Processo nº 644/2013
Data do Acórdão: 19JUN2014
Assuntos:
Justa causa de despedimento
SUMÁRIO
Constitui justa causa de despedimento a conduta do piloto de uma aeronave de passageiros que, em vez de obedecer as instruções dadas pelo controlo de tráfego aéreo para seguir o procedimento “vectorização por radar” de aproximação e aterragem no aeroporto de destino, optou por seguir o procedimento STAR, por mero gosto, arbítrio e capricho pessoal.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 644/2013
I
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM
No âmbito dos autos da acção de processo do trabalho nº CV3-12-0052-LAC, do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, proposta por A, devidamente id. nos autos, contra a B, foi proferida a seguinte sentença julgando parcialmente procedente a acção:
A, melhor identificado nos autos, vem instaurar a presente acção de processo comum do trabalho contra B, com os demais sinais dos autos, pedindo a condenação da Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$467.536,48, acrescida de juros legais vincendos até efectivo e integral pagamento.
Para tanto alega o A. que celebrou um contrato de trabalho com a Ré com efeitos a 08.01.1997, nos termos e condições que indica os quais foram sendo alterados ao longo da relação laboral, a qual cessou por iniciativa da Ré em 20.09.2006.
Sendo insubsistente a invocação de justa causa pela Ré para o despedimento do Autor este tem direito a receber uma indemnização no valor de MOP$151.199,99 pelo despedimento ilícito.
Mais alega ter o Autor direito a ser compensado pelo trabalho prestado em dias feriado, trabalho nocturno e trabalho extraordinário, nos montantes de MOP$106.592,36, MOP$127.899,33 e MOP$44.255,80, respectivamente.
Finalmente pede a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de MOP$37.589,00 referente a redução salarial ilícita.
A R. contestou defendendo-se por impugnação, concluindo pela improcedência da acção.
Foi proferido despacho saneador, e seleccionou-se a matéria de facto relevante para a discussão da causa.
Procedeu-se a julgamento com observância do formalismo legal.
Nestes autos foi dada por assente a seguinte factualidade:
a)
A Ré é uma sociedade comercial que presta o serviço público de exploração de transporte aéreo de passageiros, bagagem, carga, correio e encomendas postais;
b)
A Escritura do contrato de concessão, em regime de exclusivo, do serviço público acima referido foi publicada no boletim oficial n.º 19, II Série, de 10 de Maio de 1995;
c)
Por carta oferta dirigida pela Ré ao Autor em 29 de Novembro de 1996, foi o Autor convidado para, sob as ordens e direcção da Ré, trabalhar como Primeiro-oficial Estagiário (Trainee First Officer) e eventualmente Primeiro-oficial (First Officer), com efeitos a partir de 08 de Janeiro de 1997, conforme consta a folhas 76/83;
d)
O salário base mensal a auferir pelo Autor nos termos do sobredito contrato, após a conclusão do treino, era no valor de MOP$40.000.00 (quarenta mil patacas);
e)
O Autor aceitou a proposta de emprego, formalizando-se então a relação laboral entre Autor e Ré;
f)
Entre Abril de 1997 e Setembro de 1997, o salário base mensal do Autor era de MOP$40.000.00 (quarenta mil patacas), acrescida da quantia de MOP$1.250.00 (mil duzentas e cinquenta patacas) mensais pagas a título de subsídio de transporte e da quantia de MOP$200.00 (duzentas patacas) mensais pagas a título de subsídio de lavandaria, num total de MOP$41.450.00 (quarenta e um mil quatrocentas e cinquenta patacas);
g)
A partir de Outubro de 1997 e até 31 de Janeiro de 1999, o salário base mensal do Autor passou a ser de MOP$40.116.00 (quarenta mil cento e dezasseis patacas), acrescida da quantia de MOP$1.250.00 (mil duzentas e cinquenta patacas) mensais pagas a título de subsídio de transporte e da quantia de MOP$200.00 (duzentas patacas) mensais pagas a título de subsídio de lavandaria, num total de MOP$41.566.00 (quarenta e um mil quinhentas e sessenta e seis patacas);
h)
A partir de 1 de Fevereiro de 1999, o Autor viu o seu salário aumentado, pela atribuição de um subsídio denominado “subsídio de renda” (housing allowance) no valor mensal de MOP$4.000.00 (quatro mil patacas);
i)
A partir de 1 de Fevereiro de 1999 e até Março de 2000 o Autor auferiu a título de remuneração a quantia de MOP$45,566.00;
j)
Em 19 de Outubro de 1999, Autor e Ré celebraram um novo contrato de trabalho, o qual consta de folhas 122 a 129 e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos;
l)
Nos termos do contrato referido no item anterior pelo período de 4 anos, contados de 8 de Janeiro de 2000, o Autor passaria a exercer, sob as ordens e direcção da Ré as funções de Primeiro-oficial A (First Officer A), auferindo um salário base mensal de MOP$40.116.00 (quarenta mil cento e dezasseis patacas), acrescido da quantia de MOP$4.000.00 (quatro mil patacas) mensais, que seriam pagas a título de subsídio de renda, da quantia de MOP$1.250.00 (mil duzentas e cinquenta patacas) mensais pagas a título de subsidio de transporte, e bem assim da quantia de MOP$200.00 (duzentas patacas) mensais pagas a título de subsídio de lavandaria;
m)
Em 1 de Abril de 2000 o salário base (basic salary) do Autor foi ajustado passando a ser no valor de MOP$41.316.00, passando a remuneração mensal do Autor a totalizar, a partir de 1 de Abril de 2000 e até 8 de Outubro de 2001 a quantia de MOP$46,766.00 (quarenta e seis mil setecentas e sessenta e seis patacas);
n)
Em 9 de Outubro de 2001 o Autor foi informado da sua promoção a Comandante B;
o)
Em 23 de Outubro de 2001 Autor e Ré celebraram um novo contrato de trabalho, o qual consta de folhas 150 a 156;
p)
Nos termos do contrato referido no item anterior e pelo período de 4 anos, com inicio em 9 de Outubro de 2001, o Autor desempenharia, sob as ordens e direcção da Ré, as funções de Comandante B (“Captaín B”), passando a auferir um salário base mensal de MOP$52,000.00 (cinquenta e duas mil patacas), acrescido da quantia de MOP$6.000.00 (seis mil patacas) mensais, que seriam pagas a título de subsídio de renda, da quantia de MOP$1.250.00 (mil duzentas e cinquenta patacas) mensais pagas a título de subsídio de transporte, e bem assim da quantia de MOP$200.00 (duzentas patacas) mensais pagas a título de subsídio de lavandaria, pelo que, a remuneração mensal do Autor a partir de 9 de Outubro de 2001 e até 30 de Novembro de 2002 passou a totalizar a quantia de MOP$59,450.00 (cinquenta e nove mil quatrocentas e cinquenta patacas);
q)
Nos termos da cláusula 8.2 a 8.4 do contrato de trabalho referido nos dois itens anteriores, o Autor após completar um ano de serviço como Comandante B, e sujeito à recomendação do Director de Operações de Voo (“Director of Flight Operations”) e aprovação do Director Executivo (“Chief Executive officer”), poderia progredir na carreira e ser promovido a Comandante A (“Captain A”) com um salário mensal de MOP$56.000.00 por mês;
r)
A promoção referida no item anterior seria automática no 3º ano;
s)
Com efeitos a partir de Dezembro de 2002, o salário base do Autor foi actualizado para a quantia mensal de MOP$56.000.00, pelo que, a remuneração mensal do Autor a partir de 1 de Dezembro de 2002 e até Abril de 2005, passou a totalizar a quantia de MOP$63,450.00 (sessenta e três mil quatrocentas e cinquenta patacas);
t)
Em 19 de Julho de 2005, Autor e Ré celebraram um quarto contrato de trabalho cuja cópia consta de folhas 200 a 204 e aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;
u)
O contrato referido no item anterior seria válido pelo período de 4 anos, contados de 9 de Outubro de 2005, e o Autor passaria a exercer, sob as ordens e direcção da Ré, as funções de Comandante A (Captain A), passando a auferir um salário base mensal de MOP$58,800.00 (cinquenta e oito mil e oitocentas patacas), acrescido da quantia de MOP$6.000.00 (seis mil patacas) mensais, que seriam pagas a título de subsídio de renda, da quantia de MOP$1.250.00 (mil duzentas e cinquenta patacas) mensais pagas a título de subsídio de transporte, e bem assim da quantia de MOP$200.00 (duzentas patacas) mensais pagas a título de subsídio de lavandaria.
v)
Desde Maio de 2005 a remuneração mensal do Autor passou a totalizar a quantia de MOP$66,250.00.00 (sessenta e seis mil duzentas e cinquenta patacas);
x)
Em 15 de Junho de 2006 o Autor recebeu uma comunicação remetida pela Ré nos termos da qual o salário base passaria a MOP$63.884.00 com efeitos a partir de 1 de Julho de 2006, motivo pelo qual a remuneração mensal do Autor a partir de 1 de Julho de 2006 passou a totalizar a quantia de MOP$71.334.00 (setenta e uma mil trezentas e trinta e quatro patacas);
z)
O Autor recebeu com carácter regular e periódico os subsídios designados de subsídio de renda, subsídio de transporte e subsídio de lavandaria;
aa)
Desde o início da relação laboral, o Autor recebia outros subsídios como subsídio de voo (designado “flying allowance”), diárias (designadas “per diem”), subsídio de voo nocturno (designado “night flying allowance”), subsídio de serviço (designado “duty allowance”);
ab)
Nos termos dos supra aludidos contratos de trabalho o Autor teria direito a receber 1 (um) mês de salário por cada ano completo de serviço, de ora em diante designado como o “13º mês de salário”;
ac)
Em 20 de Setembro de 2006, o Autor recebeu uma carta da Ré, nos termos da qual foi informado que o seu contrato de trabalho cessava nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 44º, nº 1 alínea a) da Lei Laboral, ou seja, por iniciativa da B, com efeitos imediatos, a qual consta de folhas 223 e aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos;
ad)
A relação laboral entre o Autor e a Ré decorreu de forma contínua e ininterrupta entre 8 de Janeiro de 1997 e 20 de Setembro de 2006 data na qual cessou por iniciativa da Ré, durando ininterruptamente 9 anos, 8 meses e 12 dias;
ae)
Durante o período referido na alínea anterior o Autor desempenhou as funções de Piloto Comercial das aeronaves pertencentes à frota aeronáutica da Ré, estando incumbido de comandar a pilotagem das referidas aeronaves nas rotas e para os destinos de voo que sempre foram disponibilizados pela Ré enquanto concessionária do serviço público de transporte aéreo da RAEM, tendo sido sucessivamente promovido até chegar à categoria profissional de Comandante A, colhendo respeito junto dos seus pares e dos restantes membros da tripulação que o acompanhavam diariamente nos voos que efectuava segundo ordens e instruções da Ré, sem que tivesse, durante o período em que durou a sua relação laboral com a Ré, qualquer acidente ou incidente reportado e registado na Autoridade de Aviação Civil de Macau;
af)
No âmbito da suas funções o Autor apresentava-se, uma hora antes de cada voo, nas instalações da Ré, ou em outro local pela Ré determinado em outro aeroporto, assinava o registo de entrada, fazia uma análise do plano de voo, consoante as condições meteorológicas e as condições gerais de voo, coordenava os pormenores de voo com o co-piloto e bem assim com o despachante operacional de voo, fazia um resumo com os comissários de bordo - pessoal de cabine, fazia um briefing com o pessoal da manutenção, entrava no avião, dava sinal de embarque e aguardava que todos os passageiros se instalem nos seus lugares, e por fim aguardava pelo sinal da torre de controlo para iniciar o voo;
ag)
Nem sempre os voos saem a horas, sendo esse período de espera pela ordem da torre de controlo considerado período de trabalho, mas não de voo;
ah)
Unicamente após tirar os calços do avião se inicia o período de voo;
ai)
O período de trabalho do Autor só termina meia hora após colocar os calços na aeronave, ou seja, trinta minutos após o fim do último voo efectuado;
aj)
Durante a relação laboral o Autor efectuou, por diversas vezes mais do que um voo diário, estando durante esse período ao serviço da Ré, ou seja, a trabalhar.
