打印全文
Processo nº 236/2012
(Recurso Jurisdicional)

Relator: João Gil de Oliveira
Data: 10/Julho/2014

Assuntos:

- Falta de fundamentação
- Adesão aos fundamentos do parecer do MP
- RAEM como contra-interessada em acto punitivo praticado por um dos seus órgãos
- Licença provisória e deferimento tácito no desenvolvimento de actividade industrial


SUMÁRIO:

1. Não se configura a nulidade a que se refere a alínea b) do n.º 1 do art. 571.º do Código de Processo Civil (falta de fundamentos de facto e de direito), pois se tem entendido, generalizadamente, que apenas a total omissão de fundamentos constitui a falada nulidade de sentença e não já a deficiente fundamentação.

2. Não se aplica ao caso o disposto no art. 108º, n.º 2 do CPC - a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição - na medida em que o parecer do MP não configura nem requerimento nem oposição, entendidas estas como partes no processo.
3. Nem se vê como pudesse a RAEM defender a não aplicação da multa que ela aplicou através dos seus órgãos e ao mesmo tempo defendesse a existência de uma licença que noutro passo desconsiderou. Isso é que não faria sentido, não se verificando os pressupostos para que interviesse como contra interessada, face ao disposto no artigo 39º do CPAC.

4. Uma licença provisória de actividade industrial caduca no termo do prazo para que é concedido e com ela caduca a licença provisória da unidade industrial. Sem esta, não há deferimento tácito em relação ao pedido de licenciamento de actividade industrial
    

O Relator,













Processo n.º 236/2012
(Recurso Jurisdicional)

Data : 10 de Julho de 2014

RECORRENTE :
Recurso Principal
Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda.

Recurso Interlocutório
Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda.


ENTIDADE RECORRIDA :
Director dos Serviços de Economia

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    1.1. A Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda., ora recorrente no processo acima referido, mais bem identificada nos autos, notificada do despacho, de 21 de Dezembro de 2010, do MM.º Juiz, constante de fls. 398 dos autos, no qual se afirmou que a RAEM não tinha legitimidade para intervir, na qualidade de contra-interessada, no presente recurso, dele recorreu oportunamente, alegando, em síntese:
1. Nos termos do art.º 1º do Código de Processo Administrativo Contencioso, com a aplicação subsidiária do art.º 108º, art.º 562º e alínea b) do n.º 1 do art.º 571º do Código de Processo Civil, o despacho recorrido, como uma sentença, é sempre fundamentado e não pode ser proferido com base na simples concordância com o parecer do Ministério Público. Por conseguinte, o despacho recorrido violou a disposição legal supracitada por carência de fundamentação, resultando a nulidade do mesmo.
2. A estrutura da sentença abrange praticamente relatório, fundamentação e decisão.
3. A sentença compõe-se de relatório, fundamentos e decisão. No relatório a sentença começará por identificar as partes e o objecto do litígio, fixando as questões que ao tribunal cumpre solucionar (n.º 1 do art.º 562º do Código de Processo Civil). Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes (n.º 2 do art.º 562º do Código de Processo Civil). Concluirá pela decisão final. O mesmo acórdão, após recordar que a doutrina considera que “Não se pode considerar fundamentação de direito a que seja feita por simples adesão genérica aos fundamentos invocados pelas partes”, invocando para tal a norma semelhante ao n.º 2 do art.º 108º, atinente ao dever dos magistrados fundamentarem a decisão, de acordo com o qual “A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição”, decidiu que não constitui a nulidade a que se refere a alínea b) do n.º 1 do art.º 571º a fundamentação jurídica por remissão para parecer do Magistrado do Ministério Público, proferido nos termos do art.º 69º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
4. O parecer do MºPº, constante de fls. 396-397 dos autos, não está na situação referida no art.º 69º do Código de Processo Administrativo Contencioso, mas sim na situação vedada pelo n.º 2 do art.º 58º do mesmo Código, pelo que não se constitui a excepção da nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 571º.
5. Nos termos do art.º 39º do Código de Processo Administrativo Contencioso, a concepção do contra-interessado consiste em: “Têm legitimidade para intervir no processo como contra-interessados, as pessoas a quem o provimento do recurso possa directamente prejudicar”.
6. Basta fazer uma leitura pormenorizada da petição inicial, verifica-se que o provimento do recurso possa directamente prejudicar a RAEM, pelo que a RAEM é a interessada directa, tendo legitimidade para intervir no processo.
7. Nos termos do art.º 155º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, o recurso que suba imediatamente tem efeito suspensivo.
8. Os “recursos que sobem imediatamente” são previstos no art.º 601º do Código de Processo Civil, sendo condensadas as situações abrangidas pelos n.ºs 1 e 2 do art.º 601º como recursos que sobem imediatamente.
9. A não citação da RAEM para intervir no processo como contra-interessada causa termo do processo judicial existente entre a RAEM e a recorrente, pelo que o recurso interposto contra o despacho recorrido corresponde à situação, prevista na alínea a) do n.º 1 do art.º 601º do Código de Processo Civil, e, em consequência, ao qual deve fixar-se o efeito contencioso de subida imediata e efeito suspensivo.
10. Se não entender assim, deve considerar-se que, por força do art.º 601º, n.º 2 do Código de Processo Civil, a retenção torna absolutamente inúteis os recursos, pelo que estes sobem imediatamente; e, nos termos do art.º 155º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso e art.º 607º, n.º 1 do Código de Processo Civil, o recurso que suba imediatamente tem efeito suspensivo da decisão.

Pelo exposto, vem requerer se admita o presente recurso, se julgue procedente o recurso interposto pela recorrente, declare anulada/revogada a decisão recorrida, por se verificarem os vícios supramencionados no despacho recorrido e se declare que o Governo da RAEM tenha legitimidade de intervir no processo como contra-interessado.
    
    1.2. O Exmo Senhor Director dos Serviços de Economia pugna pela improcedência do recurso, nos termos da peça junta a fla 442 e segs dos autos.
    
