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Processo nº 572/2014 Data: 16.10.2014
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “furto qualificado”.
Falta de fundamentação.
Contradição insanável.
Erro notório na apreciação da prova.
In dubio pro reo.



SUMÁRIO

1. Ainda que no caso dos presentes autos em causa esteja a actual redacção do art. 355° do C.P.P.M., (introduzida pela Lei n.° 9/2013), mais exigente em termos de fundamentação, não padece o Acórdão recorrido de falta de fundamentação se nele elencou o Colectivo a quo os factos que considerou provados, identificando os que resultaram não provados, tendo também exposto, as razões da sua convicção, indicando os elementos de prova que serviram para formar a sua convicção, e expondo, ainda que abreviadamente, as razões que o levaram a dá-las como válidas e eficazes.

Pode-se, obviamente, não concordar com a fundamentação apresentada.

Mas tal não equivale a “falta de fundamentação”.

2. “Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova.

3. Verifica-se “contradição insanável” quando “se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão”.

4. “O princípio “in dubio pro reo” identifica-se com o da “presunção da inocência do arguido” e impõe que o julgador valore sempre, em favor dele, um “non liquet”, e que, “perante uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos constitutivos do crime imputado ao arguido, deve o Tribunal, em harmonia com o princípio “in dubio pro reo”, decidir pela sua absolvição”.
Conexionando-se com a matéria de facto, este princípio actua em todas as vertentes fácticas relevantes, quer elas se refiram aos elementos típicos do facto criminalmente ilícito - tipo incriminador, nas duas facetas em que se desdobra: tipo objectivo e tipo subjectivo - quer elas digam respeito aos elementos negativos do tipo, ou causas de justificação, ou ainda, segundo uma terminologia mais actualizada, tipos justificadores, quer ainda a circunstâncias relevantes para a determinação da pena.
Porém, importa atentar que o referido o princípio (“in dubio pro reo”), só actua em caso de dúvida (insanável, razoável e motivável), definida esta como “um estado psicológico de incerteza dependente do inexacto conhecimento da realidade objectiva ou subjectiva”.
Por isso, para a sua violação exige-se a comprovação de que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido.

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo


Processo nº 572/2014
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A e B, ambos com os sinais dos autos, responderam em audiência colectiva no T.J.B., vindo, a final, a ser condenados como co-autores da prática em concurso real de 2 crimes de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. b) do C.P.M., nas penas individuais de 1 ano e 6 meses cada, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 2 anos e 3 meses de prisão; (cfr., fls. 631 a 635-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformados, os arguidos recorreram.
São de opinião que a decisão recorrida viola o art. 355°, n.° 2 do C.P.P.M., sendo nula nos termos do art. 360°, n.° 1, al. a) do mesmo Código, considerando ainda que padece de “erro notório na apreciação da prova”, “contradição insanável da fundamentação”, “violação do princípio in dubio pro reo” e “violação dos art°s 65° e 48° do C.P.M.”; (cfr., fls. 648 a 668v-).

*

Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela improcedência dos recursos; (cfr., fls. 671 a 682).