al)
Quando levava os passageiros de um destino para outro e aguardava que novos passageiros entrassem no avião para os levar para outro sítio, o Autor continuava ininterruptamente ao serviço da Ré, enquanto uns passageiros desembarcavam e se aguardava pelo embarque de novos passageiros, o Autor tinha necessariamente de preencher os relatórios referentes ao voo então terminado e analisar as condições meteorológicas para o voo que se seguia, e analisar as condições mecânicas do avião e seguir todos os procedimentos inerentes ao início de um voo, para garantir que o mesmo fosse efectuado em segurança;
am)
Fazia ainda parte do período normal de trabalho do Autor o número de horas em que está a fazer testes em simulador;
an)
Em determinados dias o Autor esteve em stand by, definido no manual de operações de voo como o “período durante o qual B coloca restrições sobre um tripulante que caso contrário estaria de folga. No entanto, não deverá incluir o tempo durante o qual a B exige que um tripulante esteja contactável a fim de ser notificado de um serviço que está previsto começar 10 horas ou mais depois”;
ao)
Desde a data do início da relação laboral em 1997, e ao longo da mesma, o Autor viu-se obrigado a trabalhar em parte dos dias “feriados”, quer obrigatórios, quer não obrigatórios, sem que tenha recebido da Ré qualquer compensação.
ap)
O Autor trabalhou nos seguintes feriados:
2.1
05/04/1997
Cheng Ming-dia dos finados
Shanghai-Macau
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.2
01/05/1997
Festa do Trabalho
Macau→Xangai
2.3
10/06/1997
Dia de Portugal
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.4
01/10/1997
Implantação da RPC
Macau→Taipei
2.5
28/01/1998
1º Dia do Ano Novo Chinês
Macau→Xiamen
Xiamen→Macau
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.6
28/10/1998
Chong Yeong
Testes obrigatórios em simulador
2.7
17/02/1999
2º dia do 1º mês do Ano Novo Lunar
Macau→Seoul
2.8
18/02/1999
3º dia do 1º mês do Ano Novo Lunar
Seoul→Macau
2.9
01/05/1999
Dia do Trabalhador
Taipei→Macau
Macau→Xangai
Xangai→Macau
2.10
10/06/1999
Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.11
01/10/1999
Implantação da RPC
Macau→Zhengzhou
Zhengzhou→Macau
2.12
17/10/1999
Chong Yeong - Culto dos Antepassados
Macau→Kaohsiung
2.13
05/02/2000
1º dia do 1º mês do Novo Ano Lunar
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.14
06/02/2000
2º dia do 1º mês do Novo Ano Lunar
Macau→Gaoxiang
Gaoxiong→Macau
2.15
07/02/2000
3º dia do 1º mês do Novo Ano Lunar
Macau→Taipei
Taipei→Macau
Macau→Manila
2.16
13/09/2000
Chong Chao – dia seguinte ao Bolo Lunar
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.17
06/10/2000
Chong Yeong Festival
Macau→Gaoxiang
Gaoxiong→Macau
2.19
05/04/2001
Cheng Ming
Macau→Xiamen
Xiamen→Macau
Macau→Taipei
2.20
25/10/2001
Cheong Yeong
Macau→Pequim
Pequim→Macau
2.22
20/12/2001
Dia comemorativo do Estabelecimento da RAEM
Macau→Guilin
Guilin→Macau
2.23
01/01/2002
Taipei→Macau
2.24
01/05/2002
Dia do Trabalhador
Macau→Taipei
2.25
22/09/2002
Chong Chao – dia seguinte ao Bolo Lunar
Macau→Xangai
Xangai→Macau
Macau – Taipei
2.26
01/10/2002
Implantação da RPC
Taipei→Macau
2.27
14/10/2002
Cheong Yeong
Macau→Kunming
Kunming→Macau
Macau→Taipei
2.28
20/12/2002
Dia comemorativo do Estabelecimento da RAEM
Taipei→Macau
2.29
12/09/2003
Chong Chao
Taipei→Macau
Macau→Nanjing
Nanjing→Macau
2.30
01/01/2004
Fraternidade Universal
Banguecoque→Macau
Macau→Taipei
2.32
22/01/2004
Novo Ano Lunar
Xangai →Macau
2.33
23/01/2004
Novo Ano Lunar
Macau→Xangai
Xangai→Macau
Macau-Taipei
2.34
04/04/2004
Cheng Ming
Taipei→Macau
2.35
01/05/2004
Dia do Trabalhador
Macau→Taipei
Tapei→Macau
Macau→Taipei
2.36
29/09/2004
Chong Chao – Dia seguinte
Taipei→Macau
Macau→Haikou
Haikou→Macau
2.37
20/12/2004
Dia comemorativo do Estabelecimento da RAEM
Gaixiong→Macau
2.38
01/01/2005
Dia da Fraternidade
Macau→Taipei
Taipei→Macau
Macau→Xangai
2.39
09/02/2005
Ano Novo Lunar
Macau→Macau
2.40
05/04/2005
Cheng Ming
Taipei→Macau
Macau→Taipei
Taipei→Macau
2.41
01/05/2005
Dia do Trabalhador
Macau→Xangai
Xangai→Macau
Macau→Taipei
2.42
11/10/2005
Chong Yeong – Culto dos antepassados
Macau→Taipei
Taipei→Macau
Macau→Gaixiong
Gaixiong→Macau
2.43
31/01/2006
3º dia do 1º mês do Novo Ano Lunar
Macau→Xangai
Xangai→Macau
2.44
05/04/2006
Cheng Ming – Dia dos Finados
Macau→Banguecoque
Banguecoque→Macau
2.45
01/05/2006
Dia do Trabalhador
Macau→Shenzhen
Shenzhen→Macau
Macau→Chengdu
Chengdu→Macau
aq)
A Ré nunca pagou ao Autor o acréscimo de 25% pelo número de horas de voo nocturno efectuadas durante o período de execução do contrato.
ar)
No ano de 2003, o Autor fez 16 horas e 9 minutos de voos nocturnos.
as)
No ano de 2004, o Autor fez 30 horas e 59 minutos de voos nocturnos.
at)
No ano de 2005, o Autor fez 31 horas e 45 minutos de voos nocturnos.
au)
No ano de 2006, o Autor fez 31 horas e 16 minutos de voos nocturnos.
av)
Durante os dias em que esteve em stand by nos termos da alínea an) o Autor tinha de estar contactável e disponível para se apresentar ao serviço no aeroporto do local em que se encontrava, nos quarenta minutos posteriores à recepção da chamada da entidade patronal, que lhe solicitava a presença naquele local.
ax)
No mês de Fevereiro de 2003 o Autor trabalhou 105 horas e 11 minutos, sendo que nos dias 4, 5, 8, 19, 24 e 28 trabalhou 9:48, 11:08; 9:42; 10:40; 9:59 e 9:36 horas e minutos.
az)
No mês de Março de 2003 o Autor trabalhou 104 horas e 26 minutos, sendo que nos dias 7, 18, 22, 25 e 27 trabalhou 10:06, 9:27; 9:04; 9:38 e 8:01 horas e minutos.
ba)
No mês de Outubro de 2003 o Autor trabalhou 108 horas e 53 minutos, sendo que nos dias 6, 14, 21, 23, 27 e 31 trabalhou 10:04, 09:40; 09:48; 10:02; 08:28 e 10:14 horas e minutos.
bb) No mês de Novembro de 2003 o Autor trabalhou 100 horas e 13 minutos, sendo que nos dias 17, 19 e 30 trabalhou 9:08, 9:53 e 10:05 horas e minutos.
bc)
No mês de Dezembro de 2003 o Autor trabalhou 107 horas e 41 minutos, sendo que nos dias 5, 9, 12, 16, 19 e 25 trabalhou 9:56, 9:46; 8:41, 8:43; 10:25 e 9:57 horas e minutos.
bd)
No mês de Janeiro de 2004 o Autor trabalhou 124 horas e 22 minutos, sendo que nos dias 15, 21, 23, 24, 26 e 28 trabalhou 10:31, 10:20; 10:13; 9:48; 10:27 e 9:48 horas e minutos.
be)
No mês de Março de 2004 o Autor trabalhou 100 horas e 29 minutos, sendo que nos dias 1, 7, 10, 15, 20, 21 e 22 trabalhou 9:35, 10:33; 8:10; 10:33; 8:46; 8:16 e 9:33 horas e minutos.
bf)
No mês de Abril de 2004 o Autor trabalhou 126 horas e 56 minutos, sendo que nos dias 5, 11, 12, 20, 22, 25 e 28 trabalhou 9:42, 10:28; 10:23; 10:01; 10:31; 9:38 e 10:15 horas e minutos.
bg)
No mês de Maio de 2004 o Autor trabalhou 104 horas e 39 minutos, sendo que nos dias 1, 2, 5, 7, 19, 28 e 29 trabalhou 9:31, 9:45; 9:38; 8:58; 9:09; 10:28 e 9:28 horas e minutos.
bh)
No mês de Junho de 2004 o Autor trabalhou 123 horas e 18 minutos, sendo que nos dias 3, 7, 8, 14, 19, 20 e 28 trabalhou 9:59, 9:56; 10:43; 9:44; 11:09; 10:13 e 10:24 horas e minutos.
