Processo nº 739/2013
(Recurso Contencioso)
Relator: João Gil de Oliveira
Data: 24/Julho/2014
Assuntos:
- Falta de fundamentação
- Poderes discricionários; pedido de residência por investimento
SUMÁRIO:
1. O recorrente percebeu perfeitamente o que se pretendeu dizer, toda a gente ficou a perceber que o pedido formulado foi rejeitado porque a Administração não considerou o investimento com aquele valor (MOP705.000,00) como relevante, investimento esse que, para além do valor considerado modesto, gerou uma irrelevante criação de emprego, apenas com um trabalhador inscrito no Fundo, que esse projecto não justificava a concessão de autorização de residência, esse despacho não deixa de estar fundamentado.
2. Uma coisa é compreender, outra concordar. O que pode acontecer é o recorrente entender que esses fundamentos violam a lei por se partir de pressupostos do indeferimento não contemplados na lei. Mas nem isso acontece por estarmos perante o exercício de poderes discricionários, cabendo à Administração avaliar da relevância ou não dos projectos apresentados , colhendo-se bem que foram razões de interesse público e desenvolvimento da economia que estiveram na base da decisão e não outros.
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira
Processo n.º 739/2013
(Recurso Contencioso)
Data : 24 de Julho de 2014
Recorrente: B
Entidade Recorrida: Secretário para a Economia e Finanças
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
1. B, mais bem identificado nos autos, , não se conformando com o despacho do Exmo. Senhor Secretário da Economia e Finanças, o qual foi proferido em 15 de Outubro de 2013 e lhe indeferiu o pedido de autorização de residência apresentado junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau, (I.P.I.M.), vem interpor recurso contencioso, alegando em síntese conclusiva:
I. O Recorrente, é sócio maioritário detentor de uma quota de 60% no valor de MOP$300,000,00 da sociedade designada por XXXXXX Consultadoria, Limitada legalmente registada em Macau na Conservatória dos Registos Comercial e Bens Móveis sob o número SO 3XXXX.
II. Em virtude do investimento que foi realizado na constituição da referida sociedade o Requerente solicitou a autorização de residência em 16 de Dezembro de 2011.
III. Volvidos quase dois anos sem qualquer resposta em 15 de Outubro de 2013, foi proferida decisão de indeferimento do pedido de autorização de residência do Recorrente.
IV. Decisão esta, da qual o Recorrente foi notificado no dia 23 de Outubro de 2013, conforme se deixará comprovado através da verificação do respectivo processo administrativo,
V. A decisão de que ora se recorre encontra-se inquinada por vicio de falta de fundamentação nos termos conjugados da alínea a) do n.º 1 do art. 114° e artigo 115° ambos do Código do Procedimento Administrativo (C.P.A).
VI. O Recorrente não pode concordar que as razões aduzidas pela Entidade Recorrida possam constituir fundamento de indeferimento.
VII. A Entidade Recorrida, alega como razões da sua decisão, que o relatório do investimento estimado pela sociedade XXXXXX Consultadoria, Limitada no ano de 2012 era de MOP$705,000.00, valor este que depois de se atender à proporção total das quotas da sociedade não poderia ser considerado um investimento de interesse para a RAEM e que,
VIII. De acordo com a informação providenciada pelo fundo de Segurança Social de Macau, no ano de 2012 somente foi inscrito um único trabalhador.
IX. Acontece porém, que tais razões não fundamentam a decisão de indeferimento da autorização de residência uma vez que as mesmas se revelam insuficientes e não esclarecem concretamente a motivação do acto - n.º 2 do art. 115° do CPA.
X. De acordo com a alínea 1) do artigo 1° do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 podem requerer autorização de residência temporária na Região Administrativa Especial de Macau, as pessoas singulares não residentes titulares de projectos de investimento, em apreciação nos competentes serviços da Administração, que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau.
