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Processo nº 725/2010
(Recurso Cível)

Relator: João Gil de Oliveira

Data: 19/Junho/2014
   
   
   Assuntos:
- Reapreciação da matéria de facto
- Preclusão do direito à produção de provas
- Falta de fundamentação
- Factos novos invocados no recurso
- Indemnização a liquidar em execução de sentença


SUMÁRIO:

    1. Muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 589º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 589º).
    2. Não tendo a recorrente interposto recurso dos despachos de não admissão de determinadas provas, mostra-se precludido o direito à produção dessas mesmas provas.
    3. O não cumprimento do ónus de especificação dos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo nele realizado que impunham sobre esses pontos da matéria de facto decisão diversa da recorrida têm como consequência necessária a rejeição do recurso, tal como flui do artigo 599°, n.º 1, in fine do Código do Processo Civil.
    4. Sobre a falta de fundamentação a doutrina e a jurisprudência são unânimes no sentido em que o tribunal não tem que se dedicar a fundamentar todas as questões laterais ou que sejam exaustivas, devendo apenas ser qualificadas como padecendo de tal vício as que careçam totalmente de fundamentação.
    5. Perante uma certa complexidade contratual, se a recorrente se limita a dizer que não foi seguido o contrato sem dizer porquê, à revelia da matéria de facto que vem comprovada e que não se mostra abalada, não será de atender a tal alegação recursória.
    6. Os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento e só pode atender a factos novos nos termos em que eles sejam admissíveis de acordo com a lei processual - art. 425º do CPC.
    7. Se está comprovado o dano, resultando do defeito grave da construção e da execução da obra, a ilicitude, resultante do incumprimento contratual e da falta de execução normal e prudente das referidas regras da engenharia pertinentes, o nexo causal entre esta actuação e os danos havidos com a impermeabilização, mas ainda não se apurou o montante do prejuízo, na medida em que não se comprova o montante que a ré despendeu para sanar tais defeitos, não pode a lesada pretender ser ressarcida num montante apenas orçamentado e que ainda está apenas no campo da previsão, sem embargo de poder ser proferida condenação de quantia a liquidar em execução de sentença.

              O Relator,
              João A. G. Gil de Oliveira






















Processo n.º 725/2010
(Recurso Cível)
Data : 19/Junho/2014

RECORRENTES :
Recurso Principal
A, Limitada

Recurso Interlocutório e Subordinado
B, S.A.

RECORRIDAS :
As mesmas

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO

1. A, Limitada, autora do processo referido, mais bem identificada no processo referido, não se conformando com a decisão proferida pelo Mmo Presidente do tribunal colectivo a quo, constante dos autos, na qual se julgou improcedente a acção intentada pela recorrente contra a recorrida, se absolveu a ré dos pedidos e se condenou a recorrente a pagar à recorrida um montante de MOP$462.022,80, acrescido dos juros de mora legal contados da data de recepção da notificação da reconvenção até integral pagamento, vem interpor o presente recurso, alegando, para tanto, em síntese conclusiva:
     A. Existe erro de escrita do nome da recorrente na decisão recorrida, deve ser corrigido, sob pena de violar os art.ºs 562.º n.º 1, 569.º n.º 2, 570.º n.º 1 e 2 e 389.º n.º 1 alínea a), em conjugação com os art.ºs 633.º n.º 1 e 651.º do mesmo Código. Deste modo, a decisão recorrida é nula.
     B. A decisão recorrida violou directamente o art.º 562.º n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil, uma vez que na fundamentação da decisão recorrida não se interpretou e aplicou o direito, nem considerou todos os factos provados, tampouco fez exame crítico de prova. Deste modo, a decisão recorrida padece do vício previsto nos art.ºs 562.º n.º 2 e 3, 571.º n.º 1 alínea b) do Código de Processo Civil e, assim sendo, é nula.
     C. A decisão recorrida não procedeu ao julgamento conforme o contrato celebrado entre as partes e violou, assim, as disposições contratuais e os princípios da liberdade contratual e da liberdade do teor de contrato, ou seja, os art.ºs 399.º e 400.º do Código Civil.
     D. Existe erro na apreciação de prova.
     E. Não foram resolvidas as questões da recorrente nem foram apreciados os documentos entregues ao tribunal antes do encerramento da audiência para provar os custos cobertos pela recorrente. Pelo que, a decisão recorrida viola os art.º s563.º n.º 2 e 3 e 566.º n.º 1 do Código de Processo Civil, padece do vício previsto no art.º 571.º n.º 1 alínea d) do mesmo Código e, assim sendo, é nula.
     F. Existe erro em conhecimento quando a decisão recorrida deu como provado o conteúdo do acordo preliminar celebrado entre as partes, o que conduziu à injustiça da decisão.
     G. Existe erro na apreciação de prova quando a decisão recorrida julgou que a recorrida já pagou todo o valor da obra.
     H. O tribunal a quo não julgou correctamente a especialidade e a aplicabilidade do contrato celebrado entre as partes, assim sendo, existe erro na aplicação do direito.
     I. O tribunal a quo não autorizou o depoimento do membro do órgão de administração, na qualidade da parte, assim sendo, violou a 1ª metade do art.º 478.º n.º 2 do Código de Processo Civil.
     J. O tribunal a quo não autorizou o pedido da perícia para fazer estimação do pagamento, nomeadamente da despesa preliminar, assim sendo, violou os art.ºs 490.º e ss. e o princípio da justiça e levou à injustiça da decisão.
     
    Pelo que pede seja julgado, nos termos da lei, o procedente o recurso interposto pela recorrente e determinada a produção dos correspondentes efeitos jurídicos, seja declarada nula a decisão recorrida por violar as disposições invocadas pela recorrente, nomeadamente o art.º 571.º n.º 1 alínea b) e d) do Código de Processo Civil, e em consequência, a não produção de qualquer efeito jurídico.
    Se não se assim entender, deve-se anular a decisão recorrida por violação da lei e por injusta.
    