bi)
No mês de Julho de 2004 o Autor trabalhou 77 horas e 13 minutos, sendo que nos dias 3, 10, 11 e 14 trabalhou 10:36, 9:05; 10:56 e 10:20 horas e minutos.
bj)
No mês de Agosto de 2004 o Autor trabalhou 75 horas e 5 minutos, sendo que nos dias 20, 21, 23, 26 e 27 trabalhou 10:46, 9:40; 10:22; 9:43 e 11:10 horas e minutos.
bl)
No mês de Setembro de 2004 o Autor trabalhou 140 horas e 52 minutos, sendo que nos dias 2, 3, 13, 17, 25, 26 e 28 trabalhou 10:02, 10:14; 9:38; 8:01; 9:26; 9:55 e 12:08 horas e minutos.
bm)
No mês de Outubro de 2004 o Autor trabalhou 106 horas e 28 minutos, sendo que nos dias 7, 8, 10, 20, 21 e 26 trabalhou 9:54, 8:46; 8:51; 10:33; 10:11 e 10:10 horas e minutos.
bn)
No mês de Novembro de 2004 o Autor trabalhou 121 horas e 43 minutos, sendo que nos dias 4, 7, 13, 14, 15, 22, 27, 28 e 29 trabalhou 8:48; 9:58; 10:11; 9:17; 8:53; 10:18; 10:26; 9:45 e 10:10 horas e minutos.
bo)
No mês de Dezembro de 2004 o Autor trabalhou 111 horas e 43 minutos, sendo que nos dias 6, 11, 12, 17, 18, 22, 24 e 26 trabalhou 8:13, 8:09; 11:10; 9:30; 10:43; 8:34; 9:01 e 8:34 horas e minutos.
bp)
No mês de Janeiro de 2005 o Autor trabalhou 134 horas e 13 minutos, sendo que nos dias 1, 4, 8, 9, 13, 19, 25, 27 e 30 trabalhou 8:48, 9:51; 9:33; 10:44; 10:48; 10:24; 8:37; 9:56 e 10:36 horas e minutos.
bq)
No mês de Fevereiro de 2005 o Autor trabalhou 128 horas e 53 minutos, sendo que nos dias 2, 5, 15, 16, 22, 24, 26 e 28 trabalhou 10:13, 9:11; 10:46; 11:28; 10:28; 9:53; 9:58 e 10:46 horas e minutos.
br)
No mês de Março de 2005 o Autor trabalhou 89 horas e 53 minutos, sendo que nos dias 1, 4, 6, 23, 25 e 30 trabalhou 10:03, 9:48; 10:18; 10:23; 10:32 e 10:18 horas e minutos.
bs)
No mês de Abril de 2005 o Autor trabalhou 144 horas e 57 minutos, sendo que nos dias 1, 5, 7, 8, 12, 17, 20, 21, 24 e 28 trabalhou 10:10, 8:36; 9:42; 8:38; 11:29, 9:02, 10:52, 12:30, 9:37 e 8:16 horas e minutos.
bt)
No mês de Maio de 2005 o Autor trabalhou 141 horas e 28 minutos, sendo que nos dias 1, 8, 9, 12, 16, 17, 19, 22, 23, 24 e 31 trabalhou 10:26, 9:48; 11:33; 9:15; 10:21; 9:36; 10:13; 9:38; 11:25; 10:04 e 9:53 horas e minutos.
bu)
No mês de Junho de 2005 o Autor trabalhou 139 horas e 6 minutos, sendo que nos dias 7, 8, 11, 16, 19, 21, 23, 25 e 27 trabalhou 11:06, 9:52; 9:11; 9:27; 10:16; 9:53, 10:36; 10:36 e 9:51 horas e minutos.
bv)
No mês de Julho de 2005 o Autor trabalhou 113 horas e 57 minutos, sendo que nos dias 4, 7, 10, 15, 17 e 23 trabalhou 9:51, 8:34; 11:08; 9:17; 11:07 e 11:48 horas e minutos.
bx)
No mês de Agosto de 2005 o Autor trabalhou 42 horas e 57 minutos, sendo que nos dias 25, 26, 30 e 31 trabalhou 10:22, 10:38; 9:43 e 9:08 horas e minutos.
bu)
No mês de Setembro de 2005 o Autor trabalhou 112 horas e 40 minutos, sendo que nos dias 4, 8, 9, 10, 14, 16, 21 e 23 trabalhou 9:53, 9:02; 9:31; 10:16; 10:26, 10:28, 9:44 e 8:58 horas e minutos.
bv)
No mês de Outubro de 2005 o Autor trabalhou 112 horas e 39 minutos, sendo que nos dias 11, 13, 18, 21, 24, 26 e 29 trabalhou 10:11, 11:38; 10:15; 9:03; 10:04; 10:13 e 11:14 horas e minutos.
ca)
No mês de Novembro de 2005 o Autor trabalhou 88 horas e 26 minutos, sendo que nos dias 3, 4, 10, 18 e 20 trabalhou 10:08, 9:45; 9:33; 10:28 e 10:35 horas e minutos.
cb)
No mês de Dezembro de 2005 o Autor trabalhou 82 horas e 14 minutos, sendo que nos dias 6, 7, 12, 13, 19 e 25 trabalhou 10:13, 8:56; 8:55; 8:30; 9:51 e 10:07 horas e minutos.
cc)
No mês de Janeiro de 2006 o Autor trabalhou 141 horas e 34 minutos, sendo que nos dias 3, 4, 6, 9, 11, 15, 18, 23, 24 e 25 trabalhou 9:38, 9:21; 10:56; 9:16; 9:13; 9:36; 12:11; 9:44; 10:27 e 11:03 horas e minutos.
cd)
No mês de Fevereiro de 2006 o Autor trabalhou 120 horas e 53 minutos, sendo que nos dias 5, 6, 12, 13, 17, 20, 26 e 27 trabalhou 10:21, 10:51; 10:01; 10:28; 10:13; 11:08; 9:46 e 10:18 horas e minutos.
ce)
No mês de Março de 2006 o Autor trabalhou 101 horas e 15 minutos, sendo que nos dias 4, 5, 6, 10, 11, 20 e 26 trabalhou 10:16, 8:21; 10:10; 8:01; 8:21; 9:25 e 9:31 horas e minutos.
cf)
No mês de Abril de 2006 o Autor trabalhou 131 horas e 9 minutos, sendo que nos dias 12, 13, 15, 16, 20, 25, 29 e 30 trabalhou 9:32, 9:48; 9:53; 8:36; 8:31, 11:03; 10:03 e 10:45 horas e minutos.
cg)
No mês de Maio de 2006 o Autor trabalhou 124 horas e 53 minutos, sendo que nos dias 1, 3, 6, 7, 10, 13 e 22 trabalhou 10:58, 10:03; 10:10; 08:25; 11:05; 10:56 e 11:24 horas e minutos.
ch)
No mês de Junho de 2006 o Autor trabalhou 115 horas, sendo que nos dias 3, 5, 9, 11, 12, 24, 26 e 29 trabalhou 10:31, 10:18; 10:24; 9:28; 11:01; 9:46; 10:18 e 8:07 horas e minutos.
ci)
No mês de Julho de 2006 o Autor trabalhou 134 horas e 55 minutos, sendo que nos dias 2, 3, 7, 10, 15, 17, 21 e 24 trabalhou 10:06, 10:01; 8:21; 9:41; 11:31; 8:36; 9:21 e 9:03 horas e minutos.
cj)
O Salário Anual Suplementar referente a 2003 pago pela Ré ao Autor em Janeiro de 2004 foi no valor de MOP$18,411.00.
cl)
O Autor subscreveu o documento de folhas 801 onde aceita a alteração da cláusula do seu contrato de trabalho relativamente ao pagamento do Salário Anual Suplementar nos termos que daquele constam e aqui se dão por reproduzidos.
cm) O referido no item anterior resultou das dificuldades financeiras sentidas pela R. no ano de 2003 resultantes do surto de SARS que se abateu na Ásia e, em particular, na Região Administrativa Especial de Hong Kong.
cn)
Em 1 de Setembro de 2003, a Ré solicitou autorização à então Direcção de Serviços de Trabalho e Emprego para a execução do acordo efectuado com o A. de diminuição do Salário Anual Suplementar.
co)
Por ofício datado de 2 de Abril de 2004, a Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego notificou a Ré de que, por despacho de 25 de Fevereiro de 2004, o Secretário para a Economia e Finanças houvera aprovado a redução do Salário Anual Suplementar.
cp)
No dia 7 de Setembro de 2006, o A. comandou e pilotou a aeronave que efectuou o voo número XXXX entre a Região Administrativa Especial de Macau e o Aeroporto Internacional de Chengdu, no continente da China.
cq)
Ao aproximar-se do Aeroporto Internacional de Chengdu, durante o primeiro contacto com o Controlo de Tráfego Aéreo, o A. pediu para que lhe fosse confirmada a vectorização e para lhe ser dada a altitude e recebeu como resposta da torre da controle “confirmo”, ao que o Autor informou a STAR que seguia e pediu de novo a altitude tendo obtido de resposta a vectorização 360, pedindo o Autor para confirmar a altitude de 3600M, sendo-lhe respondido 3900M, ao que o Autor respondeu que desceu e manteve a altitude 3900M e que seguia a (STAR) FJC01A respondendo a Torre de controlo que aprovou, tudo conforme consta do DVD+R junto aos autos em audiência de julgamento, minuto 03:24 a 04:23.
cr)
Após o diálogo anterior a Torre de controlo deu ao Autor a altitudes 3600M e velocidade 190 o que este executou, após a torre de controlo deu ao Autor a altitude de 3000M e a vectorização de 350 tendo o Autor executado a altitude e quando a torre de controlo pede ao Autor a vectorização este responde que está a seguir (a STAR) FJC01A na vectorização 335, respondendo a torre de controlo para cancelar a SID e a vectorização por radar e se manter na altitude de 3000M, tudo conforme consta do DVD+R junto aos autos em audiência de julgamento, minuto 04:50 a 06:52 e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
cs)
Após o diálogo anterior o Autor disse “para sua informação eu não gosto de vectorização por radar” tendo a torre de controlo informado a altitude de 3000M que o Autor confirmou, mandando a torre de controlo que o autor executasse uma órbita pela direita ao que este respondeu “ai ai ai” e executou, a seguir é informado ao Autor a altitude a qual este pede para confirmar, sendo respondido ao que aquele manifesta que é difícil entender o controlador que não fala Chinês nem Inglês e mistura as duas línguas pedindo novamente para confirmar a altitude o que foi confirmado prosseguindo depois o diálogo até à aproximação à pista, tudo conforme consta do DVD+R junto aos autos em audiência de julgamento, minuto 07:01 a 09:51 e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
ct)
O Autor aterrou o avião na pista.
cu)
O outro piloto da referida aeronave Primeiro-Oficial Lima a pedido do Capitão Du, Vice-Presidente da Ré efectuou o “Relatório de Primeiro-oficial” (tradução livre do Inglês: “F/0 Report”) informando que:
“Nós não tivemos problemas de comunicação.