XI. Sendo certo que no artigo 2° do referido diploma legal se estabelece que poderá ser considerado investimento relevante, entre outros, a instalação de unidades industriais que, pela natureza das respectivas actividades, contribuam para o desenvolvimento e diversificação da economia da Região Administrativa Especial de Macau.
XII. Embora no artigo 7° do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 se estabeleça como um dos critérios de apreciação o valor e espécie dos projectos de investimento, em parte alguma do referido regulamento se estabelece valores mínimos a serem tidos em consideração como critério de apreciação.
XIII. Donde que será legitimo concluir que, contrariamente, ao que ficou estabelecido para os pedidos de residência que se baseiem na aquisição de imóveis - bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas e cujo valor de mercado, no momento da aquisição, não seja igualmente inferior a um milhão de patacas - o pedido de residência fundado em investimento não tem quaisquer valores mínimos com requisitos obrigatórios.
XIV. A decisão de que se recorre ao vir dizer, sem mais, que o valor de MOP$705,000.00 depois de se atender à proporção total das quotas da sociedade não poderia ser considerado um investimento de interesse para a RAEM, salvo devido respeito, não esclarece concretamente a motivação do acto, Sendo que, se fica sem perceber porque razão, não havendo limites mínimos para o efeito, o valor de MOP$705,000.00 não pode ser considerado de interesse relevante.
XV. De acordo com o n.º 2 do art. 115° do CPA esta falta de esclarecimento consubstancia a falta de fundamentação a que a Entidade Recorrida estava obrigada de acordo com a alínea a) do n.º 1 do art. 114° do mesmo CPA.
XVI. Fundamentação esta, cuja falta, determina a anulabilidade do acto nos termos do art. 130° do CPA o que ora se requer.
XVII. A isto, acresce ainda o facto da Entidade Recorrida ter invocado como, uma das duas únicas razões da decisão de indeferimento o facto de no ano de 2012 somente ter sido inscrito um único trabalhador na sociedade XXXXXX Consultadoria, Limitada.
XVIII. Mais uma vez, salvo devidos respeito, a Entidade Recorrida não esclarece porque razão teve em consideração tal fundamento uma vez que o mesmo nem sequer vem listado como um dos requisitos a ter em consideração na apreciação do pedido de residência.
XIX. Em suma, para além da decisão recorrida estar inquinada com o vicio de falta de fundamentação pelas razoes supra aduzidas, a presente decisão traduz-se, salvo devido respeito, numa decisão desproporcional, inadequada e injusta relativamente aos direitos e interesses que o ordenamento jurídico da RAEM confere ao Recorrente, nomeadamente, os artigos 33° a 42° ambos da Lei Básica da RAEM.
XX. É que, na discricionariedade, a lei não dá ao órgão administrativo competente liberdade para escolher qualquer solução que este entender, mas sim, obriga-o a procurar a melhor solução para a satisfação do interesse público de acordo com os princípios jurídicos de actuação, e bem assim, de acordo com a ratio legis das normas em causa,
XXI. A lei ao conferir os poderes discricionários pretende que eles sejam exercidos em face da existência de certas circunstâncias cuja apreciação conduza o agente a optar, entre as várias soluções possíveis, pela que considere mais adequada à realização do fim legal.
XXII. No caso sub judice, a melhor solução passa, pela justa fundamentação do acto de acordo com os dispositivos legais concretamente estabelecidos, na medida em que uma pessoa, não poderá sofrer pelas repercussões que as decisões da administração provoca nas suas vidas.
XXIII. Sendo pois de se concluir que o acto em apreço para além de se encontrar inquinado com o vicio de falta de fundamentação nos termos conjugados da alínea a) do n.º 1 do art. 114° e do n.º 2 do art. 115°, causa graves prejuízos e de difícil reparação ao Recorrente e aos interesses que este persegue, violando do mesmo modo, os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça consagrados nos artigos 5°, 7° e 138°, todos do CPA.