    2. B, S.A, contra-alega no recurso principal interposto pela A. A, LIMITADA, dizendo, em suma:
    I. Veio a Recorrente interpor recurso da sentença proferida pelo douto Tribunal a quo que, por um lado, julgou totalmente improcedentes os pedidos formulados e, por outro, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela Ré, ora Recorrida.
    II. Com as suas alegações a Recorrente vem recorrer ainda das decisões proferidas pelo tribunal a quo que: (i) não autorizou o depoimento do administrador da Recorrente; (ii) não autorizou o requerimento da Recorrente para provas periciais e verificação das despesas de obra que a Recorrida deve pagar, designadamente as de funcionamento.
    III. Os dois despachos de não admissão de prova a que se refere a Recorrente foram proferidos numa fase anterior dos autos, não tendo a Recorrente oportunamente interposto o recurso das mesmas.
    IV. Nos termos do artigo 581º do Código de Processo Civil de Macau, o prazo para a interposição dos recursos é de 10 dias, a contar da notificação da decisão, findo o qual se preclude o direito de impugnar as referidas decisões.
    V. A Recorrente não interpôs recurso dos despachos em causa, pelo que sempre se mostra esgotado nessa matéria o poder jurisdicional.
    VI. Ainda que tivesse oportunamente apresentado os respectivos requerimentos de recurso, já teria, há muito, decorrido o prazo para o oferecimento de alegações de recurso, pelo que deverão ser dadas como transitadas em julgado as decisões proferidas sobre os mesmos, devendo consequentemente, darem-se por não escritas as alegações da Recorrente nesta parte.
    VII. A Recorrente afirma que vem erradamente identificada como "A, Limitada", quando a meio do processo terá informado o Tribunal que a sociedade procedeu à alteração da sua firma para A, Limitada.
    VIII. Não resulta nenhuma dúvida quanto à identidade da ora Recorrente, mas sempre se diga que apesar de não haver necessidade de recurso da parte para que se proceda à rectificação do manifesto lapso, que poderia ter sido pedida por mero requerimento, a Recorrida não se opõe a que se proceda à respectiva rectificação.
    IX. A Recorrente manifesta discordância com a factualidade dada como provada, sem que especifique quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo nele realizado, que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida, em violação do preceituado no artigo 599°, n° 1 do CPC.
    X. Sendo o contrato celebrado pelas partes um contrato extenso, cabia, desde logo à Recorrente indicar as cláusulas a que se refere e, seguidamente, demonstrar que provas foram apresentadas para demonstrar um cumprimento ou incumprimento de uma das partes.
    XI. A Recorrente sempre tentou incumprir com o contrato, não apresentando os documentos comprovativos das despesas sempre que para tal tivesse de apresentar.
    XII. Tendo havido testemunhas que foram ouvidas pelas partes para versar sobre o cumprimento do contrato, a Recorrente não indica uma única que sustente a sua posição designadamente se havia ou não valores a pagar.
    XIII. Foi comprovado documentalmente que os pagamentos feitos pela Recorrida excederam os valores que foram exigidos.
    XIV. Neste particular, a Recorrente limita-se a invocar que a sentença recorrida não resolveu as questões por si suscitadas, nem considerou os documentos apresentados ao Tribunal anteriormente ao encerramento do julgamento sem ter identificado a que documentos se refere, o que se revela da maior importância porquanto nos presentes autos juntou documentos que se referem a outras obras que efectuou para outro dono da obra que não a Recorrida, designadamente para a construção do casino XXXX, sem ter dado qualquer explicação para tal comportamento processual.
    XV. O recurso em matéria de facto não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso de todo o complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas apenas uma reapreciação sobre a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo relativamente à decisão sobre os «pontos de facto» que o recorrente considere incorrectamente julgados, na base da avaliação das provas que, na indicação do recorrente, imponham «decisão diversa» da recorrida (provas, em suporte técnico ou transcritas quando as provas tiverem sido gravadas) -, ou da renovação das provas nos pontos em que entenda que esta deve ocorrer.
    XVI. Na reapreciação da matéria de facto, também se não poderá bastar com meras declarações gerais quanto à razoabilidade do decidido no acórdão recorrido, requerendo sempre, nos limites traçados pelo objecto do recurso, a reponderação especificada, em juízo autónomo, da força e da compatibilidade probatória entre os factos impugnados e as provas que serviram de suporte à convicção.
    XVII. O não cumprimento dos ónus de concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgado se quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo nele realizado, que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida determina nos termos do artigo 599º, n.º 1, in fine a rejeição do recurso.
    XVIII. Os termos em que foram formulados as alegações de Recurso da Recorrente pela violação de todos os deveres processuais que se impõem determinam a impossibilidade de intervenção do tribunal de recurso, termos em que deverá ser rejeitado o recurso na parte que se refere à matéria de facto.
    XIX. Veio a Requerente queixar-se, nesta sede de recurso, que a sentença recorrida peca por falta de fundamentação, desde logo decorrente do facto de não se terem relacionado os factos provados com as respectivas normas.
    XX. A Recorrente limita-se a concluir com a mera alegação de falta de fundamentação sem concretizar em que parte não se suportou a sentença oe factos dados como provados.
    XXI. A defesa da Recorrida ficou assim prejudicada, na medida em que a Recorrida não sabe, porque não estão identificadas, as decisões ou conclusões de direito que ficaram desprovidas de fundamentação de facto.
    XXII. A Tribunal, na apreciação dos pedidos formulados pela Autora não se limitou a indicar os factos em que se suportou, como também fez referência específica ao seu número processual e aplicou consequentemente a norma de direito aplicável.
    A factualidade dada como provada é suficiente para possibilitar várias alternativas para que o Tribunal a quo proferisse decisão favorável à Recorrida, e que julgasse improcedentes TODOS os pedidos formulados pela Autora, ora Recorrente, porquanto foi dado como provado que as quantias exigidas pela Autora referem-se a obras a) Cujo preço estava já incluído no custo original da empreitada ou de outro pedido de alteração; b) Ou nunca obtiveram aprovação do orçamento por palie da Ré c) Ou não se encontram devidamente documentadas; d) Ou correspondem a meros pedidos de informação; e) Cujo preço estava já incluído no custo original da empreitada ou de outro pedido de alteração; f) Ou nunca obtiveram aprovação do orçamento por parte da Ré; g) Ou não se encontram devidamente documentadas. Ou correspondem a meros pedidos de informação.
    XXIII. A opção do Tribunal a quo para decidir no mesmo sentido (de improcedência total do pedidos da Autora baseou-se no facto de as partes terem celebrado um acordo final que pôs termo ao conflito já então existente (facto que foi dado como provado), pelo que não haveria necessidade nenhuma de estar a referir-se mais sobre um conflito que as partes já dirimiram, motu proprium e de comum acordo.
    XXIV. O Tribunal começou, por isso por fazer referência ao conteúdo do acordo celebrado entre Autora e Ré, terminando, na mesma frase, por fazer uma referência específica ao quesito que foi dado como provado (36-A), fez referência à prova documental que não foi impugnada, fez referência ao incumprimento do referido acordo por banda da Autora, aplicou as regras de direito E terminou nesta parte a sentença com a conclusão que se impunha.
    XXV. Sobre a falta de fundamentação a doutrina e a jurisprudência são unânimes no sentido em que a o Tribunal não tem que se dedicar a fundamentar todas as questões laterais ou que sejam exaustivas, devendo apenas ser qualificadas como padecendo de tal vícios as que careçam totalmente de fundamentação.
    XXVI. A Lei apenas sanciona com a nulidade a falta absoluta de motivação.
    XXVII. Vem ainda a Recorrente afirmar que a sentença não se pronunciou sobre o contrato, pelo que violou o mesmo e, bem assim, o princípio de liberdade contratual e fixação livre do conteúdo dos contratos consagrado nos art. 399.° e 400.° do Código Civil.
    XXVIII. A Recorrente nem tampouco se dignou em indicar que normas (contratuais ou legais) impunham uma solução ou decisão diferente.
    XXIX. O Tribunal a quo optou por fazer referência à alteração da obrigação por efeito do acordo celebrado entre as partes.
    XXX. Foi a Recorrente, e não a Recorrida, quem sistematicamente violou o contrato de empreitada celebrada entre ambas.
    XXXI. Essencial para que haja empreitada é que o contrato tenha por objecto a realização de uma obra (o resultado final) e com o critério de autonomia (no sentido de o empreiteiro agir sob a sua própria direcção, por forma a que não exista uma situação de serviço pessoal ou elementos de subordinação, que integram os contratos de prestação de serviços e de trabalho, respectivamente).
    XXXII. O Contrato em causa nos presentes autos não é um contrato vulgar , tratando-se antes de um contrato exaustivo que se adapta ao tipo de construção a que os autos se referem: grandes empreendimentos.
    XXXIII. A envergadura da obra, que inicialmente incluía apenas os edifícios da primeira fase da construção da Doca dos Pescadores, impôs que a Autora e Ré, de comum acordo, como provado, e face à ausência de instrumentos contratuais resultantes do Código Civil, recorressem a um modelo e estrutura contratuais próprio para grandes projectos de construção, onde a fiscalização das obras a realizar e as quantidades efectivamente utilizadas possam ter um controlo, quer por parte do empreiteiro, quer por parte do dono da obra.
    XXXIV. As partes recorreram a um modelo que inclui listas de preços unitários, algo que não é estranho no nosso sistema jurídico, sendo, aliás comum nos contratos de empreitada de obras públicas.
    XXXV. In casu, porém, as partes decidiram aplicar um modelo contratual que conhecem bem e com o qual todos os intervenientes profissionais têm um necessário "à vontade" em seguir, adoptando as "General Conditions of Contratct for Building Works", edição de 1999.
    XXXVI. Não se trata de um modelo contratual preparado por uma das partes e imposto à contraparte, mas antes de um modelo contratual com cariz elevadamente profissional e equilibrado e que resulta da experiência que os profissionais do ramo foram percebendo ao longo do tempo.
    XXXVII. As partes nunca puseram em causa a validade ou invalidade do contrato., cujas cláusulas são válidas face ao regime jurídico da RAEM.
    XXXVIII. De acordo com o contrato de empreitada celebrado entre Recorrente e Recorrida, resulta bem claro, não só o escopo da empreitada, como também o papel e funções de cada um dos intervenientes (Arquitectos, Director Técnico do Projecto, Dono da Obra, Empreiteiro, Medidor Orçamentista, etc.) e o regime que se deverá adoptar, não só para aprovação de cada um dos trabalhos, como também para qualquer pedido, respectivos prazos e alternativas para resolução de eventuais litígios.
    XXXIX. As partes tiveram, no momento da formação do contrato, o cuidado de regular com precisão todas formas de boa execução do contrato garantindo a todos os respectivos direitos no âmbito dos mesmos.
    XL. Dada a necessidade de montar estaleiro e a necessidade de fazer face a despesas auxiliares da própria construção (escritórios técnicos, instalações para os trabalhadores e os demais constantes da matéria provada e dada como assente), as partes estabeleceram na cláusula 6 das condições especiais do contrato, sob a epígrafe Preliminaries (ou Preliminares) que as despesas descritas no contrato incluem todas as despesas do contrato incluindo as suas variações (alterações).
    XLI. Porque o contrato previa a possibilidade de haver variações (ou alterações à obra), estabelece o mesmo as regras com que as mesmas dever-se-iam reger.
    XLII. Todos os valores apresentados pela Recorrente, quer relativos à construção, quer os relativos às variações foram sujeitos a avaliação dos medidores orçamentistas, que definiram as quantidades que efectivamente deveriam ser pagas à Recorrente. - Resposta ao quesito 13 e seguintes da Base Instrutória.
    XLIII. A Recorrente e Ré sempre seguiram os termos do acordo no que respeita ao esquema de apresentação de orçamentos e confirmação das quantidades efectivamente aplicadas através de um medidor orçamentista pelo que só os valores por estes aprovados e não impugnados é que deverão ser entendidos como verdadeira dívida contratual.
    XLIV. A quantificação dos valores das alterações ao contrato, nos termos são calculados nos termos da Cláusula 59 do Contrato, e da Cláusula 6.1.
    XLV. Como resulta do contrato, a Recorrente, se os quisesse reclamar, teria que cumprir com os prazos previstos no mesmo e teria ainda que notificar a Ré apresentando, para o efeito, toda a documentação que suporte a referida dívida.
    XLVI. Nos termos da Cláusula 64° do Contrato, se o Empreiteiro pretender reclamar um valor ou preço diferente do notificado pelo Medidor Orçamentista, nos termos da Cláusula 59(4)(b) ou Cláusula 61(2) ou Cláusula 84(4)(b) o Empreiteiro deverá, no prazo de 28 dias desde essa notificação, notificar por escrito a sua intenção de reclamar ao Medidor Orçamentista.
    XLVII. E o mesmo acontece com qualquer outra quantia que seja reclamada pelo Empreiteiro:
    XLVIII. Se o Empreiteiro pretender reclamar qualquer pagamento adicional dentro das regras previstas em qualquer Cláusula das Condições Gerais do Contrato ou Especiais (se existirem) que não as mencionadas na sub-cláusula (l) da Cláusula 64, o Empreiteiro deveria dentro de 28 dias sobre o evento que suscite esse aumento de pedido notificar por escrito o Medidor Orçamentista da sua intenção de reclamar e as normas do contrato em que se suportam.
    XLIX. A consequência da não observação, por parte do empreiteiro, das condições e prazos de reclamação das quantias supra aduzidas está prevista no n.º 5 da mesma Cláusula, ou seja: «Se o Empreiteiro falhar no cumprimento das notificações nas sub-cláusulas (1) e (2) da presente Cláusula respeitante a qualquer reclamação, tal reclamação não será considerada.»
    L. A Recorrente depois de se aperceber que os montantes que tinha a receber já haviam sido pagos, passou a usar da estratégia de pedir sem cumprir com quaisquer regras ou prazos.
    LI. Cabia à Recorrente alegar e provar os factos constitutivos do direito que alega, designadamente: a) a referência ao contrato constitutivo da obrigação; b) o valor a pagar nos termos do contrato; c) quando é que os medidores orçamentistas aprovaram esse crédito; d) a data do vencimento da dívida; e) a data da emissão da correspondente factura e respectiva apresentação para pagamento, à Ré; f) a data da constituição em mora, se esse fosse o caso.
    LII. Tais elementos constituem o ónus de alegação e de prova, de acordo, respectivamente, com o disposto no art. 336°, número 1, do Código Civil, e no art. 420°, número 1, alínea c), do Código de Processo Civil.
    LIII. A Recorrente não fez nada disto, pelo contrário, veio confundir o valor contratado com o valor resultante dos pedidos de alterações de forma a identificar um valor global que deduziu e imaginou de seu livre alvedrio.
    LIV. Não ficou, nos presentes autos qualquer valor no limbo que ainda devesse ser aprovado.
    LV. Independentemente de quaisquer regras contratuais (que a Recorrente passou a não respeitar), ficaram demonstradas e provadas as excepções apresentadas pela Ré quanto a todos os pedidos.
    LVI. Quanto ao valor referente a despesas preliminares, a Recorrente, em total assintonia com o contrato, veio reclamar despesas como se não houvessem regras preestabelecidas sobre a oportunidade e a forma como devem ser apresentadas e documentadas,
    LVII. A Recorrente não suportou o seu raciocínio (o cálculo proporcional) em nenhum outro facto do seu articulado que refira, por exemplo, a execução de uma cláusula contratual ou qualquer outra forma de acordo que o justifique.
    LVIII. A Recorrida, para além das instruções de alteração cujos orçamentos foram por si devidamente aprovados, não é, nem pode ser responsabilizada por obrigações que não assumiu, e que se apresentam sem fonte aparente.
    LIX. Os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal recorrido no momento do seu proferimento.
    LX. Tal significa que, em regra, o Tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela foram formulados.
    LXI. Nas suas alegações de recurso a Recorrente pretende, in casu, proceder à alegação de factos novos que não foram apresentados, como os que constam dos artigos 38 a 43 das alegações, a saber: que o acordo de 26 de Julho de 2006 constante dos autos foi assinado, nos seguintes condicionalismos: a) em violação das regras contratualmente assumidas, tendo sido exigida documentação comprovativa das despesas; b) que se reportavam a um período de exigência; c) que a Recorrente o assinou na perspectiva de pedir mais, mais tarde, de acordo com os seus interesses; d) que a redacção foi feita pela Recorrida; e) Que o referido acordo não foi apreciado quanto à sua veracidade, tendo sido apenas provado a celebração do mesmo (!?); f)Que o acordo é apenas preliminar; g) Que a Recorrente assinou o acordo num estado de "depressão" e "passividade"( !?)
    LXII. Desde o início dos presentes autos que o acordo foi aceite como FACTO ASSENTE.
    LXIII. A Recorrente pretende fazer da fase de recurso um reinício do processo declarativo, tentando trazer factos novos não controvertidos para apreciação do Tribunal de Segunda Instância. Os elementos constantes do processo são mais do que suficientes para determinar que tais factos são manifestamente falsos.
    LXIV. Ainda que assim não fosse, e se a Recorrente não devesse entregar os documentos nos termos do acordo de 26 de Julho de 2006, sempre os teria de apresentar nos termos contratuais.
    LXV. Termos em que deverá ser dadas por não escrita a parte das alegações em que a Recorrente invoca factos novos e não controvertido, e, consequentemente, ser julgado improcedente o Recurso apresentado.
    Nestes termos, deverá o recurso apresentado pela Aurora/Recorrente A, Limitada, ser julgado improcedente.
    
