Processo n.º 484/2010
(Recurso Cível)
Data : 15/Maio/2014
RECORRENTES :
Recurso Final
- C
Recursos Interlocutórios
- C
- A
- B
RECORRIDAS :
- As Mesmas
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - A e B propuseram acção de anulação de deliberação social contra a C, pedindo que todo o deliberado na Assembleia Geral Extraordinária de 25 de Setembro de 2006 da Ré C, fosse anulado.
Visava essa deliberação a constituição de uma sociedade em Hong Kong, “E”, cujo capital seria detido pelos accionistas à data da deliberação da D, SA, na proporção dos respectivos direitos, que o capital e o benefício económico da participação na D passavam a ser titularidade da “E” e que fossem implementados os procedimentos necessários e adequados para a admissão daquele sociedade à cotação na Bolsa de Valores de Hong Kong e sucessivamente uma oferta pública de subscrição (IPO) em aumento de capital, reservada a novos sócios (público) pela qual estes deverão vir a tornar-se titulares de acções representativas de entre 20% a 25% (eventualmente acrescido de 15º sobre o valor a ser disperso em cumprimento de requisitos legais e regulamentares) do capital da E.
A Ré C contestou e pediu a sua absolvição do pedido, baseada na ilegitimidade substantiva do n.º 1 do art. 230º do Cód. Com., ou, subsidiariamente, na sua absolvição da Ré da instância, por falta de interesse em agir, ou, sucessivamente, por litispendência, ou absolvição do pedido, por não provada e juridicamente infundada a acção.
Mais pede a ré que seja julgada o incidente do valor da acção em MOP 11.250.000.000,00 (onze mil duzentos e cinquenta milhões de patacas).
II - Vem a decisão que ora se toma, na sequência de uma série de recursos e de reclamação para a Conferência, tendo-se embrulhado o denodo impugnatório de tal forma que há que pôr cobro à desordem processual instalada, de forma a olhar para o que é importante e desprezar o que se mostre prejudicado pela decisão do recurso que se configura como principal, qual seja o que incide sobre o despacho que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
Por vezes o uso do cavalo resolve as partidas de xadrez. Também assim no Processo, desde que não se atropelem os legítimos direitos das partes a uma composição justa do litígio. Terá sido essa a percepção do Mmo Juiz titular antecessor nestes autos quando entendeu que não ia levar nada à Conferência por entender que os seus despachos eram meramente ordenadores e disciplinares (despacho de fls 1016), tanto mais que que todas as questões relevantes seriam aí conhecidas pelo colectivo de juízes em sede dos recursos de que cumprisse conhecer.
III - Vejamos quais os recursos interpostos e quais as vicissitudes processuais de natureza incidental e outras, carentes de pronúncia por banda deste Tribunal.
Recursos interpostos:
1.º - Despacho saneador - na parte das excepções deduzidas – recorrente: R. C;
Neste recurso não foram apresentadas alegações
2.º - Despacho de fls. 620 e ss - recorrente A.
Neste recurso não foram apresentadas alegações
3.º - Despacho de fls. 620 e ss - parte que indeferiu a reclamação: - recorrente A.;
4.º - Despacho de fls. 677 e ss - pedido de alteração de valor _ recorrente A.
Neste recurso não foram apresentadas alegações
5.º - Despacho de fls. 753 e ss - que ordenou a passagem de guias: - recorrente – A.
Neste recurso não foram apresentadas alegações, no entanto a A. entende que está suspensa a sua apresentação face ao recurso interposto do despacho que julgou extinta a instância - rec. n.º 6.º - devendo começar a correr o prazo se aquele recurso merecer provimento (requerimento de fls. 956 e v.º).
6.º - Despacho de fls 813 e v. que julgou extinta a instância - recorrente -Ré C.