Nestes termos requer que seja o acto de indeferimento da autorização residência do ora recorrente declarado inválido e consequentemente, seja a sua anulabilidade declarada pelo Tribunal nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do C.P.A.C. pelo vício de falta de fundamentação.
2. O Exmo Senhor Secretário para a Economia e Finanças (SEF), contesta, em suma:
1. A relevância de um investimento, para efeitos do RA 3/2005, não depende do preenchimento de quaisquer requisitos específicos;
2. A avaliação da relevância de um investimento, para efeitos do RA 3/2005, é competência discricionária da Administração;
3. É mais que natural e expectável que a Administração, ao exercer os poderes discricionários referidos em 2, leve em consideração o valor do investimento e o número de postos de trabalho criados;
4. O acto recorrido foi fundamentado de forma clara, não suscitando dúvidas quanto aos motivos da decisão;
5. O facto de o recorrente concordar ou discordar com os motivos da decisão é irrelevante para aquilatar do cumprimento do dever de fundamentação.
Pelas razões expostas, entende que terá de ser negado provimento ao presente recurso.
3. O Exmo Senhor Procurador Adjunto emite o seguinte douto parecer:
Tentando precisar o argumentado pelo recorrente, dir-se-à que o mesmo (para além da invocação generalista e abstracta de pretensa ofensa dos princípios da igualdade, proporcionalidade e justiça, para os quais não logra a mímima concretização ou caracterização, tratando-se, pois, de matéria a não merecer, da nossa parte, maiores considerações, que não a mera referência) assaca ao acto - despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 3/10/13 (e não de 15/10/13 como adianta, quiçá por lapso, devido à confusão com a data da comunicação), falta de fundamentação, insurgindo-se ainda contra a integração/interpretação efectuada pela entidade recorrida relativamente aos pressupostos subjacentes à situação.
Mas, claramente, sem qualquer razão, a nosso ver.
Desde logo, da mera leitura do parecer do IPIM em que o acto sob escrutínio se estribou, é fácil compreender e assimilar as razões por que, para os efeitos previstos no art. 2° do R.A. 3/2005, não foi considerado como relevante o projecto de investimento apresentado pelo recorrente, adiantando-se, para o efeito, o valor respectivo (MOP 705.000,00) e o facto de a empresa ter contratado apenas um trabalhador residente, pelo que " ... não contribuiu de forma alguma para o mercado local de mão de obra".
É certo que, conforme adianta o interessado, a lei não fixa requisitos mínimos para a concessão de autorização de residência com fundamento em investimento relevante : contudo, nada obsta (e, aliás, o sendo comum aconselha) que, para o preenchimento de tal "relevância" se leve em conta, designadamente, o números de empregos criados ou a criar e o montante preciso de valor investido.
Ora, quer uma, quer outra das razões, encontram-se clara e suficientemente expressas no parecer a que se aludiu, ficando um destinatário médio em perfeitas condições de as apreender e compreender.
E, perante as mesmas, revela-se congruente que a Administração, nos poderes discricionários atribuídos na matéria, tenha concluído não se apresentar o projecto de investimento apresentado como relevante, já que nem o montante preciso do mesmo, nem o número de empregados locais contratados habilitavam, sensata e adequadamente, a diferente conclusão, não se descortinando, pois, na situação, a ocorrência de qualquer erro (e, muito menos, grosseiro) de facto ou de avaliação, de que decorra injustiça gritante, a justificar intervenção jurisdicional.
Donde, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, sermos a entender não merecer provimento o presente recurso.
4. Foram colhidos os vistos legais.
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito.
III - FACTOS
São do teor seguinte o despacho recorrido e a proposta em que se louvou:
INSTITUTO DE PROMOÇÃO DO COMÉRCIO E DO INVESTIMENTO DE MACAU
Parecer nº0521/Residência/2001 Pedido de residência por investimento relevante – 1ª vez
Requerente –B É aplicável o Reg. Adm. 3/2005
Despacho do Secretário para a Economia e Finanças
Autorizo a proposta.