    3. B, S.A, Ré na acção interpõe ainda recurso subordinado da sentença, alegando, em síntese:
    I. O presente recurso subordinado vem interposto da douta sentença proferida no 3° Juízo do Tribunal Judicial de Base, que na parte em que não deu provimento total ao pedido reconvencional apresentado pela Recorrente.
    II. Depois de realizado o julgamento foi proferida decisão sobre a matéria de facto, constante da sentença, e da qual se destaca a seguinte resposta: «[...] Quesito 72° - Provado - Por sua vez, a reparação dos defeitos de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F foi orçada pela própria A. em MOP$6,661,000,00 conforme documento que se junta sob a designação de doc. 106 e 107. [...]» (sublinhados nossos)
    III. Quer em sede de Fundamentação, quer na parte Dispositiva, da Sentença apenas resultou o seguinte quanto aos danos patrimoniais: «[...] Ficou provado que houve o problema de qualidade dumas obras prestadas pela A para a R, sendo grave a infiltração da qual resultou a contratação pela R. do terceiro para a reparação, cujas despesas são de MOP$462.022,28, pelo que, as despesas devem ser suportadas pela A. [...] III. Decisão [...] Dá-se ainda provimento parcial da reconvenção deduzida pela R. contra a A., e a A é condenada em pagamento à R. da quantia de MOP$462.022,80 com os juros da mora contados pela taxa dos juros legais a partir de recepção pela A. da notificação de reconvenção até ao pagamento integral da quantia em dívida.»
    IV. A quantia de MOP$462.022,80 e respectivos juros da mora a que a Recorrida foi condenada a pagar não se referem no todo ou em parte aos defeitos de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F
    V. Deparam-se os autos perante evidente e genuína omissão de pronúncia.
    VI. Da resposta ao quesito 72 da Base Instrutória extraem-se uma multiplicidade de factos que se têm igualmente por provados: a) que ocorreram defeitos de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F; b) foi orçada pela própria A; c) que o valor assumido pela A era de MOP$6,661,000,00; d) que este reconhecimento foi efectuado por escrito, conforme docs. 106 e 107.
    VII. Só o mero lapso pode justificar a não condenação da Autora ao pagamento do valor resultante dos defeitos de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F
    VIII. Não sobram quaisquer elementos que tivessem que ser provados. Isto porque, o facto de a Recorrente não ter procedido ainda à reparação destes defeitos por recurso a terceiro não fez cessar a existência dos defeitos reconhecidos e quantificados pela própria Recorrida.
    IX. Esses defeitos, pela sua própria natureza, diminuem o valor da obra, sendo certo que, mais cedo ou mais tarde a Recorrente terá que proceder à reparação dos mesmos.
    X. O prejuízo verificou-se e reflectiu-se permanente e negativamente no património da Recorrente que terá que recorrer a uma nova empreitada com terceiro para proceder à sanação dos vícios causados pela Recorrida.
    XI. Não cremos ainda que esteja em causa a eventual modificabilidade da decisão de facto, já que o que a decisão em crise apenas peca por não reflectir na fundamentação e na parte dispositiva a necessária consequência: a condenação da Recorrida ao pagamento da respectiva indemnização.
    XII. O Tribunal a quo entendeu que ficou provado que não obstante a Recorrida ter acabado basicamente as referidas obras, verificaram-se vícios de qualidade em algumas obras executadas, o que impôs a contratação pela Recorrida de terceiros para efectuar a respectiva reparação.
    XIII. O Meritíssimo Juiz a quo aplicou o art. 787.° do Código Civil de Macau que prevê que o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação toma-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.
    XIV. O Tribunal a quo concluiu ainda que a Recorrida não cumpriu integralmente a sua obrigação a que estava vinculada, não reparando as infiltrações das obras com a diligência de um bom pai de família, pelo que se deve entender juridicamente como não tendo cumprido a obrigação, podendo a R., ora Recorrente, exigir ao devedor a indemnização pelos danos nos termos da lei.
    XV. A douta sentença, com excepção da decisão da matéria de facto, mostra-se totalmente omissa relativamente ao pedido decorrente dos defeitos de impermeabilização que se verificaram nos telhados dos edifícios da F
    XVI. Todos os elementos necessários para o reconhecimento à Recorrida do direito a ser ressarcida pelos defeitos reconhecidamente causados pela Recorrida constam da decisão em crise:
    a) A existência dos defeitos na obra - reconhecido pela própria Recorrida;
    b) A quantificação dos mesmos - efectuada pela própria Recorrida.
    XVII. De tudo o imediatamente antes exposto resulta absolutamente claro para a ora Recorrente que a douta sentença recorrida não se pronunciou sobre um pedido formulado pela Recorrente em sede de Reconvenção, sendo certo que se trata de questão sobre a qual deveria vir a incidir decisão, em violação do artigo 571, n.º 1 al. d) do CPC.
    XVIII. Razões estas que impõem que seja a douta sentença recorrida declarada nula apenas nesta parte e substituída por outra que, julgando provada e procedente o pedido reconvencional deduzido pela Recorrente, conclua pela condenação da Recorrida no pagamento de indemnização pelos defeitos de impermeabilização que se verificaram nos telhados dos edifícios da F no valor de MOP$6,661,000.00.
    
    4. B, S.A, Ré nos autos à margem cotados interpôs oportunamente recurso interlocutório do saneador, alegando, em síntese:
    I. Na sua douta petição inicial, a Recorrida veio pedir a condenação da Recorrente, em síntese, a condenação da Recorrente: a) Por despesas de construção: Mop$5,232,820.16, acrescido dos juros à taxa legal mais uma sobretaxa de 2%; b) pelas "despesas preliminares" decorrentes de 416 instruções de alterações das obras: no valor de Mop$14,366,477.02, acrescido dos juros à taxa legal mais uma sobretaxa de 2%; e c) pelos prejuízos do impedimento e da perturbação das obras acordadas causados pela execução das instruções de alterações das obras devidas: "reembolsos" dos no valor de Mop$4,110,000.00, acrescido os juros à taxa legal mais uma sobretaxa de 2%.
    II. Recorrente teve a sua defesa prejudicada pela ininteligibilidade da causa de pedir (face ao primeiro pedido) e por ausência total de causa de pedir face aos segundo e terceiro pedidos, porque: a) da petição inicial não constam os factos constitutivos que suportem tais pedidos, ainda que na perspectiva da Autora, e b) por existir manifesta contradição entre os pedidos e a única de pedir constante na petição (o contrato de empreitada);
    III. Como concretização processual das razões invocadas, a ora Recorrente deduziu os competentes pedidos, designadamente, que fosse: (i) declarada inepta a petição inicial decorrente da falta de causa de pedir; (ii) declarada inepta a petição inicial pela contradição entre o pedido e a causa de pedir; [ ... ]
    IV. O Mm.º Juiz a quo limitou-se a referir que a causa de pedir não seria ininteligível [ii] para a Ré, porquanto a Autora assentou a causa de pedir na relação contratual existente e nas obras realizadas pela Autora, ora Recorrida.
    V. A decisão recorrida padece irreparavelmente do vício de nulidade porquanto Mm.º Juiz deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, porquanto não se referiu, no referido despacho saneador, à alegada falta de causa de pedir que suporte os segundos e terceiros pedidos apresentados pela Recorrida.
    VI. É no artigo 87º da petição que a Recorrida faz, pela primeira vez, referência que a Autora faz ao valor de Mop$5,232,820.16 a título de "despesas de construção". A recorrida não explicou, no entanto, como é que chegou a esse valor. Antes usa um cálculo totalmente imperceptível e ao revés dos contratos assinados entre as partes.
    VII. Cabia à Recorrida alegar e provar os factos constitutivos do direito que alega, designadamente: a) a referência ao contrato constitutivo da obrigação; b) o valor a pagar nos termos do contrato; c) a data da do vencimento da dívida; d) a data da emissão da correspondente factura e respectiva apresentação para pagamento, à Ré; e) data da constituição em mora, se esse fosse o caso.
    VIII. A Autora veio confundir o valor contratado com o valor resultante dos pedidos de alterações por forma a identificar um valor global que deduziu e imaginou de seu livre alvedrio.
    IX. Como resulta do contrato, e é reconhecido pela própria Recorrida, a cada instrução de alteração da Ré, deveria a Autora apresentar o respectivo orçamento.
    X. Consequentemente, deveria esse orçamento ser aprovado pelo medidor-orçamentista ("quantity surveyor" nos termos do contrato),
    XI. A Autora nem tampouco alegou esse processo, a aceitação dos orçamentos, sua entrega à Ré, e obtenção da respectiva aceitação.
    XII. Tudo isto seriam factos constitutivos do direito da Recorrida, se se verificassem.
    XIII. Nem apresentou, relativamente aos mesmos uma factura para pagamento.
    XIV. A técnica adoptada pela Recorrida foi claramente outra: imaginou um critério de aumentar o preço das obras (não acordado) e juntou 217 documentos em bloco.
    XV. E o Tribunal e a Ré, ora Recorrente que se desembaçassem, designadamente porque parte substancial desses documentos não correspondem a obras aprovadas tampouco.
    XVI. Esta técnica de encriptar os factos, toma-os inacessíveis e insindicáveis pelo Tribunal e torna ininteligível a própria causa de pedir e, consequentemente, o pedido.
    XVII. O pedido de condenação por "despesas preliminares" decorrentes de 416 instruções de alterações das obras está de todo sem causa de pedir.
    XVIII. Apenas sustenta que o contrato previa um pagamento quanto a despesas preliminares, sendo que esse já foi pago e não foi celebrado nenhum outro acordo que legitime a Recorrida a peticionar outra qualquer quantia quanto a essas despesas.
    XIX. Certo é, porém, que essas despesas não se podem referir a trabalhos adicionais realizados, porquanto esses (os que foram aprovados) foram todos liquidados.
    XX. A dívida de Mop$19,283,362.20 nasceu assim, de um cálculo abstruso, infundado, sendo certo que a Recorrente e os presentes autos desconhecem por completo a sua causa.
    XXI. Repare-se que a Ré não suportou a existência desta dívida no valor de Mop$19,283,362.20 em nenhum contrato nem explica a razão de ser da sua existência.
    XXII. A Recorrente, para além das instruções de alteração cujos orçamentos foram por si devidamente aprovados, não é nem pode ser responsabilizada por obrigações que não assumiu, e que se apresentam sem fonte aparente.
    XXIII. O alegado prejuízo do impedimento e perturbação das obras acordadas é também de todo ininteligível por ausência completa de causa de pedir.
    XXIV. No artigo 82° da petição inicial, único artigo referente aos alegados prejuízos do impedimento e perturbação das obras acordadas, veio a Recorrida dizer o seguinte: «Relativamente aos prejuízos do impedimento e perturbação das obras acordadas causados pelas instruções de alterações, a Autora perdeu Mop$10,000.00 por cada instrução de alteração que esta tinha realizado no total 411 instruções de alteração, o que fez com que a Autora sofresse os danos no valor de Mop$4,110,000.00.» (tradução livre da nossa responsabilidade).
    XXV. A Autora limita-se a afirmar que perdeu Mop$10,000.00 por cada instrução de alteração, não alegando, como era seu ónus: a) A fonte de tal obrigação (contratual ou extracontratual); b)Data do nascimento da obrigação; c) Data da interpelação para cumprimento, se fosse devido; d) Data da constituição em mora.
    XXVI. É evidente a razão da omissão dos referidos factos constitutivos da pretensa obrigação: a dívida não existe por completo.
    XXVII. É por todos sabido que se o Autor não mencionar o facto concreto que serve de fundamento ao pedido, a petição será inepta.
    XXVIII. É também inepta a petição se a indicação do pedido ou causa de pedir for feita em termos verdadeiramente obscuros ou ambíguos (ininteligíveis).
    XXIX. A omissão da causa de pedir afecta necessariamente a defesa da Ré, porquanto a falta de referência à fonte constitutiva da pretensa obrigação impossibilitou a defesa da Recorrente e a aferição da sua existência e validade por parte do Tribunal.
    XXX. Com todo o devido respeito, com ou sem intenção, a Recorrida, como tentativa de responsabilizar a Recorrente pelo pagamento de obrigações sem especificar os factos constitutivos de tais obrigações, dificulta ou torna mesmo impossível à Ré a faculdade de se defender.
    XXXI. Ao contrário do que está obrigado pelo ónus de alegação que lhe assiste, a Recorrida não concretizou nenhum facto do qual resulte, designadamente que: a) Qual a fonte das obrigações? b) Qual o momento do nascimento das obrigações? c) Qual o momento da interpelação para pagamento de cada uma das pretensas dívidas? d) Qual o momento da constituição em mora.
    XXXII. A petição inicial é, por isso, inepta nos termos do artigo 139.° do CPCM.
    XXXIII. Afigura-se, pois, manifesto que a Recorrida não articulou tudo quanto devia na sua p.i., como impõe o princípio do dispositivo e da substanciação, previstos, respectivamente, no n.º 1 do art. 5° e n° 4 do art. 417° ambos do Código de Processo Civil (CPC) - segundo os quais o objecto da acção é o pedido, mas, sendo este ultimo definido através da causa de pedir.
    XXXIV. Com efeito, à luz do princípio da substanciação emergente do referido n.º 4, do artigo 417° do CPC, devia a Recorrida ter consubstanciado o direito invocado através da indicação dos respectivos factos constitutivos.
    XXXV. Dispõe o artigo Artigo 571.° do Código de Processo Civil que: 1. É nula a sentença: [...] d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
    XXXVI. O douto Despacho recorrido refere-se apenas à ininteligibilidade.
    XXXVII. O Despacho Recorrido silencia claramente a questão da ausência completa de causa de pedir, pelo que deverá ser declarado nulo por omissão de pronúncia.
    XXXVIII. O Despacho recorrido violou assim o disposto nos artigos 571.°, n.º 1, al. d), 417°, n.º 4 e 139°, n.º 1, n.º 2, alíneas a) e b) todos do CPC.
    Nestes termos, requer:
    a) seja a decisão recorrida declarada nula; e
    b) seja a mesma substituída por outra que, julgando procedente a excepção ineptidão da petição inicial, declarando-se a nulidade do processo nos termos do n.º 1 do artigo 139 do Código do Processo Civil