*

Neste T.S.I. juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação de fls.648 a 669 dos autos, os recorrentes arguiram sucessivamente a falta da fundamentação de facto, o erro notório na apreciação de prova, a violação do princípio in dubio pro reo, a contradição insanável da fundamentação, a falta de fundamentação na graduação da pena, a demasiada severidade da pena aplicada, a violação do disposto no art.48° do Código Penal por não lhes conceder a suspensão da execução da pena imposta, e a renovação da prova.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.671 a 682 verso), no sentido do não provimento do presente recurso na sua totalidade, bastando que lhe acrescentemos os seguintes pontos.
1- Ora, em sede das três primeiras arguições (falta da fundamentação de facto, erro notório na apreciação de prova, violação do princípio in dubio pro reo), os recorrentes alegaram repetidamente os mesmos três factos, a saber:
Em primeiro lugar, nenhum dos dois ofendidos podiam, durante a audiência de julgamento, afirmar ser os recorrentes quem tivessem furtados os seus bens (在審判聽證中,沒有任何一名被害人能夠確定是上訴人取去他們的財務);
Em segundo, os agentes da PSP e da PJ, testemunhas, reconheciam não presenciar que os recorrentes tivessem cometido a prática do furto de bens alheios (不論是治安警察局的警員還是司法警察局偵查員均表示沒有親眼看到上訴人曾從被害人處取去財務);
E em terceiro, os vídeos de gravação instalados naquele «Bus» não dá a ver que eram os recorrentes quem tivessem praticado furto de bens alheios (即便在庭審上觀看了巴士的錄影光碟,亦沒有看到上訴人作出取去他人財務的行為).
2- Afigura-se que é mutatis mutantis válida, para a nulidade prevista na a) do citado art.360°, a doutrina retirada pelo Venerando TUI no sentido de que «A nulidade a que se refere a alínea b) do n.° 1 do art. 571.° do Código de Processo Civil apenas se verifica quando haja falta absoluta de fundamentos e não quando a justificação seja apenas deficiente.», (Ac. no Processo n.°21/2004)
No que respeite concretamente ao aludido segmento legal, sustenta
o TUI [Acs. nos Processos n.°23/2002 e n.°3/2007): Não há norma processual que exige que o julgador exponha pormenorizada e completamente todo o raciocínio lógico ou indique os meios de prova que se encontram na base da sua convicção de dar como provado ou não provado um determinado facto, nem a apreciação crítica das provas em ordem a permitir a sua apreciação pelo tribunal de recurso, sem prejuízo, naturalmente, de maior desenvolvimento quando o julgador entenda fazer.
E ensina ainda o TUI (Ac. no Processo n.°9/2001): Se, em determinado caso, for possível conhecer as razões essenciais da convicção a que chegou o tribunal, pela enumeração dos factos provados e não provados e pela indicação dos meios de prova utilizados, torna-se desnecessária a indicação de outros elementos, designadamente a razão de ciência.
No caso sub iudice, o Tribunal a quo explicou (cfr. pp.16 a 17 do Acórdão recorrido): 然而,在庭上已取得足夠證據認定兩名嫌犯確曾實施了被指控的其餘2項盜竊罪,尤其是透過被害人的證言、在庭上所展示的錄影光碟、司法警察局偵查員C
所作的分析、該證人詳細地描述這個調查經過出開始直至對兩名嫌犯進行拘捕,連同對公共汽車上所取得的錄像作審閱、對兩名嫌犯所使用的 “澳門通” 卡作分析,並能確實該等嫌犯在澳門的段子逗留期間內頻密地使用 “澳門通” 卡且能查出他們進出澳門特別行政區的情況。
Ponderando tal explicação em consonância com as jurisprudências acima citada, entendemos com tranquilidade que não surge in casu nem a arguida falta de fundamentação de facto nem a nulidade p.p. na a) do art.360° do CPP, encontrando-se suficiente e cabalmente fundamentado o Acórdão recorrido.
3- A argumentação dos recorrentes demonstram que a invocada violação do princípio in dubio pro reo é a directa consequência do «erro notório na apreciação de prova». Quanto a este consagrada na c) do n.°2 do art.400° do CPP, é pacífica e consolidada a seguinte jurisprudência (cfr. Acórdãos do Venerando TUI nos Processo n.º17/2000, n.º16/2003, n.º46/2008, n.°22/2009, n.°52/2010, n.°29/2013 e n.º4/2014):
O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão corno provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta.
Em esteira, o certo é que os aludidos três factos alegados pelos recorrentes não se entra em nenhuma das modalidades do «erro notório na apreciação de prova», delineadas reiteradamente pelo TUI. Daí flui que não se existe este vício.
Bem, os dito 3 factos em que se estribam o «erro notório na apreciação de prova» mostram nitidamente que ele pôs em crise, no fundo, a apreciação e livre convicção do Tribunal a quo sobre os vários meios de prova, tentando sobrepor a sua valorização sobre a do Tribunal.
O que justifica que se recordar o ensinamento do Venerando TUI no seu Processo n.°13/2001: O recorrente não pode utilizar o recurso para manifestar a sua discordância sobre a forma como o tribunal a quo ponderou a prova produzida, pondo em causa, deste modo, a livre convicção do julgador.
De outro lado, interessa não olvidar (Acórdão do Venerando TSI no Processo n.°132/2004): A invocação do vício de erro notório na apreciação da prova não pode servir para pôr em causa a livre convicção do Tribunal, pois que o mesmo nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o recorrente.
E mais (Acórdão do Venerando TSI no Processo n.°470/2010): Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal c aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.
Em conformidade com tais sensatas jurisprudências, afigura-se-nos inquestionável que não se verifica o invocado «erro notório na apreciação de prova» ou a violação do princípio in dubio pro reo e, assim, inócuo e impertinente a pretendida renovação da prova.
4- Os recorrentes opinaram que existia «contradição insanável da fundamentação» entre o facto não provado n.° 1 e os provados n.°s 3 e 5, por aquele não provado ser incompatível com estes dois não provados, de molde manifestamente insanável (vide. as conclusões 17 a 19 da Motivação).
Inculca reiterada e constantemente o Venerando TUI que como vício intrínseco da decisão, a "contradição insanável da fundamentação" consiste na contradição entre a fundamentação probatória da matéria de facto, bem como entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada. (vide. Acórdãos nos Processos n.°17/2000 e n.°52/2010)
Interessa ainda reter que só se verifica tal vício quando se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre este e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão (Acórdãos do TSI no Processos n.°634/2010 e n.°656/2011).
Em harmonia com tais inculcas jurisprudenciais, não descortinamos a «contradição insanável da fundamentação» configurada pelos recorrentes - Pois, a não comprovação do «agrupamento (糾結)» anterior à entrada em Macau definido no o facto não provado n.° 1 nada impede de conluio e conjugação de esforço posteriores, aludidos nos factos provados n.°s 3 e 5 pelo Tribunal a quo.
No que concerne aos restantes argumentos dos recorrentes - a falta de fundamentação na graduação da pena, a demasiada severidade da pena aplicada, a violação do disposto no art.48° do Código Penal por não lhes conceder a suspensão da execução da pena imposta, sufragamos inteiramente as doutas explanações do ilustre Colega na Resposta.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do recurso em apreço”; (cfr., fls. 693 a 695).