Durante a aproximação as instruções do controlador foram altas e claras e a fraseologia linguística foi normal.
O comandante por vezes utilizou fraseologia fora do normal.
Durante a descida, nós recebemos instruções para nos dirigirmos para FLC VOR, FLC O1A Chegadas, manter os 4200 mt.
Depois de FLC VOR, o controlador instruiu-nos para descermos para os 3900 mt.
A instrução seguinte foi para virar à esquerda, interceptar a vectorização do curso de aproximação final ILS RWI 02.
Eu estava virar a alavanca de selecção HDG no FCV quando o comandante tirou a minha mão da alavanca e disse ao controlador que não iria virar e que iria continuar no STAR. Eu fiquei surpreso e mesmo discordando com a situação, para manter a serenidade na cabine e não criar mais stress, continuei com a mesma atitude positiva anterior.
O controlador repetiu a mesma instrução dada anteriormente por diversas vezes.
O comandante XXX, ainda PNF, recusou as instruções do ATC (Controlo de Tráfego Aéreo) e disse-me para me manter no STAR.”
cv)
Em 8 de Setembro de 2006, a Administração Regional do Sudeste da Autoridade de Aviação Civil da China enviou uma carta à Ré cuja cópia consta de folhas 875/876 e aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
cx)
A R., após ter tomado conhecimento dos factos ocorridos no dia 7 de Setembro, começou uma investigação ao incidente.
cz)
No dia 18 de Outubro notificou a Autoridade de Aviação Civil de Macau do relatório final da investigação.
da)
A Ré opera em qualquer dia do ano, tendo um funcionamento contínuo, estendendo-se as suas operações aos fins-de-semana e feriados obrigatórios.
db)
O A. apresentou à Ré, em 12 de Setembro de 2006, uma carta de demissão com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2006.
As questões a decidir nesta sede processual consistem em conhecer da:
1. Da existência de justa causa para o despedimento do Autor;
2. Da compensação pelo trabalho prestado em dias feriado;
3. Da compensação pelo trabalho nocturno prestado;
4. Da compensação pelo trabalho extraordinário;
5. Da licitude da redução salarial.
6. Dos juros moratórios pedidos;
Vejamos então!
«Diz-se contrato de trabalho aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade ou direcção desta» - Cit. de António de Lemos Monteiro Fernandes em Direito de Trabalho, Vol. I, 6ª Ed., 1987, pág. 48 -.
Não sendo esta questão posta em causa temos por assente que entre o Autor e a Ré foi celebrado um contrato de trabalho, sendo que a relação laboral durou de 08.01.1997 a 20.09.2006.
Considerando o período durante o qual a relação de trabalho subsistiu a mesma esteve sempre sujeita ao regime consagrado no Decreto-Lei nº 24/89/M.
Definida a natureza jurídica da relação material subjacente e o regime jurídico aplicável, analisemos as questões que cumpre apreciar e decidir.
1. Da existência de justa causa para o despedimento do Autor;
A factualidade referente a esta questão encontra-se nas alíneas ac), ad) e cp) a cz).
O Decreto-lei 24/89/M no artº 43º nº 1 consagrava que «ocorrendo justa causa, qualquer das partes pode pôr termo à relação de trabalho, não havendo lugar ao pagamento de indemnizações», estabelecendo no seu nº 2 que «constitui, em geral, justa causa qualquer facto ou circunstância grave que torne praticamente impossível a subsistência das relações de trabalho».
O artº 44º do mesmo diploma consagra que:
Artigo 44.º
(Justa causa de rescisão por iniciativa do empregador)
1. Constituem justa causa para o empregador rescindir a relação de trabalho, entre outros, os seguintes factos:
a) A conduta culposa do trabalhador que viole os deveres emergentes do presente decreto-lei e do contrato;
b) A qualidade do trabalho prestado;
c) Alteração das condições em, que a relação de trabalho foi acordada, desde que relevante.
2. A invocação de justa causa que venha a relevar-se insubsistente, torna o despedimento ilegítimo e sujeito às consequências decorrentes da lei.
O que resulta da factualidade assente é que «Em 20 de Setembro de 2006, o Autor recebeu uma carta da Ré, nos termos da qual foi informado que o seu contrato de trabalho cessava nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 44º, nº 1 alínea a) da Lei Laboral, ou seja, por iniciativa da B, com efeitos imediatos, a qual consta de folhas 223 e aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos» - cf. al. ac) -.
Pese embora naquela carta se invoque o disposto no artigo 44º, nº 1 alínea a) da Lei Laboral, o certo é que dali não resulta qual a conduta em concreto, isto é, quais os factos que sendo imputáveis ao Autor implicaram a violação dos deveres emergentes do contrato.
Contudo, ao tempo não existia norma idêntica ao actual artº 69º da Lei nº 7/2008 a qual impõe a comunicação escrita da decisão de cessação da relação laboral com a descrição sumária dos factos que lhe são imputados.
Destarte, em termos formais tem que se ter a declaração da cessação como perfeita.
Que dizer contudo dos fundamentos.
A este respeito invoca a Ré que o Autor no dia 7 de Setembro de 2006 não obedeceu às orientações da torre de controlo pondo em risco a navegação aérea na zona, seja para a aeronave que pilotava fosse para as restantes.
O que se provou sobre esta questão consta das alíneas cq) a ct).
Malogradamente as partes pouco alegam no que a esta matéria concerne, mas há que atender a determinados conceitos de navegação aérea para se entender o diálogo entre o Autor e a Torre de controlo. Para o efeito uma STAR é um procedimento de aproximação à pista/aterragem pré-definido e do qual constam a vectorização e altitudes a que o avião deve obedecer para sair do corredor aéreo em que circulava e fazer a sua aproximação à pista. Ou seja, usando uma linguagem comum, uma STAR é uma espécie de mapa de “estradas aéreas” para o avião seguir. Uma SID é o mesmo tipo de procedimento mas para levantar voo.
Aterrar por vectorização é um procedimento de aterragem unicamente orientado pela torre de controlo mandando o avião seguir para determinadas coordenadas/orientação e a determinadas altitudes, mas que não estão previamente definidas e são escolhidas no momento pelo controlador aéreo.
A diferença entre uma e outra é que na aproximação feita com base numa STAR o piloto sabe a orientação e altitude que deve seguir e que corresponde ao que está previamente definido. A STAR funciona como um trajecto escrito num mapa.
Na aproximação por vectorização o piloto é informado momento a momento qual a orientação e altitude para onde deve seguir. Nesta situação se o piloto não receber de modo perfeito as orientações da torre de controlo ou não obedecer correctamente à indicação da torre de controlo pode ocorrer um acidente, uma vez que o trajecto não está previamente definido, podendo a aeronave embater no relevo existente.
Nas alíneas cq), cr) e cs) está resumidamente transcrito o diálogo entre o Autor e a torre de controlo no dia do evento.
Tal como se refere na redacção daquelas alíneas e na fundamentação da matéria de facto, o que se deu como provado foi o que consta da gravação – diálogo falado – e não o resumo escrito, pois este dista e em muito, no que à clareza concerne, do que consta da gravação.
Importa também aqui referir que a linguagem entre pilotos e torre de controlo é extremamente codificada precisamente para facilitar as já difíceis transmissões por rádio. Daí que desvios a essa linguagem gerem imediatamente duvidas sobre a informação transmitida.
Seguindo o diálogo desde o início o que podemos observar é que o Autor pede para que lhe seja confirmada a vectorização e para lhe ser dada uma altitude.
Da torre de controlo recebe como resposta “affirm” que corresponde a confirmo. Ou seja, a torre de controlo não entendeu a pergunta do Autor e responde apenas a metade, ou seja, confirma a vectorização e não responde à altitude.
O Autor volta a informar a STAR que está seguir e que não aceita vectorização por radar e pede novamente a altitude. O diálogo prossegue em manifesta dificuldade de comunicação não se percebendo a informação que é transmitida e numa manifesta confusão se a informação que é transmitida respeita a vectorização ou altitude, terminando com a torre de controlo a aprovar a aproximação através da STAR indicada pelo Autor.
Porém, após a aprovação da STAR a torre de controlo volta a dar informações para vectorização por radar desrespeitando a STAR e manda cancelar a SID – procedimento para levantar voo -. Este diálogo decorre no espaço de tempo de dois minutos e trinta segundos.
Ora, a dificuldade de audição das informações emitidas pela torre de controlo e a quase impossibilidade de entender o que delas consta, tudo como resulta de forma inequívoca da gravação, associada à contradição de informação, v.g. ora se aprova, ora se manda alterar, estando em procedimentos STAR manda cancelar SID, pede-se altitude e/ou para confirmar altitude e é informada vectorização … leva-nos a ter de concluir que subsistem muitas duvidas quanto à alegada incorrecção do procedimento do Autor.
Por outro lado, na prática o que sucedeu foi o Autor seguir um procedimento – mapa de aproximação (STAR) – previamente estabelecido e como tal garantido em vez de seguir de forma “cega” a orientação da torre de controlo, cuja percepção e clareza são objectivamente inexistentes.
Se adicionarmos a tudo isto o cansaço decorrente da “pressão” de se levar o comando de uma aeronave de passageiros, cuja aterragem em zona montanhosa se pretendia, não podemos concluir com a certeza jurídica necessária que o Autor tenha violado uma qualquer regra de segurança a que estivesse obrigado.
Por outro lado, cabia à Ré que, aquando do despedimento apenas alegou a violação da alínea a) do nº 1 do artº 44º do Decreto-Lei nº 24/89/M, indicar de modo objectivo quais as normas da navegação aérea que o procedimento do Autor violou, o que não fez.
A documentação que foi junta aos autos a folhas 868 – certidão emitida pela autoridade de aviação civil da RAEM – e que em parte serviu para fundamentar alguma da factualidade dada por assente, não permite de modo algum concluir que o Autor haja violado uma qualquer regra a que estivesse obrigado, pelo menos com base no que dali consta.
Se não vejamos, o relatório junto pelo co-piloto é a versão dos factos apresentada por este, e não mais do que isso, o qual quando comparado com a audição da gravação nos permite suscitar duvidas sobre a sua credibilidade.
O outro elemento junto é o relatório da torre de controlo, obviamente com uma versão oposta à do Autor pelo que, careceria também de ser indagada e provada.
Ou seja, daquela certidão nada resulta que permita uma conclusão segura e fundamentada, ficando-se sem saber que diligências foram realizadas para apurar dos factos, que factos foram apurados e que regras foram violadas.