(Ass. vide o original)
3/10/13
Parecer do Departamento do Director-Adjunto do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência
Concordo.
2 SEP. 2013
(Ass. vide o original)
ZZZ
Director-Adjunto
Assunto: Apreciação do pedido da autorização de residência temporária
Comissão executiva:
1. Identificação do interessado:
Nn.º
Nome
Relação
Identificação
N.º
Prazo de validade
1
B
Requerente
Passaporte da Nigéria
A02......
2017/08/29
O requerente apresentou o pedido no primeiro com o passaporte n.º A00...... (vide a fls. 6) e posteriormente entregou o passaporte referido com prazo de validade mais longo.
2. Ao abrigo do despacho n.º 120-I/GM/97, proferido pelo então Governador de Macau, a CPSP emitiu parecer relativamente do documento de viagem do interessado e notificou este Instituto que estiveram preenchidas as condições para o requerente apresentar o pedido da autorização de residência.
3. O requerente apresentou o pedido da autorização de residência temporária fundamentando-se em que é titular de 60% das quotas da XXXXXX Consultadoria, Limitada.
4. O requerente entregou os documentos comprovativos (vide a fls. 19) que revelou o investimento seguinte:
Nome comercial: XXXXXX Consultadoria, Limitada
Data de abertura: 20 de Julho de 2011
Capital registado: MOP$500.000,00
Quotas do requerente: 60%, no valor de MOP%300.00,00 (sic.)
O requerente é membro do órgão de administração, o outro sócio que detém 40% das quotas não apresentou o pedido da autorização de residência, é também membro do órgão de administração.
Área de exploração: procura de negócios, consultadoria do mercado africano, representante de produtores, propostas de negócios
Sede da pessoa jurídica: Rua de ......, n.º ..., Edifício ......, ...º andar, apartamento ... (sic.)
8. De acordo com o impresso do plano de investimento entregue (vide as fls. 12 a 14), a empresa pretendeu investir no ano 2012 os valores seguintes. Calculando-se com a proporção de 60% das quotas, detida pelo requerente, lançaria um valor de MOP$423.000,00. Previu-se contratar 10 trabalhadores residentes. De acordo com a guia da contribuição para o fundo de segurança social de Fevereiro de 2012, a empresa contratou 1 assalariado:
1. Compra de equipamentos e instrumentos
150.000,00
2. Despesa preliminar
5.000,00
3. Despesa de recursos humanos
50.000,00
4. Outras custas anuais da exploração em Macau
500.000,00
Valor de investimento previsto no ano 2012 em Macau
705.000,00
9. De acordo com o impresso do plano de investimento entregue (vide as fls. 16 a 17), a empresa dedica-se em Macau à consultadoria relativamente ao mercado e negócios africanos.
7. Considerando:
1) A XXXXXX Consultadoria, Limitada dedica-se em Macau à consultadoria relativamente ao mercado e negócios africanos, em sede de registo num apartamento de habitação.
2) De acordo com o impresso do plano de investimento fornecido, previu-se o valor total de investimento de 2012 no montante de MOP$705.000,00. Após feita sintetizadamente uma análise, entende-se que o projecto de investimento não se mostra relevante, calculando-se à razão proporcional das quotas do requerente.
3) De acordo com a guia da contribuição para o fundo de segurança social de Fevereiro de 2012, a empresa contratou 1 assalariado, assim sendo, não contribuiu da forma óbvia para o mercado local de emprego.
Pelo exposto, entende-se que não se considera relevante o projecto de investimento do requerente, o que, deste modo, não se mostra favorável ao pedido da autorização de residência do requerente.
8. Pelo que, este Instituto realizou audiência escrita por ofício n.º 07037/GJFR/2013 de 4 de Julho de 2013 (vide a fls. 45).
