Processo n.º 294/2014 Data do acórdão: 2014-6-19 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– condução em estado de embriaguez
– antecedentes criminais
– prática de novo crime dentro do período da pena suspensa
– pena de prisão efectiva
– inibição efectiva de condução
– medida da pena
– art.º 44.º, n.º 1, do Código Penal
– art.º 48.º, n.º 1, do Código Penal
– art.º 109.º, n.º 1, da Lei do Trânsito Rodoviário
– lógica decisória
S U M Á R I O
1. Não se pode substituir pela multa a pena de prisão do recorrente, porque há que prevenir este arguido – que não só não é delinquente primário, como tem também já diversos antecedentes criminais – do cometimento de novo delito no futuro (cfr. o critério material vertido no art.º 44.º, n.º 1, do Código Penal).
2. Nem se pode mandar suspender, em sede do art.º 48.º, n.º 1, do Código Penal, a execução da pena de prisão dele, porquanto este, para além de ter experimentado já uma pena de prisão suspensa, por um crime de condução em estado de embriaguez num processo penal anterior, veio cometer nesta vez o mesmo tipo de crime doloso ainda dentro do pleno período da suspensão da execução da pena única por que tinha ficado condenado num outro processo.
3. Não obstante ter sido condenado na sanção de inibição, suspensa, de condução naquele primeiro referido processo, o arguido voltou a cometer um mesmo tipo legal de crime de condução em estado de embriaguez, pelo que atendendo às prementes exigências de prevenção especial desse crime, é inviável mandar suspender-lhe nesta vez a sanção de inibição de condução à luz do art.º 109.º, n.º 1, da Lei do Trânsito Rodoviário, até porque em termos da lógica decisória falando, como o recorrente tem que cumprir agora a pena de prisão pelo crime de condução em estado de embriaguez, já não se justifica formular um juízo favorável à suspensão da execução da inibição de condução, aplicada ao mesmo crime.
4. Aos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do Código Penal, a sanção de dois anos de inibição de condução por que vinha condenado o recorrente na sentença recorrida, dentro da correspondente moldura legal de um até três anos de inibição, não é nada de exagerada.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 294/2014
(Autos de recurso penal)
Arguido recorrente: a
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 22 a 24 dos autos de Processo Sumário n.° CR4-14-0063-PSM do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base que o condenou como autor material de um crime consumado de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 90.º, n.º 1, da Lei n.º 3/2007, de 7 de Maio (isto é, Lei do Trânsito Rodoviário), na pena de cinco meses de prisão efectiva, com inibição de condução por dois anos, veio o arguido a, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando ao Tribunal sentenciador, em geral, o excesso na medida da pena, para rogar concretamente – com base nas sobretudo alegadas circunstâncias da sua confissão integral e sem reservas dos factos, com demonstração do profundo arrependimento e promessa de não cometimento de novo delito no futuro, por um lado, e, por outro, nas suas condições pessoais, familiares e profissionais – a substituição da pena de prisão pela pena de multa nos termos do art.º 44.º, n.º 1, do Código Penal (CP), ou, pelo menos, a suspensão da execução da pena de prisão em sede do art.º 48.º, n.º 1, do CP, para além de pretender a suspensão da execução da sanção de inibição de condução ao abrigo do art.º 109.º, n.º 1, da LTR, ou, pelo menos, a redução do período dessa inibição para tão-só um ano (cfr. com mais detalhes, o teor da motivação de recurso, apresentada a fls. 37 a 43 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu (a fls. 53 a 55 dos autos) a Digna Delegada do Procurador, no sentido de manifesta improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 87 a 88v), pugnando também pela evidente improcedência do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto descrita como provada no texto da decisão recorrida (sendo certo que o recorrente confessou, na audiência de julgamento realizada perante o Tribunal recorrido, integralmente e sem reservas os factos imputados), é de tomá-la como fundamentação fáctica do presente aresto recurso, sob aval do art.o 631.o, n.o 6, do Código de Processo Civil, ex vi do art.o 4.o do Código de Processo Penal.