*

Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 632-v a 634, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Dois são os recursos trazidos à apreciação deste T.S.I..

Nada parecendo obstar, a tanto se passa.

3.1. Da lei (processual) aplicável aos autos

Em 01.01.2014 entrou em vigor a Lei n.° 9/2013 que introduziu alterações ao C.P.P.M. aprovado pelo D.L. n.° 48/96/M de 02.09.1996.

Nos termos do art. 6° da dita Lei n.° 9/2013:

“1. As alterações ao Código de Processo Penal introduzidas pela presente lei são aplicáveis aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor.
   2. Exceptuam-se do disposto no número anterior:
 1) Os processos em que tenha já sido designada data para a audiência em primeira instância;
 2) Os processos que se encontram em fase de recurso, se houver já despacho preliminar do relator nos termos do artigo 407.º do Código de Processo Penal.
   3. Independentemente da fase em que se encontre, são aplicáveis a todos os processos pendentes a alteração aos n.os 7 e 8 do artigo 100.º do Código de Processo Penal e as disposições legais que passam a estabelecer prazos mais alargados para a prática de actos processuais”.
  
No caso, a data da audiência de julgamento ocorrida no T.J.B. foi designada por despacho de 15.04.2014; (cfr., fls. 577).
  
Constata-se assim que à situação dos autos aplica-se o C.P.P.M. na sua versão actual, introduzida pela Lei n.° 9/2013.
  
Esclarecido este aspecto, continuemos.

3.2. Dos recursos

Nos seus recursos, colocam os arguidos ora recorrentes as questões seguintes:
- falta de fundamentação;
- erro notório e contradição insanável;
- violação do princípio in dubio pro reo;
- violação dos art°s 65° e 48° do C.P.M..