    2.1. COMPANHIA DE CONSTRUÇÃO E OBRAS DE ENGENHARIA A LDA A國際有限公司, tendo sido admitido o recurso por si interposto contra a douta sentença que julgou improcedente o recurso contencioso do despacho do Exmo Senhor Director dos Serviços de Economia que indeferiu seu recurso hierárquico necessário da aplicação de multa de 30.000,00 e encerramento da actividade industrial, vem apresentar as suas alegações, alegando em síntese conclusiva:
    
1ª - O processo penal administrativo em que o acto punitivo foi proferido foi instaurado em 2005 contra a COMPANHIA DE BETÃO B LDA por suspeita de actividade ilegal dos Factos fixados na sentença recorrida vê-se que foi sempre essa pessoa jurídica quem foi encontrada a laborar no local e não a recorrente;
2ª - porém, o processo foi instruído unitariamente e no pressuposto de que aquela pessoa jurídica e a recorrente eram a mesma coisa, isto é, que cada uma dessas pessoas e actos de cada uma eram a mesma pessoa e actos da mesma pessoa:
3ª - com igual erro de facto e de direito julgou a douta sentença fixando como Facto Assente que "A Recorrente é titular da "COMPANHIA DE BETÃO B LDA" e através desta procede à fabricação de betão e outras actividades no lote "G4".", devendo consequentemente esse n.º 4 dos Factos Assentes ser declarado nulo ou revogado, por violação dos cit. arts. 184º do C. Civil e art. 176º do Cód. Comercial;
4ª - Bem como anulado deve ser o acto punitivo e revogada a sentença por assentes nesse facto falso de que 2 pessoas distintas são a mesma pessoa (ou que uma titula a outra) e em processo e facto que trata as duas pessoas e actos de cada uma delas como se fossem a mesma pessoa e actos da mesma pessoa, por erro de facto e violação dos cit arts. 184º do C. Civil e art. 176º do Cód. Comercial pois o registo comercial de cada uma delas, ambos nos autos, mostram que ambas são pessoas distintas desses preceitos por força daqueles preceitos, e nem sequer o corpo social é o mesmo;
5ª - no licenciamento industrial, o licenciamento e obras que hão-de ser sujeitas a vistoria para licença definitiva ali licença propriamente dita (arts. 31º e segs. do DL 11/99/M) são da competências da DSSOPT e respectivas normas do Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU) aprovado pela DL n.º 79/85/M, de 21 de Agosto, e legislação complementar, nomeadamente arts. 1° n° 1, 3° e segs. do cit Regulamento:
6ª - Mas no caso dos autos foi obtido imediatamente licenciamento provisório cujo regime (arts. 15° n° 2, 20°, 25° e 28° do cit DL 11/99/M, de 22/3, maxime este último) não contempla como impeditivo do licenciamento provisório tal requisito prévio das obras e licença da DSSOPT;
7ª - Essas licenças provisórias são válidas por 6 meses, findos os quais e coincidindo com tal prazo de validade é feita vistoria de licenciamento ou licença definitiva - arts. 33° e 34° do DL 11/99/M, de 22 de Março - que no presente caso não ocorreu por o licenciamento e obras a vistoriar ainda se encontrar pendente a DSSOPT e a aguardar resposta da DSSOPT ainda em 14.2.2008 (fls.78-79 do processo instrutor, tal como também fls.64-65 em de 21.8.2007 e 11.09. fls.67-68 de 15.11.2007 e 19.11, fls.75-76, de 24.01.2008 e 28.01.2008. fls.78-79 de 12.2.2008 c 14.2.200:. a fls.78-79 do processo instrutor);
8ª - Para que tal vistoria se realize antes de caducarem os 6 meses da licença, o art. 31 ° do DL 11/99/M, de 22/3, preceitua que no prazo máximo de 3 meses a contar da data de emissão da licença provisória, o seu titular deve informar a DSE, através do Modelo C, da sua disponibilidade para a realização da vistoria inicial ao estabelecimento e/ou unidade industrial em causa. Só que esse preceito não revoga nem pode revogar aqueloutros do cit DL n° 79/85/M (conclusão 5ª) e obrigar a DSSOPT a ter concluído o processo e obra a vistoriar dentro desses 3 meses tal como efectivamente a DSSOPT muito para além dos cit. 3 meses, em 19.11.2007 e 14.2.2008 (fls.68 do processo instrutor e fls.78-79, respectivamente), não tinha concluído nem consta que concluído tivesse à data do acto punitivo recorrido.
9ª - Consequentemente, não sendo peremptórios os prazos das fases do procedimento do licenciamento final industrial, por força da tramitação na DSSOPT e normas do RGCU, por maioria de razão e unidade sistemática da lei e do processo também o não podem ser quanto à alegada caducidade pelo decurso do prazo de 6 meses do licenciamento provisório (arts. 26° e 29° do DL 11/99/M) dado que este é apenas uma fase provisória ou intermédia tendo em vista o licenciamento final (arts. 31°, 33° e 34° do DL 11/99/M) num processo de licenciamento com fases e prazos sistemáticmente interligados entre si até vistoria para licenciamento final sistemáticamente tida por realizável dentro daqueles 6 meses (art. 33° n.º 3 do DL 11/99/M) mas que, como vimos, pode ser derrogada pelas normas e processo da DSSOPT (como foi o caso dos autos que, muito para lá daqueles 6 meses ainda não estava concluído).
10ª - Há pois violação por parte do acto recorrido e sentença recorrida, que não da recorrente, desses preceitos e "ratio legis" bem como vicio de violação de lei (art. 114° n° 1 e) do Cod Procedimento Administrativo), sofrendo a douta sentença, por isso também, por via de tal viciada caducidade à revelia da unidade do processo, da mesma ilegalidade do acto recorrido que ela acolheu.
11ª - Os autos provam que foi obtido licenciamento provisório industrial com validade até 06.12.2006 (como consta a fls. 52 do processo instrutor) e que a recorrente em 01.12.2006 requereu a sua renovação, isto é, requereu renovação de licença provisória em data (01.12.2006) em que usufruía de licença ainda válida (válida até 06.12.2006), não tendo havido despacho dentro de um mês, isto é, até 01.Jan.2007;
12ª - ocorreu pois deferimento tácito da sua renovação ex vi art.15º n.º 2 do DL 11/99M, de 22 de Março já que, tal como prevê esse artigo: - o pedido se reportava a espaço localizado (n° 2 al. a), do cit DL) em edifício que já funcionava de facto como industrial (já ali funcionava a industria da recorrente nos termos do licenciamento provisório), também de direito como industrial (por portadora da referida licença provisória), não se tratava de pedido enquadrável nos artigos 21 ° e 22° do mesmo DL (n° 2 al. b), do cit DL), O requerente não estava impedido do exercício daquela actividade e tanto assim que até se encontrava autorizada (nem restantes impedimentos do n.º 2 al. c), do cit DL), não se mostrar solicitado pela DSE nenhum elemento que a recorrente não tivesse acatado (n° 2 al. d), do cit DL) e não ter sofrido nenhum indeferimento nos 2 anos antecedentes (n° 2 al. e), do cit DL) pois a recorrente funcionava apenas desde que obtivera a licença provisória (art. 24° n° 3 do DL 11/99/M) nada havendo nos autos diferente disso.
13ª - Uma vez deferida tacitamente, a licença provisória existe do ponto de vista jurídico, tornando-se inócuo e nulo qualquer deferimento ou indeferimento do pedido que já está deferido e que só uma revogação expressa desse deferimento (que não o mero indeferimento de pedido já deferido) a poderá destruir, tendo a interessada a faculdade de gozar livremente o direito assim constituído devendo apenas comunicar à DSE que vai continuar a sua actividade - previsto no art. 15° n° 4 do DL 11/99/M - como sempre fez;
14ª - o acto punitivo recorrido e com ele a sentença recorrida caíram em erro de facto ao pressuporem inexistência de licença quando atinai ela existia, por tacitamente deferida, errando na aplicação de norma punitiva inaplicável por não verificado o pressuposto da falta de licença nela prevista e violando igualmente as referidas normas do art.15° n° 2 e n° 4 do DL 11/99M, de 22 de Março sobre existência de licença ex vi do deferimento tácito ali previsto.
15ª - A prova constante dos supra diversos ofícios do inquérito ou processo instrutor ao departamento emissor e a respostas deste bem como a reprodução e registo informático da mesma (fls. 50 a 52 do processo instrutor) mostram também que o processo e acto punitivo que nele assenta não sabiam ou revelam fortes dúvidas (e ignorando eles muito mais ignorava o particular arguido) sobre a subsistência ou não da regularidade da licença e datas de validade face às diferentes datas constantes nos documentos de fls. 50-51 por um lado (30.09.2006) e fls.. 52-53 por outro (06 de Dezembro de 2006);
16ª - Por isso, o acto punitivo e a sentença recorrida cairam em erro nos pressupostos de facto e violaram o princípio "in dubio pro reo", pois, para lá da nossa posição sobre a sua existência por força de deferimento tácito, nunca deviam, face à dúvida que tais elementos revelam, ter punido facto (falta de regularidade de licença) que as próprias autoridades consideraram duvidoso (a subsistência ou não da licença e actividade), devendo por consequência esta ser revogada a sentença e anulado o acto punitivo por ela mantido.
    TERMOS em que se pede a revogação da sentença recorrida e anulação do acto recorrido, com todas as legais consequências.
    
