ser conhecida apenas junto dos seus consumidores, entendendo-se que só a marca de prestígio precisa de ser conhecida do público em geral.)

Não obstante estas doutas posições doutrinárias, como em regra em tudo, cremos que a melhor posição será aquela que se encontra no “caminho” entre as duas, ou seja, uma posição ecléctica ou mitigada.

Reza esta posição que deve considerar-se que o público relevante varia consoante o tipo de produto ou serviço em causa. Se estivermos perante um tipo de produto ou serviço de grande consumo, devemos apurar se a marca é conhecida de parte significativa do grande público. Se o produto ou serviço atinge, pela sua funcionalidade, apenas uma parte do sector da sociedade, então teremos de perscrutar o grau de conhecimento junto do público com acesso expectável àqueles produtos e ou serviços

Apesar da natureza de “mera” recomendação, pela importância da sua origem institucional, outrossim relevando que os critérios que dela emergem, não sendo decisivos e dogmáticos, servirão, no entanto, como indicadores do que se deve ter em conta para se aferir da qualidade de marca notória, parece-nos interessante chamar à colação o que dispõe a Recomendação Conjunta da Assembleia da União de Paris e da Assembleia Geral da OMPI – Joint Recommendation Concerning Provisions on the Protection of Well-Known Marks, Geneva, 2000, a saber:
 
a) - O grau de conhecimento da marca no sector do público relevante:
b) - A duração, extensão e área geográfica de uso da marca;
c) - A duração, extensão e área geográfica de promoção da marca, incluindo publicidade e apresentação em feiras e exposições dos produtos e ou serviços a que a marca se aplica;
d) - A duração e área geográfica de quaisquer registos, e ou pedidos de registo da marca, na medida em que reflectem o uso ou o conhecimento da marca – Cfr. in http://www.wipo.int/about-ip/en/development_iplaw/pub833-toc.htm#TopOfPage


   Importa ainda referir que, através do article 2 (2) da Recomendação aqui referida, se opera com um conceito de sector relevante do público, indicando, como tal: i) os actuais ou potenciais consumidores do tipo de bens e/ou serviços a que a marca se aplica; ii) pessoas envolvidas em canais de distribuição do tipo de bens e/ou serviços a que a marca se aplica; iii) círculos de negócio ou comerciais que lidam com o tipo de bens e/ou serviços a que a marca se aplica.

Acrescenta a mesma Recomendação, neste mesmo preceito e na sua subalínea (2) (b), que a marca que seja bem conhecida de pelo menos um dos sectores relevantes do público antes referidos, num determinado território nacional, deve ser considerada notória nesse Estado Membro.
 
  Isto posto, definido o quadro legal e doutrinário, cremos nós de forma suficiente para balizar a decisão que se impõe, o que temos de relevante assente, o que de facto deve ser atendido para o efeito e que se seleccionou com alguma prudência e nos termos que atrás se mencionou sob a epigrafe “fundamentação da matéria de facto”, tudo sem prejuízo do que noutra instância mais se puder retirar dos autos, é o seguinte: 1) - A Recorrente é uma Sociedade Comercial que se dedica, entre outras, às actividades de produção, importação, exportação e comercialização de tabaco; 2) - Sendo uma afiliada do grupo tabaqueiro mundial – a British American Tabacco p.l.c.; 3) Por deliberação tomada em 29 de Março de 2004, a Recorrente incorporou, por fusão, a Sociedade Comercial denominada ETI – Ente Tabacchi Italiani – S.p.A.; 4) A Recorrente tornou-se assim titular da Mara de produtos “MS”, relativa a tabaco, cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34; 5) - Cujo registo se encontra efectuado a seu favor em diversos países e regiões, nomeadamente junto do Registo Internacional de Marcas (no âmbito do protocolo de Madrid)na Europa Comunitária, no Canadá e na Austrália; 6) - A Recorrente é também tiutlar da marca nominativa, figurativa ou mista de produtos “MS ETI” (a expressão “ETI” vem do acrónimo de outrora “ETI – Ente Tabacchi Italiani – S.p.A.), relativa a tabaco, cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34; 7) - Tendo o seu registo sido efectuado na Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai; 8) - Por outro lado, a Recorrente é igualmente titular da marca figurativa de produtos “100’s MS INTERNATIONAL” concernente a cigarros, cigarrilhas, charutos, fósforos e isqueiros e outros artigos para fumadores, todos incluídos na classe 34, registada em Itália; 9) - Na Ásia, a Recorrente é titular registada de mais de vinte marcas nominativas ou mistas de produtos incluindo a expressão “MS”, todas referentes a produtos de tabaco, fósforos, isqueiros e outros produtos para fumadores, incluídos na classe 34, nomeadamente na Coreia e na República Popular da China, tais como:
l) Alfa Filtro MS; l) MS Nazionale Box;
m) MS 100’s Deluxe; m) MS Red Box;
n) MS Alfa Box; n) MS Stop Filtro;
o) MS Brera Slim; o) MS Zenith 100’s Triplo Filtro;
p) MS Club Leggera; p) MS Club Slim;
q) MS Filtro King Size; r) MS Italia;
r) MS Linda Leggera; s) MS Napoli;
s) MS Miscela Aromatica; t) MS Firenze;
t) MS Miscela Classica; u) MS Roma;
u) MS Miscela Delicata; v) MS Venezia;
v) MS Mundial; w) MS Mild Extra Slim
10) - A Recorrente com a marca “MS” vem apoiando, desde há muitos anos, grandes eventos desportivos internacionais, através da promoção da marca “MS”, em especial em competições automobilísticas e de motociclismo; 11) – A marca “MS” vem sendo exibida durante competições desportivas oficiais, quer de Fórmula 1, quer de circuitos Moto GP (a classe Moto GP ou Moto Grand Prix destina-se aos motociclos de 800cc de cilindrada, englobando as provas máximas do Grande Prémio de Motociclismo, organizado pela Federação Internacional de Motociclismo). Estas competições são presenciadas por milhares de fãs e vistas por milhões de telespectadores em todo o mundo; 12) Na década de ’80, a marca “MS” foi a grande patrocinadora da escuderia Osella, da Fórmula 1, cujo piloto principal era então o americano Eddie Cheever ; 13) - A partir de 2001, a Recorrente fez novos investimentos em publicidade e na promoção da marca “MS”, à escala internacional, assumindo-se como patrocinadora oficial da escuderia Aprilia, de motociclos, para o campeonato internacional de Moto GP (patrocínio terminado em 2005 devido à proibição geral de publicidade a produtos de tabaco em eventos desportivos); 14) - Vários canais de televisão vêm transmitindo integralmente, desde há vários anos, os grandes prémios de motociclismo, ou informam e passam imagens sobre tais eventos.