–– E, apreciando, mostra-se de começar pela alegada “falta de fundamentação”.

Pois bem, ainda que no caso dos presentes autos em causa esteja a actual redacção do art. 355° do C.P.P.M., (introduzida pela Lei n.° 9/2013), mais exigente em termos de fundamentação, cremos porém que carecem os recorrentes de razão.

Com efeito, no Acórdão ora recorrido, elencou o Colectivo a quo os factos que considerou provados, identificando os que resultaram não provados, tendo também exposto, adequadamente, as razões da convicção do Tribunal, indicando os elementos de prova que serviram para formar a sua convicção, e expondo, ainda que abreviadamente, as razões que levaram o Tribunal a dá-las como válidas e eficazes.

Basta aliás ler o Acórdão recorrido, (cfr., fls. 632-v a 634), para assim ser de concluir.

Pode-se, obviamente, e como temos vindo a entender, não concordar com a fundamentação apresentada.

Mas tal não equivale a “falta de fundamentação”.

Improcedem assim os recursos no ponto em questão.

–– Quanto ao assacado “erro notório na apreciação da prova” e “contradição insanável da fundamentação”, vejamos.

Constitui entendimento firme e pacífico que o primeiro destes dois vícios, (típicos da “decisão da matéria de facto”), ocorre “quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”

De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 03.07.2014, Proc. n.° 375/2014 do ora relator).

Como também já tivemos oportunidade de afirmar:

“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., Ac. de 22.05.2014, Proc. n.° 284/2014 e de 03.07.2014, Proc. n.° 375/2014).

Por sua vez, verifica-se “contradição insanável” quando “se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão”; (cfr., v.g. no Acórdão deste T.S.I. de 24.10.2013, Proc. n° 645/2013).

E, sendo este o sentido e alcance das imputadas maleitas, evidente se mostra de concluir que também aqui não tem os ora recorrentes razão.

De facto, não se vislumbra onde, como ou em que termos tenha o Colectivo a quo violado qualquer regra sobre o valor das provas tarifadas, regra de experiência ou legis artis, retirando de um facto provado ou não provado uma conclusão logicamente inaceitável, não nos parecendo, também, que tenha incorrido em “incompatibilidade” ou “contradição”, (muito menos insanável), valendo aqui o que sobre a questão se consignou no Parecer do Ilustre Procurador Adjunto e que, aqui, por uma questão de economia processual, se dá por integralmente reproduzido.

Na verdade, a convicção do Tribunal a quo apresenta-se como perfeitamente possível e explicável pelas regras de experiência – pois que os “furtos” ocorreram pouco após a chegada dos arguidos e de estes se sentarem perto dos ofendidos, mantendo-se aí por pouco tempo, (o necessário para o “trabalho”) – notando-se, igualmente, que a decisão, é no seu todo, clara, lógica e isenta de qualquer obscuridade.

–– Quanto à imputada “violação do princípio in dubio pro reo”, vejamos.

Em relação a este princípio temos considerado que:

“O princípio “in dubio pro reo” identifica-se com o da “presunção da inocência do arguido” e impõe que o julgador valore sempre, em favor dele, um “non liquet”, e que,
“Perante uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos constitutivos do crime imputado ao arguido, deve o Tribunal, em harmonia com o princípio “in dubio pro reo”, decidir pela sua absolvição”; (cfr., v.g. o Ac. de 06.04.2000, Proc. n.° 44/2000, e mais recentemente, de 19.09.2013, Proc. n.° 157/2013).
Por sua vez, e como entende a doutrina, segundo o princípio “in dubio pro reo” «a persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido»; (cfr., Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, pág. 215).
Conexionando-se com a matéria de facto, este princípio actua em todas as vertentes fácticas relevantes, quer elas se refiram aos elementos típicos do facto criminalmente ilícito - tipo incriminador, nas duas facetas em que se desdobra: tipo objectivo e tipo subjectivo - quer elas digam respeito aos elementos negativos do tipo, ou causas de justificação, ou ainda, segundo uma terminologia mais actualizada, tipos justificadores, quer ainda a circunstâncias relevantes para a determinação da pena.
Porém, importa atentar que o referido o princípio (“in dubio pro reo”), só actua em caso de dúvida (insanável, razoável e motivável), definida esta como “um estado psicológico de incerteza dependente do inexacto conhecimento da realidade objectiva ou subjectiva”; (cfr., Perris, “Dubbio, Nuovo Digesto Italiano”, apud, Giuseppe Sabatini “In Dubio Pro Reo”, Novissimo Digesto Italiano, vol. VIII, págs. 611-615) .
Por isso, para a sua violação exige-se a comprovação de que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido; (neste sentido, cfr. v.g., o Ac. do STJ de 29-4-2003, proc. n.º 3566/03, in “www.dgsi.pt”).

Daí também que, para fundamentar essa dúvida e impor a absolvição, não baste que tenha havido versões dispares ou mesmo contraditórias; (neste sentido, cfr., v.g. o Ac. da Rel. de Guimarães de 9-5-2005, proc. n.º 475/05, in “www.dgsi.pt”), sendo antes necessário que perante a prova produzida reste no espírito do julgador - e não no do recorrente - alguma dúvida sobre os factos que constituem o pressuposto da decisão, dúvida que, como se referiu, há-de ser “razoável” e “insanável”.

Ora, não se vislumbrando – nem indicando os recorrentes – que em momento algum tenha o Colectivo a quo decidido contra os arguidos, não obstante dúvida sobre a sua culpabilidade, e visto que o mesmo Colectivo conseguiu “formar convicção”, evidente é também que inexiste violação ao princípio em questão.

–– Por fim, da “pena”.

Aos crimes cometidos cabe a pena de prisão até 5 anos e multa até 600 dias; (cfr., art. 198°, n.° 1 do C.P.M.).

E, ponderando, no estatuído nos art°s 40°, 64° e 65° do C.P.M., na dita moldura e na conduta dos arguidos, entendeu o Tribunal a quo que adequada era a pena de 1 ano e 6 meses de prisão para cada um dos (2) crimes de “furto qualificado” pelos ora recorrentes cometidos.

E, da reflexão que nos foi possível efectuar, cremos nós que, também aqui censura não merece o decidido.

Dizem os recorrentes que a pena não está (devidamente) fundamentada, o mesmo sucedendo com a não suspensão da execução da pena única.

Bom, em matéria de “fundamentação” dúvidas não há que importa ter (certas) cautelas, essencialmente, atenta a nova versão do art. 355° do C.P.P.M..

Porém, há também que compreender que não se pode exigir, sempre, uma fundamentação abundante e generosa.

Esta, dependerá, (ou deve depender), do “caso concreto”.

E, no caso concreto, cremos que se deve considerar que fundamentada está também a decisão quanto à pena aplicada.

Com efeito, o Colectivo a quo – e como se pode ler do Acórdão recorrido – ponderou no preceituado no art. 65° do C.P.M., (que fixa os critérios para a determinação da pena), na forma de cometimento do crime, (em “comparticipação”), no dolo directo e intenso dos arguidos e nas necessidades de prevenção criminal, para chegar às penas parcelares de 1 ano e 6 meses de prisão para cada crime de “furto qualificado” pelos recorrentes cometido.

Ora, atento o que se deixou exposto, e certo sendo que de afastar era uma pena não privativa da liberdade, (ao abrigo do art. 64° do C.P.M.), pois que esta não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, há que dizer igualmente que excessivas não parecem as penas parcelares fixadas.

De facto, o (tipo de) “furto” dos autos, em autocarros públicos, recorrendo os arguidos a objectos afiados para cortar os bolsos das calças dos ofendidos para depois lhes subtrair a carteira, aproveitando o “aperto” da viagem, o cansaço ou distracção dos ofendidos, não deixa de provocar (alguma) apreensão, fortes sendo pois as necessidades de prevenção criminal.