Mais se observa:
- Fls. 951 v.º despacho: sobre falta de procuração e ordenada a remessa dos autos à 1.ª Instância para ser proferido despacho de sustentação em relação a todos os recursos - art.º 617.º do C.P.C.;
- Fls. 954 - requerimento da recorrente C onde esclarece que a procuração em falta encontra-se junta ao procedimento cautelar;
- fls. 956 - requerimento da recorrente A, onde refere que em relação ao recurso por si interposto do despacho de fls. 753, que ficou suspenso, deverá correr de novo, caso o recurso interposto pela contra-parte C da sentença que extinguiu a instância, mereça provimento;
- Fls. 957 v.º e 958 – despacho onde se refere em síntese que face ao despacho de fls. 813 que julgou a extinção da instância, como a inutilidade superveniente da apreciação de todas as restantes questões levantadas pelas partes, tendo apenas o réu interposto recurso desse despacho e não incindido o mesmo sobre a questão de mérito, carecerá de despacho de sustentação – art.º 617.º do CPC.
- Fls. 962 e ss - Pedido de aclaração por parte da recorrente C;
- Fls. 973 – despacho – regularizador do patrocínio e que quanto ao pedido de aclaração, o despacho de fls. 951 v.º foi reparado na sequência da exposição dada pelas AA de fls. 956:
- Fls. 981 e ss - Reclamação para a Conferência apresentada pela Recorrente C do douto despacho de fls. 957 v.º e 958 , tendo concluído aí da seguinte forma:
1. O poder jurisdicional do Exmo. Senhor Dr. Relator quanto à decisão de admissão dos recursos interpostos pelas partes esgotou-se com a prolação do despacho de fls. 951-v, sendo a decisão ulterior de revogação da mesma violadora do caso julgado formal formado nos termos e por força do disposto no Artigo 569° do Código de Processo Civil;
2. Se se entender que o despacho de fls. 951-v não consubstanciou juízo de admissão dos recursos referidos, deverá então concluir-se por que seja nulo por violação do princípio da audição previsto n.º 1 do artigo 625.° do CPC.
3. A flixação, a título definitivo, do valor da causa serve múltiplos propósitos, designadamente o de permitir determinar o valor de custas imputado a cada uma das partes, permitindo, bem assim, liquidar a responsabilidade económica do sujeito sobre que a responsabilidade por custas deva, a final, impender;
4. O juízo que o Tribunal deve fazer quanto à determinação do valor da causa jamais resulta prejudicado pela circunstância de que os mesmos tenham sido extintos por força da ocorrência de um facto superveniente que tenha alegadamente gerado a sua inutilidade;
5. Porque assim é, tem de concluir-se pela subsistência em apreciação da matéria que constituiu objecto daquele mesmo recurso, sob pena de que o próprio Tribunal ad quem viesse a ocorrer em omissão de pronúncia sancionada com a nulidade nos termos do conjugada mente disposto no n.º 2 do Artigo 563° e na primeira parte da alínea d) do n.º 1 do Artigo 571°, ambos do código de Processo Civil.
6. Caso o recurso interposto pela ora Reclamante contra o despacho saneador mereça provimento pelo tribunal ad quem, nos termos do conjugadamente disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 412.° e alínea h) do artigo 413.°, ambos do CPC, será proferida decisão de absolvição da ora Reclamante da instância;
7. Este recurso deve, portanto, ser apreciado com prioridade sobre o recurso interposto da decisão de fls. 813, cujo conhecimento ficará prejudicado em caso de provimento do primeiro, sob pena de nulidade da decisão que nesses termos pudesse vir a ser proferida, nos termos do conjugadamente disposto no no. 1 do Artigo 563° (aplicável ex vi do n.º. 2 do Artigo 631°) e na primeira parte da alínea d) do n.º 1 do Artigo 571°, todos do Código de Processo Civil.