Com estes dados, visto os produtos da marca da recorrente, diremos, seguindo os critérios aventados para encontrar o público relevante e, por via disso, a conclusão quanto a notoriedade da marca, que o mesmo é em relação aos produtos que comercializa e ou produz (espécie de produtos específicos, que pela sua funcionalidade, atinge apenas uma parte do sector da sociedade) um público concreto, especial.


Como conclusão imediata e lógica apenas vislumbramos uma: estamos perante uma marca notória nos termos e para os efeitos do artº214º nº1 alb) do RJPI.

E para isso convoca-se o conhecimento do tal público relevante, que nem precisa de ser todo ele, apenas alguns dos sectores - i) os actuais ou potenciais consumidores do tipo de bens e/ou serviços a que a marca se aplica; ii) pessoas envolvidas em canais de distribuição do tipo de bens e/ou serviços a que a marca se aplica; iii) círculos de negócio ou comerciais que lidam com o tipo de bens e/ou serviços a que a marca se aplica -, outrossim o que provado a propósito se considerou, ou seja, que a marca SM “é conhecida não só entre as tabaqueiras, entrepostos comerciais, e vendedores de tabaco, mas também reconhecida entre os consumidores.


Desta sorte, cremos que é de direito qualificar a marca em causa como notória e na medida que, por imposição da lei (o registo da marca é recuado quando (….) constitua imitação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Macau (….)” – Cfr. artº214 nº1 al.b) do RJIP), para ter essa qualidade, é necessário que a mesma seja conhecida em Macau, acrescentamos nós, por sector específico.

Note-se que a excepção que emerge da protecção especial da marca notória (e de prestígio) corresponde a um desvio, também, a um valor estrutural das economias de mercado, ou seja, a da prossecução e protecção da livre concorrência. Nessa medida, a leitura e aplicação da excepção legal criada para a marca notória, auscultada à luz dos critérios da lei e com auxílio da dogmática, exigem uma redobrada e especial cautela.

No caso, mesmo tendo presente este dado, cremos que, na nossa modesta óptica, é segura a conclusão que extraímos supra.

O primeiro passo encontra-se dado no sentido da procedência do recurso e no que concerne ao segmento em análise. Urge apurar se o mesmo também ocorre em relação aos demais requisitos.

Estes, como emerge do teor literal do preceito em apreciação, prendem-se com a reprodução, imitação ou tradução da marca notória MS pela registanda, se esta for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se, ou que esses produtos possam estabelecer ligação com o proprietário da marca notória.

Quanto à identidade de produtos, não carece este tribunal de qualquer esforço argumentativo: os produtos para os quais se pretende o registo da marca SMS são os mesmos da marca MS (classe 34ª) – assim registada em inúmeros países.