5. Foram colhidos os vistos legais.
    
    II - FACTOS
    Vêm provados os factos seguintes:

- A autora é uma companhia limitada instituída e aberta em Macau aos 27 de Outubro de 1998 nos termos da lei, inscrita na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXXX, dedicando-se na área de construção, com capital no valor de MOP10.000.000,00. (vide os documentos 1 e 2) (A)
  - A ré é uma companhia limitada instituída e aberta em Macau aos 28 de Agosto de 2000 nos termos da lei, inscrita na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXXX, dedicando-se na área de fornecimento de serviços e de investimentos industrial e comercial, com capital no valor de MOP10.000.000,00. (vide os documentos 3 e 4) (B)
  - A pedido da concessão de terreno da ré, tendo tratado o órgão competente do Governo da RAEM dos respectivos procedimentos administrativos e trâmites, o Ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas, XXXX, proferiu o despacho n.º 2/2004 aos 7 de Janeiro de 2004, no qual concedeu à ré, por arrendamento e com dispensa de concurso público, um aterro com a área de 109,495 m2, sito em Porto Exterior, perto da Avenida da Amizade, que se destinaria à construção dum complexo de instalações de turismo e entretenimento com designação de “B”. O despacho e o contrato de concessão, conjugando com as condições, foram publicados no Boletim Oficial, n.º 2, série II, pág. 215 a 221, aos 14 de Janeiro de 2004, quarta-feira. (vide os documentos 5 a 6. Para o devido efeito jurídico, o teor dos documentos dá-se aqui por integralmente reproduzido) (C)
  - O terreno referido é descrito na CRP sob o n.º XXXX no Livro B, destina-se à construção urbana, fica em Avenida da Amizade, com designação de “B”, e não é feita a declaração de matriz predial. (vide os documentos 8 e 9) (D)
  - No dia 31 de Dezembro de 2005, o complexo de instalações de turismo e entretenimento de B entrou em funcionamento e esteve aberto ao público. As instalações abrangem 3 partes: “C” , “D” , “E”, entre as quais, “D” é constituído por “XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, XXX e XXX”. (vide o documento 12) (E)
  - No dia 23 de Abril de 2003, a autora e a ré chegaram a acordo e celebraram em Macau o Contrato para a Construção da 1ª Fase do E de B (adiante se designado por “contrato”). (vide todo o contrato constante do documento 13, incluindo o original e a tradução chinesa reconhecida notarialmente. Para o devido efeito jurídico, o teor dos documentos dá-se aqui por integralmente reproduzido) (F)
  - Conforme as disposições do acordo, as partes convencionaram que a autora (como empreiteira) executava a obra em função dos termos gerais e especiais, contrato, impresso de tenro, lista de quantidades, impresso de preços, projectos e regulamentos. A autora executava a obra dentro do prazo fixado pelo contrato, ou do prazo definível pelo gerente de projecto nos termos do contrato. A ré (como empregadora) pagava o valor de contrato final à autora dentro do tempo determinado no contrato com observância das formalidades definidas. (vide a fls. 15 da tradução chinesa constante do documento 13) (G)
  - Conforme o contrato, a autora deve construir no E, parte do complexo de instalações de turismo e entretenimento “B”, a estrutura de 7 arquitecturas e a obra da impermeabilização do telhado. (H)
  - As 7 arquitecturas são respectivamente “XXXX”, “XXXX”, “XXXX”, XXXX”, “XXXX”, “XXXX” e “XXXX”. (vide o documento 13 e as fls. 6 e 7 da tradução chinesa)
  - As partes resolveram perante acordo que a obra referida começou no dia 22 de Abril de 2003 e terminou no dia 3 de Novembro de 2003. (vide o documento 13 e as fls. 6, 7 e 9 a 13 da tradução chinesa) (J)
  - O valor de contrato é de MOP$7.650.392,00, constituído por duas partes: “despesas preliminares” e “despesas de construção”. (vide o documento 13 e a fls. 9 da tradução chinesa) (K)
  - A ré nomeou como “gerente da obra” referida uma companhia de Hong Kong, “G Ltd.”, em sede da pessoa jurídica em XXXX. (L)
  - A ré nomeou como “fiscal” da obra referida a “H”, em sede da pessoa jurídica em XXXX. (M)
  - De 16 de Julho de 2003 a 31 de Dezembro de 2006, a ré pagou à autora, por meio de cheque, por 26 vezes, uma quantia de MOP$76.812.755,86. (N)
  - Conforme o acordo, a ré pagaria à autora um montante de MOP$7.200.000,00 até o fim de Julho de 2006. (vide o documento 206) (O)
  - Mas no facto, a ré pagou o montante referido até o dia 31 de Dezembro de 2006. (P)
  - No valor de contrato de MOP$7.650.392,00, apurado no facto K), uma parte é a despesa preliminar, no valor de MOP$1.531.030,00, que se destina a pagar à autora pelas custas, decorrentes durante o período de construção (de 22 de Abril de 2003 a 3 de Novembro de 2003), de fornecer a equipa de administração no estaleiro de forma a supervisionar a obra, proteger todos os equipamentos e outros objectos, comprar seguros de trabalhador, elaborar a garantia do cumprimento contratual, fornecer guardas, seguranças, cercas e iluminações, fornecer equipamentos de combate a incêndio e pessoais devidamente treinados para evitar o risco de rebentar incêndio na obra, eliminar lixos, fornecer cerca temporária e porta do estaleiro, escritório e respectivos equipamentos, casa de banho temporária e equipamento de conservação, água necessária, electricidade e serviços de telecomunicação, facilidades comuns, estrada temporária, projectos e limpar o estaleiro. (Quesito 1º)
  - A restante parte, no valor de MOP$6.119.362,00, destina-se a construir a estrutura das arquitecturas e a obra de impermeabilização de telhado. (Quesito 2º)
  - De 23 de Abril de 2003 até o fim de Julho de 2004, cumprindo as funções e exercendo os poderes conferidos pelo art.º 60.º dos termos gerais do contrato, a gerente da obra, G Ltd., constante e ocasionalmente deu várias ordens de alteração à autora na execução da obra. (Quesito 3º)
  - As ordens de alteração correspondem a muitos âmbitos, geralmente incluindo adicionar a electricidade temporária, acrescentar uns projectos respeitantes e uns não mencionados e não relacionados projectos à obra objecto do contrato original. (Quesito 4º)
  - Todas as vezes, recebidas as ordens, a autora proponha sempre um preço ao fiscal. (Quesito 5º)
  - O preço era um valor aproximado, porque as ordens não eram ou não podiam ser executadas imediatamente. Entretanto, a autora proponha o preço final ao fiscal sempre que fosse determinado. (Quesito 6º)
  - A autora propôs o preço total das alterações ordenadas pela G Ltd., no montante de MOP$56.729.980,79. (Quesito 7º)
  - O fiscal procedeu à estimação das 22 alterações e as despesas preliminares foram de MOP$3.385.855,18. (Quesito 8º)
  - Do documento fornecido pelo fiscal, H Limited, à autora em 5 de Agosto de 2005, pode-se ver que o preço foi no valor de MOP$60.115.835,97. (Quesito 9º)
  - Em Agosto de 2004, a ré nomeou como nova gerente da obra a I, Limitada, em sede da pessoa jurídica em XXXX, para substituir a G Ltd.. (Quesito 11º)
  - Desde a nomeação até Junho de 2005, a gerente da obra, I, Limitada, constante e ocasionalmente deu várias ordens de alteração à autora na execução da obra. (Quesito 12º)
  - Todas as vezes, recebidas as ordens, a autora também proponha sempre um preço ao fiscal. (Quesito 13º)
  - O preço era um valor aproximado, entretanto, a autora proponha o preço final ao fiscal sempre que fosse determinado. (Quesito 14º)
  - A autora propôs o preço total das alterações ordenadas pela I, Limitada, no montante de MOP$14.279.348,05. (Quesito 15º)
  - No que diz respeito às alterações ordenadas pelas duas gerentes da obra, excepto os objectos estipulados a construir no contrato, a autora materialmente construiu ainda:
  a) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tecto falso do XXXX e de XXXX;
  b) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tecto falso de XXXX;
  c) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, linhas de decorações, pintura das paredes exteriores, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tectos falsos de XXXX e XXXX;
  d) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, linhas de decorações, pintura das paredes exteriores e tectos falsos de XXXX e XXXX;
  e) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, obra de impermeabilização, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tectos falsos de XXXX , XXXX e XXXX;
  f) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, obra de impermeabilização, telhaduras de XXXX e XXXX;
  g) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, rebocos, linhas de decorações, pintura das paredes exteriores, obra de impermeabilização, telhaduras de Miami,
  h) estruturas, paredes de blocos e obra de impermeabilização de XXXX;
  i) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, rebocos, pintura das paredes exteriores do terraço e artigos de ferro;
  j) estruturas, paredes de blocos, quadros obra de impermeabilização, telhaduras, engessamento das escadas de emergência, pintura, ferragens e porta de emergência;
  k) estruturas XXXX e XXXX; e
  l) paredes de blocos, rebocos, pintura das paredes exteriores, engessamento das escadas de emergência, pintura, tecto falso, ferragens e porta de emergência do D. (Quesito 17º)
  - O prazo original da obra estipulado no contrato é de 22 de Abril de 2003 a 3 de Novembro de 2003. Porém, por causa da execução das alterações, a obra foi concluída em 15 de Junho de 2005. (Quesito 18º)
  - No dia 27 de Maio de 2005, a I, Limitada, gerente da obra, notificou várias empreiteiras incluindo a autora, exigindo que a obra seja concluída em 15 de Junho de 2005. (Quesito 19º)
  - Na execução das alterações (de 4 de Novembro de 2003 a 15 de Junho de 2005, por 1 ano e 8 meses), a autora fez ainda os trabalhos de fornecer a equipa de administração no estaleiro de forma a supervisionar a obra, proteger todos os equipamentos e outros objectos, comprar seguros de trabalhador, elaborar a garantia do cumprimento contratual, fornecer guardas, seguranças, cercas e iluminações, fornecer equipamentos de combate a incêndio e pessoais devidamente treinados para evitar o risco de rebentar incêndio na obra, eliminar lixos, fornecer cerca temporária e porta do estaleiro, escritório e respectivos equipamentos, casa de banho temporária e equipamento de conservação, água necessária, electricidade e serviços de telecomunicação, facilidades comuns, estrada temporária, projectos e limpar o estaleiro. (Quesito 20º)
  - No dia 26 de Julho de 2006, a autora e a ré chegaram a acordo preliminar relativamente ao valor da obra não pago. (Quesito 26º)
  - No dia 30 de Setembro de 2006, a autora forneceu à ré o documento 207, exigindo-lhe pagar um montante de MOP$20.593.935,14. (Quesito 29º)
  - Entretanto, a ré recusou de pagar. (Quesito 30º)
  - O defensor da autora interpelou a ré, por carta registada escrita, para pagamento. (Quesito 31º)
  - Recebendo a carta no dia 11 de Setembro de 2007 e sabendo o teor, a ré ainda não pagou. (Quesito 32º)
  - As quantias exigidas pela A. referem-se a obras que:
  a) cujo preço estava já incluído no custo original da empreitada ou de outro pedido de alteração;
  b) ou nunca obtiveram aprovação do orçamento por parte da R.;
  c) ou não se encontram devidamente documentados;
  d) ou correspondem a meros pedidos de informação. (33º)
  - Provado o que consta da resposta dada ao quesito 26º. (34º)
  - Nos termos do referido acordo a A. e a R. concordaram que o montante de MOP$7,200,000 seriam suficientes para dirimir o conflito que existia entre a A. e a R., sem prejuízo de a A. apresentar até ao dia 1 de Outubro de 2006 toda a documentação respeitante ao montante ainda em dívida. (35º)
  - Em cumprimento do referido acordo, a R. pagou a quantia acordada por meio de cheque n.º XXXX. (36º)
  - Em cumprimento do referido acordo, a R. comunicou à A., em 1 de Novembro de 2006, que dava por cessada a relação que as ligava nada mais havendo a prestar por ambas partes. (36º-A)
  - Provado o que consta das respostas dadas aos quesitos 26º, 34º, 35º, 36º e 36º-A. (37º e 38º)
  - A R. apenas aceitou pagar aquela quantia (MOP$7,200,000) como uma forma de pôr termo ao conflito. (39º)
  - A A. juntou alguns documentos que se referem a instruções que nunca foram confirmadas. (41º)
  - Nos termos do contrato sub judice a A. comprometeu-se a executar, entre muitos outros, os trabalhos de estruturas de betão armado, canalizações, sistema de esgotos, impermeabilização de todos os telhados. (42º)
  - Com vista à emissão do certificado de realização e finalização dos trabalhos, a R. realizou uma inspecção ao local da obra. (43º)
  - Nessa mesma inspecção foram detectados defeitos de obra e trabalhos inacabados. (44º)
  - Foram detectados defeitos na impermeabilização dos telhados dos diversos edifícios do complexo. (45º)
  - Entre outros, foram detectadas infiltrações de água na parede frontal da entrada do edifício L. (46º)
  - Foram igualmente detectados defeitos nas escadas e nos alçapões dos telhados de alguns edifícios. (47º)
  - Já no edifício M foram detectadas infiltrações de água nas vigas e placas de betão armado. (49º)
  - Surgiram igualmente fendas nas paredes exteriores e interiores do edifício as quais provocaram infiltrações de água pluviais. (51º)
  - Foram também detectadas infiltrações de água através da membrana de impermeabilização dos telhados. (52º)
  - Provocadas pela insuficiente sobreposição da membrana de impermeabilização entre a parede vertical e o telhado alcatroado. (53º)
  - Com efeito, os problemas com as infiltrações de água resultaram da falha na execução dos trabalhos de alvenaria, armação de telhados, colocação de telhas, entre outros. (54º e 55º)
  - Os defeitos foram prontamente comunicados à A., quer verbalmente quer por forma escrita, conforme documentos que se juntam sob a designação de docs. 100 a 103, e cujo teor se dão aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos. (56º)
  - A A., assumindo a responsabilidade por alguns dos defeitos detectados, procedeu à sua imediata reparação. (57º)
  - A partir de determinada altura, a A. recusou-se a reparar os defeitos prontamente denunciados. (58º)
  - Isto apesar das inúmeras e repetidas insistências da R. junto da A. (59º)
  - A partir de Janeiro de 2007, a A. deixou de fazer quaisquer reparações. (60º, 61º e 62º)
  - E para reduzir na medida do possível os prejuízos decorrentes da conduta supra descrita, a R. viu-se forçada a recorrer aos serviços de empresas externas e estranhas ao contrato de empreitada em questão para proceder à reparação dos defeitos ora descritos. (63º)
  - Para esse efeito contratou a “J Limited” para proceder à reparação dos defeitos de impermeabilização no Edifício L. (64º)
  - Sendo que os serviços prestados pela referida empresa ascenderam à quantia de MOP$40,000. (65º)
  - Para proceder à reparação dos defeitos de impermeabilização no Edifício M a R. recorreu aos serviços da “K Ltd”. (67º)
  - Os serviços desta empresa ascenderam ao montante de MOP$422,022.28. (28º)
  - Por sua vez, a reparação dos defeitos de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F foi orçada pela própria A. em MOP$6,661,000, conforme documento que se junta sob a designação de doc. 106 e 107. (72º)
  - A R. despendeu as quantias referidas nas respostas dadas aos quesitos 65ºe 68º. (74º)
  - A execução dos trabalhos levados a cabo pela A. originou para a R. prejuízos materiais. (75º)
  - Provado o que consta do teor da cláusula 52 (1) das condições gerais do contrato. (78º)
  - Foi publicada pela A. uma notícia num jornal local de grande tiragem dando conta de que a R. não cumpriu as suas obrigações decorrentes do contrato que havia celebrado com a A., nomeadamente, que não haveria pago todas as quantias a que estaria obrigada, e que a A. havia sido forçada a intentar a competente acção judicial. (80º)
    