2.2. O Exmo Senhor Procurador Adjunto oferece o seguinte douto parecer:
    Nestes autos, a recorrente «Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda.» interpôs dois recursos jurisdicionais, mediante Requerimentos respectivamente de fls.400 e de fls.A62 dos autos.
*
- Do recurso interlocutório de fls.406 a 420 dos autos
    Constante de fls.406 a 420 dos autos, o 1° recurso incide no douto despacho de fls.398 que decidiu: «Concordo com o teor do parecer do M.ºP.º de fls.396 a fls.397, pelo que determino a ilegitimidade da RAEM como contra-interessada nos presentes autos».
    Note-se que face a manifesta ilegitimidade da RAEM como contra-interessada no recurso contencioso sob Processo n.º740/10-ADM e «por cautela», a Mema. Juiz do TA decidiu, no douto despacho de fls.395 dos autos, não citar o M.ºP.º, mas abrir-lhe a vista para pronunciar.
    E depois do parecer de fls.396 a 397 do M.ºP.º a mesma decretou o despacho recorrido de determinar a ilegitimidade da RAEM como contra-interessada, fundamentando-o na expressa e propositada declaração de concordância com tal parecer.
    Ensina o Venerando TUI (Acórdão no Processo n.º 1/2004): Não constitui a nulidade a que se refere a alínea b) do n.º 1 do art. 571.° do Código de Processo Civil a fundamentação jurídica por remissão para o parecer do Magistrado do Ministério Público proferido nos termos do art. 69.º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
    Em sintonia com esta jurisprudência, podemos tranquilamente te por certo que o despacho em questão não infringe o preceito na alínea b) do n.º 1 do art. 571° do CPC, que comina nulidade quando a sentença não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão
    Do despacho recorrido na parte respeitante à retenção do recurso jurisdicional, a recorrente nunca deduziu reclamação prevista no n.º 1 do art. 153° do CPAC, pelo que são absoluta e completamente irrelevantes as conclusões 7ª a 10ª das Alegações do recurso em apreço.
    A definição consignada no art. 39° do CPAC insinua que o critério que diferencia e distingue o «assistente» do «contra-interessado» reside na situação de este ter de possuir interesses directamente contrapostos ao do recorrente; a coincidência da posição com a da entidade recorrida não é suficiente - possuir interesse idêntico ou coincidente ao da entidade recorrida pode apenas conferir a qualidade de assistente.
    Tudo isto conduz forçosamenmente à improcedência do presente recurso jurisdicional.
*
- Do recurso final de fls. 474 a 491 dos autos
    Ora, as conclusões nas Alegações de fls.474 a 491 mostram que a recorrente invocou sucessivamente:
    1° - erro de facto, visto serem pessoas colectivas diferentes a recorrente e a «Companhia de Betão B, Lda.»;
    2° - violação de lei, por não ser peremptório o prazo do licenciamento provisório, cujo decurso não determina caduciade;
    3° - erro nos pressupostos de facto, violação do art. 15° n.º 2 e n.º 4 do D.L. n.º 11/99/M, e infracção ao princípio in dubio pro reo, sendo todos derivados do deferimento tácito da licença.
    1.1 - Repare-se que a recorrente «Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda.» era titular da Licença Industrial Provisória n.º C/2006 e da Licença Provisória de Unidade Industrial n.º D/2006 (docs. de fls.50 e 51 do P.A.).
    E, a recorrente «Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda.» reconheceu o facto de «敝司在上述地段開設之B混凝土有限公司,迄今已運作五年» (docs. de fls.50 e 51 do P.A., sublinhado nosso). Quer dizer que a «Companhia de Betão B, Lda.» era por si cirada.
    O que toma insubsistente o invocado erro de facto traduzido em considerarem a recorrente e a «Companhia de Betão B, Lda.» como se fossem a mesma pessoa colectiva.
    1.2 - A recorrente reconheceu que a validade da Licença Industrial Provisória n.º C/2006 terminaria em 06/12/2006, e ela pediu a renovação em 01/12/2006. O que revela que ela não observou culposamente o art. 31° do D.L. n.º 11/99/M.
    Essa conduta ilícita e culposa da recorrente não obsta à caducidade da Licença Industrial Provisória n.º C/2006 nem permitiria a presunção do deferimento tácito. Daí decorrente que não podem deixar de falecer os 2° e 3° argumentos da recorrente.
    Acresça-se que o facto alegado no art. 16° da contestação determina absolutamente inviável a presunção do deferimento tácito e inevitavelmente descabida a arguida violação do art.15° do D.L. n.º 11/99/M e do princípio in dubio pro reo.
    De outra lado, não pode perder da vista que na fase do recurso contencioso, a recorrente nunca aduziu os 2° e 3° argumentos - surgindo pela primeira vez nas Alegações do recurso jurisdicional.
    E, a existir, os quis gerariam, quanto a mais, a mera anulabilidade do acto contenciosamente impugnado, pelo que não são do conhecimento oficioso.
    Inculca o TUI incansavelmente que os recursos jurisdicionais não visam criar decisões sobre matérias novas, pelo que se a questão não foi suscitada no recurso contencioso, não se pode da mesma conhecer, a menos que se trate de matéria de conhecimento oficioso. De tudo isto nos dá conta o douto Acórdão proferido no Processo n.º 32/2008.
    Em esteira com tal jurisprudência, entendemos tranquilamente que são, por completo, irrelevantes e inócuos aqueles 2° e 3° argumentos da recorrente, não podendo os quais acarretar nenhuma invalidade à douta sentença recorrida.
*
    Por todo o exposto acima, propendemos pela total improcedência do recurso em apreço.