Releva, isso sim, a questão da imitação.

São os seguintes os sinais em confronto:
  SMS Tobacco Trading. (vs) B. A. Tobacco Italia



A contrafacção ou, digamos, reprodução em sentido estrito, como parece claro, corresponde a uma cópia fiel, integral, isto é, o uso da marca anteriormente registada sem qualquer modificação – Cfr. Pupo Correia, in Direito Comercial, 10ª Ed., Ediforum, p.347.

No caso é evidente que não estamos perante cópia fiel de marca notória (MS), bastando para tal o confronto das mesmas.

Estaremos perante uma imitação?

A imitação corresponde à “adopção de uma marca confundível com outra. Por conseguinte, a imitação não é identidade, antes supõe a existência de elementos comuns e outros diferentes” - Cfr. A. e loc. cit.

Pela clareza de raciocínio não podemos deixar de continuar a transcrever aquele citado e Il. Professor da Universidade Lusíada e quanto à forma de aferir a existência de imitação de uma marca por outra, se é ou não confundível com outra anteriormente registada.

Refere que “(…) o legislador consagra dois critérios: um subjectivo e outro objectivo”.

Quanto ao segundo está o mesmo consagrado no artº215ºnº2 do RJIP e consubstancia uma presunção relativa de imitação: “considera-se reprodução ou imitação parcial de marca, a utilização de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada (….)”:

Nestes casos “é desnecessária a verificação da possibilidade psicológica de indução em erro, nos termos do critério subjectivo”.

Quanto ao primeiro está o mesmo consagrado, no nosso ordenamento, na al.c) do nº1 do artº215 do RJPI: “haverá violação do princípio da novidade quer as duas marcas se confundam quando postas em confronto, quer suceda que, estando apenas à vista a marca a constituir (a mais moderna), se deva concluir que ela é susceptível de ser tomada por outra ou associada com outra de que se tenha conhecimento, a menos que o observador proceda a um exame atento ou confronto. Considera-se imitada a marca que for tão parecida com outra, que o consumidor só as possa distinguir depois de exame atento ou confronto de uma com a outra”.

Adianta ainda que “Esta formulação normativa harmoniza-se perfeitamente com a concepção de BÉDARRIDE, largamente acolhida pela doutrina e a jurisprudência, segundo a qual: “a questão da imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca e não pelas dissemelhanças que poderiam oferecer os diversos pormenores, considerados isolados e separadamente”.

Deste modo, se a semelhança de conjunto, entre a marca anterior protegida e a mais recente, sem consideração dos pormenores diferenciadores, gerar a possibilidade de confusão, pela fácil indução em erro do consumidor, haverá imitação da primeira pela segunda”. Cfr. A. e op. cit. pag.348

Em face disso que conclusão retirar em relação às marcas conflituantes? Haverá ou não imitação MS pela registanda?

Cremos que a questão não se coloca à luz do referido critério objectivo, tanto bastando para o efeito o confronto das marcas em crise face às registadas.

Não há na registanda a utilização de qualquer elemento de fantasia, nomeadamente da MS (que não os tem), ou seja, uma qualquer expressão que deve reservar-se para termos sem significado próprio, cujo objectivo é apenas a sonoridade que resulta de uma determinada combinação de letras, fruto da imaginação e destituída de correspondência na realidade. Alega a recorrente, e não temos como não acreditar, até pelas pesquisas feitas na internet, que MS correspondem às iniciais de “Monopoli di Stato”.

O problema tem de se resolvido, pois, à luz do critério subjectivo.

Não olvidamos que a marca registanda é uma marca mista, composta por um elemento verbal (nominativo) de três letras (SMS) sobre uma parte desenhística ou emblemática (figurativa). Por seu turno a marca recorrente é composta exclusivamente por um elemento verbal (nominativo): MS.

Resulta do confronto das marcas, que registanda absorve a totalidade da marca MS, acrescentando-lhe um S e o tal fundo.

Será isto o suficiente para lhe conferir diferenciação em relação à marca MS e por forma a afastar qualquer possibilidade de imitação, quando é certo que a lei se contenta com a imitação parcial (“A marca constitua, no todo ou em parte essencial, reprodução, imitação (….)”?

Cremos que não.