    III – FUNDAMENTOS
    A- Recurso interlocutório
Foi interposto pela Ré B
SA um recurso interlocutório do despacho saneador, mas como a Ré ganhou a acção e viu julgado parcialmente o pedido reconvencional, não tendo recorrido da sentença – apenas o fazendo subordinadamente- aquele recurso só será conhecido se a sentença proferida não vier a ser confirmada, nos termos disposto no artigo 628º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
Razão por que passaremos ao conhecimento do recurso da sentença proferida a final.
    
    B - Recurso principal
    1. Objecto do Recurso
    O objecto do presente recurso passa pela análise das seguintes questões:
     - Não autorização de determinadas provas
    - Nulidade da sentença recorrida por violação do disposto do art. 562º n. 2 e 3 do Código de Processo Civil, por falta de especificação da interpretação e aplicação das disposições legais, sem tomar em consideração todos os factos provados, por falta de avaliação das provas, gerador do vício previsto no art. 571.°/1, b) do mesmo Código;
    - Falta de pronúncia sobre o contrato celebrado por ambas as partes, em violação do princípio de liberdade contratual e fixação livre do conteúdo dos contratos consagrado nos art. 399.° e 400.° do Código Civil;
    - Erro notório na verificação das provas;
    - Falta de pronúncia sobre determinadas questões levantadas pela recorrente, não se tendo em consideração os documentos com vista a comprovação das despesas da recorrente, pelo que, a sentença recorrida terá violado o disposto dos art. 563.°/2 e 3 e 566/1 do Código de Processo Civil, constituindo o vício previsto no art. 571º, n.º 1, d) do mesmo Código e causando a sua nulidade.
    
    2. Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 598, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem..
Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 589º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 589º).
Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.

3. Do erro na identificação da A., ora recorrente
    A recorrente vem invocar nesta sede de recurso o erro na designação da mesma.
    Nesse sentido, afirma que vem erradamente identificada como "A, Limitada", quando oportunamente terá informado o Tribunal que a sociedade procedeu à alteração da sua firma para A, Limitada, requerendo a rectificação em conformidade.
    Nos termos do artigo 570°, n.º l do Código de Processo Civil, "Se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz."
    Trata-se, pois, de um lapso material passível até de rectificação oficiosa, o que não se deixa de determinar nesta fase, não resultando nenhuma dúvida quanto à identidade daquela (cfr. fls 2998 vol. 15).

4. Falta de provas
    Alega a A., recorrente, que o tribunal a quo não autorizou o depoimento do administrador da recorrente, violando o disposto do art. 478.°/2, 1ª parte do Código de Processo Civil; o tribunal a quo também não autorizou o requerimento pela recorrente das provas periciais para verificação das despesas de obra que a recorrida deve pagar, designadamente as de funcionamento, violando o disposto do art. 490.° e seguintes do Código de Processo Civil.
    Nos artigos 581º e 584º do Código de Processo Civil de Macau, estabelece-se o princípio geral da admissibilidade de recurso das sentenças e dos despachos judiciais, sempre que a irrecorribilidade não esteja prevista na lei e o certo é que, não tendo a recorrente interposto recurso dos despachos de não admissão de tais provas, mostra-se precludido o direito à produção dessas provas.
    Termos, pois, que as decisões em causa deverão ser dadas como transitadas em julgado, de nada servindo agora a impugnação suscitada.
     Improcede, pois, o recurso nessa parte.