Nestes termos, e nos mais em Direito consentidos que Vós, Venerandos Juízes, mui doutamente suprireis, se requer seja a presente reclamação julgada procedente, por legalmente fundada, e em consequência:
a) Seja a decisão revogatória declarada nula com a consequente repristinação e execução da decisão que originariamente ordenou a baixa dos autos ao TJB para cumprimento do disposto no artigo 617.° do CPC também em relação ao recurso interposto pelas Recorridas a fls. 624 e admitido a fls. 625; e, bem assim,
b) Seja revogada a decisão que condiciona o conhecimento do recurso interposto pela ora Reclamante do despacho de fls. 321 e ss à procedência do recurso pela mesma interposta da decisão de folhas 813.
- Reclamação sobre passagem de guias por este T.S.I. para pagamento de preparos da reclamação para a conferência, apresentada pela Ré C – fls. 1011 e ss, ainda não decidida.
- Posteriormente veio o Mmo Juiz Relator a considerar que todas as questões suscitadas seriam conhecidas em sede dos recursos, pelo que não seriam conhecidas em sede de reclamação para a Conferência.
IV- Deste apanhado sobressai claramente que o recurso que se assume como o principal e do qual depende tudo o mais, com excepção da determinação do valor da causa, em vista da sua tributação, prévia e posterior à prática dos diferentes actos que reclamem pagamento ou adiantamento de custas, é o relativo ao despacho da Mma Juíza que declarou extinta a instância com base no facto de se ter entendido que a anulação da deliberação social de 25/Set./06, objecto do pedido de anulação dos presentes autos, já ter siso executada com a cotação da respectiva empresa «D Holdings Limited» na bolsa de Valores de Hong Kong.
Afigura-se-nos que deste recurso depende tudo o mais que se coloca no seio da presente instância, ou seja, se ela se mostra extinta, não importará mais conhecer das questões que se prendem com a instrução e demais questões tendentes ao conhecimento de meritis; ao invés, se assim se não entender, então há que conhecer das questões colocadas e que devam ser conhecidas neste momento e nesta fase recursória.
Acontece, porém, que para se conhecer desse recurso, bem como dos demais, se for caso disso, não se tratando aqui de um recurso que verse sobre questão do mérito ou de fundo, este recurso, bem como os demais que com ele sobem e devam ser conhecidos têm de ser sustentados ou reparados. Trata-se de uma formalidade essencial, tal como decorre do disposto no artigo 617º do Código de Processo Civil, sendo a lei bem clara ao impor ao relator que mande baixar o processo para aquele efeito. Tal omissão não pode deixar de ser suprida.1
Razão por que nos abstemos neste momento de conhecer deste recurso, bem como dos demais, tendo alguns deles subido, estranhamente, sem que tivesse sido proferido tal despacho de sustentação ou reparação.
Por outro lado, verifica-se ainda, tal como resulta do apontamento supra, que nalguns dos recursos interpostos não foram oferecidas alegações, pelo que os mesmos devem ser julgados desertos.
V- Quanto à questão relativa ao pedido de anulação das guias para pagamento do preparo incidental referente à reclamação para a Conferência seria ele devido, face ao disposto no artigo 17º, n.º 5 do Regime das Custas, não fora o caso do Mmo Juiz então Relator ter entendido não conhecer das questões colocadas em sede de reclamação, pois que elas seriam conhecidas em sede de conhecimento dos recursos.
VI - Decisão
Nesta conformidade, acordam os juízes que compõem este colectivo do tribunal de Segunda Instância em remeter os autos à 1ª instância para que sejam supridas as faltas apontadas, devendo os diversos recursos ser devidamente sustentados ou reparados e tomada posição em relação àqueles que devam ser julgados desertos por falta de apresentação de alegações.
Deve ser dada sem efeito a passagem das guias relativas à reclamação para a Conferência, visto o acima exposto.
Sem custas por não serem devidas.
Macau, 15/Maio/2014,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 - Lopes do Rego, Comentários ao CPC, II, Almedina, 1999, 747
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484/2010 10/10