3. Foram colhidos os vistos legais.


    II - FACTOS
    Vêm provados os seguintes factos:

   “1. Em 7 de Fevereiro de 2005, a recorrente e a RAEM celebraram um Termo de compromisso, no qual a RAEM autorizou à recorrente a usar imediatamente o Lote G4 situado nos novos aterros, junto à Rua das Canforeiras e Rua das Árvores do Pagode em Coloane (doravante designado simplesmente por Lote “G4”), para fixação do estabelecimento de mistura de asfaltos e betões (vide fls.. 51 a 54 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   2) Na sequência do ofício n.º Of.1309/CA/2005 do Conselho do Ambiente no que respeita à poluição causada por fábrica de betões no XX e Rua das XX, o pessoal da DSE efectuou inspecção ao local em causa e detectou que a “Companhia de Betão B, Lda. (B混凝土有限公司)” andava a produzir betões e estava equipada das máquinas de produção de betões, sem qualquer documento ou licença industrial respeitante ao Lote “G4” (vide fls.. 1 a 3, 20 e 22 a 23v. do P.A.).
   3) Através da licença de ocupação do terreno a título precário n.º 91/2005, emitida a 6 de Dezembro de 2005 pela Comissão de Terras, à recorrente foi autorizada a ocupação a título precário do terreno no Lote “G4”, destinado à fixação do estabelecimento de mistura de asfaltos e betões. A aludida licença tinha o prazo de validade de 1 ano contado a partir de 6 de Dezembro de 2005, e previu que “o ocupante não poderá ampliar o edifício provisório nem alienar, locar ou sublocar a presente licença” (vide fls.. 45 a 47 do P.A.).
    Posteriormente, à recorrente foi autorizada a continuação de ocupação a título precário do Lote “G4” (vide fls.. 60 a 68 dos autos e fls.. 174 a 176 do P.A.).
   4) A recorrente é a titular da licença da “Companhia de Betão B, Lda. (B混凝土有限公司)”, explorando a actividade de produção de betões no Lote “G4” através da referida Companhia (vide fls.. 123 a 124 e 250 do P.A.).
   5) Em 3 de Janeiro de 2006, o pessoal da DSE efectuou inspecção à Rua das XX em XX em Coloane e detectou que a “Companhia de Betão B, Lda. (B混凝土有限公司)” andava a produzir betões (vide fls.. 41 e 41v. do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   6) Em 31 de Março de 2006, a DSE emitiu a licença industrial provisória n.º C/2006 à recorrente que lhe permitiu o desenvolvimento da actividade de “produção de betões e massa de vidraceiro”, sendo válida até 30 de Setembro de 2006 (vide fls.. 69 dos autos e fls.. 50 e 50v. do P.A.).
   7) No mesmo dia, a DSE também emitiu a licença provisória de unidade industrial n.º D/2006 à recorrente que lhe permitiu o desenvolvimento da actividade de “produção de betões e massa de vidraceiro” na unidade industrial no Lote “G4”, sendo válida até 30 de Setembro de 2006 (vide fls.. 70 dos autos e fls.. 51 e 51v. do P.A.).
   8) Conforme os registos informáticos da DSE, o prazo de validade das duas licenças provisórias supramencionadas foi prorrogado até 6 de Dezembro de 2006 (vide fls.. 52 a 53 do P.A.).
   9) Em 1 de Dezembro de 2006, a recorrente apresentou à DSE o pedido de renovação da licença industrial provisória n.º C/2006 (vide fls.. 55 do P.A.).
   10) Após o término do prazo de validade das supracitadas licença industrial provisória n.º C/2006 e licença provisória de unidade industrial n.º D/2006, à recorrente e à “Companhia de Betão B, Lda. (B混凝土有限公司)” nunca mais foram emitidas pela DSE quaisquer licença industrial nem licença de unidade industrial (nem mesmo a licença provisória).
   11) Finda a validade das referidas duas licenças, a recorrente continuava a exercer actividade de produção de betões no Lote “G4”.
   12) Em 28 de Maio de 2007, o pedido de renovação da licença industrial provisória da recorrente foi indeferido. Do assunto foi notificada a recorrente por meio do ofício n.º 80752/2007, de 29 de Maio de 2007 (vide fls.. 61 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   13) Em 31 de Maio de 2007, a recorrente apresentou novamente o pedido da licença industrial provisória à DSE (vide fls.. 62, 287 a 288v. do P.A.).
   14) Em 28 de Março de 2008, o Director Substituto da DSE proferiu despacho, onde se referiu que devido à actividade desenvolvida pela recorrente, sem licença industrial correspondente, no Lote “G4”, nos termos do parecer e proposta exarados a fls.. 76 do P.A., foi autorizada a instauração do processo de transgressão contra a recorrente (vide fls.. 76 e 76v. e 79 e 79v. do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   15) Em 10 de Abril de 2008, a recorrente foi notificada do processo de transgressão n.º 34/2008/DIAE/DIIC-2ªB por meio do ofício n.º 040197/2008/DIAE/DIIC-2ªB da DSE, onde se referiu que, nos termos do art.º 9º, n.º 1 e art.º 82º, al. b) do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, foi instaurado o processo de sanção administrativa contra a recorrente que exercia, sem licença industrial, actividade industrial (produção de betões) no Lote G4 na zona industrial da zona de aterros em XX em Coloane (vide fls.. 142 dos autos e fls.. 80 e 81 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   16) Em 17 de Abril de 2008, a DSE recebeu a resposta formulada pela recorrente, respeitante à instauração do processo de sanção administrativa em apreço. Na resposta, a recorrente declarou que sempre tinha dado prosseguimento ao procedimento administrativo do pedido de autorização do plano da legalização de obras de construção civil, a fim de assegurar o pedido de renovação da licença de actividade industrial (vide fls.. 82 a 108 do P.A.).