Na apreciação global das marcas conflituante, diremos, que a confundibilidade existe. E se não for patente, pelo menos “chegaremos” a essa conclusão com recurso ao competente juízo valorativo quanto à susceptibilidade da marca registanda ser tomada pela marca MS da recorrente ou associada com ela. - Cfr. Ac. do TJ de 11.11.97, C-251/95 (Sabel BV v. Puma AG), in http:// Europa.eu.int/jurisp/cgi-bin/gettext.pl?lang=pt, no sentido de que “o risco de associação não é uma alternativa ao conceito de risco de confusão mas serve para definir o alcance deste”

Para a conclusão retirada, como é corrente, segundo cremos unânime, devemos ajuizar o elemento preponderante ou dominador da marca mista, ou seja, no caso, o elemento verbal: SMS (MS). É com uma consideração especial relativamente a este elemento que se deve fazer a avaliação, relevando-o substancialmente na análise que se faça do conjunto e no confronto com a marca MS. – Cfr. Fernandez Nóvoa, in Tratado de Derecho de Marcas, Marcial Pons, Madrid, 2 ed., 2004, p.338 (no sentido de que o critério correcto, no confronto de marcas mistas, ou entre mistas e nominativas, parece ser o de, a priori, não privilegiar nenhum dos elementos embora, por regra, o elemento nominativo deva ser considerado o elemento predominante).

Se olharmos, com a visão do consumidor normal dos produtos assinalados pelas marcas em confronto, para o respectivo conteúdo essencial, ou seja, o que de estrutural as constitui, facilmente detectamos que o que chama a atenção na sua construção é o “MS” que é totalmente adoptado pela marca registanda. Não interessa se acrescenta mais um S e se lhe dá um fundo desenhístico. Este dado é pormenor de somenos importância: ambas as figuras estão estruturadamente construídas de forma muito similar.

Note-se, como se referiu e se reafirma, a “questão da imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca e não pelas dissemelhanças que poderiam oferecer os diversos pormenores, considerados isolados e separadamente”.

Insistindo, o que desperta a atenção ao consumidor dos produtos das marcas conflituantes, por ser o seu núcleo ou “coração”, é exactamente o tal “MS”, elemento totalmente incorporado pela registanda.

Por a marca MS ser uma marca sobejamente conhecida, por isso é notória, diremos que é da experiência comum que será a expressão MS que identifica imediatamente o produto que assinala.

É este elemento figurativo “que no seu efeito auditivo e visual, fonética e graficamente se destaca, avulta, e prevalece, propiciando a indução do consumidor em erro ou confusão. Os demais elementos (…)” da marca registanda “(….) são, a nosso ver, menos susceptíveis de interessar e impressionar a atenção do consumidor médio (….) – não tendo por isso, a eficácia distintiva (….)” - Cfr. Ac. do STJ de Portugal de 25 de Março de 2004, in DGSI

O risco de confusão, como é consabido, deve ser entendido em sentido lato de forma a incluir, quer o risco de confusão em sentido rigoroso, quer o risco de associação, ou seja, mesmo nas situações em que o consumidor não é induzido a tomar uma marca por outra, bastando que ele, ainda que distinga os sinais, liga uma a outra e, em consequência um produto ao outro. Como refere Coutinho de Abreu, “crêem erroneamente tratar-se de marcas e produtos imputáveis a sujeitos com relações de coligação ou licença, ou tratar-se de marcas comunicando análogas qualidades dos produtos” – A. cit., in Curso de Direito Comercial I, 4º ed, pag.376 e ac. do TJ de 11.11.97 já citado.

Como adjuvante da conclusão extraída, diremos, ainda, não ser exigível na ponderação comparativa que se imponha, utilizando o critério do consumidor médio, que se confronte as marcas, e por, em regra, o consumidor não o poder fazer. Releva o que retém de memória da marca notória e no momento da compra de um produto determinado como uma “nova” marca – Cfr. Ferrer Correia, in Lições de Direito Comercial, V.I, 1973, p.329 (também doutamente citado pela recorrente).

Acresce que a indução do consumidor em erro ou confusão, é tanto maior quanto maior for o relevo da marca “copiada”, qualificação esta que se deve reconhecer à marca da recorrente em face do “estatuto” que se lhe concedeu. - Cfr. Couto Gonçalves, in Manual de Direito Industrial, 4ª Ed., p.238

Cremos, pois, que decidiremos com acerto se revogarmos a douta decisão da DSE, substituindo-a por outra que recuse a concessão da marca SMS, em consequência o seu registo, e por se considerar estarmos perante a imitação de uma marca notória nos termos e para os efeitos dos preceitos supra invocados.


IV - DECISÃO

Pelo exposto, decide-se julgar procedente o recurso interposto pela BRITISH AMERICAN TOBACCO ITALIA, S.p.A., determinando-se a recusa da concessão da marca registanda SMS e, em consequência, do seu registo.

Custas a cargo da recorrida SMS Tobacco Trading, e só por ela por a DSE delas estar isenta.
Registe e notifique.
Oportunamente cumpra o disposto no art. 283º do RJPI.
Macau, 20/02/2014

Carlos Armando da Cunha Rodrigues de Carvalho
Processo No. CV3-12-0040-CRJ 1