5. Do julgamento e reapreciação da matéria de facto
    5.1. Para que este tribunal possa reapreciar a matéria de facto, dispõe o artigo 599.° n.º 1 do Código de Processo Civil que, quando impugne a decisão de facto, cabe ao recorrente especificar, sob pena de rejeição do recurso:
    “a) Quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados;
    b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo nele realizado, que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida.”
    Lendo e relendo as alegações de recurso apresentadas pela recorrente, não resulta nenhum ponto em concreto, nenhuma contradição, incompleição, insuficiência, detalhe probatório apto a corroborar a tese de erro de julgamento, a partir dos quais se possa dizer que esta prova não permite determinada conclusão, que aquela prova é desmentida por outra, nenhuma incoerência específica, nem nenhum facto que tenta sido apontado como tendo sido incorrectamente julgado no aresto posto em crise.
    A recorrente limita-se a suscitar generalidades e afirmações conclusivas, pelo que não é possível a este Tribunal ir analisar e rever as provas de forma a poder tirar outras ilações factuais.
    A recorrente não indica documentos ou testemunhas ou respectivos excertos donde se retira o que foi por si sustentado, pelo que não é possível esgrimir contra meros moinhos de vento.
     5.2. Vejamos a concretização desta falta de especificação.
Diz a recorrente que a despesa preliminar é independente do custo de construção, pelo que existe erro na apreciação de prova quando a decisão recorrida indicou que a recorrida já pagou todo o valor.
Para tanto limita-se a invocar uma prova pericial que devia ter sido produzida e não o foi.
     5.3. Noutro passo afirma:
“22. De acordo com o quadro/regime fixado no contrato, a recorrente situa-se numa posição passiva. Se não executar, viola o contrato; após a execução, precisa ainda de aguardar a estimação e a prestação da recorrida.”
    Não concretiza qual o enquadramento que devia ser feito. Sendo o contrato celebrado pelas partes um contrato extenso, devia indicar cláusulas a que se refere e, seguidamente, demonstrar que provas foram apresentadas para demonstrar um cumprimento ou incumprimento de uma das partes.
    Provas essas que não são de alguma forma escassas, espraiando-se o processo por 37 volumes, a maior parte deles, prova documental, não se compreendendo que perante tal acervo a parte venha agora dizer que a interpretação dos factos e do contrato devia ser outra sem concretizar, sem dizer porquê, limitando-se a meras generalidades.
     Para além de não concretizar quais os documentos, excertos e passagens que motivariam uma outra convicção, repare-se que a recorrente não aponta uma única testemunha ou passagem do seu depoimento em que possa basear a sua discordância. Ora, perante isso, este tribunal nada pode fazer.
     5.4. Ainda neste particular, a recorrente limita-se a invocar o seguinte:
    “24. A decisão recorrida não ponderou o disposto especial no contrato celebrado entre as partes.
    25. Deste modo, aparece uma questão de prova: não é a recorrente que prova quais projectos foram executados por ela e quanto dinheiro ela gastou, visto que, no período da obra, executava as ordens sempre que as recebeu e já apresentava o impresso de preços, durante tanto tempo, a gerente da obra, nomeada pela recorrida, sabia completamente se a recorrente as executou ou não; por outro lado, o pagamento foi realizado após ser feita a estimação pelo fiscal nomeado pela recorrida, pelo que, o dever recai sobre a recorrida e a recorrente não tem responsabilidade.”
    
    A confusão é de tal ordem por parte da recorrente que é a própria recorrida que chama até a atenção para o facto de terem sido juntos documentos que se referem a outras obras que efectuou para outro dono da obra que não a recorrida, designadamente para a construção do casino XXXX,

    5.5. As apontadas insuficiências impedem a reapreciação da matéria de facto. É neste sentido que se tem pronunciado a Jurisprudência dos Tribunais de Macau.1
    O não cumprimento do ónus de especificação dos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo nele realizado que impunham sobre esses pontos da matéria de facto decisão diversa da recorrida têm como consequência necessária a rejeição do recurso, tal como flui do artigo 599°, n.º 1, in fine do Código do Processo Civil.

6. Da alegada falta de fundamentação
    6.1. Vem a recorrente queixar-se, nesta sede de recurso, que a sentença recorrida peca por falta de fundamentação, desde logo decorrente do facto de não se terem relacionado os factos provados com as respectivas normas.
    Com todo o respeito continua aqui a recorrente a incorrer no mesmo pecado já acima apontado, deixando também ela de fundamentar a falta de fundamentação imputada à douta sentença, já que se limita a concluir com a mera alegação de falta de fundamentação, sem concretizar em que conclusões não se suportou a sentença nos factos dados como provados.
    Fica-se sem saber o que é que não está fundamentado, ficando-se apenas a saber que a recorrente pretendia outro resultado, qual fosse o da condenação da ré.
    Na verdade, o Tribunal a quo, na apreciação dos pedidos formulados pela autora, não se limitou a indicar os factos em que se suportou, na sequência do julgamento de facto produzido, mas deixou ainda claro que considerou que a ré cumpriu os pagamentos e que não estava em dívida o que vinha reclamado.
    
    6.2. A matéria de facto dada como provada suporta bem a tese do tribunal.
    Não obstante a existência de um facto provado como o do artigo 33º -
    “As quantias exigidas referem-se a obras que:
    a) Cujo preço estava já incluído no custo original da empreitada ou de outro pedido de alteração.
    b) Ou nunca obtiveram aprovação do orçamento por parte da Ré.
    c) Ou não se encontram devidamente documentadas.
    d) Ou correspondem a meros pedidos de informação.” -,
    o Mmo Juiz não deixou de ir mais longe e consignou:
    
    “De acordo com os autos, a autora e a ré celebraram um contrato por escrito, a primeira concordou que executaria uma série de obras no terreno do projecto de exploração da ré e a última aceitou que pagaria o preço da obra conforme a disposição do contrato.
     A autora apontou que, no período da obra, por causa da execução das ordens (de alteração) das gerentes da obra nomeadas pela ré, acresceu muito o custo, assim sendo, exigiu à ré pagar as custas decorrentes das alterações, incluindo a custa de construção, a despesa preliminar e os danos monetários gerados pela execução das ordens de alteração.
     De acordo com os art.ºs 1133.º e 1134.º do Código Civil, empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço. O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela.
     Antes de mais, deixando ao lado se a autora tem o direito a demandar da ré essa quantia, é verdadeiro que as partes celebraram um acordo por escrito aos 26 de Julho de 2006 a fim de resolver a questão da dívida da obra, conforme o qual a autora aceitou receber no primeiro um montante de MOP$7,200,000 e entregaria à ré o impresso do valor da obra não calculado e os documentos comprovativos antes de 1 de Outubro de 2006, senão, considerar-se-ia como a última prestação de toda a obra esse montante de MOP$7,200,000 e a autora não teria direito a requerer da ré qualquer outro pagamento.
     Entendo que a situação referida se pode ver como modificação da dívida, cujo teor está em conformidade com a vontade das partes. A ré já cumpriu pontualmente a prestação acordada, pelo que podemos confirmar que a relação jurídica estabelecida entre as partes se extinguiu no dia 1 de Outubro de 2006 e as partes concordaram resolver a questão da dívida da obra com esse montante de MOP$7,200,000 (vide a resposta dada ao quesito 36º-A).
     Além disso, é também provado que a autora já entregou à ré o documento 207 no dia 30 de Setembro de 2006 e tentou pedir o pagamento dum montante de MOP$20,593,935.14, mas a ré recusou.
     Embora a autora entregasse o impresso do valor da obra, não juntou a prova da dívida.
     Dispõe o art.º 399.º do Código Civil que:
     “1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste Código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.
    2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei.”
    O contrato deve ser pontualmente cumprido, o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado (vide art.º 400.º n.º 1 e art.º 752.º n.º 1 do Código Civil).
    Com base no acordo estipulado, após recebido o montante de MOP$7,200,000, a autora não tem o direito a requerer da ré a eventual dívida da obra, quer a custa de construção quer a despesa preliminar, a não ser que possa entregar à ré o impresso do valor da obra e os documentos comprovativos, o que, porém, não aconteceu.
    Pelas razões expostas, venho julgar procedente a excepção peremptória referida e absolver a ré dos 1º e 2º pedidos e respectivos pedidos complementares apresentados pela autora.
    A autora já renunciou o 3º pedido (vide a acta da audiência constante da fls. 7100), pelo que se extinguiu o processo respeitante a esse pedido e a custa decorrente da renúncia fica a cargo da autora.
    Se não se concordar que as partes chegaram a acordo relativamente à dívida, procedendo à análise a partir dum outro ângulo, entendo ainda que se deve rejeitar os pedidos de pagamento apresentados pela autora pelas razões seguintes.
    É provado que, realizados vários pagamentos, a ré já pagou à autora um montante total de MOP$76,812,755.86 (vide a alínea N) dos factos provados), o valor da obra foi somente de MOP$60,115,835.97 mais MOP$14,279,348.05 (vide as respostas dadas aos quesitos 9º e 15º), pelo que a quantia paga pela ré é superior ao valor total da obra (incluindo a custa de construção e a despesa preliminar), acresce que não se dão provados os art.ºs 10.º e 16.º dos factos constantes da base instrutória, é de entender que, excepto a quantia referida, a ré não precisou de pagar à autora qualquer outra custa, incluindo a despesa preliminar.
    Daqui se vê que, a autora já recebeu o valor da obra, cabe julgar procedente a excepção peremptória e absolver a ré dos 1º e 2º pedidos apresentados pela autora.”
    
    6.3. Sobre a falta de fundamentação a doutrina e a jurisprudência são unânimes no sentido em que o tribunal não tem que se dedicar a fundamentar todas as questões laterais ou que sejam exaustivas, devendo apenas ser qualificadas como padecendo de tal vício as que careçam totalmente de fundamentação.
    Na verdade, “[...] não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito [...]
    Por um lado, o julgador não tem que analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes; a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adoptada pelo julgador.
    Por outro lado, não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia.” 2
    Também Alberto dos Reis:
    “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada.
    O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.”3
    Esta mesma doutrina vem referenciada na Jurisprudência da RAEM. A nulidade da sentença por falta de fundamento de facto e direito só se verifica na ausência total de fundamentação4; se se tiver por deficiente ou incompleta não há nulidade.5
    
    7. Da omissão de pronúncia
    Do contrato celebrado entre a recorrente e a recorrida
    Vem ainda a recorrente afirmar que a sentença não se pronunciou sobre o contrato, pelo que violou o mesmo e, bem assim, o princípio de liberdade contratual e fixação livre do conteúdo dos contratos consagrado nos art. 399.° e 400.° do Código Civil.
    Não tem razão a recorrente, tal como resulta da transcrição acima feita.
    Só que o Mmo Juiz a quo optou por fazer referência à alteração da obrigação por efeito do acordo celebrado entre as partes.
    De todo o modo, a recorrente continua ainda aqui sem indicar as normas que impunham uma solução ou decisão diferente.
    Em todo o caso não deixa de resultar bem patente o incumprimento do contrato por banda da A., vistas as deficiências da obra sobejamente comprovadas.
    Como resulta da alínea E) dos factos assentes, no dia 23 de Abril de 2003, a autora e a ré chegaram a acordo e celebraram o «Contrato de Construção da 1ª Fase do Projecto do F », contrato complexo que extravasa até os limites de uma simples empreitada destinada ao levantamento de uma construção simples.
    A envergadura da obra, que inicialmente incluía apenas os edifícios da primeira fase da construção da Doca dos Pescadores, impôs que as partes recorressem a um modelo e estrutura contratuais próprios para grandes projectos de construção, onde a fiscalização das obras a realizar, as quantidades e os montantes efectivamente envolvidos pudessem ter um controlo, quer por parte do empreiteiro, quer por parte do dono da obra.
    Repare-se que as partes recorreram a um modelo que inclui listas de preços unitários, procedimento comum nos contratos de empreitada de obras públicas, adoptando um regime condensado nas "General Conditions of Contratct for Building Works", modelo esse que tem cariz profissional e que resulta da experiência que os profissionais do ramo foram percebendo ao longo do tempo.
    Perante esta complexidade contratual, a recorrente limita-se a dizer que não foi seguido o contrato sem dizer porquê, à revelia da matéria de facto que vem comprovada e que não se mostra abalada.
    Razão por que não se atenderá a esta alegação recursória.
    