   17) Em 25 de Abril de 2008, face ao processo sancionatório instaurado contra a recorrente por ser suspeita do exercício, sem licença industrial, de actividade industrial no Lote “G4”, a DSE decidiu notificar a recorrente para efectuar a audiência escrita no prazo de 10 dias úteis (vide fls.. 109 a 110 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   18) Em 30 de Abril de 2008, por meio do ofício n.º 040226/2008/DIAE/DIIC-2ªB, a DSE notificou a recorrente para efectuar a audiência escrita no prazo de 10 dias úteis (vide fls.. 143 a 146 dos autos e fls.. 109 a 111 e 118 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   19) Em 2 de Maio de 2008, a recorrente recebeu o ofício supramencionado (vide fls.. 118 do P.A.).
   20) Em 7 de Maio de 2008, a DSE recebeu a audiência escrita da recorrente (vide fls.. 112 a 115v. do P.A.).
   21) Em 8 de Maio de 2008, o pessoal da DSE elaborou o relatório final, no qual se propôs a aplicação da multa de MOP30.000,00 à recorrente ao abrigo do art.º 82º, al. b) do Decreto-Lei n.º 11/99/M, de 22 de Março, e a imediata cessação da actividade industrial desenvolvida no Lote “G4” ao abrigo do art.º 85º, n.º 1 do mesmo Decreto-Lei, por esta ter exercido, sem licença industrial, de actividade industrial no Lote “G4” (vide fls.. 116 a 117 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   22) Em 28 de Maio de 2010, o subdirector substituto da DSE proferiu despacho, cujo conteúdo era “Concordo com a penalização proposta” (vide fls.. 117 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   23) Em 1 de Junho de 2010, através da notificação n.º 13/2010, a DSE notificou a recorrente da referida decisão punitiva, sendo ainda notificada de que podia levantar a guia de pagamento na aludida Direcção, no prazo de 10 dias contados a partir do dia seguinte ao da notificação, para efectuar o pagamento voluntário da multa, ou interpor recurso hierárquico necessário para o director da DSE no prazo de 30 dias, bem como era obrigada a imediata cessação da actividade industrial desenvolvida no Lote “G4” (vide fls.. 120 e 121 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   24) Em 15 de Junho de 2010, a recorrente recebeu a referida notificação (vide fls.. 121 do P.A.).
   25) Em 29 de Junho de 2010, os inspectores da DSE inspeccionaram o Lote “G4” e detectaram que o aludido terreno ainda era ocupado pela “Companhia de Betão B, Lda. (B混凝土有限公司)” como estabelecimento de produção de betões, havendo como equipamentos de produção duas linhas de produção com quatro tanques na totalidade, seis auto-betoneiras, armazém de cinzas de carvão, armazém de areias e pedras, armazém de líquidos químicos, sala de controlo e sala de examinação da qualidade de produtos, além disso, encontrando-se no local 3 trabalhadores que responsabilizavam pela produção de betões e 4 condutores de auto-betoneira (vide fls.. 237 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   26) Em 2 de Julho de 2010, a DSE recebeu o recurso hierárquico necessário interposto pela recorrente (vide fls.. 122 a 191 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   27) Em 3 e 4 de Agosto de 2010, os inspectores da DSE procederam à investigação no Lote “G4” e detectaram que a recorrente estava a exercer actividade de produção de betões, sendo equipada com duas linhas de produção de betões, dois escavadores e quatro auto-betoneiras estacionados no local em causa, onde se encontravam um trabalhador a usar o escavador para escavar areia e um outro trabalhador a conduzir a auto-betoneira até à linha de produção para introduzir betões (vide fls.. 244 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   28) Em 23 de Agosto de 2010, os inspectores da DSE inspeccionaram o Lote “G4” e detectaram que não era a recorrente a exercer a respectiva actividade, mas sim a “Companhia de Betão B, Lda. (B混凝土有限公司)”. Além do mais, o local em causa encontrava-se em funcionamento, várias auto-betoneiras estavam estacionadas naquele estabelecimento e nele havia já produtos acabados (vide fls.. 249 a 257 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   29) Em 30 de Agosto de 2010, o pessoal da DSE elaborou o relatório, propondo a rejeição do recurso hierárquico necessário interposto pela recorrente e a manutenção do despacho proferido em 28 de Maio de 2010 pelo subdirector daquela Direcção (vide fls.. 46 a 47 dos autos e fls.. 258 a 259 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   30) Em 31 de Agosto de 2010, o director da DSE proferiu o seguinte despacho: “Concordo com o parecer e autorizo a rejeição do recurso hierárquico necessário” (vide fls.. 47 dos autos e fls.. 259 do P.A.).
   31) Em 3 de Setembro de 2010, através da notificação n.º 29/2010, a DSE notificou a recorrente da referida decisão que rejeitou o recurso hierárquico necessário e manteve o despacho punitivo a quo, sendo ainda notificada do levantamento imediato da guia de pagamento na aludida Direcção para efectuar o pagamento voluntário da multa, bem como da imediata cessação da actividade industrial desenvolvida no Lote “G4”. Mais se indicou na notificação que a recorrente podia recorrer contenciosamente para o Tribunal Administrativo no prazo de 30 dias (vide fls.. 45 e 45v. dos autos e fls.. 260, 260v. e 265 do P.A., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
   32) Em 15 de Setembro de 2010, a recorrente recebeu a supracitada notificação (vide fls.. 265 do P.A.).
   33) Em 14 de Outubro de 2010, a recorrente, mediante o seu mandatário judicial, respectivamente, interpôs o presente recurso contencioso e intentou procedimento cautelar de suspensão da eficácia, em processo n.º 65/10-SE, para este Tribunal.
   34) Em 28 de Outubro de 2010, face ao procedimento cautelar supramencionado, este Tribunal proferiu a sentença, autorizando a suspensão da decisão feita em 31 de Agosto de 2010 pelo director da DSE que aplicou a multa de MOP30.000,00 à recorrente e lhe ordenou a imediata cessação da respectiva actividade industrial.”
    
