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Proc. nº 195/2013
(Recurso contencioso)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 10 de Julho de 2014
Descritores:
-Renovação de autorização de residência
-Recusa do pedido
-Renovação do pedido

SUMÁRIO:

I – Se o funcionário de um serviço público não aceita o requerimento que o interessado pretende apresentar ao órgão administrativo decisor, não se pode dizer que há por parte dele uma recusa decisória que devesse ser sindicada, se não se demonstrar que tinha competências próprias ou delegadas para o efeito.

II – Se mais tarde o mesmo interessado formula idêntico pedido, não pode a Administração negar-se a conhecer o pedido com o fundamento de ele não ter recorrido da recusa. É que, mesmo que se pudesse falar de uma “recusa decisória”, nada impedia o particular de renovar a pretensão uma vez verificados os requisitos do art. 11º do CPA, gerador de uma nova decisão impugnável.

Proc. nº 195/2013

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A, com os demais sinais dos autos, interpôs neste TSI recurso contencioso do despacho do Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças de 5 de Fevereiro de 2013, que indeferiu o pedido de renovação de autorização de residência temporária.
Na petição inicial apresentou as seguintes conclusões:
«a). Em 2001, o requerente pediu ao IPIM a fixação de residência em Macau por investimento.
b). Em 1 de Maio de 2002, o recorrente e os membros do seu agregado familiar obtiveram a autorização de residência temporária, válida até 1 de Maio de 2005.
c). O recorrente e seus familiares, conforme a marcação, deslocaram-se ao IPIM no dia 25 de Abril de 2005, às 16h45, para tratar das formalidades relativas à renovação da autorização de residência temporária, tendo, na altura, apresentado os documentos necessários para a renovação.
d). O funcionário do IPIM, invocando que o recorrente tinha vendido o prédio objecto do seu investimento, recusou-se a admitir os outros documentos relevantes à renovação entregues pelo recorrente.
e). A fim de tratar das formalidades de renovação com êxito, o recorrente ainda entregou uma declaração ao IPIM, vindo esclarecer as suas situações referentes à aquisição de prédios e solicitar que fosse dada a ele e aos seus familiares a oportunidade de continuar a residir em Macau.
f). Daí se vê que não são verdades a afirmação na respectiva Informação “o requerente, no mesmo dia, não entregou os documentos necessários para o pedido de renovação” ou a de que o recorrente não deduziu pedido de renovação junto da respectiva autoridade.
g). Em 9 de Maio de 2005, o recorrente foi informado por telefone por um funcionário do IPIM de que o seu caso não podia ser processado como pedido de renovação, sendo-lhe necessário apresentar novo pedido.
h). Mas o funcionário do IPIM não indicou claramente ao recorrente a razão pela qual o seu caso não podia ser processado como pedido de renovação, nem lhe esclareceu como “apresentar novo pedido” ou quais os documentos necessários para tal efeito, nem informou o mesmo dos meios de impugnação que poderia utilizar.
i). Depois disso, o recorrente não recebeu qualquer correspondência ou notificação escritas do IPIM.
j). Por isso, atenta a supracitada mensagem do funcionário do IPIM, o recorrente pensava erradamente que já tinha sido cancelado o seu estatuto de residente temporário.
k). Tendo em conta os factos acima mencionados, a decisão que indeferiu o pedido de renovação do requerente não tem fundamento de facto e, além de tudo, violou as respectivas disposições do CPA e da legislação sobre a fixação de residência por investimento.
l). Neste caso concreto, o recorrente, apesar de ter vendido o prédio objecto do investimento, já se constituiu em nova situação jurídica atendível nos termos do art.º 7.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 14/95/M.
m). Além disso, com observância do art.º 8.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, o recorrente foi ao IPIM tratar das formalidades de renovação até trinta dias antes do termo do período de validade da sua autorização de residência temporária.
n). O pessoal do IPIM não tinha fundamento para se recusar a admitir os documentos entregues pelo recorrente para efeitos de renovação.
o). Dest' arte, em sintonia com as disposições legais supramencionadas, o recorrente devia ter o seu pedido de renovação deferido.
p). Por isso, o despacho recorrido violou as disposições do Decreto-Lei n.º 14/95/M referentes à renovação da autorização de residência temporária, e, em consequente, violou também o art.º 3.º do CPA que se reporta ao princípio da legalidade a que deve obediência a actuação da Administração Pública, e que exige a esta que tome decisões em conformidade com as disposições legais.
q). Ademais, à luz do art.º 8.º do CPA, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé.
r). Em face de situações concretas, a Administração Pública deve ponderar, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa, e prestar ao respectivo recorrente (sic) informações e dados correctos, além de esclarecimentos detalhados, em vez de induzir o mesmo em erro.
s). Mas no caso sub judice, o recorrente foi induzido em erro pelas informações incorrectas e inexplícitas prestadas pelo pessoal da Administração, levando a que o seu pedido de renovação da autorização de residência temporária fosse indeferido.
Com base nisto, solicita-se ao Mm.º Juiz que sejam os factos invocados no presente recurso julgados procedentes por provados e que, consequentemente, seja anulado o despacho recorrido em virtude da violação dos aludidos preceitos legais e princípios.
Por fim, solicita-se que, conforme os art.ºs 53.º a 55.º do CPAC, seja a entidade recorrida citada para, em caso de necessidade, contestar no prazo fixado por lei, bem como que se ordene a apensação do respectivo processo administrativo aos presentes autos de recurso contencioso».
*
A fls. 21 dos autos, veio a entidade recorrida informar ter, por despacho seu de 6/05/2013, procedido à reforma do acto administrativo sindicado.
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Na sequência disso, o recorrente, mantendo os fundamentos utilizados na primitiva petição, veio apresentar complementarmente a peça de fls. 25 a 32, que concluiu da seguinte maneira:
«a). Mantendo-se os fundamentos de facto do recurso contencioso interposto em 27 de Março, vem o recorrente impugnar o acto de reforma levado a cabo pela entidade recorrida.
b). No respectivo acto de reforma, foi retirado o fundamento do acto recorrido que se reportava à caducidade da autorização de residência temporária do recorrente resultante da falta de renovação no prazo de 180 dias após o termo do respectivo período de validade, além de que se defendeu a não satisfação pelo recorrente das condições para a renovação devido ao facto de ter vendido o prédio objecto do seu investimento.
c). Mas na realidade, o recorrente consultou a opinião do IPIM antes de vender o referido prédio em 2003, tendo, nessa altura, o funcionário do IPIM dito ao recorrente que bastava que ele voltasse a adquirir bem imóvel de valor correspondente para não lhe deixarem de ser verificados os requisitos para a fixação de residência por investimento.
d). Para além disso, antes de pedir a renovação da autorização de residência, o recorrente já adquiriu um novo prédio, com vista à satisfação das exigências para a fixação de residência por investimento.
e). Neste caso concreto, apesar de ter vendido o prédio objecto do investimento, o recorrente já se constituiu em nova situação jurídica atendível conforme o disposto no art.º 7.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 14/95/M.
f). O recorrente ainda, com observância do art.º 8.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, se deslocou ao IPIM para tratar das formalidades de renovação até trinta dias antes do termo do período de validade da sua autorização de residência temporária.
g). Ao abrigo do estipulado no mencionado diploma legal, devia ser deferido o pedido de renovação do recorrente.
h). Por outro lado, o acto de reforma alegou que o funcionário do IPIM tinha notificado oralmente o recorrente da decisão de indeferimento do seu pedido de renovação.
i). Todavia, a notificação oral desse funcionário não se fundamentava em qualquer decisão da entidade competente, além de que o próprio funcionário não tinha competência para tomar tal decisão de indeferimento.
j). Além de tudo, mesmo que quisesse notificar o recorrente oralmente, deveria fazê-lo de acordo com o art.º 70.º do CPA.
k). No entanto, o funcionário do IPIM não indicou claramente ao recorrente os respectivos fundamentos, nem lhe esclareceu como “apresentar novo pedido”, nem informou o mesmo dos meios de impugnação que pudesse utilizar.