Destarte, impõe-se concluir não ter sido demonstrado com a certeza jurídica necessária a existência de factos imputáveis ao Autor que permitam concluir que este tenha tido uma conduta culposa violadora dos deveres a que estava obrigado emergentes do Decreto-Lei nº 24/89/M e do contrato de trabalho, pelo que, se impõe concluir pela inexistência de justa causa para o despedimento por banda do empregador aqui Ré.
Nos termos do artº 48º do Decreto-Lei nº 24/89/M verificando-se ser insubsistente a justa causa invocada pelo empregador é este obrigado ao pagamento de uma indemnização igual ao dobro da prevista no nº 4 do artº 47º do mesmo diploma.
Ora, uma vez que in casu a relação laboral durou mais de 9 e menos de 10 anos, de acordo com a alínea g) do nº 4 do artº 47 supra indicado, in casu, a indemnização há-de ser igual ao dobro do equivalente a 18 dias de salário por cada ano de serviço, com as limitações dos números 5 e 6 daquele preceito.
Assim, o valor do salário diário seria de MOP$466,67, correspondendo o valor a 18 dias a MOP$8.400,06 o qual multiplicado por nove anos que durou a relação laboral – MOP$75.600.54 e depois por dois, corresponde ao valor global de MOP$151.201,08, quantia a pagar pela Ré ao Autor a título de indemnização pelo despedimento.
2. Da compensação pelo trabalho prestado em dias feriado;
A factualidade referente a esta matéria encontra-se nas alíneas ao) e ap).
Dali resulta que ao longo da relação laboral o Autor trabalhou em 42 feriados obrigatórios.
Sobre esta matéria dispõe o artº 19º e 20º do Decreto-Lei nº 24/89/M.
Contudo, de entre os feriados obrigatórios apenas os feriados do dia 1 de Janeiro, três dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro são remunerados e apenas o trabalho prestado nesses dá direito a acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal.
Pelo que relativamente aos feriados obrigatórios remunerados em que o Autor trabalhou, tendo-se demonstrado – alínea ao) – que não recebeu da ré qualquer compensação, isto é, que foi apenas remunerado como um dia normal de trabalho, tem este direito a receber o valor correspondente ao dobro do salário diário.
No mesmo sentido veja-se Acórdão do TUI proferido no processo nº 28/2007 em 21.09.2007 -:
«2.6. Salário pelo trabalho em dias de feriado obrigatório
Está em causa o trabalho prestado pelo autor nos dias de feriado obrigatório (1 de Janeiro, três dias no Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro), em que a lei prevê o direito à retribuição (art. 19.°, n. «nºs 1 e 3 do RJRL).
O art. 20.°, n.º 1 do mesmo diploma dispõe que “O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, referidos no n.º 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal...”.
Quer isto dizer que a lei atribui uma remuneração nunca inferior ao dobro da normal, que acresce a esta, pelo que bem decidiu o Acórdão recorrido ter o trabalhador direito ao triplo da retribuição diária, já que não se provou terem as partes acordado uma remuneração superior para tal trabalho.
Mas, como o autor já foi pago em singelo, terá, agora, direito ao dobro da retribuição.».
Assim sendo, e numa vez que do mapa constante da alínea ap) resulta que o Autor trabalhou em 22 dias feriados obrigatórios remunerados, tem este direito a receber a respectiva remuneração.
Remuneração essa que será calculada com base no salário diário do Autor ao tempo (divisão do valor do salário base por 30).
Deste modo, a título de indemnização pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório tem o Autor direito a receber a quantia de MOP$71.296,28 conforme resulta do mapa que segue.
Ano
Dia
Feriado Obrigatório (MOP)
D x Q x V = T
1997
1 Maio
1
x
1,333.33
x
2
=
2,666.66
1 Outubro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
1998
20 Janeiro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
1999
17 Fevereiro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
18 Fevereiro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
1 Maio
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
1 Outubro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
2000
5 Fevereiro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
6 Fevereiro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
7 Fevereiro
1
x
1,337.20
x
2
=
2,674.40
2002
1 Janeiro
1
x
1,733.33
x
2
=
3,466.66
1 Maio
1
x
1,733.33
x
2
=
3,466.66
1 Outubro
1
x
1,733.33
x
2
=
3,466.66
2004
1 Janeiro
1
x
1,866.67
x
2
=
3,733.34
22 Janeiro
1
x
1,866.67
x
2
=
3,733.34
23 Janeiro
1
x
1,866.67
x
2
=
3,733.34
1 Maio
1
x
1,866.67
x
2
=
3,733.34
2005
1 Janeiro
1
x
1,866.67
x
2
=
3,733.34
9 Fevereiro
1
x
1,866.67
x
2
=
3,733.34
1 Maio
1
x
1,960.00
x
2
=
3,920.00
2006
31 Janeiro
1
x
1,960.00
x
2
=
3,920.00
1 Maio
1
x
1,960.00
x
2
=
3,920.00
TOTAL MOP
71,296.28
3. Da compensação pelo trabalho nocturno prestado;
A matéria de facto referente a esta questão encontra-se nas alíneas aq) a au).
Tal como resulta dos contratos de trabalho celebrados entre o Autor e a Ré e dados por reproduzidos nas alíneas c), j), o) e t), constantes de folhas 76/83, 122/129, 150/156, 200/204 o trabalho prestado pelo Autor entre as 00.00 horas e as 06.00 horas era remunerado com um acréscimo salarial de 25%.
Como resulta das alíneas ar) a au) nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 o Autor efectuou voos nocturnos, isto é durante o período compreendido entre as 00.00 e as 06.00 horas, pelo que, terá de ser remunerado com um acréscimo salarial de 25%.
Assim há que proceder ao apuramento do montante devido.
No cálculo da remuneração devida há que ter em consideração o valor do salário base que o Autor auferia na data em que os voos nocturnos foram realizados, elementos estes que constam da factualidade apurada. No que concerne às datas (dia e mês) em que os voos nocturnos se realizaram, embora não se refira expressamente nas alíneas ar) a au), tal resulta dos documentos que serviram para formar a convicção do tribunal quanto à resposta dada aos itens 10º a 13º da base instrutória e referidos a folhas 942. Pelo que, em prol de se apurar o quanto concretamente devido, evitando remeter as partes para execução de sentença, socorremo-nos dos referidos elementos para o apuramento em causa.
Assim, a título de remuneração devida pelo trabalho nocturno realizado nos anos de 2003 a 2006 o Autor tem a receber a quantia de MOP$26.379,67, conforme se demonstra no mapa anexo.
Ano
Voo Nocturno (MOP)
H x Q = T
2003
16:09
x
233.33
=
3,768.33
2004
30:59
x
233.33
=
7,229.44
Jan - Abr 2005
16:15
x
233.33
=
3,791.67
Maio - Dez 2005
15:30
x
245.00
=
3,797.50
Jan - Jun 2006
25:01
x
245.00
=
6,129.08
Jul-06
6:15
x
266.18
=
1,663.65
TOTAL MOP
26,379.67
4. Da compensação pelo trabalho extraordinário;
A factualidade referente a esta questão encontra-se nas alíneas ax) a ci).
Apenas se reivindica trabalho extraordinário para os anos de 2003 a 2006.
Para o período em causa regulam os contratos de trabalho de folhas 154/160 e 200/204, referidos nas alíneas o) e t).
Desses contratos resulta que quando o Autor voar mais do que 850 horas por ano o excesso é remunerado à razão de 1.5 – veja-se cláusula 8.1 e 8.2 -.
Pergunta-se então o que é que o contrato de trabalho regula: trabalho extraordinário ou um limite de horas de voo?
Salvo melhor opinião a cláusula em questão reporta-se apenas a tempo de voo – entre a colocação de calços ou em inglês bloks off, bloks on), tal, como aliás se esclarece no nº 2 da cláusula.
Mas se duvidas ainda subsistirem vejamos ainda:
A título meramente ilustrativo é bom de referir que o RJRT vigente ao tempo definia para o comum dos trabalhadores uma carga horária semanal de 48 horas, o que depois de descontado os seis dias de descanso semanal, ou seja uma semana, corresponde a uma carga horária de 2.448 ano.
É certo que a actividade do Autor é específica e desgastante, mas ainda assim, seria intenção de consagrar tão grande discrepância? Parece-nos que não.
O que resulta da letra do contrato não é propriamente o pagamento de trabalho extraordinário quando prestado para além do horário normal, mas sim, o pagamento extraordinário de horas de voo quando para além do limite estabelecido. Solução que facilmente se entende se atendermos, que como resulta da factualidade assente o tempo de voo – período entre o tirar de calços e o recolocar os calços no avião – não é o mesmo que tempo de trabalho do Autor, pois o exercício da actividade laboral deste começa antes do início do voo e termina algum tempo após o termo do voo.
Esta questão é de tal forma importante que se consultarmos os “log book” do autor juntos aos autos, verificamos que nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 o Autor não voou mais do que 850 horas por ano e no entanto das alíneas bd) a ci) resulta que nos anos de 2004 a 2006 trabalhou mais do que 850 horas por ano.
Destarte, salvo melhor opinião não podemos interpretar aquela cláusula contratual como referente à remuneração de trabalho extraordinário, mas apenas como remuneração de horas de voo quando para além das 850 anuais.
Aqui chegados resta-nos apurar se o Autor prestou trabalho extraordinário e se tem direito a ser remunerado por tal.
Sobre esta questão estabeleciam os artigos 10º e 11º do Decreto-Lei nº 24/89/M que nenhum trabalhador deveria trabalhar mais de 8 horas por dia com um limite de 48 horas semanais, podendo o limite de 8 horas ser excedido até às 10.30 horas de acordo com os usos e costumes ou o modo de laboração.
No entanto não resulta dos nº 1 e 2 do indicado artº 10º que o período das 8 às 10.30 horas de trabalho seja trabalho extraordinário.
Porém, do nº 3 desse preceito resulta inequívoco que sempre que o período de trabalho exceder as 48 horas semanais tal é qualificado como trabalho extraordinário.
Ou seja, para o legislador do Decreto-Lei 24/89/M só havia trabalho extraordinário quando era excedido o limite semanal, interpretação que é corroborada pelas alíneas e), g) e h) do artº 2º do mesmo diploma, onde se refere que trabalho extraordinário é aquele que é prestado para além do período normal de trabalho, sendo o período normal de trabalho o número de horas que o trabalhador se obriga a prestar, mas em que período normal de trabalho e horário de trabalho são coisas distintas, sendo o horário de trabalho diário, mas já não o período normal de trabalho. Neste mesmo sentido, atente-se à mudança de redacção dos nº 6 e 8 do artº 2º da Lei 7/2008.
Assim sendo, no domínio da legislação vigente ao tempo em que decorreu a relação laboral entre Autor e Ré há trabalho extraordinário quando o trabalhador prestou a sua actividade por mais de 48 horas semanais.