    IV - FUNDAMENTOS
A - Do recurso interlocutório
    1.Vem interposto recurso interlocutório do despacho de fls.398 que decidiu:
    «Concordo com o teor do parecer do M.ºP.º de fls.396 a fls.397, pelo que determino a ilegitimidade da RAEM como contra-interessada nos presentes autos».
    Quanto à pretensa falta de fundamentação, mostra-se o despacho fundamentado, pois o despacho que considerou a ilegitimidade da RAEM como contra-interessada, baseou-se na concordância e adesão à fundamentação do parecer do MP.
    Contrariando o decidido pelo o Venerando TUI, no Pocesso n.º 21/2004, de que não constitui a nulidade a que se refere a alínea b) do n.º 1 do art. 571.° do Código de Processo Civil a fundamentação jurídica por remissão para o parecer do Magistrado do Ministério Público proferido nos termos do art. 69.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, sustenta a recorrente que não se trata aqui de um parecer nos termos do art. 69º, mas sim nos do 58º do CPAC.
    Não se configura a nulidade a que se refere a alínea b) do n.º 1 do art. 571.º do Código de Processo Civil (falta de fundamentos de facto e de direito), pois se tem entendido, generalizadamente, que apenas a total omissão de fundamentos constitui a falada nulidade de sentença e não já a deficiente fundamentação.1
    Não se aplica ao caso o disposto no art. 108º, n.º 2 do CPC - a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição - na medida em que o parecer do MP não configura nem requerimento nem oposição, entendidas estas, como está bem de ver, como partes no processo.
    Na nossa perspectiva, nada obsta a que o despacho, vista até a sua natureza e o seu objecto, adira e adopte a posição do MP que se assume assim como um verdadeiro garante da legalidade e promotor da aplicação da boa justiça.
    
    2. Quanto à questão exceptiva em discussão. Da qualidade da RAEM como contra-interessada
    Diz a recorrente que entra pelos olhos dentro o interesse da RAEM em função do prejuízo que pode resultar do desfecho do recurso.
    Não. Não conseguimos enxergar o que realmente pretende atingir a recorrente com tal afirmação.
    O interesse da RAEM não deixa de ser prosseguido através da acção punitiva desenvolvida pelos seus órgãos e pela defesa na não anulação do acto que conferiu a licença nos termos em que o fez.
    Nem se vê como pudesse a RAEM defender a não aplicação da multa que ela aplicou através dos seus órgãos e ao mesmo tempo defendesse a existência de uma licença que noutro passo desconsiderou. Isso é que não faria sentido, não se verificando os pressupostos para que interviesse como contra interessada face ao disposto no artigo 39º do CPAC. A noção consagrada naquela norma aponta no sentido de que o critério que diferencia e distingue o «assistente» do «contra-interessado» reside na situação de este ter de possuir interesses directamente contrapostos ao do recorrente; a coincidência da posição com a da entidade recorrida não é suficiente, pois possuir interesse idêntico ou coincidente ao da entidade recorrida pode apenas conferir a qualidade de assistente.
    Do despacho recorrido na parte respeitante à retenção do recurso jurisdicional, a recorrente nunca deduziu reclamação prevista no n.º 1 do art. 153° do CPAC, pelo que são absoluta e completamente irrelevantes as conclusões 7ª a 10ª das Alegações do recurso em apreço.
    Tudo isto conduz necessariamente à improcedência do presente recurso jurisdicional.

B - Do recurso final de fls. 474 a 491 dos autos
1. Questões a conhecer, tal como invocados:
    - violação de lei, por não ser peremptório o prazo do licenciamento provisório, cujo decurso não determina caducidade;
    - erro nos pressupostos de facto, violação do art. 15° n.º 2 e n.º 4 do D.L. n.º 11/99/M, e infracção ao princípio in dubio pro reo, sendo todos derivados do deferimento tácito da licença.
    - erro de facto, visto serem pessoas colectivas diferentes a recorrente e a «Companhia de Betão B, Lda.»;
    
    2. Da caducidade da licença.
    2.1. Em traços largos, na tese da recorrente, se esta não tinha licença foi por culpa da Administração que não seguiu as práticas habituais ou porque seria de considerar que tacitamente ela fora concedida.
    A prática legal prevista e habitualmente seguida no licenciamento industrial (licença definitiva ou licença propriamente dita - arts. 31º e segs. do DL 11/99/M) e obrigatória face às competências da DSSOPT e referidas nas normas do Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU) aprovado pela DL n° 79/85/11, de 21 de Agosto seria a seguinte, tal como ocorreu:
    A recorrente requereu e obteve a Licença Industrial Provisória n° C/2006 (fls. 50 do Proc. instrutor bem como a fls. 69 dos autos), emitida a 31.3.2006 e validade até 30.09.2006, bem como a Licença Provisória de Unidade Industrial n° D/2006, emitida na mesma data mas validada até 06.12.2006 (cfr. fls. 52 e 53 do Proc. instrutor).
    A 01.12.2006 pediu a renovação da licença provisória, constando de fls. 55 e segs. do proc. instrutor vários documentos da DSE dos quais se vê que a tramitação c decisão da DSE sobre a obra a vistoriar e licenças a emitir por esta estava dependente da resolução do processo na DSSOPT.
    Com efeito, dele se vê que em relação à situação da ocupação do terreno ou lote G4 em causa ainda tramitava (fls. 55-56 e 59 do proc. instrutor em 2.jan.2007 e 5.3.2007) e em 14.2.2008 (fls. 78-79 do processo instrutor) ainda estava a aguardar resposta da DSSOPT quanto ao licenciamento e obras necessárias à instalação industrial a vistoriar (fls. 64-65 do proc. instrutor em de 21.8.2007 e 11.09, f1s 67-68 de 15.11.2007 e 19.11, fls. 75-76, de 24.01.2008 e 28.01.2008, fls. 78-79 de 12.2.2008 e 14.2.2008 a f1s. 78-79 do processo instrutor).
    Só havendo lugar ao juízo licenciativo (a licença definitiva, que não a provisória) das atribuições do foro industrial (DSE), licenciando ou não a requerida actividade e a satisfação do edifício e instalações para a mesma, depois de concluído os processos do foro da DSSOPT relativos à concessão do terreno e licenciamento das obras do referido edifício ou instalações.
    Importaria assim atentar na diferença entre licença provisória e definitiva e entre licenciamento para instalação de unidade industrial e para desenvolvimento da actividade industrial. Reconhece-se que sejam coisas diferentes.
    Mas já não seria assim quanto ao licenciamento provisório - arts. 15° n.º 2, 20°, 25° e 28° do cit. DL 11/99/M, de 22/3, maxime este último que não contempla como impeditivo do licenciamento provisório tal requisito prévio das obras e licença da DSSOPT, ao contrário do licenciamento definitivo (arts. 31º e segs.) o qual requer obras prontas a vistoriar que dependem da DSSOPT.
    Chama a recorrente a atenção para o facto de que, sendo certo que o art. 31° do DL 1l/99/M, de 22/3 preceitua que no prazo máximo de 3 meses a contar da data de emissão da licença provisória, o seu titular deve informar a DSE, através do Modelo C, da sua disponibilidade para a realização da vistoria inicial ao estabelecimento e/ou unidade industrial em causa", tal preceito não revoga nem pode revogar aqueloutros do cit. DL n° 79/85/M e obrigar a DSSOPT a ter concluído o processo e obra a vistoriar dentro desses 3 meses tal como efectivamente a DSSOPT muito para além dos cit. 3 meses, em 19.11.2007 e 14.2.2008 (fls. 68 do processo instrutor e fls. 78-79, respectivamente), não tinha concluído nem consta que concluído tivesse à data do acto punitivo recorrido.
    A culpa seria, assim, da DSSOPT que não licenciou a obra em devido tempo, não caducando ou extinguindo o procedimento de licenciamento, compreendendo-se que a concessão da licença provisória fosse efectivamente concedida, por período que coincide com o da vistoria para licença definitiva (art. 33° n° 3 do DL 11/99/M).
    Ainda, em reforço dessa unidade do sistema, a disposição legal que preceitua que, depois de obtida a licença provisória, deve o titular no prazo máximo de 3 meses a contar da data de emissão da licença provisória, informar a DSE da sua disponibilidade para a realização da vistoria do estabelecimento dentro dos 6 meses de validade da licença provisória a fim de se emitir ou recusar a licença definitiva (arts. 31° do DL 11/99/M, de 22/3).
    Desta unidade, retira a recorrente a conclusão de que se mantém a licença provisória, enquanto não se realizar a vistoria por atraso, inércia, ou incúria da Administração, no fundo, por culpa sua, como diz, tal como sucedeu no caso dos autos que em 14/2/2008 ainda não tinha sido concluído na DSSOPT.
    