9. O requerente entregou a contestação escrita (vide as fls. 34 a 44) em 22 de Julho de 2013, alegando:
1) No início da exploração, já se registou a residência como a sede da pessoa jurídica da empresa;
2) Muitas empresas, no início da exploração, não são conhecidas pelos consumidores, nem ganham a confiança destes, portanto, o valor de exploração é reduzido; como muitos clientes do Interior da China não conhecem bem o mercado africano, a empresa precisa de mais tempo para construir a confiança deles no investimento na África ou em Macau;
3) No âmbito de investimento, como acima dito, a empresa precisa de vários anos para construir a confiança dos consumidores, pelo que não se pode ver como o valor de investimento da empresa o valor de investimento previsto de 2012;
4) A empresa também contribuiu para o mercado local de mão-de-obra porque contratou um assalariado em Fevereiro de 2012 e um empregado a tempo inteiro em Março de 2013.
10. Quanto à contestação referida, entende-se que:
1) De acordo com a guia da contribuição para o fundo de segurança social fornecida, a empresa contratou no 2º trimestre de 2013 um trabalhador residente, mas ainda não contribuiu da forma óbvia para o mercado local de mão-de-obra;
2) As facturas e cotações entregues pelo requerente demonstram apenas as suas actividades comerciais, não há prova que revela uma alteração do valor de investimento previsto;
3) Pelo que ainda não se considera relevante o projecto de investimento do requerente.
Concluída a apreciação:
Propõe-se que seja indeferido o pedido da autorização de residência do interessado seguinte.
Nº
Nome
Relação
1.
B
Requerente
À consideração superior.
Técnico superior
Ass. vide o original
XYZ (XYZ)
IV - FUNDAMENTOS
1. Questões a conhecer:
- Falta de fundamentação;
-Violação de princípios.
2 - Vício de falta de fundamentação
2.1. Refutando a argumentação da entidade recorrida que, como razões da sua decisão, avançou com o investimento estimado pela sociedade XXXXXX Consultadoria, Limitada no ano de 2012 de MOP$705,000.00, valor este que depois de se atender à proporção total das quotas da sociedade não poderia ser considerado um investimento de interesse para a RAEM .
Para além de que terá sido inscrito no Fundo de Segurança Social de Macau, no ano de 2012 somente um único trabalhador.
Tais razões não fundamentariam a decisão de indeferimento da autorização de residência uma vez que as mesmas se revelam insuficientes e não esclarecem concretamente a motivação do acto - n.º 2 do art. 115° do CPA.
Fica-se sem perceber por que razão, não havendo limites mínimos para o efeito, o valor de MOP$705,000.00 não pode ser considerado de interesse relevante, uma vez que a entidade recorrida simplesmente não esclarece concretamente a motivação do acto.
Sendo que de acordo com o n.º 2 do art. 115° do CPA esta falta de esclarecimento consubstancia a falta de fundamentação a que a Entidade Recorrida estava obrigada de acordo com a alínea a) do n.º 1 do art. 114° do mesmo CPA, determinante da anulabilidade do acto nos termos do art. 130° do CPA..
2.2. O que resulta desta alegação é que o vício imputado ao acto está mal configurado. O recorrente percebeu perfeitamente o que se pretendeu dizer, toda a gente ficou a perceber que o pedido formulado foi rejeitado porque a Administração não considerou o investimento com aquele valor como relevante, investimento esse que, para além do valor considerado modesto, gerou uma irrelevante criação de emprego, apenas com um trabalhador inscrito no Fundo, que esse projecto não justificava a concessão de autorização de residência.
Uma coisa é compreender, outra é concordar. Como resulta do teor da petição de recurso, o recorrente compreendeu perfeitamente o acto administrativo, sinal de que o mesmo está devidamente fundamentado.