Da prova produzida – alíneas ax) a ci) – e do seu confronto com o calendário o Autor apenas prestou mais do que 48 horas de trabalho por semana, na semana de 19 a 25 de Junho de 2005, tendo trabalhado 48 horas e 50 minutos.
Haveria assim que remunerar os 50 minutos de trabalho extraordinário prestado pelo Autor.
Contudo, entre Autor e Ré nada foi acordado quanto à remuneração do trabalho extraordinário – artº 11º nº 2 do Decreto-Lei nº 24/89/M -, pelo que, ainda que se acabe por concluir ter o Autor prestado 50 minutos de trabalho extraordinário, nada tendo sido acordado pelas partes quanto à remuneração deste, nada há a arbitrar ao Autor.
Assim sendo, há que julgar nesta parte o pedido improcedente por não provado.
5. Da licitude da redução salarial.
Relativamente a esta questão a matéria de facto encontra-se nas alíneas cj) a co).
Resumindo a factualidade assente o que dali resulta é que o Autor deu o seu consentimento para a redução salarial relativa ao que ao salário suplementar (e que ass partes apelidavam de 13º mês), redução salarial essa que foi autorizada pela autoridade competente mas posteriormente à sua realização.
Ora, duvidas não há de que a redução salarial foi autorizada.
Sendo certo que a alínea d) do artº 9º do Decreto-Lei 24/89/M referia que a redução salarial tinha de ser precedida de autorização do gabinete para os assuntos do trabalho, o certo é que do contrato de trabalho também não resulta a data em que o tal 13º mês é pago.
A Ré poderia muito bem ter aguardado pela autorização (ou não) da redução e proceder ao pagamento, contudo, optou por pagar aquele valor já com a redução - em Janeiro -, vindo a autorização a ser concedida posteriormente – em Fevereiro -.
Ou seja, sobre esta matéria o que sucedeu foi uma mera irregularidade formal no procedimento que a breve trecho foi sanada com a autorização governamental.
Assim sendo, salvo melhor opinião há que entender que a redução salarial foi legalmente autorizada nada tendo o Autor a receber a este título.
6. Dos juros moratórios pedidos;
Dispõe o nº 4 do artº 794º do C.Civ. que «se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor».
Destarte, sem necessidade de outras considerações, face ao que tem vindo a ser entendido pelo Tribunal de Segunda Instância, nomeadamente Acórdão proferido no processo nº 426/2007, datado de 26.07.2007, tratando-se no caso em apreço de crédito ilíquido os juros moratórios, só se vencem a contar da data em que seja proferida a decisão que procede à liquidação do quanto indemnizatório.
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julga-se a acção parcialmente procedente porque parcialmente provada e em consequência condena-se a R a pagara ao A. a quantia de MOP$248.877,03 acrescida dos juros moratórios à taxa legal a contar da presente data, sendo a R. absolvida do remanescente do pedido.
Custas a cargo da A. e R. na proporção do decaimento.
Registe e Notifique.
Não se conformando com essa sentença, veio a Ré recorrer dela concluindo e pedindo que:
1. A Recorrente despediu o Recorrido com justa causa porque este "no dia 7 de Setembro de 2006 não obedeceu às orientações da torre de controlo pondo em risco a navegação aérea na zona, seja para a aeronave que pilotava fosse para as restantes."
2. Na decisão recorrida, contudo, o tribunal a quo cometeu dois lapsos que acabaram por influenciar a decisão final de forma determinante, a saber:
a. omitiu da lista dos factos dados como assentes os factos que efectivamente evidenciam a desobediência do Recorrido às orientações da torre de controlo; e
b. apesar do fundamento do despedimento ter sido a desobediência "às orientações da torre de controlo pondo em risco a navegação aérea na zona, seja para a aeronave que pilotava fosse para as restantes", o Tribunal a quo não ajuizou sobre a justeza dessa causa de despedimento mas sim sobre uma outra causa (violação de regras de segurança) que nunca foi invocada pela Recorrente.
3. Efectivamente, existiu uma omissão nos factos assentes às respostas dadas pelo Recorrido ao controlador de tráfego aéreo no sentido de que "Não aceito vectorização por radar" ("Don't accept radar vector") e de que "Eu não aceito vectorização por radar" (" I don’t accept radar vector") que levou a que tribunal a quo tivesse concluído que forma equívoca que o Recorrido não teve uma conduta juridicamente censurável.
4. O Recorrido desobedeceu efectivamente às ordens da Torre de Controlo quando, após lhe ter sido ordenado que se orientasse de acordo com as instruções de vectorização que lhe iriam sendo dadas pelo controlador de tráfego aéreo, se negou, por duas vezes, a obedecer a essas ordens.
5. O Recorrido não apresentou, todavia, qualquer justificação para não acatar as ordens da Torre de Controlo que se prendesse com recusas válidas e razoáveis, como questões de segurança, de urgência a bordo, problemas técnicos ou problemas de comunicação.
6. O Recorrido justificou a desobediência às instruções da Torre de Controlo com o facto de não gostar de vectorização por radar!
7. Fica, assim, claro que existem no rol dos factos assentes duas omissões relacionadas com as recusas do Recorrido em obedecer às ordens da Torre de Controlo, apesar de essas omissões e recusas se deverem considerar provadas, na medida em que constam de um documento (o DVD+R) cujo teor foi dado como integramente reproduzido na decisão recorrida.
8. Apesar do fundamento do despedimento do Recorrido ter sido a desobediência "às orientações da torre de controlo pondo em risco a navegação aérea na zona, seja para a aeronave que pilotava fosse para as restantes", o tribunal a quo não se pronunciou sobre a justeza dessa causa de despedimento, sobre as desobediências, a sua justificação, nem sobre o risco criado pelo Recorrido.
9. Efectivamente, em vez de aquilatar se existiu uma efectiva desobediência às ordens recebidas da torre de controlo e se existiu um risco para a navegação aérea e se esses factos e risco constituem justa causa para o despedimento, o tribunal a quo decidiu que "não podemos concluir com a certeza jurídica necessária que o Autor tenha violado uma qualquer regra de segurança a que estivesse obrigado".
10. A causa do despedimento não foi, contudo, a violação de regras de segurança} mas sim a desobediência às ordens da Torre de Controlo criando perigo para a própria aeronave e para as aeronaves que se encontravam no tráfego circundante (e para as vidas das respectivas tripulações e passageiros) .
11. O perigo criado pelo Recorrido para a segurança do voo da aeronave por si comandada e para o outro tráfego aéreo circundante, bem como para as vidas das respectivas tripulações e passageiros, foi real, sério e grave, na medida em que nos minutos que antecederam a aterragem o tráfego aéreo estava muito congestionado, estando os controladores a orientar várias aeronaves simultaneamente num espaço aéreo muito apertado na medida em que este afunila para as aeronaves convergirem no eixo da pista de aterragem (sem menosprezar o tráfego relacionado com as aeronaves em terra que precisam do mesmo espaço aéreo para levantar voo) .
12. Ou seja, o Recorrido (i) desobedeceu efectivamente às ordens da Torre de Controlo por duas vezes, (ii) que o fez por mero capricho justificando-se com o facto de não gostar de ser direccionado por controladores aéreos, (iii) que com essa conduta os controladores de tráfego aéreo tiveram que chamar a atenção das aeronaves circundantes para terem cuidado com o voo da B e tiveram ainda que desviar algum tráfego da rota da aeronave comandada pelo Recorrido e que, por fim, (iv) essa atitude do Recorrido criou um risco efectivo para a segurança das aeronaves que nesse dia se aproximavam ou partiam do Aeroporto Internacional de Chengdu, incluindo a aeronave da própria Recorrente comandada pelo Recorrido.
13. O Tribunal a quo, apesar da objectividade e clareza dos factos e riscos dados como provados e assentes (por remissão para os documentos que se deram como reproduzidos), decidiu que "não podemos concluir com a certeza jurídica necessária que o Autor tenha violado uma qualquer regra de segurança a que estivesse obrigado", acabando por decidir "ser insubsistente a justa causa invocada pelo empregador".
14. É claro que o Tribunal a quo não pôde concluir pela subsistência da justa causa invocada pelo empregador de violação pelo Recorrido de regras de segurança - porque não foi essa a causa invocada para o despedimento.
15. Se o Tribunal a quo se tivesse pronunciado sob a verdadeira causa subjacente ao despedimento do Recorrido (a desobediência às ordens da torre de controlo e o risco criado para pessoas e bens), teria certamente concluído de forma diversa, isto é, que a prova produzida demonstrou ter existido justeza do despedimento do Recorrido.
16. Por outro lado, o Tribunal a quo perfilhou o entendimento equivocado do Recorrido no sentido de que o contrato de trabalho celebrado com a Recorrente lhe conferia o "direito a auferir um acréscimo de 25% pelos voos nocturnos".
17. No entanto, os contratos de trabalho celebrados entre a Recorrente e o Recorrido não conferem ao Recorrido nenhum direito a ser compensado pelo trabalho nocturno com uma taxa adicional de 25%.
18. Os referidos contratos apenas lhe conferem o direito a receber um crédito adicional de 25% na contabilização do número de horas de voo para efeitos de pagamento de horas extraordinárias à razão de 1.5 por cada hora que, num ano de trabalho, exceda as 850 horas de voo.
19. Ou seja, a percentagem de 125% constitui um factor de ponderação (um crédito adicional de 25% de tempo de voo) para cálculo do tempo de trabalho prestado durante o ano civil para efeitos de se apurar se o trabalhador trabalhou mais de 850 horas durante o ano.
20. O Tribunal a quo, contudo, decidiu que o referido crédito de 25% de tempo de trabalho constituía na realidade um crédito salarial (condenando a Recorrente no pagamento de uma compensação correspondente a 25% do trabalho prestado em período nocturno) , confundindo créditos de tempo com créditos salariais.
21. Uma vez que a lei aplicável no período em questão (2003 a 2006) não previa qualquer remuneração adicional pelo trabalho nocturno e uma vez que o contrato de trabalho não confere qualquer remuneração adicional pelo trabalho nocturno, a decisão recorrida carece de fundamento legal e contratual e viola claramente o teor de qualquer um dos contratos de trabalho celebrados entre a Recorrente e o Recorrido.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, determinando-se a revogação da decisão recorrida no que diz respeito às matérias que constituem objecto do presente recurso e a sua substituição por outra que determine a absolvição da Recorrente dos referidos pedidos.
Notificado o Autor ora recorrido, contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso (vide as fls. 1032 a 1062 dos p. autos).
II
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
Em face das conclusões tecidas na petição do recurso, são as seguintes questões que constituem o objecto da nossa apreciação:
1. Da (in)subsistência da justa causa de despedimento; e
2. Da compensação por trabalho nocturno.
Passemos então a apreciá-las.