    2.2. Antes de procedermos à análise deste fundamento, importa referir que este argumento não foi invocado no recurso, pelo menos nos exactos termos em que ora vem delineado.
    Não sendo invocado este vício, gerador de anulabilidade e não sendo de conhecimento oficioso, sempre estaria fora do âmbito do conhecimento deste Tribunal.
    Na verdade, os recursos jurisdicionais não visam criar decisões sobre matérias novas, pelo que se a questão não foi suscitada no recurso contencioso, não se pode da mesma conhecer, a menos que se trate de matéria de conhecimento oficioso. De tudo isto nos dá conta o douto Acórdão proferido no Processo n.º 32/2008.2
    Em esteira com tal jurisprudência, entendemos tranquilamente que são, por completo, irrelevantes e inócuos aqueles 2° e 3° argumentos da recorrente, não podendo os quais acarretar nenhuma invalidade à douta sentença recorrida.
    
    2.3. Não nos eximiremos, no entanto, a dizer algo sobre o assunto, na medida em que se entenda que, ainda que não configurado da mesma forma, o vício sempre terá sido invocado.
    Não somos a acompanhar a posição defendida pela recorrente.
    A invocação do princípio de que os prazos não correm nem prescrevem ou caducam enquanto o interessado não tiver o direito de exercer o seu direito-dever, que no caso era o dever de disponibilizar uma obra cujo direito-dever de cumprir que estaria dependente da Administração Pública (DSSOPT) não pode relevar em sede do direito público quando está em causa o desenvolvimento de uma actividade poluente que pode pôr em causa os interesses superiores de toda uma população. Importa até não esquecer que este procedimento foi desencadeado por uma participação do próprio Conselho de Ambiente.
    No fundo, o atropelo da lei, o cometimento de irregularidades, se não até de ilegalidades administrativas, não legitima o desenvolvimento de actividades potencialmente prejudiciais não licenciadas.
    A prática legal e habitual não pode justificar as práticas ilegais, não sendo aqui de aplicar o artigo 114º, n.º 1, e) do CPA.
    Nem o princípio da boa-fé pode valer neste caso em que se evidencia a salvaguarda de superiores valores ambientais.
    As Obras Públicas tiveram culpa, não fizeram o trabalho em tempo, atrasaram ou paralisaram a produção industrial, culposamente causaram prejuízos, sibi imputat, se assim aconteceu, se assim se provasse, haveria que indemnizar.
    A recorrente não deixa de reconhecer que a validade da Licença Industrial Provisória n.º C/2006 terminaria em 06/12/2006, e ela pediu a renovação em 01/12/2006., renovação esta, sempre provisória, que só muito mais tarde foi concedida, sendo certo que nos termos do artigo 29º, n.º 1, as licenças provisórias caducam no fim do prazo de validade, tal caducidade acarreta a caducidade das licenças provisórias de unidade industrial que lhe estiverem agregadas, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, razão por que não se reuniam as condições para que se produzisse um deferimento tácito quanto à renovação da licença provisória requerida.
    
    3. Assim se entra na análise de uma outra linha argumentativa, qual seja a do deferimento tácito da licença.
    3.1. Resulta dos autos que foi obtido licenciamento provisório industrial com validade até 06.12.2006 (como consta a fls. 52 do processo instrutor) e que a recorrente em 01.12.2006 requereu a sua renovação, isto é, requereu renovação de licença provisória em data (01.12.2006) em que usufruía de licença ainda válida (válida até 06.12.2006).
    Quando assim sucede e logo que decorra um mês (a 01.Jan.2007) sem despacho, como foi o caso, ocorre deferimento tácito.
    Ao abrigo do disposto no artigo 15º do DL n.º 11/99/M, teria havido deferimento tácito do pedido de licença.
    