Não se pode dizer que há falta de fundamentação. O que pode acontecer é o recorrente entender que esses fundamentos violam a lei por se partir de pressupostos do indeferimento aí não contemplados. Mas nem isso acontece por estarmos perante o exercício de poderes discricionários, cabendo à Administração avaliar da relevância ou não dos projectos apresentados, colhendo-se bem que foram razões de interesse público e desenvolvimento da economia que estiveram na base da decisão e não outros.
De acordo com a alínea 1) do artigo 1° do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 cujo conteúdo se passa a transcrever:
"Podem requerer autorização de residência temporária na Região Administrativa Especial de Macau, nos termos do presente diploma, as seguintes pessoas singulares não residentes:
1) Os titulares de projectos de investimento, em apreciação nos competentes serviços da Administração, que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;"
Estamos aqui perante uma apreciação manifestamente discricionária sobre a apreciação do que seja um investimento considerado relevante para a RAEM.
A não ser assim, ter-se-ia de impor um juízo positivo de preenchimento desse requisito num pedido que envolvesse um qualquer valor, por exemplo de MOP 10.000,00.
Acresce, no entanto, que a Administração não se limitou ao valor; avançou ainda com um outro critério, qual fosse o da criação do número de postos de trabalho, índice importante, como se sabe, enquanto factor económico e de desenvolvimento.
Se é certo que a lei não fala em requisitos mínimos, com bem acentua o recorrente, não é menos certo que a sua falta legitime o deferimento do pedido a qual preço.
3. Quanto à pretensa ofensa dos princípios da igualdade, adequação, proporcionalidade e justiça, diremos apenas que refutar essa alegação é esgrimir contra fantasmas, na medida em que se não concretiza essa violação.
3.1. A presente decisão traduz-se, em sua opinião, numa decisão desproporcional, inadequada e injusta relativamente aos direitos e interesses que o ordenamento jurídico da RAEM confere ao Recorrente, nomeadamente, nos artigos 33° e 43° ambos da Lei Básica da RAEM.
É que, na discricionariedade, a lei não dá ao órgão administrativo competente liberdade para escolher uma qualquer solução que este entender, mas sim, obriga-o a procurar a melhor solução para a satisfação do interesse público de acordo com os princípios jurídicos de actuação, e bem assim, de acordo com a ratio legis das normas em causa, ou seja, a lei ao conferir os poderes discricionários pretende que eles sejam exercidos em face da existência de certas circunstâncias cuja apreciação conduza o agente a optar, entre as várias soluções possíveis, pela que considere mais adequada à realização do fim legal.
No caso sub judice, a melhor solução passa, em seu entender, pela justa fundamentação do acto de acordo com os dispositivos legais concretamente estabelecidos, na medida em que uma pessoa, não poderá sofrer pelas repercussões que as decisões da administração provocam nas suas vidas,
3.2. Não nos diz a recorrente porquê e em que medida esses princípios foram violados, razão pela qual não há possibilidade de aferir da sua razão ou falta dela.
Dá a ideia de que se aventa esta violação de princípios apenas ao acaso.
Porquê uma situação desigual e desproporcionada? Nada se diz.
Porquê uma solução injusta? Porque causou sacrifício, incómodo, inconvenientes ao requerente? Alude-se vagamente a esse índice aferidor, mas o problema da boa administração não é deferir tudo o que se lhe apresente, agradar a cada um dos indivíduos, sem levar em conta o interesse colectivo. Ainda que se entenda que por via da satisfação do interesse de todos e da colectividade as pessoas individualmente sejam felizes e não deixem de concretizar a satisfação dos seus interesses individuais. Ora, contrariamente ao que se insinua, não há razões nenhumas para duvidar que houve quaisquer outros interesses, que não a satisfação do interesse público, na decisão deste caso concreto.
Tudo visto e ponderado, o recurso não deixará de improceder.
V - DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao presente recurso contencioso.
Custas pelo recorrente, com 7 UC de taxa de justiça
Macau, 24 de Julho de 2014
Presente (Relator) Vítor Manuel Carvalho Coelho João A. G. Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng
(Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho
739/2013 1/21