1). Só em 5 de Fevereiro deste ano, o recorrente recebeu o despacho da entidade recorrida que indeferiu o seu pedido de renovação.
m). Pelo exposto, tendo em conta os factos e preceitos legais supracitados, o pedido de renovação da autorização de residência temporária do recorrente (e dos membros da sua família) devia ter sido deferido, sendo que a entidade recorrida, ao indeferir o pedido do requerente, não tinha fundamento de facto e violou as respectivas disposições do CPA e da legislação sobre a fixação de residência por investimento.
n). Assim sendo, o despacho recorrido não só violou as disposições do Decreto-Lei n.º 14/95/M respeitantes à renovação da autorização de residência temporária, como também desrespeitou as respectivas disposições do CPA e o princípio da legalidade.
o). Ainda por cima, dispõe o art.º 8.º do CPA que a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé.
p). Nos presentes autos, o recorrente foi induzido em erro pelas informações incorrectas e inexplícitas prestadas pelo pessoal da Administração, levando a que o seu pedido de renovação da autorização de residência temporária fosse indeferido, razão pela qual se violou também o princípio da boa fé estatuído no CPA.
Com base nisto, mantendo-se os fundamentos do recurso contencioso interposto pelo recorrente em 27 de Março deste ano, em particular, os pressupostos processuais e os fundamentos de facto, solicita-se ao Mm.º Juiz que julgue procedentes por provados os factos e fundamentos apresentados pelo recorrente em relação ao acto de reforma praticado pela entidade recorrida e que, em consequente, anule o despacho recorrido em virtude da sua violação dos preceitos legais e princípios jurídicos acima mencionados.
Por último, pede-se que seja a entidade recorrida notificada para, se considerar necessário, contestar no prazo legalmente fixado, bem como que seja ordenada a apensação do respectivo processo administrativo aos presentes autos de recurso contencioso».
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Contestou a entidade recorrida (fls. 42-47 e tradução de fls. 51-58 do apenso “traduções”), tendo formulado as seguintes conclusões:
«1. Os factos indicados pelo recorrente no n.º 13 da sua petição inicial e no n.º 8 das suas novas alegações e pedidos relativos ao acto reformado revelaram que ele sabia perfeitamente que o seu pedido de renovação da autorização de residência de 25 de Abril de 2005 tinha sido recusado pelo IPIM.
2. A recusa do pedido de renovação de residência implicava que não foi renovada a autorização de residência.
3. Uma vez que não foi renovada a autorização de residência, não existiria procedimento administrativo respeitante à renovação de residência suspenso na sua apreciação.
4. Bastam para comprovar que o recorrente sabia disso a declaração de pedido de clemência que entregou ao IPIM em 26 de Abril de 2005 (cfr. fls. 6 a 8 do processo administrativo) e o facto de, durante os sete anos passados, o recorrente não ter efectuado qualquer consulta ou impugnação junto da Administração.
5. O recorrente, bem sabendo que a sua autorização de residência não tinha sido renovada, e que não existia procedimento administrativo suspenso na sua apreciação, veio solicitar à Administração, sete anos depois, que decidisse sobre um procedimento inexistente, o que, manifestamente, não tem razão.
6. Em termos de natureza, o acto recorrido só se pode assumir como uma notificação, em concreto, uma notificação destinada a informar o recorrente de que a Administração não iria decidir sobre um pedido já recusado, por falta de razão e de fundamento de direito.
7. Além do teor de natureza notificativa, o acto recorrido não contém qualquer decisão que vise a alteração da situação jurídica do recorrente, em especial, a sua situação jurídica no âmbito da fixação de residência.
8. O acto recorrido não constitui uma decisão do órgão da Administração que ao abrigo de normas' de direito público vise produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, daí que não seja acto administrativo a que se refere o art.º 110.º do CPA, sendo, assim, insusceptível de recurso contencioso.
9. Na verdade, o que alterou a situação jurídica do recorrente no âmbito da fixação de residência foi o acto de recusa do seu pedido de renovação de residência praticado pelo IPIM em 25 de Abril de 2005, mas não o acto recorrido.
10. Caso o recorrente considerasse ilegal e irrazoável o acto do IPIM de não admitir o seu pedido de renovação de residência, ou caso entendesse ser anulável este acto em virtude da incompetência relativa do seu autor IPIM, deveria impugná-lo administrativa ou contenciosamente. No entanto, decorridos mais de sete anos desde então, o recorrente não apresentou impugnação contra este acto do IPIM.
11. Pelo facto de o recorrente não ter impugnado o acto do IPIM de não admitir o seu pedido de renovação de residência, o qual lhe produziu efeitos jurídicos directos, tal acto, mesmo viciado de ilegalidade ou incompetência relativa, encontrar-se-ia sanado pelo decurso do prazo fixado por lei, tomando-se válido.
12. Como o acto do IPIM de não admitir o pedido de renovação de residência do recorrente já se tomou válido, e o acto recorrido, por seu turno, não contém decisão que tenha alterado a situação jurídica do recorrente, o seu pedido de anulação do acto recorrido mostra-se infundado.
Face ao exposto, é de indeferir o pedido formulado no presente recurso contencioso».
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Houve lugar à produção de prova, mas as partes não apresentaram alegações facultativas.
*
O digno Magistrado do MP, sobre o objecto do recurso, emitiu o seguinte parecer:
«Cremos assistir razão ao recorrente.
Com a reforma do acto, afastando como motivação do indeferimento do pedido de renovação de autorização de residência na RAEM a caducidade da autorização anteriormente concedida, resultante da falta da renovação respectiva, acaba a entidade recorrida por reconhecer que, de facto, o interessado apresentou, por escrito, ao IPIM, em 25/4/05, um pedido de renovação de autorização de residência, por investimento.
Sustenta, porém, que tal pedido terá sido denegado com fundamento no facto da venda do imóvel que fundamentara a concessão da autorização de residência original, tendo sido esse indeferimento comunicado ao recorrente, oralmente e presencialmente logo na data da apresentação do requerimento e telefonicamente em 9/5/05 (contacto que o visado, de resto, não contesta), razão por que, entendendo, desta feita, que “...não era necessário este Instituto repetir, por escrito, a notificação já feita oralmente ao requerente”, sendo que “No caso de não se conformar com a recusa do seu pedido deveria apresentar impugnação administrativa ou contenciosa no prazo legalmente fixado. No entanto já caducou o seu direito de impugnação por não ter sido exercido tempestivamente”, razão por que “...não lhe assiste razão nem fundamento de direito ao pedir novamente a este Instituto que seja autorizada a renovação das autorizações de residência temporária dele e dos membros do seu agregado familiar”.
Isto, em síntese, o que descortinamos com o essencial da motivação do acto reformado, vertida no “Parecer” a que a decisão controvertida anuiu, através do qual a entidade recorrida partirá, pois, do princípio que, por inércia do interessado, o acto de indeferimento supostamente ocorrido e comunicado na própria data de entrada do requerimento, se terá firmado, consolidado na ordem jurídica, apresentando-se, assim, como caso decidido ou resolvido.
O problema é: mas que acto?
Mesmo dando de barato a existência de uma qualquer decisão oral denegando a pretensão do visado, ocorrida na precisa data de apresentação dessa pretensão, com fundamento na venda a que nos reportámos, quem é o autor respectivo? Contra quem haveria o recorrente de formular a dita impugnação?
A inexistência de reporte, por escrito, da decisão, contendo, além do mais, a autoria respectiva, sempre conduziria, inevitavelmente à ocorrência da nulidade do acto (mesmo aceitando-se a existência do mesmo), por carência absoluta de forma legal, nos termos preconizados pela al. f) do nº 2 do art.º 122º, CPA.
Donde, seja por tal via, seja pela inexistência daquele acto, constatar-se não corresponder à realidade a situação em que a entidade recorrida se estribou para denegar a pretensão formulada, pelo que, por ocorrência de erro nos pressupostos subjacentes à decisão controvertida, entendemos merecer provimento o presente recurso».