1. Da (in)subsistência da justa causa de despedimento
O Autor alegou ter sido despedido com a invocação da causa insubsistente, e pediu com base nesse fundamento a indemnização nos termos previstos no artº 44º/2 da lei laboral.
Contestou a Ré dizendo que o despedimento foi legítimo e causado por conduta culposa do Autor, que consiste na inobservância pelo Autor, em 07SET2006, enquanto piloto de uma aeronave de passageiros da Ré, na execução de um voo partindo de Macau com destino à cidade de Chengdu, RPC, das instruções dadas, pelo controlo de Tráfego Aéreo da Administração Regional do Sudoeste das Autoridades de Aviação Civil da China, para efectuar vectorização por radar, como procedimento de aproximação e aterragem no Aeroporto Internacional de Chengdu da RPC.
Para o Tribunal a quo, tendo em conta matéria de facto provada, impõe-se concluir não ter sido demonstrado com a certeza jurídica necessária a existência de factos imputáveis ao Autor que permitam concluir que este tenha tido uma conduta culposa violadora dos deveres a que estava obrigado emergente do D. L. nº 24/89/M e do contrato de trabalho, pelo que, se impõe concluir pela inexistência de justa causa para o despedimento por banda do empregador aqui Ré.
Ora, a conclusão nestes termos a que chegou o Tribunal a quo apoiou-se essencialmente no seguinte:
* A dificuldade da audição das informações emitidas pela torre de controlo e a quase impossibilidade de entender o que delas consta;
* O cansaço decorrente da pressão de se levar o comando de uma aeronave de passageiros a aterrar em zona montanhosa;
* A existência das dúvidas sobre a credibilidade do relatório junto pelo co-piloto, quando comparada com a audição da gravação; e
* A falta de indagação e comprovação da versão do ocorrido em 07SET2006 contida no relatório da torre de controlo.
Para a Ré ora recorrente, ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo omitiu da lista dos factos dados como assentes os factos que efectivamente evidenciam a desobediência do Autor às orientações da torre de controlo.
E justamente por não ter levado em consideração os tais factos omitidos o Tribunal a quo concluiu pela inexistência de justa causa para o despedimento do Autor.
Os tais factos, omitidos pelo Tribunal a quo na óptica da recorrente, consistem no teor dos seguintes fragmentos (as partes sublinhadas) do diálogo entre a torre de controlo e o piloto, ora Autor recorrido, no decurso do procedimento de aproximação com vista à aterragem no Aeroporto Internacional Chengdu da RPC:
Piloto: (aos 3m e 34s) Say again and we will follow, I will follow the STAR, sir. Don’t accept radar vector. FJC01A and give me the altitude.
Torre de Controlo: (aos 03m e 46s) AMU198 descend and maintain FL3900M. Radar vectoring. Now turn right heading 360.
Piloto: (aos 03m e 54s) Sorry, sir. I don’t accept radar vector. FJC01A and say again your altitude.
Para a Ré ora recorrente, é precisamente o facto de o piloto ter dito o que disse que inequivocamente demonstra que o Autor desobedeceu às ordens da torre de controlo.
Ou seja, não aceitou a instrução do controlo de tráfego para proceder com a vectorização por radar, mas insistiu em seguir o procedimento STAR e só pediu que lhe fosse informada altitude.
Ora, ficou provado o que consta da gravação do diálogo.
Por ordem do Exmº Juiz a quo, a Ré ora recorrente juntou aos autos o CD que documentou o diálogo.
A fim de nos inteirar do que se passou, convém ver em que contexto estiveram inseridos os tais fragmentos do diálogo.
Ora, conforme a transcrição escrita do teor, junta pela Ré e não impugnado pelo Autor, do diálogo, juntamente com a apresentação do CD, deste veículo consta o seguinte teor:
C: (03:24) AMU198 heading 360, descend and maintain 3900M.
P: (03:28) Heading 360 confirm? And which altitude?
C: (03:33) Affirm.
P: (03:34) Say again and we will follow, I will follow the ST AR, sir. Don't accept radar vector. FJC01A and give me the altitude.
C: (03:46) AMU198 descend and maintain FL3900M. Radar vectoring. Now tum right hea 360.
P: (03:54) Sorry, sir. I don't accept radar vector. FJC01A and say again your altitude.
C: (04:04) AMU 198 turn right heading 360. Radar vectoring to intercept the localizer.
P: (04:10) Confirm altitude 3600?
C: (04:13) AMU198 3900M.
P: (04:16) 3900M and we are following FJC01A.
C: (04:22) Roger. Approved.
P: (04:23) Thank you.
P: (04:50) AMU198 approaching 3900M.
C: (04:53) AMU198 reduce speed 190, descend and maintain 3600M.
P: (04:59) Speed 190. Descend 3600M. AMU198.
C: (05:54) AMU198 descend and maintain 3000M on QNH 1006. Now turn right heading 350.
P: (06:05) Stand by sir.
P: (06:21) AMU 198 say again altitude?
C: (06:25) AMU 198 attitude 3000M on QNH1 006.
P: (06:30) 3000M on QNH 1006.
C: (06:39) AMU198 report your heading.
P: (06:42) We are on heading JF ... J ... FJC01A. On heading 335.
C: (06:52) AMU198 cancel SID. And radar vectoring. Descend and maintain 3000M until QNH 1006.
P: (07:01) 3000M on QNH 1006. And for your information, I don't like radar vectors.
C: (07:09) Roger, and AMU 198 maintain 3000M on QNH 1006.
P: (07:15) 1006 QNH 3000M, AMU198.
C: (07:21) Roger.
C: (07:43) AMU198 turn right, make a right orbit.
P: (07:49) Ai, Ai, Ai. Right orbit, AMU198.
C: (07:58) AMU198 descend and maintain 2... continue, descend and maintain 2700M.
P: (08:05) Confirm altitude.
C: (08:08) AMU198 descend and maintain 2700M.
P: (08:13) Oh, sorry. It's so difficult to understand. You don't speak Chinese, you don't speak English. You speak mixed English and Chinese. Confirm 2700M?
C: (08:22) Affirm.
P: (09:26) AMU198 2700M.
C: (09:29) Roger AMUI98. Continue descend and maintain 2400M.
P: (09:34) 2400M, AMU198.
C: (09:40) AMU198 you can continue a ... continue approach.
P: (09:47) Continue the STAR for approach the runway 02, confirm?
C: (09:51) Affirm.
E o Tribunal a quo interpretou este diálogo no seu todo nos termos seguintes:
Seguindo o diálogo desde o início o que podemos observar é que o Autor pede para que lhe seja confirmada a vectorização e para lhe ser dada uma altitude.
Da torre de controlo recebe como resposta “affirm” que corresponde a confirmo. Ou seja, a torre de controlo não entendeu a pergunta do Autor e responde apenas a metade, ou seja, confirma a vectorização e não responde à altitude.
O Autor volta a informar a STAR que está seguir e que não aceita vectorização por radar e pede novamente a altitude. O diálogo prossegue em manifesta dificuldade de comunicação não se percebendo a informação que é transmitida e numa manifesta confusão se a informação que é transmitida respeita a vectorização ou altitude, terminando com a torre de controlo a aprovar a aproximação através da STAR indicada pelo Autor.
Porém, após a aprovação da STAR a torre de controlo volta a dar informações para vectorização por radar desrespeitando a STAR e manda cancelar a SID – procedimento para levantar voo -. Este diálogo decorre no espaço de tempo de dois minutos e trinta segundos.
Ora, a dificuldade de audição das informações emitidas pela torre de controlo e a quase impossibilidade de entender o que delas consta, tudo como resulta de forma inequívoca da gravação, associada à contradição de informação, v.g. ora se aprova, ora se manda alterar, estando em procedimentos STAR manda cancelar SID, pede-se altitude e/ou para confirmar altitude e é informada vectorização … leva-nos a ter de concluir que subsistem muitas duvidas quanto à alegada incorrecção do procedimento do Autor.
Todavia, ante o teor do diálogo, ora integralmente transcrito, salvo o devido respeito, nós temos outra interpretação.
O que nós captámos através da leitura da transcrição deste diálogo é que o Autor percebeu as instruções emitidas pelo Controlo de Tráfego Aéreo, isto é, para efectuar o procedimento de aproximação através de vectorização por radar, só que disse por três vezes não aceitar as instruções para seguir o procedimento vectorização por radar por não gostar (3m34s – Don’t accept radar vector; 3m54sse – Sorry Sir, I don’t accept radar vector; 7m01s – And for your information, I don’t like radar vector.) e mostrou-se relutante face a estas instruções, que lhe foram várias vezes repetidas, e acabou por não proceder de acordo com essas instruções, isto é, em vez de levar a cabo o procedimento mediante a vectorização por radar, optou, contra as instruções, por seguir o procedimento STAR que ele próprio decidiu seguir.
Por outro lado, conforme se vê na carta dirigida pela Administração Regional do Sudoeste das Autoridades de Aviação Civil da China ao Vice-Presidente da Ré, em 08SET2006, dia seguinte ao incidente ocorrido, cujo teor foi dado por integralmente reproduzido na matéria de facto provada, a tal atitude de desobediência do Autor em face das instruções dadas pela torre de controlo afectou muitas outras aeronaves, algumas tiveram de alterar a direcção da sua trajectória, enquanto outras precisaram de pairar no céu à espera de instruções, o que levou à grave desordem do tráfego aéreo (This action had affected many of the other aircrafts; some of them have to alter the heading directions, while others need to hover in the sky. As a result, the traffic in the air was very in disarray – vide fls. 877 dos presentes autos).
É verdade que o Autor acusou o pessoal da torre de controlo de não dominar quer chinês quer inglês (8m13s – You don’t speak Chinese, you don’t speak English, You speak mixed English and Chinese.), o certo é que a atitude do próprio Autor é bem demonstrativa da compreensão por parte dele das instruções que lhe foram dadas para seguir o procedimento através da vectorização por radar, procedimento que respondeu expressamente não aceitar.
Ora, mesmo para nós, leigos na matéria da pilotagem de aeronaves e da aviação civil, a atitude do Autor é extremamente perigosa, basta pensar no número dos passageiros por ele conduzidos e dos outros utentes e passageiros que se transportavam nas outras aeronaves no momento da ocorrência a navegar nas imediações do Aeroporto Internacional Chengdu, cujas vidas poderiam ser postas em alto risco pelo mero gosto, arbítrio e capricho do Autor, assim como nos bens patrimoniais ai envolvidos.
Então vamos averiguar se essa conduta do Autor, sem dúvidas extremamente perigosa, constitui a justa causa para o seu despedimento.
A propósito da matéria de rescisão por iniciativa do empregador com justa causa, o Decreto-Lei nº 24/89/M estatui nos seus artºs 43º/2 e 44º/1-a) que constitui justa causa para o despedimento “a conduta culposa do trabalhador que viole os deveres emergentes do presente do contrato e que que torne praticamente impossível a subsistência das relações de trabalho”.