    3.2. Dispõe este artigo 15º:
    1. Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a não emissão de qualquer licença, nos prazos fixados nos termos do presente diploma, constitui presunção de indeferimento tácito do correspondente pedido, do qual cabe recurso hierárquico necessário para o Governador.
    2. Há lugar ao deferimento tácito do pedido de licença provisória quando, não sendo esta emitida no prazo de 1 mês a contar da respectiva apresentação, se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
    a) A fracção ou fracções a que se reporta o pedido e onde se pretende exercer a actividade estarem localizadas em edifício industrial;
    b) O pedido não ser enquadrável nos artigos 21.º e 22.º;
    c) O requerente não estar legalmente impedido de exercer a actividade, designadamente por via de sentença de interdição ou inabilitação transitada em julgado, ou por se encontrar interdito ou proibido do exercício da actividade, nos termos do presente diploma ou do regime jurídico das infracções contra a saúde pública e contra a economia;
    d) A DSE não ter instado o requerente a regularizar ou completar o pedido ou os elementos ou informações que lhe devam ser anexos;
    e) A DSE não ter indeferido ou recusado a emissão de licença ao requerente, para alguma das actividades em causa e para o mesmo local, nos 2 anos imediatamente anteriores ao pedido.
    3. O deferimento tácito não dispensa o requerente do cumprimento dos deveres estabelecidos nas normas aplicáveis ao exercício da actividade e no presente diploma, excepto no que toca à obrigatoriedade de afixação da licença.
    4. O início da actividade ao abrigo do deferimento tácito deve ser precedido de comunicação à DSE.
    
    3.3. Como daqui resulta, a regra é a do indeferimento tácito.
    A invocar-se o n.º 2, sempre faltaria a verificação da al. a) que estava dependente do processo que corria na DSSOPT.
    Na verdade, por o edifício já funcionar de facto como industrial, na medida em que já ali funcionava a indústria da recorrente nos termos do licenciamento provisório), tal não significa que tivesse a licença de edifício industrial, pendente como estava o respectivo licenciamento.
    
    4. Quanto ao principio "in dubio pro reo"
    4.1. Ainda aqui nos confrontamos com o mesmo obstáculo que levaria ao não conhecimento de vícios não invocados no recurso contencioso..
    
    4.2. Não sem que se deixe de dizer que não há razão para se invocar o princípio do in dubio pro reo, na exacta medida em que no momento em que foi verificada a infracção não existia licença, exactamente nos termos acima vistos.
    Não se observa em lado algum que as autoridades tenham considerado o caso duvidoso, tal como a recorrente afirma, aliás, antes se verifica de todo o procedimento que sempre deram como assente a inexistência da licença e parece até que a recorrente não teve dúvidas quanto a esse facto, tendo-se limitado, em determinado momento, a pedir apenas a alteração do montante da multa fixado.
    
     5. Do alegado desvio de procedimento; erro de facto
    5.1 Alega o recorrente que o processo penal administrativo em que o acto punitivo foi proferido foi instaurado em 2005 contra a COMPANHIA DE BETÃO B LDA. por suspeita de actividade ilegal desta, sendo abundante a prova constante desse processo ou processo administrativo instrutor (fls. 2 a 41) que foi essa empresa quem ali operou pelo menos até Janeiro de 2006 e não a ora recorrente (ver processo administrativo instrutor e também fls.119 dos autos).
    Mas acabou por ser nele punido um terceiro, a recorrente, a qual a lei e o processo instrutor mostram que só iniciou ali actividade em 31 de Março de 2006.
    O processo foi instruído unitariamente e no pressuposto de que aquela empresa e a recorrente eram a mesma coisa, no mesmo erro incorrendo a sentença recorrida dando-se ilegalmente por provado no n° 4 dos Factos Assentes que "A Recorrente é titular da "COMPANHIA DE BETÃO B LDA." e através desta procede à fabricação de betão e outras actividades no lote "G4"."
    
    5.2. É verdade que o registo Comercial da COMPANHIA DE BETÃO B LDA. encontra-se junto a fls.119-133, como sociedade comercial matriculada em 13.5.2005 sob o n° 21278 (SO). E o da recorrente, COMPANHIA DE CONSTRUÇÃO E OBRAS DE ENGENHARIA A LDA. A國際有限公司, encontra-se junto a fls. 28-44, como sociedade comercial matriculada em 27.04.2000 sob o n° 1501 (SO), donde resulta que são pessoas jurídicas distintas arts. 184º do C. Civil e art. 176º do Cód. Comercial.
    Mas desde logo se verifica que todos os contactos e e a actuação da Administração a partir de 2006 é feita sempre com a recorrente, sendo que a actividade não licenciada se reporta a um período temporal posterior ao de final desse ano.

Por outro lado, era a recorrente «Companhia de Construção e Obras de Engenharia A, Lda.» que era a titular da Licença Industrial Provisória n.º C/2006 e da Licença Provisória de Unidade Industrial n.º D/2006 (docs. de fls.50 e 51 do P.A.).
Visto o teor das licenças de fls 50 e 51 do PA, o acordo celebrado entre o Governo e a recorrente em 2005 (cfr. fls. 52 a 53 dos autos), o alegado por esta no artigo 20º da petição de recurso, onde se alude que quem ali desenvolvia a actividade em referência era a C. de Betão B, Lda., ao mesmo tempo que é a recorrente que assume a titularidade do licenciamento, não se oferecem quaisquer dúvidas pela responsabilidade da recorrente em relação à produção de betão em referência.
Pelo que ainda aqui não lhe assiste razão ao pretender imputar a responsabilidade a terceira sociedade, à qual seria alheia.
    
    6. Nesta conformidade o recurso não deixará de improceder.
    Considerando a resposta da recorrente de 563 a 564 dos autos, face à revogação do acto, no sentido de que a Licença Industrial Provisória n.º 7/2013, emitida em 03/05/2013, não toca os efeitos já produzidos pelo acto contenciosamente impugnado e o requerimento de fls. 563 a 564, pelo qual a recorrente mantém o recurso contencioso na sua totalidade, dele se continuará a conhecer, face ao disposto nos n.º l e n.º 3 do art. 80° do CPAC.
    A concessão da licença provisória ora certificada nos autos torna supervenientemente inútil o recurso interposto, por revogação do acto, apenas na parte respeitante ao encerramento da actividade para futuro.
    
    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em julgar improcedente o recurso interlocutório e em negar provimento ao recurso final, confirmando-se, assim, a decisão recorrida na parte respeitante à aplicação da multa e ao encerramento da actividade até à revogação do acto nesse segmento, tornando-o inútil em relação ao encerramento da actividade, para futuro, vista essa revogação.
    Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 e 5 Ucs, respectivamente.
               Macau, 10 de Julho de 2014

_________________________ _________________________
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira Vitor Manuel Carvalho Coelho
(Relator) (Presente)
(Magistrado do M.oP.o)

_________________________
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)
               
1 - Ac. do TUI, Proc. n.º 1/2012, entre outros
2 - Ac. do TUI, Proc. n.º 32/2008, de 29/6/2009; na linha do mesmo entendimento nos Acórdãos de 29 de Junho de 2005, no Processo n.º 15/2005 e de 10 de Maio de 2006, no Processo n.º 7/2006.
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------

236/2012 36/36