*
Cumpre decidir.
***
II – Pressupostos processuais
O tribunal é matéria, nacionalidade e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - Em 7/11/2001, o recorrente, com fundamento na aplicação de fundos em propriedade imobiliária de valor não inferior a um milhão de patacas, requereu ao IPIM a autorização de residência temporária, tendo-se então instaurado no IPIM o processo n.º 1119/2001 (fls. 75 do p.a.).
2 - Em 1 de Maio de 2002, o recorrente e os membros do seu agregado familiar obtiveram a autorização de residência temporária, válida até 1 de Maio de 2005 (fls. 70 do p.a.).
3 - Para pedir a renovação de residência temporária, o recorrente e seus familiares, conforme a marcação, deslocaram-se ao IPIM no dia 25 de Abril de 2005, às 16h45, para tratar das respectivas formalidades, tendo, na altura, apresentado documentos relacionados com o pedido (fls. 6 do p.a.).
4 - No mesmo dia, o recorrente entregou os respectivos documentos comprovativos do prédio (cfr. fls. 7 a 42 do p.a) no sentido de comprovar ter adquirido no dia 22/03/2005 uma fracção habitacional autónoma designada D22” do 22º andar “D” do prédio sito nos nºs XXXX na Taipa pelo preço de HK$ 1.030.000,00 (7 e sgs. do p.a., nomeadamente fls. 16 a 20).
5 - No entanto, o funcionário do IPIM, invocando que o recorrente tinha vendido o prédio objecto do seu investimento, não recebeu os outros documentos relevantes à renovação entregues pelo recorrente.
6 - A fim de tratar das formalidades de renovação com êxito, o recorrente ainda entregou ao IPIM uma declaração (cfr. Anexo 3 ou fls. 44 a 46 do p.a.), vindo esclarecer as suas situações referentes à aquisição de prédios e solicitar que fosse dada a ele e aos seus familiares a oportunidade de continuar a residir em Macau.
7 - No dia 9 de Maio de 2005, enquanto aguardava o deferimento do seu pedido de renovação, o recorrente foi informado por telefone por um funcionário do IPIM de que o seu caso não podia ser processado como pedido de renovação, sendo-lhe necessário apresentar novo pedido (cfr. o n.º 4 da Informação, na página 2 do Anexo I do p.a.).
8 - Contudo, o funcionário do IPIM não indicou claramente ao recorrente a razão pela qual o seu caso não podia ser processado como pedido de renovação, nem lhe esclareceu como “apresentar novo pedido” ou quais os documentos necessários para tal efeito, nem informou o mesmo dos meios a utilizar para impugnar a decisão do IPIM que não admitiu o seu pedido de renovação.
9 - Depois disso, o recorrente não recebeu qualquer correspondência ou notificação escritas do IPIM.
10 - No dia 27/08/2012 o recorrente deu entrada no IPIM o seguinte requerimento:
«REQUERIMENTO
Ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau:
O requerente, em 2001, começou a tratar as formalidades de fixação de residência por investimento imobiliário em Macau, com cinco membros de agregado familiar e processo n.º 1119/2001. Em 2002, obteve o bilhete de identidade de residente não permanente de Macau. Contudo, na renovação feita em 2005, foi informado pelo IPIM de que a qualidade de residente do requerente foi cancelada por ter transferido a propriedade imobiliária. Contudo, antes disso, o requerente chegou a perguntar ao pessoal do IPIM, tendo obtido a resposta de que deve adquirir de novo o prédio antes do pedido da renovação. Como já foi adquirido o prédio, a qualidade de fixação de residência do requerente ainda foi cancelada pelo IPIM. Até à presente data o requerente não recebeu qualquer carta do IPIM sobre o cancelamento. Agora vem por este meio pedir ao IPIM que seja autorizado o seu pedido de renovação da autorização de residência temporária, de modo a que possa continuar a fixar residência em Macau.
Pede deferimento.
O requerente,
Ass.) A
23/8/2012»
(fls. 52 do p.a. e tradução a fls. 64 do apenso “traduções”).
11 - No dia 18/09/2012 o mesmo recorrente, através de advogado, formulou o seguinte requerimento:
«Proc. 1119/2001
Ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau:
G, advogado do senhor A ora requerente nos autos supra referenciados (com procuração já junta aos autos), vem, segundo os dados fornecidos pelo requerente, expor e pedir o seguinte, quanto ao pedido de “renovação da autorização de fixação de residência temporária” apresentado ao IPIM pelo requerente em 23 de Agosto:
(1) Em Outubro de 2001, o requerente começou a tratar as formalidades de fixação de residência em Macau por investimento imobiliário, tendo-lhe sido emitido o bilhete de identidade de residente não permanente de Macau em 2002.
(2) Em Dezembro de 2003, o requerente vendeu o respectivo imóvel.
(3) Diz o douto acórdão n.º 55/2010 proferido em 6/4/2011 pelo Tribunal de Última Instância, que segundo o disposto no art.º 7.º, n.º 3 do D.L n.º14/95/M, mesmo que a situação jurídica esteja alterada após ter sido autorizado o pedido de fixação de residência temporária, também pode ser autorizado o seu pedido de renovação de residência desde que o interessado constitua em nova situação jurídica atendível no prazo não inferior a 30 dias.
(4) O requerente chegou a comunicar ao IPIM o facto de ter vendido a sua propriedade imobiliária, não tendo, contudo, até á presente data, recebido a notificação desse Instituto que se deve adquirir de novo a propriedade, nos termos da supracitada disposição legal, a fim de se sanar a sua situação jurídica já alterada.
(5) Na realidade, antes de decorrido o prazo de autorização de residência em 2005, o requerente já adquiriu novamente outra propriedade, no sentido de constituir em nova situação jurídica atendível.
(6) Pelo que, nos termos da respectiva disposição legal, deve ser autorizado o seu pedido de renovação da autorização de residência temporária.
(7) Com base nisso, requer-se ao IPIM que autorize o pedido de renovação do requerente e do seu agregado familiar.
(8) Caso o respectivo pedido não seja autorizado pelo IPIM, requer-se que seja proferida a decisão no prazo legal e notificado o requerente, ao abrigo do art.º 70.º do Código do Procedimento Administrativo».
(fls. 54 do p.a. e tradução a fls. 65-66 do apenso “traduções”).
12 - No âmbito do procedimento administrativo em apreço, com o nº 1191/2001, foi lavrada a seguinte Informação datada de 27/12/2012 (fls. 16 a 21 do apenso “traduções e fls. 64 a 66 do p.a.):
«Informação N.º: 01343/GJFR/2012
Data: 27/12/2012
Assunto: Indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária Processo n.º 1119/2001
Exm.º Sr. Director do GJFR, António B,
1. O requerente A, à luz do Decreto-Lei n.º 14/95/M, tendo por fundamento a aplicação de fundos em propriedade imobiliária de valor não inferior a um milhão de patacas (o estabelecimento CR/C do Edf. XXXX, sito na Avenida XXXX, Macau), obteve a autorização de residência temporária em Macau no dia 1 de Maio de 2002, extensiva ao seu cônjuge C, ascendente D e descendentes E e F, com o prazo de validade, para todos, até 1 de Maio de 2005 (cfr. processo n.º 1119/2001).
2. O requerente, conforme a marcação, foi tratar das formalidades de renovação no dia 25 de Abril de 2005, às 16h45, sendo de 8215 o número de marcação (cfr. Anexo 1). Contudo, dos dados constantes dos autos resulta que o requerente, no mesmo dia, não entregou os documentos necessários para o pedido de renovação.
3. Importa apontar que, nos dias 25 e 26 de Abril de 2005, o requerente apenas entregou os documentos comprovativos do prédio (cfr. Anexo 2) e uma declaração (cfr. Anexo 3), conforme os quais, em 2003, o requerente vendeu o mencionado prédio para financiar o seu negócio, e em Março de 2005, adquiriu um novo prédio, vindo pedir, com base nisso, ao presidente do IPIM que lhes fosse dada, a ele e aos seus familiares, a oportunidade de residir em Macau.
4. Conforme a tabela de comunicações deste Instituto (cfr. Anexo 4), no dia 9 de Maio de 2005, este Instituto telefonou ao recorrente, comunicando-lhe que o seu caso não podia ser tratado como pedido de renovação, sendo-lhe necessário apresentar novo pedido se quisesse obter o direito de residência em Macau.
5. Em 19 de Outubro de 2005, um homem de apelido Tam, que declarou ser amigo do requerente, veio ao IPIM consultar informações acerca do pedido de renovação do requerente, tendo, então, o funcionário deste Instituto reiterado ao mesmo que tinha dado resposta ao requerente por via telefónica em 9 de Maio de 2005 (cfr. Anexo 4).
6. De facto, o requerente, recebida a resposta deste Instituto dada por telefone, não realizou qualquer consulta nem deduziu pedido de autorização de residência temporária junto deste Instituto. E a autorização de residência temporária que lhe tinha sido concedida também caducou por ele não ter pedido a renovação da mesma à respectiva autoridade dentro dos 180 dias posteriores ao termo do respectivo período de validade, ficando sem efeito os períodos consecutivos calculados com vista à sua qualificação de residente permanente.
7. Em 31 de Julho de 2012, este Instituto recebeu uma carta do advogado constituído pelo requerente, Dr. G, na qual pediu o mesmo para consultar o processo de pedido de autorização de residência do requerente (cfr. Anexo 5).
8. Em 6 de Agosto de 2012, o advogado constituído pelo requerente, Dr. G, deslocou-se pessoalmente ao IPIM para consultar o dito processo (cfr. Anexo 6).
9. O requerente apresentou um requerimento a este Instituto no dia 23 de Agosto de 2012, afirmando o seguinte: 1) O estatuto de residentes de Macau do requerente e dos membros da sua família foi cancelado por este Instituto, sem que, até então, o requerente tenha recebido qualquer correspondência deste Instituto que respeitasse ao cancelamento do estatuto de residentes deles. 2) Veio solicitar a este Instituto que lhes fosse concedida, a ele e aos membros da sua família, a renovação de residência (cfr. Anexo 7).
10. Tendo em vista o número anterior, no dia 30 de Agosto de 2012, este Instituto, mediante o ofício n.º 14039/GJFR/2012, respondeu ao requerente nos seguintes termos:
Consultando os dados relevantes, verifica-se que a supracitada autorização de residência temporária não foi cancelada como se referiu na carta (do requerente), mas sim caducou por falta de renovação. Além disso, o pedido de renovação da autorização de residência deve ser deduzido no prazo legalmente fixado (vide o art.º 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 14/95/M de 27 de Março, aplicável ex vi o art.º 22.º, n.º 1, al. 1) do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, assim como o art.º 23.º do Regulamento Administrativo n.º 5/2003), todavia, já terminou o prazo para a renovação da respectiva autorização de residência (cfr. Anexo 8).
11. Mais tarde, em 18 de Setembro de 2012, o requerente, através do seu advogado constituído, Dr. G, apresentou uma correspondência a este Instituto, apontando o seguinte: 1) O requerente comunicou a este Instituto o facto de ter vendido o prédio, mas, até então, não foi notificado por este Instituto para adquirir um novo prédio no prazo eventualmente designado, por forma a sanar a sua situação jurídica alterada, tal como se exige nos preceitos legais acima mencionados. 2) De facto, em 2005, o requerente, antes do termo do prazo de validade da sua autorização de residência, já adquiriu um outro prédio, o que o constituiu em nova situação jurídica atendível. 3) Consoante o acórdão do Tribunal de Última Instância de 6 de Abril de 2011, proferido no processo n.º 55/2010, e ao abrigo do disposto no art.º 7.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 14/95/M, mesmo que o interessado veja a sua situação jurídica alterada após concedida a autorização de residência temporária, o seu pedido de renovação poderá ser deferido, contanto que se constitua em nova situação jurídica atendível no prazo que lhe for fixado e não inferior a trinta dias. Com base nisso, solicitou que fosse deferido o pedido de renovação da autorização de residência temporária dele e dos membros do seu agregado familiar (cfr. Anexo 9).
12. Com referência ao número anterior, é de salientar que, as autorizações de residência temporária concedidas ao requerente e aos membros do seu agregado familiar eram todas válidas até 1 de Maio de 2005, mas que caducaram nos termos legais, pelo facto de o requerente não ter requerido a sua renovação dentro do prazo de 180 dias após o termo do respectivo período de validade (isto é, até 28 de Outubro de 2005). Daí se vê que, as autorizações de residência temporária anteriormente concedidas ao requerente e os membros do seu agregado familiar não foram canceladas na sequência da mudança do objecto do investimento tal como alegou o requerente. Ademais, decorridos mais de sete anos desde a caducidade das autorizações de residência temporária do requerente e dos membros do seu agregado familiar, falta-lhes fundamento de direito para solicitarem a este Instituto que seja tratado o respectivo pedido de renovação da autorização de residência temporária, daí que se proponha o indeferimento desse pedido.
Submete-se o assunto à apreciação e decisão superior.
O Técnico Superior H
(Assinatura e carimbo: vide o original)
(fls. 16 a 21 do apenso “traduções”e 64 a 66 do p.a.)
13 - No dia 28/12/2012 foi emitida a seguinte proposta do Director do Gabinete Jurídico:
“Concordo com o teor da presente Informação. As autorizações de residência temporária do requerente e dos membros do seu agregado familiar caducaram, pelo facto de estes não terem pedido a sua renovação dentro dos 180 dias posteriores ao termo do respectivo período de validade. Decorridos mais de 7 anos desde então, agora, não têm fundamento de direito para solicitar a este Instituto que seja tratado o seu pedido de renovação da autorização de residência temporária, daí que se proponha o indeferimento daquele pedido.
Submete-se o assunto à apreciação da Comissão Executiva.
O Director do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência (GJFR), B
Aos 28 de Dezembro de 20 I 2 (Ass.: vide o original)”
14 - Foi posteriormente emitido o seguinte Parecer de 8/01/2013 do Presidente do Instituto do Comércio e do Investimento de Macau (fls. 15 do apenso “traduções” e 15 do p.a.).
“Concordo com a proposta. A despacho do Exm.º Senhor Secretário para a Economia e Finanças”
O Presidente I
Aos 8 de Janeiro de 2013 (Ass.: vide o original).
15 - O Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças despachou então em 5/02/2013 (fls. 64 do p.a. e 15 do apenso”traduções”)
“Autorizo a proposta”
16 - Em 29/04/2013 foi prestada a seguinte Informação: (cfr. fls. 16 a 20 do apenso “traduções”)
«Informação N.º 00514/GJFR/2013
Data 29/04/2013
Assunto: Reforma do acto administrativo - Processo n.º 1119/2001
Exm.º Senhor Director do GJFR, António, B,
1. No dia 5 de Fevereiro de 2013, o Senhor Secretário para a Economia e Finanças proferiu despacho na Informação n.º 01343/GJFR/2013 de 27 de Dezembro de 2012 deste Instituto (doravante designada por “Informação”), autorizando a proposta nela apresentada, que consiste em indeferir o pedido de renovação da autorização de residência temporária do requerente A e dos membros do seu agregado familiar, deduzido pelo requerente através do seu advogado (cfr. Anexo 10).
2. O requerente interpôs recurso contencioso do aludido despacho do Secretário para a Economia e Finanças, tendo-se então instaurado o processo n.º 195/2013.
3. Referiu-se na petição inicial do recurso contencioso que, em 25 de Abril de 2005, às 16h45, o requerente se deslocou a este Instituto para tratar das formalidades relativas à renovação de residência, mas que o funcionário deste Instituto, com base no facto de o requerente ter vendido o prédio objecto do investimento, se recusou a admitir os documentos por ele entregues para efeitos de renovação.
4. Tendo em consideração os factos invocados pelo requerente no recurso contencioso, descobre-se que existem erros na Informação, pelo que vem expor o seguinte:
5. Consta do n.º 2 da Informação: “2. O requerente, conforme a marcação, foi tratar das formalidades de renovação no dia 25 de Abril de 2005, às 16h45, sendo de 8215 o número de marcação. Contudo, dos dados constantes dos autos resulta que o requerente, no mesmo dia, não entregou os documentos necessários para o pedido de renovação.”
6. Aludiu-se no n.º 6 da Informação: “6. De facto, o requerente, recebida a resposta deste Instituto dada por telefone, não realizou qualquer consulta nem requereu a autorização de residência temporária junto deste Instituto. E a autorização de residência temporária que lhe tinha sido concedida também caducou por ele não ter pedido a renovação da mesma à respectiva autoridade dentro dos 180 dias posteriores ao termo do respectivo período de validade, ficando sem efeito os períodos consecutivos calculados com vista à sua qualificação de residente permanente.”
7. No n.º 12 da Informação, propôs-se ao Senhor Secretário que fosse indeferido o pedido de renovação da autorização de residência temporária do requerente A e dos membros do seu agregado familiar deduzido pelo mesmo através do seu advogado, com fundamento na caducidade da sua autorização de residência por falta de renovação dentro dos 180 dias posteriores ao termo do respectivo período de validade.
8. Não obstante, a Informação indicou o seguinte nos nºs 3, 4 e 5:
9. “3. Importa apontar que, nos dias 25 e 26 de Abril de 2005, o requerente apenas entregou os documentos comprovativos do prédio e uma declaração, conforme os quais, em 2003, o requerente vendeu o mencionado prédio para financiar o seu negócio, e em Março de 2005, adquiriu um novo prédio, vindo pedir, com base nisso, ao presidente do IP 1M que lhes fosse dada, a ele e aos seus familiares, a oportunidade de residir em Macau.”
10. “4. Conforme a tabela de comunicações deste Instituto, no dia 9 de Maio de 2005, este Instituto telefonou ao recorrente, comunicando-lhe que o seu caso não podia ser tratado como pedido de renovação, sendo-lhe necessário apresentar novo pedido se quisesse obter o direito de residência em Macau.”
11. “5. Em 19 de Outubro de 2005, um homem de apelido Tam, que declarou ser amigo do requerente, veio ao IPIM consultar informações acerca do pedido de renovação do requerente, tendo, então, o funcionário deste Instituto reiterado ao mesmo que tinha dado resposta ao requerente por via telefónica em 9 de Maio de 2005.”
12. Os factos constantes dos nºs 3, 4 e 5 demonstraram que no dia marcado para o tratamento da renovação da autorização de residência (25 de Abril de 2005) e no dia seguinte, o requerente apresentou a este Instituto o requerimento de renovação da autorização de residência, acompanhado com documentos relacionados. Mas este Instituto, com o fundamento de o requerente ter vendido o bem imóvel que fundamentou o seu pedido de fixação de residência por investimento, recusou-se a admitir o seu requerimento. Este Instituto, em 9 de Maio de 2005, ainda comunicou por telefone ao requerente que era impossível processar o seu pedido como pedido de renovação, e que o requerente necessitava de apresentar novo pedido para se poder ponderar a hipótese de lhe conceder de novo o direito de residência.
13. Dos factos acima referidos resulta que o requerente pediu a renovação da autorização de residência em 25 de Abril de 2005, pedido esse que, no entanto, não foi admitido por este Instituto.
14. Perante isso, o que consta dos nºs 3, 4 e 5 da Informação contradiz o conteúdo dos nºs 2, 6 e 12: apontaram-se, por um lado, factos bastantes para comprovar a dedução pelo requerente de pedido de renovação da autorização de residência, mas concluiu-se, por outro, pela caducidade da respectiva autorização de residência por o requerente não ter deduzido pedido de renovação.
15. Com base nisto, propõe-se ao Exm.º Senhor Secretário para a Economia e Finanças que consinta que seja reformado o teor da Informação n.º 01343/GJFR/2012 deste Instituto, no sentido de se substituírem os nºs 1 a 12 da referida Informação pelos termos seguintes, para além de se substituírem as propostas feitas pelo Director do GJFR e pelo Presidente deste Instituto nessa Informação pelas correspondentes que eles vieram a formular na presente, mas com a manutenção da parte restante dessa mesma, em particular, o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 5 de Fevereiro de 2013 acerca dessa Informação, cuja redacção é: “Autorizo a proposta”.
Reforma do Acto Administrativo
1. O requerente A, nos termos do Decreto-Lei n.º 14/95/M, tendo por fundamento a aplicação de fundos em propriedade imobiliária de valor não inferior a um milhão de patacas (o estabelecimento CR/C do Edf. XXX, sito na Avenida XXXX, Macau), obteve a autorização de residência temporária em Macau no dia 1 de Maio de 2002, extensiva ao seu cônjuge C, ascendente D e descendentes E e F, com o prazo de validade, para todos, até 1 de Maio de 2005 (cfr. processo n.º 1119/2001).
2. O requerente, conforme a marcação, foi tratar das formalidades de renovação no dia 25 de Abril de 2005, às 16h45, sendo de 8215 o número de marcação (cfr. Anexo 1).
3. O funcionário deste Instituto descobriu que tinha sido vendido o bem imóvel que este Instituto tinha em vista ao conceder ao requerente a autorização de residência, pelo que se recusou a admitir o seu pedido de renovação da autorização de residência deduzido no dia marcado.
4. Com efeito, ao processo n.º 1119/2001, instaurado com base na autorização de residência concedida ao requerente, não se encontra junto o requerimento de renovação da autorização de residência, mas tão só os documentos comprovativos do prédio (cfr. Anexo 2) e a declaração (cfr. Anexo 3) entregues pelo requerente em 25 e 26 de Abril de 2005, respectivamente. De acordo com tais documentos, em 2003, o requerente vendeu o aludido prédio para financiar o seu negócio, e em 2005, adquiriu um novo prédio, vindo pedir ao presidente do IPIM que fosse dada a ele e aos seus familiares a oportunidade de residir em Macau. Constata-se, assim, que nessa altura o requerente já sabia bem que o seu pedido de renovação da autorização de residência não fora admitido por este Instituto.
5. Conforme a tabela de comunicações deste Instituto (cfr. Anexo 4), em 9 de Maio de 2005, este Instituto telefonou ao recorrente, comunicando-lhe que o seu caso não podia ser tratado como pedido de renovação, sendo-lhe necessário apresentar novo pedido se quisesse obter o direito de residência em Macau. Isto também demonstra que o requerente, nessa altura, tinha conhecimento perfeito da não admissão do seu pedido de renovação da autorização de residência.
6. Recebida a resposta deste Instituto dada por telefone em 9 de Maio de 2005, o requerente não efectuou qualquer consulta nem deduziu pedido de autorização de residência temporária junto deste Instituto.
7. De acordo com os factos acima descritos, na data marcada, isto é, em 25 de Abril de 2005, o requerente deslocou-se a este Instituto para tratar do pedido de renovação da autorização de residência, pedido esse que, no entanto, foi recusado por este Instituto com fundamento no facto de se ter vendido o bem imóvel que fundamentou o pedido de autorização de residência do requerente. Na altura, o requerente foi notificado oralmente pelo funcionário deste Instituto da não admissão do seu pedido de renovação da autorização de residência, pelo que daquela tivesse conhecimento.
8. Em 31 de Julho de 2012, este Instituto recebeu uma carta (cfr. Anexo 5) do advogado constituído pelo requerente, Dr. G, na qual pediu o mesmo para consultar o processo de pedido de autorização de residência do requerente. Mais tarde, em 6 de Agosto de 2012, o mesmo advogado deslocou-se pessoalmente ao IPIM para consultar o dito processo (cfr. Anexo 6).
9. O requerente apresentou um requerimento a este Instituto no dia 23 de Agosto de 2012, afirmando o seguinte: 1) O estatuto de residentes de Macau do requerente e dos membros da sua família foi cancelado por este Instituto, sem que, até então, o requerente tenha recebido qualquer correspondência deste Instituto que respeitasse ao cancelamento do estatuto de residentes deles. 2) Veio solicitar a este Instituto que lhes fosse concedida, a ele e aos membros da sua família, a renovação de residência (cfr. Anexo 7).
10. Entende este Instituto que os aludidos dois pedidos formulados pelo requerente através do advogado carecem de fundamentos
11. Em relação ao pedido 1), o pedido de renovação da autorização de residência deduzido pelo requerente em 25 de Abril de 2005 não foi admitido por este Instituto, o que, nessa altura, já lhe foi comunicado oralmente. Acresce que, posteriormente, este Instituto voltou a informá-lo por telefone de que o seu pedido tinha sido recusado, sendo-lhe necessário apresentar novo pedido para se poder ponderar a hipótese de lhe conceder nova autorização de residência. Por isso, não era necessário este Instituto repetir, por escrito, a notificação já feita oralmente ao requerente. No caso de não se conformar com a recusa do seu pedido, o requerente deveria apresentar impugnação administrativa ou contenciosa no prazo legalmente fixado. No entanto, já caducou o seu direito de impugnação por não ter sido exercido tempestivamente. Não faz sentido a questão levantada pelo advogado do requerente acerca da não recepção de correspondência deste Instituto, não devendo ser apreciada.
12. Quanto ao pedido 2), dado que o pedido de renovação da autorização de residência deduzido pelo requerente em 25 de Abril de 2005 não foi admitido, agora falta-lhe fundamento quando pede a este Instituto que seja concedida a ele e aos membros da sua família a renovação de residência, sendo, pois, de indeferir tal pedido.
13. Embora tenha realizado as análises acima expostas, este Instituto, na resposta relativa aos pedidos 1) e 2), prestada por ofício n.º 14039/GJFR/2012 de 30 de Agosto de 2012, entendeu erradamente que a autorização de residência do requerente caducou por não se ter requerido a sua renovação no prazo estabelecido (cfr. Anexo 8), o que constitui erro nos pressupostos de facto, devendo ser corrigido. Sendo assim, propõe-se que se substitua a parte de fundamentação do ofício n.º 14039/GJFR/2012 pelo conteúdo dos nºs 1 a 12 da parte intitulada “Reforma do Acto Administrativo” da presente peça.
14. Depois, em 18 de Setembro de 2012, o requerente, através do advogado constituído Dr. G, apresentou uma correspondência a este Instituto, apontando o seguinte: 1) O requerente comunicou a este Instituto o facto de ter vendido o prédio, mas, até então, não foi notificado por este Instituto para adquirir um novo prédio no prazo eventualmente designado, por forma a sanar a sua situação jurídica alterada, tal como se exige no preceito legal1 acima mencionado. 2) De facto, em 2005, o requerente, antes do termo do prazo de validade da sua autorização de residência, já adquiriu um outro prédio, o que o constituiu em nova situação jurídica atendível. 3) Consoante o acórdão do Tribunal de Última Instância de 6 de Abril de 2011, proferido no processo n.º 55/2010, e ao abrigo do disposto no art.º 7.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 14/95/M, mesmo que o interessado veja a sua situação jurídica alterada após concedida a autorização de residência temporária, o seu pedido de renovação poderá ser deferido, contanto que se constitua em nova situação jurídica atendível no prazo que lhe for fixado e não inferior a trinta dias. Com base nisso, solicitou que fosse deferido o pedido de renovação da autorização de residência temporária dele e dos membros do seu agregado familiar (cfr. Anexo 9).
15. A propósito do pedido do requerente, reitera-se que, pelo facto de que o pedido de renovação da autorização de residência deduzido pelo requerente em 25 de Abril de 2005 foi recusado por este Instituto, agora, não lhe assiste razão nem fundamento de direito ao pedir novamente a este Instituto que seja autorizada a renovação das autorizações de residência temporária dele e dos membros do seu agregado familiar. No caso de não se conformar com o acto deste Instituto de não admitir o seu pedido em 25 de Abril de 2005, o requerente deveria apresentar impugnação administrativa ou contenciosa no prazo legalmente fixado. No entanto, já caducou o seu direito de impugnação por não ter sido exercido tempestivamente. Propõe-se que seja indeferido o pedido do requerente.
Submete-se o assunto à apreciação e decisão superior.
O Técnico Superior H
(Assinatura: vide o original)
17 - Sobre o assunto, foi proferido o seguinte Parecer de 29/04/2013, do Director do Gabinete Jurídico (fls. 39 e 40 do apenso “traduções”):
“Atentos os factos, o requerente deduziu, a 25 de Abril de 2005, pedido de renovação da autorização de residência, o qual, todavia, não foi admitido por este Instituto, não estando em causa a caducidade da autorização de residência resultante da falta de renovação dentro dos 180 dias posteriores ao termo do respectivo período de validade. Por esse motivo, concordo com a presente Informação na parte referente à reforma do respectivo acto administrativo, nomeadamente do conteúdo dos nºs 1 a 12 da Informação n.º 01343/GJFR/2012 deste Instituto. A proposta formulada nessa Informação será substituída pela correspondente proposta oferecida pela presente Informação, mantendo-se, no entanto, a parte restante dessa mesma, em particular, o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 5 de Fevereiro de 2013 acerca dessa Informação, cuja redacção é: “Autorizo a proposta”.
Submete-se o assunto à apreciação da Comissão Executiva.
O Director do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência, António, B”
18 - Em 29/04/2013 o Presidente do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (fls. 1539 do apenso “Traduções”) opinou o seguinte:
«Concordo com a proposta. A despacho do Exm.º Senhor Secretário para a Economia e Finanças».
19 - No dia 6/05/2013 o Secretário para a Economia e Finanças despachou (fls. 39 do apenso “traduções”)
“Concordo”.
***
IV – O Direito
1 – Introdução
Dois foram os actos administrativos praticados no âmbito dos presentes autos: o de 5/02/2013, que motivou o recurso contencioso, e o de 6/05/2013 (acto reformador), que motivou a apresentação de alegações complementares.
O acto primitivo, de 5/02/2013, do Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças (cfr. fls. 64 do p.a e 15 do apenso “traduções”), indeferiu o pedido do recorrente subscrito em 23/08/2012 (apresentado no dia 27/08/2012) de renovação de autorização de residência para si e agregado (anexo 7 ou fls. 52 do p.a.). O fundamento foi o de que a autorização concedida em 1/05/2002 tinha caducado, em virtude de o interessado não ter efectuado em momento oportuno o pedido de renovação, isto é, no prazo de 180 dias após o termo do período de validade da autorização anterior. A ideia era esta: não se poderia renovar algo que estava já caducado.
Na petição inicial, o recorrente logo se apressou a desmentir os factos vertidos na referida fundamentação, dizendo que no prazo legal (em 25/04/2005) se dirigiu ao IPIM para requerer a renovação e que entregou os documentos pertinentes, mais acrescentando que outros não apresentou por o funcionário se ter negado recebê-los com o argumento de que ele já tinha vendido o prédio com base no qual lhe havia sido concedida a autorização de residência de 1/05/2002.
Compulsado o processo administrativo apenso, logo se vê que, realmente, o ora recorrente apresentou no dia 25 de Abril de 2005 os documentos referentes ao novo imóvel adquirido em 22/03/2005 (fls. 8 e sgs. do p.a.) e que no dia imediato apresentou uma declaração/requerimento explicando as circunstâncias por que não comunicou dentro do prazo de 30 dias a venda que fez da fracção que havia adquirido na Av. do Coronel Mesquita ao abrigo de cuja compra tinha obtido a concessão da autorização de residência (fls. 43 a 45 do p.a. e 59 a 62 do apenso “traduções”).
Portanto, para a Administração não fora apresentado na altura própria o pedido de renovação, pelo que a autorização anterior tinha caducado; para o recorrente, porém, o pedido tinha sido feito e entregues os documentos necessários, embora alguns não tivessem sido aceites, segundo diz. Haveria, aqui, por conseguinte, alguma discrepância fáctica que talvez urgisse dissecar em sede probatória.
Mas, eis que a Administração, logo após a citação, numa análise mais detalhada de todo o procedimento administrativo, chegou à conclusão, através da Informação 00514/GJFR/2013, que o ora recorrente chegou a apresentar requerimento a pedir a renovação da autorização de residência e que tal pedido não foi admitido (foi recusado). Ou seja, reconheceu que o argumento da caducidade que esteve na base do indeferimento contido no despacho inicial de 5/02/2013 não estava certo ou não era verdadeiro. Razão que a levou a reformar o acto nos termos da dita Informação nº 00514/GJFR/2013 e do Parecer do Gabinete Jurídico de 29/04/2014 e do Parecer do Presidente do Instituto de Promoção e Comércio e do Investimento de Macau da mesma data.
E, então, o indeferimento veiculado pelo acto reformador é fundamentado no seguinte:
1º - Ao recorrente foi recusado o pedido apresentado no dia 25/4/2005; recusa que foi novamente informada por telefone no dia 9/05/2005. Dessa recusa (ou dessa não admissão) o interessado não recorreu a seu tempo. Por isso, já caducou há muito o seu direito de impugnação (referir-se-á, certamente, à “caducidade do direito ao recurso”: art. 46º, nº2, al. h), do CPAC);
2º - Não pode agora (sete anos depois) o recorrente pedir a renovação da autorização de residência, se esta autorização já não tinha sido renovada (lê-se melhor na contestação).
*
2 – O acto impugnado na petição inicial
2.1 - O indeferimento de 5/02/2013 foi baseado na circunstância de o interessado não ter renovado o pedido de autorização de residência no prazo devido em 2005, pelo que teria caducado a autorização concedida em 2002 e terminado o prazo para a renovação que fora somente pedida em 2012 (sete anos depois da caducidade).
A esse acto imputou o recorrente os vícios de erro sobre os pressupostos de facto, violação das disposições do DL nº 14/95/M, do art. 3º do CPA (princípio da legalidade), violação do princípio da boa fé (art. 8º do CPA).
Vejamos.
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2.2 - O recorrente atacou esse acto dizendo que ele padecia do vício de erro sobre os pressupostos de facto, uma vez que teria efectivamente formulado dentro do período legal o respectivo pedido. Este argumento foi considerado procedente pela entidade recorrida que, no acto reformador, reconheceu o erro de facto.
Este vício está portanto agora prejudicado pelo acto novo. A partir do momento em que o acto reformador fez cair os fundamentos em que se baseou o acto anterior e compôs uma nova sustentação para o indeferimento, esse vício imputado ao acto reformado, salvo o devido respeito, não carece de ser conhecido.
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2.3 - Ora, no que respeita ao art. 3º do CPA, ele é um dispositivo legal que estabelece de forma ampla o dever de a Administração agir conforme a lei e o direito. É, portanto, um princípio programático. Se todas as vicissitudes administrativas de antijuridicidade acabassem por cair no seu âmbito de previsão, isso significaria que todos os vícios dos actos se reduziriam ao vício de violação de lei. E isso não é certo, como se sabe. Ou seja, não é por alguma violação ocorrer que ela representará sempre violação de lei; tudo dependerá do tipo de vício concretamente verificado.
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2.4 - Quanto às disposições do DL nº 14/96/M, não esclarece o recorrente quais possam ter sido ofendidas, salvo a do art. 8º, nº1. Todavia, como vimos, o argumento inicial do acto primitivo de que o recorrente não tinha apresentado o pedido de renovação deixou de valer com o acto reformador. Logo, não faz sentido manter a discussão à volta desse dispositivo legal.
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2.5 - Finalmente, o recorrente também invocou a violação do princípio da boa fé. Em sua opinião, a Administração Pública violou a confiança que o recorrente nela depositou, bem assim como deveria ter prestado informações correctas e explícitas.
Em boa verdade, esta invocação está insuficientemente clara. Não se percebe o que ele verdadeiramente quer dizer. Não sabemos se quer dizer que foi levado a pensar que, caso não fosse recusado o seu pedido de renovação, teria boas razões para crer que seria deferido. Mas, se é isso o que pensa, nada lhe podemos valer. Porquê? Porque esta matéria é de natureza discricionária. Ora, só poderíamos sindicar a decisão sob o ponto de vista invocado, se a Administração tivesse indeferido o pedido numa base de razões substantivas. Como o não fez e, não sendo o caso resolúvel no âmbito da actuação vinculada, não podemos concordar com a afirmação do recorrente, uma vez que nenhum juízo de prognose poderia da nossa parte ser feito com êxito sobre o assunto.
Por outro lado, quaisquer informações incorrectas e inexplícitas que pudesse ele ter recebido de algum funcionário administrativo, elas agora não estão em causa, uma vez que o que conta é o acto que indeferiu o seu pedido. E se, no início, o acto de 5/02/2013 se baseava no facto de o recorrente não ter apresentado no prazo legal o pedido de renovação, isso deixou de ter importância uma vez que esse fundamento foi abandonado pelo acto reformador. Isto é, se alguém disse no IPIM ao recorrente que o seu caso não podia ser tratado como pedido de renovação, mas sim como pedido novo (parecendo que o informavam de que deveria apresentar um pedido de autorização de residência, como se fosse a primeira vez), essa questão perdeu todo o interesse já que o acto administrativo acabou por reconhecer que o impetrante tinha realmente apresentado um pedido de renovação.
E também não tem interesse saber se alguém disse ao recorrente que bastaria que ele adquirisse outro bem imóvel de valor correspondente para não lhe deixarem de ser verificados os requisitos para a autorização por investimento. Qualquer informação desse tipo, no máximo, se foi fonte de prejuízos, apenas poderá legitimar o exercício de um direito de indemnização a esgrimir em acção própria para efectivação de responsabilidade civil extracontratual.
Portanto, não faz mais sentido a invocação deste vício, que assim se julga improcedente.
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3 – O acto de 6/05/2013 (acto reformador)
3.1 - Como já se viu, a Administração deu-se conta do erro em que incorrera ao assentar o indeferimento de 5/02/2013 na circunstância de o recorrente não ter apresentado nenhum requerimento com vista à renovação da autorização de residência em Abril de 2005, o que não era verdade.
Convém, no entanto, ter presente que nem o acto primitivo de 5/02/2013, nem este (novo) de 6/05/2013, estão a dar resposta ao pedido efectuado em Abril de 2005. Estão, sim, a decidir o pedido do recorrente apresentado no dia 23/08/2012.
E o que diz o reformador?
Reconhece que o recorrente apresentou um pedido em Abril de 2005. Todavia, face à recusa do pedido então apresentado, “…não lhe assiste razão nem fundamento de direito ao pedir novamente a este Instituto que seja autorizada a renovação das autorizações de residência…”. Depois, acrescenta que o recorrente deveria ter impugnado a não admissão do seu pedido apresentado em Abril de 2005 e que, agora, já não o pode fazer, por caducidade do direito ao recurso. E foi por isso que indeferiu o novo pedido de 6/05/2013.
Ou seja, este acto diz por outras palavras:
a) Indefiro o teu novo pedido, porque não recorreste da recusa;
b) E indefiro porque é agora muito tarde para recorrer da recusa.
Ora, qualquer destes argumentos é falacioso, com o devido respeito. Não se pode dizer: “não te defiro o pedido porque não recorreste da recusa de entrada do teu requerimento de Abril de 2005”. Há até nesta afirmação alguma contradição, na medida em que não se pode indeferir algo (através de uma decisão de fundo) com fundamento em não se ter recorrido de uma recusa (decisão procedimental). Quando muito, mesmo que se entenda que aquela recusa era impugnável, o que a falta de recurso representaria era um efeito de caso decidido. Ou seja, por nunca se ter discutido a validade dessa recusa, o máximo que se poderia dizer era que ela não mais podia ser discutida.
Mas, acontece que o que estava para decidir era agora outra coisa: Não era o pedido inicial de Abril de 2005, nem tampouco a recusa, mas sim o pedido novo de Agosto de 2012, ainda que com base nos elementos apresentados em Abril de 2005.
Ora bem. O recorrente, para além dos mesmos vícios que já tinha imputado ao acto de 5/02/2013, vem agora também arguir a inexistência de acto de recusa (e isso parece reconduzir-se ao erro sobre os pressupostos de facto) de que pudesse recorrer e a incompetência do funcionário recusante.
Vejamos.
A Administração diz que houve recusa.
Mas pergunta-se: como pode um funcionário administrativo recusar a entrada de uns papéis e aceitar outros?!. Que tipo de poderes tinha ele para não aceitar o pedido? E para quê aceitar aqueles sem a correspondente pretensão? Para que serviriam eles, então? Não se compreende!
E não se compreende porque o funcionário que está atrás de um balcão de um qualquer serviço público não deve, nem pode, recusar a aceitação de papéis, documentos, pedidos, etc, que se destinem a um procedimento administrativo, uma vez que só as entidades competentes para a instrução e para a decisão deverão analisar a sua relevância para os fins procedimentais. Um funcionário que assim age, pensamos nós, está a ultrapassar os seus deveres funcionais ao assumir uma competência que não é sua.
O que se passou foi a apresentação de um pedido, instruído dos documentos necessários ao efeito pretendido pelo interessado (cfr. art.57º e 76º, do CPA).
O funcionário, mesmo sem ter razões para suprir deficiências ou irregularidades ao abrigo do art. 78º, do CPA, pura e simplesmente recusou a entrada (recusou aceitar o pedido), como se tivesse poderes para tal. No fundo, esta recusa ultrapassou os próprios poderes de indeferimento liminar a efectuar pelo órgão decisor próprio, o qual, mesmo assim, só poderia ter lugar se o interessado não acedesse ao convite para tornar inteligível o que porventura não fosse (e não seria, eventualmente, o caso).
O funcionário deveria, em primeiro lugar, ter procedido como mandam as regras dos arts. 80º e 81º do CPA (registo do requerimento e entrega de recibo). Conduzido, posteriormente, o requerimento e documentos anexos ao órgão administrativo, só por ele deveria ser lavrada alguma decisão liminar, desde que o caso pudesse representar alguma das situações previstas no art. 82º do CPA que permitissem o “desenvolvimento normal do procedimento”.
Nada disso aconteceu! O que se passou não foi uma recusa de entrada de requerimento. Com aquela atitude não poderemos admitir que estejamos perante uma decisão no verdadeiro sentido do termo. Nem o CPA, nem outra norma ou acto de delegação, que se conheça (a entidade recorrida não nos forneceu elementos para tal), confere ao agente administrativo poderes para recusar a entrada do requerimento.
Desde logo, por este motivo o acto em crise não seria válido, por ter falhado nos seus pressupostos de facto.
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3.2 - Aliás, esta questão ainda nos suscita um outro comentário. Imaginemos que a recusa não foi imputável ao funcionário, mas a um órgão decisor: que acto administrativo teria sido ele, concretamente? Qual o seu conteúdo? E quem fora o seu autor? E o acto oral era possível? Estava previsto especialmente (art. 112º, nº1, do CPA)? Como podia o recorrente recorrer se nada disso ele sabia, enquanto lhe não fossem vertidos por escrito esses elementos? Repare-se que, nos termos desta disposição legal, só nos casos em que a lei (que não existe) ou a natureza e as circunstâncias concretas do caso (situações de urgência ou de fiscalização, por exemplo) imponham a forma oral é que não se usará a forma escrita2. Nada disso se poderia invocar aqui! Um tal acto oral, sem lei que o permitisse e sem que a natureza e as circunstâncias o impusessem, seria nulo, de acordo com o art. 122º, nº1, l. f), do CPA3.
Acontece que o procedimento administrativo apenso não nos mostra nenhum acto decisor de recusa praticado por escrito pelo órgão administrativo competente para o efeito (nem referência a acto oral existe em relação a órgão decisor competente).
Por conseguinte, não pode agora a Administração vir extrair efeitos preclusivos da falta de impugnação administrativa ou contenciosa dessa recusa e indeferir um pedido de Maio de 2013 com o argumento de que o interessado não recorreu de uma decisão de recusa do pedido. Isto é, não pode a Administração fundamentar a nova decisão com o argumento de que, pelo facto de o recorrente não ter recorrido da recusa, o caso já “caducou” (supomos que queria referir-se à caducidade do direito de recorrer (ver pontos 12 e 15, da Informação de Reforma nº 00514/GIFR/2013).
Aliás, até esta fundamentação nos suscita outra observação: é que, se o problema fosse realmente esse, então ele não seria de caducidade do direito de recorrer (art. 46º, nº2, al. h), do CPAC), uma vez que o recorrente não está a recorrer dessa “recusa”, mas sim do acto de 5/02/2013 e, posteriormente, do acto reformador de 6/05/2013. Se o recorrente estivesse a impugnar contenciosamente aquela recusa, então, quando muito, o problema haveria de ser solucionado à luz do caso decidido ou do “caso resolvido”, de efeitos análogos aos do caso julgado. Situação que nos iria impedir de conhecer o recurso por irrecorribilidade. Mas, não é esse o caso dos autos.
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3.3 - Portanto, e tal como resulta da conclusão i) das alegações complementares do recorrente, ou a recusa não constitui verdadeiro acto administrativo ou se o for, proveio de alguém que não teria competência para o fazer, sendo além disso, nulo, por absoluta falta e forma.
Na verdade, mesmo que a recusa fosse acto verdadeiro (ainda que praticado por órgão incompetente), a falta de impugnação apenas poderia fazer reflectir os seus efeitos em relação ao pedido formulado em Abril de 2005. Estaria resolvida definitivamente aquela recusa, não mais podendo ser discutida jurisdicionalmente. Só que, mesmo nessa hipótese, nada impedia o recorrente de, ao abrigo do art. 11º do CPA, voltar a pedir a renovação, como de resto fez em Agosto de 2012, gerando um novo dever de decisão recorrível autonomamente. Por conseguinte, o direito de impugnar não caducou (art. 46º, nº2, al. h), do CPAC). Só teria caducado se a impugnação viesse dirigida contra essa recusa, mas não vem.
Isto significa, enfim, que o argumento da falta de impugnação da recusa (se ela existisse ou se ela fosse possível) não podia ser invocado para justificar o indeferimento do pedido de renovação. Ou seja, tendo a Administração considerado inexistir a caducidade da autorização concedida em 2002, nada já poderia impedi-la de conhecer o pedido de renovação apresentado em Agosto de 2012.
Em suma, o que, no nosso entender, a digna entidade administrativa deveria ter feito era estudar o caso e decidir se concedia a pretendida renovação da autorização de residência, mas nunca com aquela fundamentação.
Face ao exposto, o recurso merece proceder, sem necessidade de entrar na análise do argumento retirado do art. 7º, nº3, do DL nº 14/95/M (constituição de nova situação jurídica atendível), uma vez que o acto sindicado nunca se referiu a esta norma para justificar o indeferimento. Na verdade, o indeferimento, como se viu, nem sequer entrou na análise dos requisitos substantivos da renovação da autorização de residência.
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V – Decidindo
Nesta conformidade, acordam conceder provimento ao recurso contencioso, anulando o acto impugnado.
Sem custas.
TSI, 10 de Julho de 2014
José Cândido de Pinho
Tong Hi Fong
Lai Kin Hong
Presente
Victor Manuel Carvalho Coelho





1 O Decreto-Lei n.º 14/95/M preceitua no seu art. o 7º, n.º 3: “Em caso de perda da titularidade da situação jurídica que determinou a concessão de autorização de residência, esta deve ser cancelada se, no prazo que lhe for fixado e não inferior a trinta dias, o interessado não se constituir em nova situação jurídica atendível.”
2 Mário Esteves de Oliveira e outros, Código de Procedimento Administrativo, 2ªed., pág. 578.
3 Neste sentido, Mário Esteves de Oliveira e outros, ob. cit., pág. 648.
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