Conforme se vê na matéria de facto assente, ficou provada a celebração do contrato individual entre o Autor e a Ré, cujo teor foi dado integralmente provado.
Nos termos desse contrato, fica estipulado na sua cláusula 6ª que “The employee is required to comply with all staff regulations……” – cf. fls. 123 dos presentes autos.
Um dos “regulations” a que se refere essa cláusula é o “Flight Operations Manual” que se juntou com a contestação aos autos a fls. 786 a 789, cuja autenticidade não foi impugnada por quem quer seja.
Ai no ponto 1.4.1.5. dedicado ao Flight Execution esta estipulado, inter alia, como dever do piloto, que:
“The Commander shall:
* take all actions which may improve the efficiency and confort of the flight without adverse affect on safety; e
* take all actions necessary to ensure the safety of the flight; if these actions divert from prescribed procedures he shall (if time permits) do so in consultation with other crewmembers and submit a report ……
O Autor não invocou quaisquer razões na ordem da segurança de navegação, do melhoramento de eficiência e do conforto dos passageiros para justificar a sua actuação não conforme com as instruções que lhe foram dadas pelo Controlo de Tráfego Aéreo das Autoridades de Aviação Civil do local do destino.
Antes pelo contrário, como vimos supra, fê-lo por mero arbítrio, gosto e capricho pessoal.
Demonstrada a violação do dever de segurança emergente do contrato individual de trabalho celebrado entre o Autor e a Ré, resta saber ser a tal violação torna praticamente a subsistência das relações de trabalho.
Ora, por razões óbvias, a comprovada actuação do Autor abalou já gravemente a confiança nele depositada pela Ré ao entregar a ele o comando da aeronave em cada voo comercial de passageiros, o que torna necessariamente inexigível à Ré a continuação das relações de trabalho com o Autor.
Aliás esse nosso juízo é reforçado pela carta, acerca da ocorrência em 07SET2006, dirigida à Ré pela Administração Regional do Sudoeste da Autoridade de Aviação Civil da China, onde foi dito, em tom extremamente sério, que “In order to maintain the flight safety in the our responsible FIR, also considering the benefit of your company’s flight operation, we believe the captain who conduct the above said flight, is not qualifiied and appropriate to conduct flights in southwest área of China any more.” – cf. fls. 877 dos presentes autos.
Assim sendo, sem mais delonga, é de concluir que a atitude do Autor tal como foi descrita na matéria de facto assente é violadora dos seus deveres de segurança exigidos no manual de operações dos voos (“Flight Operations Manual”) para o qual remete expressamente o contrato individual de trabalho e constitui causa mais do que justa para o seu despedimento.
Procede assim esta parte do recurso.
2. Da compensação por trabalho nocturno
O Autor pediu a compensação consistente no acréscimo de 25% pelo trabalho efectuado no período compreendido entre 00h00 e 06h00, hora de Macau.
O Tribunal a quo julgou procedente e condenou mais do que pediu nos termos seguintes:
1. Da compensação pelo trabalho nocturno prestado;
A matéria de facto referente a esta questão encontra-se nas alíneas aq) a au).
Tal como resulta dos contratos de trabalho celebrados entre o Autor e a Ré e dados por reproduzidos nas alíneas c), j), o) e t), constantes de folhas 76/83, 122/129, 150/156, 200/204 o trabalho prestado pelo Autor entre as 00.00 horas e as 06.00 horas era remunerado com um acréscimo salarial de 25%.
Como resulta das alíneas ar) a au) nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 o Autor efectuou voos nocturnos, isto é durante o período compreendido entre as 00.00 e as 06.00 horas, pelo que, terá de ser remunerado com um acréscimo salarial de 25%.
Assim há que proceder ao apuramento do montante devido.
No cálculo da remuneração devida há que ter em consideração o valor do salário base que o Autor auferia na data em que os voos nocturnos foram realizados, elementos estes que constam da factualidade apurada. No que concerne às datas (dia e mês) em que os voos nocturnos se realizaram, embora não se refira expressamente nas alíneas ar) a au), tal resulta dos documentos que serviram para formar a convicção do tribunal quanto à resposta dada aos itens 10º a 13º da base instrutória e referidos a folhas 942. Pelo que, em prol de se apurar o quanto concretamente devido, evitando remeter as partes para execução de sentença, socorremo-nos dos referidos elementos para o apuramento em causa.
Assim, a título de remuneração devida pelo trabalho nocturno realizado nos anos de 2003 a 2006 o Autor tem a receber a quantia de MOP$26.379,67, conforme se demonstra no mapa anexo.
Ano
Voo Nocturno (MOP)
H x Q = T
2003
16:09
x
233.33
=
3,768.33
2004
30:59
x
233.33
=
7,229.44
Jan - Abr 2005
16:15
x
233.33
=
3,791.67
Maio - Dez 2005
15:30
x
245.00
=
3,797.50
Jan - Jun 2006
25:01
x
245.00
=
6,129.08
Jul-06
6:15
x
266.18
=
1,663.65
TOTAL MOP
26,379.67
Apesar de o Tribunal a quo teceu considerações no sentido de que o Autor terá de ser remunerado com um acréscimo salarial de 25% pelos voos nocturnos, o certo é que este acréscimo não foi levado em conta para a elaboração desse mapa onde se apurou o valor da compensação que atribuiu.
Pois, como se vê nesse mapa, embora não explicada a forma como se apuraram os dados numéricos, sabemos, através da análise dos elementos numéricos constantes da matéria de facto assente, que o valor de compensação resulta tão só da multiplicação do salário horário pelo número das horas dos voos nocturnos efectuados durante o período entre 2003 e 2006.
E não a multiplicação do acréscimo de 25% do salário horário pelo número das horas dos voos nocturnos efectuados durante o período entre 2003 e 2006, que o Autor pediu.
Não a multiplicação do acréscimo de 25% porque no mapa foi atribuído ao Autor o valor resultante da multiplicação do salário horário por cada hora de voos nocturnos, que é simplesmente calculado mediante a divisão do salário mensal, por 30 (dias por mês) e por 8 (horas por dia).
Ou seja, em vez de atribuir ao Autor a compensação, que o Autor pediu, consubstanciada no acréscimo de 25% em todas as horas de voos nocturnos ao longo do período compreendido entre JAN2003 e JUL2006, o Tribunal a quo deu a compensação consistente no valor achado mediante a multiplicação do número dos voos nocturnos pelo salário horário base.
Perante o assim decidido, a recorrente veio reagir contra a tese invocada pelo Autor no sentido de que o contrato de trabalho confere ao Autor o direito a auferir um acréscimo de 25% pelos voos nocturnos.
Na óptica da recorrente, o contrato não confere ao Autor nenhum direito a ser compensado pelos voos nocturnos com uma taxa adicional de 25%.
Mas sim, para a recorrente, o contrato individual de trabalho apenas confere ao Autor o direito a receber um crédito adicional de 25% na contabilização do número de horas de voo para efeitos de pagamento de horas extraordinárias à razão de 1.5 por cada hora que, num ano de trabalho, exceda as 850 horas de voo.
A propósito do dito acréscimo de 25% nos voos nocturnos, ficou estipulado na cláusula 8ª do contrato individual de trabalho, cujo teor foi dado integralmente provado que:
……
8. Flight time limitation and overtime payment
1 The employee's maximum duty and flight times shall be in accordance with the prevailing AACM regulation. In the event the employee's total annual flying hours exceeds the limit of 850 hours at the end of the calendar year, B shall pay overtime payment at 1.5 times the ordinary rate of pay for each completed extra hours flown. Overtime payment will only be made at the end of the calendar year when it can be determined whether the 850 hours has been exceeded.
2 For the avoidance of doubt, Flight Time is determined as blocks off, blocks on time, as reported on the Captain's report. Flight Time hours shall be rated in the following manner:
Flight on effective duty 100%
Flight time not on effective 50%
duty but immediately preceded
or followed by effective duty
Extra crew due to professional 50%
requirement
Ferry Flights 100%
Test Flights 100%
Cargo Flights 100%
Nights Flights 125%
(night flight comprises the period
between 00:00 hrs & 06:00 hrs
Macau time)
Flight Time on Day Off 125%
(only with pilot's agreement)
Public Holidays 100%
……
Tem razão a recorrente, pois se procedermos a uma leitura atenta do clausulado no mesmo contrato, nomeadamente o ponto 8 que acabamos de transcrever, o acréscimo de 25% nele referido é o factor de ponderação para o efeito de cálculo da remuneração das horas de voo nocturno para além de 850 horas por ano.
E não um acréscimo da remuneração de todas e quaisquer horas de voo nocturno.
Todavia, in casu, a questão não se põe.
Não se põe a questão porque, como demonstrámos supra, o valor achado e atribuído ao Autor pelo Exmº Juiz a quo resulta da multiplicação do salário horário pelo número das horas dos voos nocturnos, sem que tivesse tido em conta o tal acréscimo de 25%.
Portanto, como dissemos ab initio, o acréscimo que foi atribuído ao Autor pelo Exmº Juiz a quo foi mais do que o próprio Autor pediu.
Pois o Autor pediu a atribuição do acréscimo de 25%, ao passou que o Tribunal a quo deu 100%, isto é, o salário horário para cada uma das horas de voo nocturno efectuadas nos anos 2003 a 2006.
Naturalmente não se pode manter o assim decidido.
Portanto resta saber se o Autor merece algum acréscimo de 25%, pelos voos nocturnos comprovadamente efecutados.
Tal como vimos na cláusula 8ª do contrato individual de trabalho acima transcrita, o factor de ponderação de 1,25 (acréscimo de 25%) só se aplica às horas de voo nocturno para além de 850 horas de voo em cada ano, e não quaisquer horas de voos nocturnos.
In casu, tendo-se limitado a alegar e provar o número total de voo nocturno nos anos 2003 a 2006, mas não tendo logrado provar o número das horas de voo nocturno para além de 850 horas de voo em cada ano, o pedido do Autor da compensação do acréscimo de 25% não pode deixar de improceder in totum, pois não se sabe se foram efectuados alguns voos nocturnos para além das 850 horas de voo por ano.
Tudo visto resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência julgar procedente o recurso interposto pela Ré B, revogando a parte da sentença recorrida no que diz respeito à condenação da Ré no pagamento ao Autor a quantia de MOP$151.201,08, a título de indemnização de por insubsistência de justa causa invocada do despedimento, e a quantia de MOP$26.379,67, a título de remuneração devida pelo trabalho nocturno realizado nos anos de 2003 a 2006, e mantendo na íntegra a restante parte da sentença recorrida.
Custas pelo Autor recorrido.
Notifique.
RAEM, 19JUN2014
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng