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Processo nº 223/2014
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 29 de Maio de 2014

ASSUNTO:
- Marca
- Capacidade distintiva

SUMÁRIO:
- A marca é um sinal distintivo de produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas, daí que o seu registo exige a capacidade distintiva.
- Tanto “C” como “C STRIP” indicam uma determinada zona específica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento.
- As marcas nominativas contêm a expressão “C STRIP CREWARDS CLUB” não possuem capacidade distintiva, pelo que não pode serem objecto do registo.
O Relator,





Processo nº 223/2014
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 29 de Maio de 2014
Recorrente: A Corp.
Recorrida: Direcção dos Serviços de Economia

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 19/12/2013, julgou-se improcedente a acção intentada pela Recorrente A Corp., e, em consequência, confirmou-se o despacho recorrido que recusou do pedido do registo das marcas N/XXX49 a N/XXX50, destinadas a serviços da classe 35ª.
Dessa decisão vem recorrer a Recorrente, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
a) A Recorrente suscitou, junto do Tribunal a quo, a questão da aquisição de distintividade da marca C STRIP CREWARDS CLUB por força do uso, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 214.º do RJPI.
b) O Tribunal a quo, porém, não se pronunciou sobre esta questão, o que configura omissão de pronúncia, geradora de nulidade da sentença, ao abrigo do disposto na alinea d) do n.º 1 do artigo 571.º do Código de Processo Civil.
c) A marca C STRIP CREWARDS CLUB a que se reportam os pedidos de registo N/XXX49 e N/XXX50 é uma marca nominativa complexa, em cuja composição surgem apenas duas palavras que podes ser consideradas descritivas: C e CLUB.
d) STRIP constitui, na marca em causa, expressão de fantasia, o que confere à marca um carácter geral de fantasiai não é um termo usual e só passou a ser utilizado por iniciativa da Recorrente, que o associou a C.
e) À palavra STRIP correspondem as palavras portuguesas tira, faixa, pista.
f) STRIP não é urna referência geográfica mas antes uma alusão à Strip de Las Vegas, onde a Recorrente possui a sua sede e opera o D Resort-Hotel-Casino.
g) A expressão C STRIP, que integra a marca C STRIP CREWARDS CLUB, alude a uma experiência decalcada daquela que a Strip de Las Vegas proporciona a quem a visita, o que só pode e na realidade é feito pela Recorrente, única operadora instalada em toda a zona do C que também opera resorts integrados na Strip de Las Vegas.
h) A utilização da marca C STRIP CREWARDS CLUB, ou outra que integre a expressão C STRIP, por outros operadores, é uma utilização enganadora.
i) A marca C STRIP CREWARDS CLUB possui, assim, capacidade para distinguir, em função da origem, os serviços da Recorrente dos serviços de outros comerciantes.
j) O público consumidor associa a marca C STRIP CREWARDS CLUB à Recorrente, pois que sabe tratar-se de uma marca que lhe está intimamente associada.
k) Ao considerar que a marca C STRIP CREWARDS CLUB é composta por sinais que designam apenas características de produtos ou serviços, isto é, a sua proveniência geográfica, e por termos usuais e correntes, a sentença recorrida procede a uma errada aplicação das normas contidas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 199.º e na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º do RJPI.
l) Porém, mesmo que se entendesse que a marca C STRIP CREWARDS CLUB é exclusivamente constituída por expressões genéricas e usuais, o que se não aceita, sempre se dirá que adquiriu distintividade por força de uma utilização intensa, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 214.º do RJPI.
m) Por força dessa utilização, o público consumidor associa a marca C STRIP CREWARDS CLUB e qualquer outra que integre a expressão C STRIP a produtos e serviços prestados pela Recorrente ou por empresas suas subsidiárias.
*
A Direcção dos Serviços de Economia respondeu à motivação do recurso da Recorrente, nos termos constantes a fls. 144 a 148 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso ora interposto.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
A. A 08 de Agosto de 2008, a Recorrente solicitou o registo das seguintes marcas:
* N.º XXX49 - "C STRIP CREWARDS CLUB", destinada a assinalar serviços na classe XXª;
* N.º XXX50 - "C STRIP CREWARDS CLUB", destinada a assinalar serviços na classe XXª.
B. Tendo o pedido do registo sido publicado no Boletim Oficial da RAEM, nº 1, II Série, no dia 7 de Janeiro de 2009.
C. Por despacho de 01 de Julho de 2013, da Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, foi recusado o pedido do registo das marcas registandas.
D. O despacho de recusa do registo das marcas ora em apreço foi publicado no Boletim Oficial da RAEM, nº 32, II Série, de 7 de Agosto de 2013.
E. Fundamentou-se o despacho recorrido no facto de as marcas registandas, compostas pelas indicações geográficas "C" e "STRIP" e pelas indicações genéricas "REWARDS" e "CLUB", carecerem de eficácia distintiva suficiente merecedora de protecção.
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III – Fundamentos
   O presente recurso consiste em saber se as marcas N/XXX49 e N/XXX50 possuem capacidade distintiva, susceptíveis de serem objecto de protecção pelo registo.
   Como se sabe, a marca é um sinal distintivo de produtos e serviços de uma empresa dos de outras.
   A constituição da marca, em princípio, é livre. Pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais nominativos, fonéticos, figurativos ou emblemáticos, ou por uma e outra coisa conjuntamente. Pode ser ainda composta pelo formato de um produto ou da respectiva embalagem (artº 197º do RJPI)
   Todavia, esta liberdade de composição da marca não é ilimitada.
   A lei estabelece, a este respeito, várias restrições, uma das quais é justamente a constituição da marca que tem de ser dotada de eficácia ou capacidade distintiva.
   Assim, a marca não pode ser exclusivamente composta por sinais ou indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, o lugar de origem, a época de produção dos produtos ou que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio (artº 199º do RJPI).
   Referem-se aqui, nas palavras do Prof. Ferrer Correia, os chamados sinais descritivos dos produtos.
   Para o mesmo autor, os sinais descritivos dos produtos só não poderão preencher, de per si, o conteúdo da marca se forem usados sem modificação. A proibição já não valerá quando, através de alterações gráficas e fonéticas, se lhes atribua um conteúdo original e distintivo.
   No caso em apreço, o Tribunal a quo negou o registo da mesma pelas seguintes razões:
   “...
    A questão aqui se coloca é a de saber se as marcas registandas, compostas pelas expressões “C STRIP CREWARDS CLUB” são susceptíveis de protecção e que deve ser concedido o registo.
   A marca, como sinal distintivo, serve para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.
   Quanto à sua composição, a marca pode ser nominativa e figurativa, consoante ser constituída por uma palavra ou palavras, ou por qualquer desenho ou figura. Por outro lado, a marca ainda pode ser mista quando for composta por elementos nominativos e figurativos, formando um conjunto gráfico próprio (Propriedade Industrial I Vol., José Mota Maia).
   Nestes termos, a marca goza, na sua composição, do chamado princípio da liberdade, salvo condicionalismos impostos por lei.
   Um desses condicionalismos consiste em a marca registanda ter capacidade distintiva, i.e., a marca deve permitir identificar um produto ou um serviço de entre os produtos ou serviços da mesma natureza propostos pelos concorrentes no mercado.
   Assim, é necessário que a marca não seja constituída por termo que seja usual e indispensável aos concorrentes para apresentar os seus produtos ou serviços aos consumidores.
   Prevê o artº 199º, nº 1, alínea b) do Regime Jurídico da Propriedade Industrial (RJPI): “não são susceptíveis de protecção (…) os sinais constituídos exclusivamente por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos”.
   Dispõe ainda o artº 199º, nº 1, alínea c) do mesmo diploma: “não são susceptíveis de protecção (…) os sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio”.
   Portanto, a lei proíbe a marca constitui exclusivamente por sinal descritivo tal como se refere no preceituado acima citado na medida em que o sinal descritivo não dota de capacidade distintivo que é comum a todos os objectos idênticos qualquer que seja a sua origem.
   Para além disso, também não merecem de protecção os sinais genéricos que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio, nos termos previstos na alínea c) do nº 1 do artº 199º do mesmo diploma legal.
   No presente caso, verifica-se que as marcas registandas contêm as expressões “C”, “STRIP”, “REWARDS” e “CLUB”, expressões “C STRIP” que consistem, sem margem para dúvidas, numa indicação da proveniência geográfica - uma zona e uma área geográfica concretamente entre as ilhas da Taipa e de Coloane - que é usada, hoje em dia, vulgar e frequentemente pelo Governo, imprensa e população de Macau, e em outras denominações genéricas “REWARDS” e “CLUB”, a palavra “REWARDS” exprime recompensas e o vocábulo “CLUB” exprime clube, a frase “REWARDS CLUB” encontra-se hoje em dia ligada aos serviços que oferecem recompensas, normalmente prestados por operador de casino, tornando-se os termos usuais na linguagem corrente em Macau.
   Salvo o devido respeito por diversa opinião, independentemente de essas expressões se encontrarem juntas ou separadas, faltam-lhe capacidade distintiva suficiente para se distinguir de outros bens ou serviços, insuficiência essa não se gera por combinação da indicação geográfica e palavras usuais, mas sim a combinação sua não consiga permitir ao consumidor médio distinguir um produto ou serviço de entre os produtos ou serviços da mesma natureza propostos pelos outros concorrentes no mercado, tal como por exemplo as expressões “MACAU” e “HOTEL”, cuja combinação é manifestamente desprovida da capacidade distintiva e não pode constituir uma marca, por não deixar adequadamente o consumidor médio identificar o produtor ou fornecedor de serviços que a utiliza.
   Com efeito, não é de olvidar que na zona de “C” existem várias concorrentes que exploram ou explorarão os idênticos ramos de actividade, se fosse concedido o registo da marca sob escrutínio, iria dificultar o consumidor em identificar os produtos ou serviços marcados.
   Assim sendo, andou bem a Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia de Macau, que recusou do pedido do registo das marcas NXXX49 a NXXX50, destinadas a serviços da classe XXª....”.
Trata-se de uma decisão que aponta para a boa solução do caso e que está em conformidade com a jurisprudência que tem sido adoptada recentemente e de forma unânime por este Tribunal nos processos congéneres, nomeadamente nos Procs. nºs 127/2013, 43/2013, 172/2008 e 102/2013, em que a ora recorrente também era parte nos mesmos.
Assim, ao abrigo do disposto do nº 5 do artº 631º do CPCM, é de negar provimento ao recurso, com os fundamentos constantes na decisão impugnada.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
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Custas pela Recorrente.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 29 de Maio de 2014.

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Ho Wai Neng
(Relator)

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José Cândido de Pinho
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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Tong Hio Fong
(Segundo Juiz-Adjunto)