8. Da validade do contrato
8.1. As partes nunca puseram em causa a validade ou invalidade do contrato.
    Consagra o artigo 399.° do Código Civil que “1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste Código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver”.
    Como refere a ré, ora recorrida, não se pode obstar, de acordo com o princípio da liberdade contratual, à aplicação, por importação, de um modelo contratual que as partes conheçam e se sintam à vontade em cumprir, desde que as mesmas não contendam com nenhum dispositivo com carácter imperativo da Lei da RAEM. De acordo com o contrato de empreitada celebrado, resulta bem claro, não só o escopo da empreitada, como também o papel e funções de cada um dos intervenientes (Arquitectos, Director Técnico do Projecto, Dono da Obra, Empreiteiro, Medidor Orçamentista, etc.) e o regime que se deverá adoptar, não só para aprovação de cada um dos trabalhos, como também para qualquer pedido, respectivos prazos e alternativas para resolução de eventuais litígios.
    Como se disse já, as partes tiveram, no momento da formação do contrato, o cuidado de regular com precisão todas formas de boa execução do contrato garantindo a todos os respectivos direitos no âmbito dos mesmos.
    Dada a necessidade de montar estaleiro e a necessidade de fazer face a despesas auxiliares da própria construção (escritórios, técnicos, instalações para os trabalhadores e os demais constantes da matéria provada e dada como assente), as partes estabeleceram na cláusula 6 das condições especiais do contrato, sob a epígrafe Preliminaries (ou Preliminares) que as despesas descritas no contrato incluem todas as despesas do contrato incluindo as suas variações (alterações).
    8.2. Como também ficou provado, todos os valores apresentados pela recorrente, quer relativos à construção, quer os relativos às variações foram sujeitos a avaliação dos medidores orçamentistas, que definiram as quantidades que efectivamente deveriam ser pagas à recorrente. - resposta ao quesito 13º e seguintes da Base Instrutória - sempre tendo sido seguido os termos do acordo no que respeita ao esquema de apresentação de orçamentos e confirmação das quantidades efectivamente aplicadas através de um medidor orçamentista, pelo que só os valores por estes aprovados e não impugnados é que podem ser entendidos como verdadeira dívida contratual, tal como flui da cláusula 59ª do Contrato:
    « (…)
    (4) (a) Variações ordenadas de acordo com a Cláusula 60, trabalho mostrado nos Desenhos ou descrito nas Especificações, mas não medido nas Listas de Quantidades ou a rectificação de qualquer erro nas quantidades firmes, serão estimadas de acordo com a Cláusula 61. As Quantidades Provisórias, sujeito ao parágrafo (h) desta sub-cláusula, será estimado aos valores indicados nas Listas de Quantidades.
    (b) Se a execução de trabalho em relação a qualquer item para o qual uma quantidade provisória é indicada nas Listas de Quantidades (excepto o programa de trabalho diário, se o houver) resultar na quantidade actual de trabalho executado ser substancialmente maior ou menor que a indicada nas Listas de Quantidades e se na opinião do Medidor esse aumento ou decréscimo tornar o valor para o item exorbitante ou inaplicável, o Medidor determinará um aumento ou decréscimo apropriado do valor para o item usando o valor das Listas de Quantidades como base dessa determinação e notificará conformemente o Empreiteiro.
    (5) Quando as Listas de Quantidades não estão incluídas no Contrato, a qualidade e quantidade de trabalho incluído no Valor do Contrato é considerada como sendo a que é mostrada nos Desenhos ou descrita nas Especificações. O Empreiteiro providenciará uma Tabela de Preços detalhada com quantidades aproximadas mostrando a elaboração da Proposta do Concurso. Quando qualquer quantidade provisória é incluída no Contrato pelo Dono da Obra. o item será estimado ao preço da Tabela. As Variações serão estimadas aos preços incluídos na Tabela de acordo com a Clausula 61. (…)»
    8.3. Acresce que quanto aos pedidos, importa também atentar nas obrigações que incumbiam à autora, face ao disposto na cláusula 64° do Contrato:
    “ (1) Se o Empreiteiro pretender reclamar um valor ou preço diferente do notificado pelo Medidor Orçamentista, nos termos da Cláusula 59(4)(b) ou Cláusula 61(2) ou Cláusula 84(4)(b) o Empreiteiro deverá, no prazo de 28 dias desde essa notificação, notificar por escrito a sua intenção de reclamar ao Medidor Orçamentista.»
    (2) Se o Empreiteiro pretender reclamar qualquer pagamento adicional dentro das regras previstas em qualquer Cláusula das Condições Gerais do Contrato ou Especiais (se existirem) que não as mencionadas na sub-cláusula (1) desta Cláusula o Empreiteiro deverá dentro de 28 dias sobre o evento que suscite esse aumento de pedido notificar por escrito o Medidor Orçamentista da sua intenção de reclamar e as normas do contrato em que se suportam.
    (…)
    (5) Se o Empreiteiro falhar no cumprimento das notificações nas subcláusulas (1) e (2) da presente Cláusula respeitante a qualquer reclamação, tal reclamação não será considerada.”
    Ora, o que temos é que não se invoca o cumprimento destes condicionalismos para a reclamação dos montantes que vêm peticionados pela autora.
8.4. Também assim quanto ao valor referente a despesas de construção (correspondente ao pedido de MOP$5,232,820.16) - cfr. art. 87° da petição, não se alcança que factos possam consubstanciar. Cabia-lhe, pois, alegar e provar os factos constitutivos do direito que alega, designadamente a referência ao contrato constitutivo da obrigação, o valor a pagar nos termos do contrato, quando é que os medidores orçamentistas aprovaram esse crédito, a data do vencimento da dívida, a data da emissão da correspondente factura e respectiva apresentação para pagamento, a data da constituição em mora, se esse fosse o caso.
Ressalta de todo este procedimento e dos valores extra peticionados que eles deviam ser aprovados pelo técnico orçamentista e pela própria ré, factualidade que não se mostra comprovada.
8.5. No que importa à comprovação desses valores, resulta o seguinte:
A partir do dia 16 de Julho de 2003 até ao dia 31 de Dezembro de 2006, a Ré pagou à Autora, em 26 vezes e por cheque, na quantia total de Mop$76,812,755.86 (N).
Conforme consta do referido acordo, a ré comprometeu-se a pagar à autora uma quantia de MOP$7.200.000,00 até finais de Julho de 2006 (O).
Na realidade, a Ré pagou a referida quantia em 22 de Julho de 2006. (cfr doc. 2406) (P).
A Autora comunicou ao medidor orçamentista o valor fixo das despesas de construção, no valor de Mop$56,729, 980.79 (quesito 7º)..
Na altura, em resultado da estimativa pelo medidor orçamentista procedeu à avaliação apurando o valor de MOP$3,385,855,18. (quesito 8º).
As quantias exigidas referem-se a obras que:
a) Cujo preço estava já incluído no custo original da empreitada ou de outro pedido de alteração.
b) Ou nunca obtiveram aprovação do orçamento por parte da Ré.
c) Ou não se encontram devidamente documentadas.
d) Ou correspondem a meros pedidos de informação. (quesito 33º).
Não se comprovam outros valores.
8.6. Também no que respeita a despesas preliminares, a autora veio reclamar despesas como se não houvesse regras preestabelecidas sobre a oportunidade e a forma como deviam ser apresentadas e documentadas, estabelecendo uma proporção de 1:4 sem qualquer base legal ou contratual que enquadrasse a génese dessa obrigação. Daí que tenha alegado:
«78. A Autora realizou as 64 instruções de alterações da Gerente do Projecto. G Lda., sobre as quais a Autora apresentou ao medidor orçamentista o valor fixo das despesas de construção de Mop$56,729,980.79. Calcula-se à proporção, as despesas preliminares serão de Mop$14,182,495.19.
79. A Autora realizou as 352 instruções de alterações da Gerente do Projecto, Civil Engineering Consultants Co. Limited, sobre as quais a Autora apresentou ao medidor orçamentista o valor fixo das despesas de construção de Mop$14,279,348.05. Calcula-se à proporção, as despesas preliminares serão de Mop$3,569,837.01.
80. Por consequência, as despesas de construção são no valor total de Mop$77,128,690.84; e as despesas preliminares são no valor total de Mop$19,283, 362.20»
8.7. Ainda sem concretizar qual o suporte probatório, o pedido inicial de MOP$14,366,477.02 ampliado para MOP$17,280,102.5, não se pode retirar da amálgama de centenas de documentos que a recorrente se limita a juntar aos autos sem que lhe faça corresponder a rubrica respectiva.
Para mais se se observa que parte desses documentos são meros documentos internos (da própria A) sem referência à obra em causa, outros, meras duplicações de documentos que haviam sido sindicados pelo medidor orçamentista, e devidamente pagos e outros dizendo respeito a obras estranhas à ré.

9. Da Invocação de factos novos
    Os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento e só pode atender a factos novos nos termos em que eles sejam admissíveis de acordo com a lei processual - art. 425º do CPC.
    Vem a recorrente, nesta sede, - artigos 38º a 43º - afirmar que o acordo de 26 de Julho de 2006 constante dos autos foi assinado com determinados condicionalismos que não foram atendidos pelo Tribunal:
    “38. A recorrida não observou o contrato uma vez que exigiu à recorrente entregar prova que demonstrou o seu direito a receber a quantia.
    39. Se não assinasse o acordo, não podia até receber esse montante de MOP$7,200,000.
    40. A recorrente só podia aceitar esse montante no primeiro, e depois, demandar o valor não pago, para conservar o seu interesse.
    41. Face à situação referida, a recorrente assinou.
    42. O acordo foi elaborado por escrito pela recorrida.
    43. O conteúdo do acordo não foi provado na audiência, foi provada apenas a celebração do acordo, são duas coisas distintas. Pelo que não se pode considerar provado o conteúdo nem se dar por reproduzido para constituir um dos factos provados.”
    Para além de não se perceber bem o que a recorrente pretende dizer entre a comprovação do acordo e o conteúdo do acordo, o certo é que não pode agora introduzir factos e condicionantes que não foram atendidos, porque não alegados.
    A veracidade do acordo nunca foi posta em causa e os seus termos foram definidos pela própria recorrente, tendo sido com base nele e demais termos contratados que a autora, ora recorrente, formulou o seu pedido.
    Na verdade, comprovou-se que:
    Nos termos do referido acordo a A. e a R. concordaram que o montante de MOP$7,200,000 seriam suficientes para dirimir o conflito que existia entre a A. e a R., sem prejuízo de a A. apresentar até ao dia 1 de Outubro de 2006 toda a documentação respeitante ao montante ainda em divida.
    Em cumprimento do referido acordo, a R. pagou a quantia acordada por meio de cheque n.º XXXX.
    A R. apenas aceitou pagar aquela quantia (MOP$7,200,000) como uma forma de pôr termo ao conflito.
    
    Neste particular falece ainda razão à recorrente.
    10. Ainda do recurso interlocutório, face à decisão do recurso final
    Dele não se conhece, pois, como já se assinalou, a decisão final, relativamente às questões aí decididas, foi proferida em benefício da aí recorrente, mostrando-se prejudicadas pela sorte dada à acção e sua confirmação nesta sede recursória.
    
    B - Do recurso subordinado
    1. O que a ré, aqui recorrente pretende é o pagamento de MOP$6.661.000,00, referente ao pagamento de indemnização pelos defeitos da impermeabilização que se verificaram nos telhados dos edifícios da F.
    
    2. Vejamos o que alega.
     Basicamente vem dizer que se comprovaram defeitos graves na execução dos trabalhos por parte da A., defeitos com a referida impermeabilização, defeitos reconhecidos expressamente naquele aresto, e que, tendo apenas a A. sido condenada no pagamento de uma parte do pedido, relativa a alguns dos defeitos, a sentença proferida omitiu esta parcela, devendo essa falta ser suprida por este Tribunal.
    Aspecto importante é a constatação pela ré, aqui recorrente, que os factos provados são os necessários e suficientes para habilitarem a uma decisão condenatória a seu contento.
    3. Actualizemos a matéria fáctica pertinente:
    - No dia 23 de Abril de 2003, a autora e a ré chegaram a acordo e celebraram em Macau o Contrato para a Construção da 1ª Fase do E de B (adiante se designado por “contrato”). (vide todo o contrato constante do documento 13, incluindo o original e a tradução chinesa reconhecida notarialmente. Para o devido efeito jurídico, o teor dos documentos dá-se aqui por integralmente reproduzido) (F)
    - Conforme as disposições do acordo, as partes convencionaram que a autora (como empreiteira) executava a obra em função dos termos gerais e especiais, contrato, impresso de tenro, lista de quantidades, impresso de preços, projectos e regulamentos. A autora executava a obra dentro do prazo fixado pelo contrato, ou do prazo definível pelo gerente de projecto nos termos do contrato. A ré (como empregadora) pagava o valor de contrato final à autora dentro do tempo determinado no contrato com observância das formalidades definidas. (vide a fls. 15 da tradução chinesa constante do documento 13) (G)
    - Conforme o contrato, a autora deve construir no E, parte do complexo de instalações de turismo e entretenimento “B”, a estrutura de 7 arquitecturas e a obra da impermeabilização do telhado. (H)
    (…)
    - No que diz respeito às alterações ordenadas pelas duas gerentes da obra, excepto os objectos estipulados a construir no contrato, a autora materialmente construiu ainda:
    a) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tecto falso do XXXX;
    b) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tecto falso de XXXX;
    c) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, linhas de decorações, pintura das paredes exteriores, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tectos falsos de XXXX e XXXX;
    d) paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, linhas de decorações, pintura das paredes exteriores e tectos falsos de XXXX e XXXX;
    e) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, obra de impermeabilização, telhaduras, engessamento, pintura das escadas de emergência e tectos falsos de XXXX, XXXX e XXXX;
    f) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, janelas, portas, rebocos, obra de impermeabilização, telhaduras de XXXX e XXXX;
    g) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, rebocos, linhas de decorações, pintura das paredes exteriores, obra de impermeabilização, telhaduras de Miami,
    h) estruturas, paredes de blocos e obra de impermeabilização de XXXX;
    i) estruturas, paredes de blocos, quadros inferiores, rebocos, pintura das paredes exteriores do terraço e artigos de ferro;
    j) estruturas, paredes de blocos, quadros obra de impermeabilização, telhaduras, engessamento das escadas de emergência, pintura, ferragens e porta de emergência;
    k) estruturas ho XXXX; e
    l) paredes de blocos, rebocos, pintura das paredes exteriores, engessamento das escadas de emergência, pintura, tecto falso, ferragens e porta de emergência do D. (Quesito 17º)
    (…)
    - Com vista à emissão do certificado de realização e finalização dos trabalhos, a R. realizou uma inspecção ao local da obra. (43º)
    - Nessa mesma inspecção foram detectados defeitos de obra e trabalhos inacabados. (44º)
    - Foram detectados defeitos na impermeabilização dos telhados dos diversos edifícios do complexo. (45º)
    - Entre outros, foram detectadas infiltrações de água na parede frontal da entrada do edifício L. (46º)
    - Foram igualmente detectados defeitos nas escadas e nos alçapões dos telhados de alguns edifícios. (47º)
    - Já no edifício M foram detectadas infiltrações de água nas vigas e placas de betão armado. (49º)
    - Surgiram igualmente fendas nas paredes exteriores e interiores do edifício as quais provocaram infiltrações de água pluviais. (51º)
    - Foram também detectadas infiltrações de água através da membrana de impermeabilização dos telhados. (52º)
    - Provocadas pela insuficiente sobreposição da membrana de impermeabilização entre a parede vertical e o telhado alcatroado. (53º)
    - Com efeito, os problemas com as infiltrações de água resultaram da falha na execução dos trabalhos de alvenaria, armação de telhados, colocação de telhas, entre outros. (54º e 55º)
    - Os defeitos foram prontamente comunicados à A., quer verbalmente quer por forma escrita, conforme documentos que se juntam sob a designação de docs. 100 a 103, e cujo teor se dão aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos. (56º)
    - A A., assumindo a responsabilidade por alguns dos defeitos detectados, procedeu à sua imediata reparação. (57º)
    - A partir de determinada altura, a A. recusou-se a reparar os defeitos prontamente denunciados. (58º)
    - Isto apesar das inúmeras e repetidas insistências da R. junto da A. (59º)
    - A partir de Janeiro de 2007, a A. deixou de fazer quaisquer reparações. (60º, 61º e 62º)
    - E para reduzir na medida do possível os prejuízos decorrentes da conduta supra descrita, a R. viu-se forçada a recorrer aos serviços de empresas externas e estranhas ao contrato de empreitada em questão para proceder à reparação dos defeitos ora descritos. (63º)
    - Para esse efeito contratou a “J Limited” para proceder à reparação dos defeitos de impermeabilização no Edifício L. (64º)
    - Sendo que os serviços prestados pela referida empresa ascenderam à quantia de MOP$40,000. (65º)
    - Para proceder à reparação dos defeitos de impermeabilização no Edifício M a R. recorreu aos serviços da “K Ltd”. (67º)
    - Os serviços desta empresa ascenderam ao montante de MOP$422,022.28. (28º)
    - Por sua vez, a reparação dos defeitos de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F foi orçada pela própria A. em MOP$6,661,000, conforme documento que se junta sob a designação de doc. 106 e 107. (72º)
    - A R. despendeu as quantias referidas nas respostas dadas aos quesitos 65ºe 68º. (74º)
    - A execução dos trabalhos levados a cabo pela A. originou para a R. prejuízos materiais. (75º)
    - Provado o que consta do teor da cláusula 52 (1) das condições gerais do contrato. (78º)
    - Foi publicada pela A. uma notícia num jornal local de grande tiragem dando conta de que a R. não cumpriu as suas obrigações decorrentes do contrato que havia celebrado com a A., nomeadamente, que não haveria pago todas as quantias a que estaria obrigada, e que a A. havia sido forçada a intentar a competente acção judicial. (80º)
    4. Vejamos agora no que se consignou na douta sentença recorrida a propósito do pedido reconvencional.
    
    “Quanto à reconvenção deduzida pela ré, dispõe o art.º 218.º n.º 2 alínea a) do Código de Processo Civil que “A reconvenção é admissível nos seguintes casos: Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa”.
     No caso, a ré alegou que a autora não concluiu devidamente a obra e a qualidade padece de vícios, portanto, pediu que seja pela autora suportada o custo de reparação já gasto.
     Bem como ensinou o Dr. José Alberto dos Reis, “A reconvenção não é obrigatória. Quando não existem os obstáculos objectivos e formais seguintes, o réu pode apresentar pedido contra o autor através da reconvenção; mas não necessariamente a título de reconvenção ou na formalidade desta. Para além desta maneira, pode também intentar acção autónoma e separadamente.” – Comentário ao Código de Processo Civil, vol. III, pág. 97.
     É provado que, embora a autora conclua a obra, existe vícios de qualidade numa parte da obra, fazendo com que a ré precise contratar outrem para reparação.
     Dispõe o art.º 787.º do Código Civil que “O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.”
     A autora não cumpriu completamente a devida responsabilidade, nem tratou da questão da infiltração com a atitude de bom pai de família, o que constitui juridicamente o incumprimento da prestação, assim sendo, a ré pode exigir ao devedor a indemnização nos termos da lei.
     Apontou o Dr. Antunes Varela em “Das obrigações em Geral”, vol. II, pág. 92, que “A sanção prioritária para o incumprimento é que a lei determina imperativamente o dever que recai sobre o devedor de pagar a indemnização ao credor, para reparar os danos causado, incluindo perdas imediatas e interesses a perder no futuro.”
     No âmbito da indemnização dos danos, dispõe o art.º 560.º n.º 1 do Código Civil que “A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível.”
     É provado que existe problema de qualidade numa parte da obra e é grave a infiltração, fazendo com que a ré precise contratar outrem para reparação. Já gastou um montante de MOP$462,022.28, que deve ser suportado pela autora.
    *
     Em termos da indemnização dos danos não patrimoniais, como não se dão provados os factos constituinte da causa, faltando o fundamento de facto, é de rejeitar o pedido da indemnização dos danos não patrimoniais (reconvenção) da ré.”
    
    5. Daqui podemos ver que não houve lapso na sentença recorrida.
    Houve a preocupação de ressarcir a ré das despesas efectuadas com a reparação dos defeitos detectados.
    Em relação à verba que está em causa, sabemos apenas que a reparação foi orçada em MOP$6.661.000,00, o que é diferente de a ré ter despendido essa quantia. Uma coisa é o orçamento para os trabalhos de reparação e outra é a efectivação dessa despesa.
    Tanto assim que no acórdão da matéria de facto se explicita que a ré suportou as despesas mencionadas nas respostas aos quesitos 65º e 68º - resposta ao quesito 74º -, onde não se inclui a apontada verba.
    Digamos que, neste particular aspecto, está comprovado o dano, resultando do defeito grave da construção e da execução da obra, a ilicitude, resultante do incumprimento contratual e da falta de execução normal e prudente das referidas regras da engenharia pertinentes, o nexo causal entre esta actuação e os danos havidos com a impermeabilização, apesar de ainda não se ter apurado o montante do prejuízo.
    Não se comprova o montante que a ré despendeu para sanar tais defeitos, pois que existe apenas um orçamento sobre os mesmos.
    Nesta conformidade não andou bem a ré em pretender desde já que a autora fosse condenada num montante que ainda está apenas no campo da previsão.
    Não obstante, entende-se por bem, estando apenas em causa a quantificação do montante, entende-se por bem condenar a autora a pagar à ré a quantia que se venha a liquidar em execução de sentença, ao abrigo do disposto no artigo 564º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
    Tudo visto, resta decidir.
    
    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso principal, confirmando a decisão recorrida e, concedendo parcial provimento ao recurso subordinado da A., revoga-se parcialmente o decidido no respeitante ao pedido reconvencional, condenando a A. a pagar à Ré no que se venha a liquidar em execução de sentença, referente aos defeitos das obras de impermeabilização nos telhados dos edifícios da F, no mais se mantendo o decidido.
    Não se conhece do recurso interlocutório, face à sorte do recurso final, nos termos vistos.
    Averbe-se a rectificação do nome da A., passando a sua referência na sentença recorrida a ser A, Limitada.
    Custas pela recorrente no recurso principal.
    Custas no recurso subordinado na proporção de 2/5 para a Ré e 3/5 para a A.
    Sem custas o recurso interlocutório.
Macau, 19 Junho de 2014,
Joao A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
Jose Cândido de Pinho
1 - Entre outros, Ac. do TSI, proc. n.º 283/2003, de 25/03/2004 e proc. n.º 977/2009, de 15/4/2010
2 - Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed., pág. 687
3 - Código do Processo Civil Anotado, V, 140
4 - Ac. do TSI, de 13/7/2000, PROC. 24/2000
5 - Ac. do TUI, de 14/7/2004, proc. 21/2004 e deste TSI, proc. n.º 662/2009, de 27/10/10
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725/2010 71/71