Segundo essa mesma factualidade provada, e na parte que ora interessa à solução do recurso:
– em 20 de Março de 2014, cerca das 05:41 horas, o pessoal do Corpo de Polícia de Segurança Pública mandou parar, para investigação, um veículo automóvel na altura conduzido pelo arguido, na sequência do que descobriu, através do teste de alcoolemia por sopro, que este apresentou 1,22 gramas de álcool por litro de sangue;
– a pedido do arguido, foi subsequentemente feito o teste hospitalar de alcoolemia, o qual veio relevar que o arguido apresentou 1,51 gramas de álcool por litro de sangue;
– o arguido tem por habilitações literárias o 3.º ano do ensino secundário complementar, declara trabalhar como agente de relações públicas em casino, com trinta e três mil patacas de rendimento mensal, e com uma filha menor a cargo conjunto dele e da sua esposa, também trabalhadora;
– o arguido tem seguintes antecedentes criminais:
– chegou a ser condenado em 6 de Dezembro de 2002, no Processo outrora n.º PCC-055-02-5, por um crime de ofensa simples à integridade física, na pena de 15 dias de multa, à quantia diária de cinquenta patacas, tendo essa paga sido paga;
– chegou a ser condenado em 12 de Maio de 2009, no Processo n.º CR2-09-0141-PSM, por um crime de condução em estado de embriaguez, na pena de cinco meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, para além da sanção de inibição de condução por um ano, suspensa na sua execução por um ano, tendo a punição já sido declarada extinta em 24 de Janeiro de 2013;
– chegou a ser condenado em 31 de Maio de 2010, no Processo n.º CR2-08-0620-PCS, por um crime de fuga à responsabilidade, na pena de 50 dias de multa, à quantia diária de cem patacas, para além da inibição de condução por dois meses, tendo a multa sido paga em 21 de Outubro de 2010;
– e chegou a ser condenado em 9 de Janeiro de 2013, no Processo n.º CR1-11-0066-PCC, por um crime de abuso de confiança e um crime de simulação de crime, na pena única de um ano e nove meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, tendo essa decisão condenatória transitado em julgado em 22 de Fevereiro de 2013.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, vê-se que o recorrente sindicou do mérito da decisão recorrida no tangente à problemática da medida da pena.
Entretanto, perante os elementos pertinentes acima referidos na parte II do presente acórdão de recurso, realiza este Tribunal de recurso que:
– desde já, não se pode substituir pela multa a pena de prisão por que vinha condenado o recorrente nesta vez, porque há que prevenir este arguido – que não só não é delinquente primário, como tem também já diversos antecedentes criminais – do cometimento de novo delito no futuro (cfr. o critério material na questão de decisão de substituição, ou não, da pena de prisão por multa, vertido no art.º 44.º, n.º 1, do CP);
– de igual modo, tem que naufragar a subsidiariamente rogada suspensão da execução da pena de prisão, porquanto o recorrente, para além de ter experimentado já uma pena de prisão suspensa, por um crime de condução em estado de embriaguez no outrora Processo n.º CR2-09-0141-PSM, veio cometer nesta vez o mesmo tipo de crime doloso ainda dentro do pleno período da suspensão da execução da pena única por que tinha ficado condenado no último dos seus anteriores processos penais (com o n.º CR1-11-0066-PCC), de maneira que é impensável formular agora qualquer juízo de prognose favorável em sede do art.º 48.º, n.º 1, do CP;
– não obstante ter sido condenado na sanção de inibição, suspensa, de condução no acima referido Processo n.º CR2-09-0141-PSM, o arguido voltou a cometer um mesmo tipo legal de crime de condução em estado de embriaguez, pelo que atendendo às prementes exigências de prevenção especial desse crime, é de todo em todo inviável mandar suspender-lhe nesta vez a sanção de inibição de condução à luz do art.º 109.º, n.º 1, da LTR, até porque em termos da lógica decisória falando, como o recorrente tem que cumprir agora a pena de prisão pela prática do crime de condução em estado de embriaguez, já não se justifica formular um juízo favorável à suspensão da execução da inibição de condução, aplicada ao mesmo crime;
– por fim, aos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do CP, a sanção de dois anos de inibição de condução por que vinha condenado o recorrente na sentença recorrida, dentro da correspondente moldura legal de um até três anos de inibição, não é nada de exagerada, tendo também sobretudo em ponderação as já mencionadas necessidades prementes da prevenção especial (pois o arguido já não é delinquente primário na prática do crime de condução em estado de embriaguez), com a agravante de que são elevadas as exigências da prevenção geral do mesmo tipo de crime (o que, aliás, sustenta também a justeza da pena de prisão achada na decisão recorrida).
Em síntese, improcede o recurso, sem mais indagação por desnecessária.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar improcedente o recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com dez UC de taxa de justiça.
Comunique ao Processo n.º CR1-11-0066-PCC, para os efeitos tidos por convenientes.
O presente acórdão é irrecorrível nos termos do art.º 390.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal.
Macau, 19 de Junho de 2014.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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