Por sua vez, e como já se deixou referido, a forma de cometimento dos crimes, em “comparticipação”, demonstrando assim elevado grau de ilicitude, agindo os arguidos com dolo directo e intenso, e em “repetição”, pois que dois, em datas distintas, foram os furtos cometidos, implica, certamente, uma adequada “reacção penal”, sendo pois e desta forma, adequadas as penas parcelares impostas, (que ainda assim estão próximas do seu limite mínimo).

Quanto à “pena única”, a mesma é a solução.

Com efeito, integralmente respeitados foram os limites do art. 71°, n.° 2, motivos não havendo também aqui para qualquer censura.

No que toca à não “suspensão da execução da pena”.

Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Como temos vindo a entender:

“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., Ac. de 01.03.2011, Proc. n° 837/2011, do ora relator, e, mais recentemente, de 24.07.2014, Proc. n° 428/2014).

No caso dos autos diz o recorrente que o Tribunal não fundamentou a decisão de não suspensão da execução da pena única de prisão de 2 anos e 3 meses, sendo verdade que na decisão recorrida não consta um único argumento – expressamente exposto – sobre tal questão.

Porém, entende a maioria deste Colectivo que tendo (nomeadamente) presente a (diferença de) redacção entre os art°s 44° e 66° e a do art. 48° ora em questão, necessidade não tinha o Tribunal recorrido de o fazer.

Contudo, e seja como for, temos também para nós que possível não é a pretendida suspensão.

De facto, atento o tipo e circunstâncias de cometimento dos crimes dos autos, face às atrás já referidas necessidades de prevenção criminal, inviável é pois a pretendida suspensão da execução da pena única aos ora recorrentes fixada.

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, acordam negar provimento aos recursos.

Pagarão os arguidos 8 UCs da taxa (individual) de justiça.

Honorários ao Exmo. Defensor Oficioso no montante de MOP$2.000,00.

Macau, aos 16 de Outubro de 2014
José Maria Dias Azedo
  Chan Kuong Seng (entendo, pois, que tendo o Tribunal “a quo” indicado a norma incriminadora (que prevê a moldura legal aplicável aos ilícitos criminais praticados pelos dois arguidos), a norma do art.º 64.º do CP (com exposição dos motivos da necessidade de aplicação da pena de prisão em detrimento da pena de multa), e as normas dos art.ºS 65.º e 71.º (com exposição dos motivos da graduação da pena de prisão e da fixação da pena única), e não sendo obrigatória a concessão do benefício de suspensão da execução da pena de prisão aplicada em duração não superior a três anos (pois o art.º 48.º, n.º 1, do CP fala do poder suspender, e não dever suspender), o Tribunal “a quo” não precisa de justificar, no seu acórdão, o porquê da não suspensão da pena de prisão, tal como não precisaria de justificar o porquê da não atenuação especial da pena à luz do art.º 66.º do CP (visto que a atenuação especial da pena também não é de aplicação automática ou obrigatória nos termos gerais do art.º 66.º do CP), isto tudo porque, em suma, o Tribunal “a quo” não precisa de justificar o não uso de uma faculdade decisória conferida pelo Legislador Penal com confiança no prudente e livre arbítrio do julgador judicial, estando, assim, observados, no caso concreto dos autos, o disposto nos art.ºS 355.º, n.º 2, e 356.º, n.º 1, do CPP, bem como o estatuído no art.º 65.º, n.º 3, do CP).
Tam Hio Wa



















Processo nº 572/2014
(Autos de recurso penal)



Declaração de voto

Não obstante ter relatado o acórdão que antecede, não subscrevo o segmento decisório com o qual – por maioria – se entendeu que o Tribunal a quo não necessita de fundamentar a decisão de não suspensão da execução de uma “pena de prisão não superior a 3 anos”, como é a dos presentes autos.

Em síntese, eis os motivos que me levaram a divergir do entendimento dos meus Exmos. Colegas.

Pois bem, é sabido que nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Por sua vez, em matéria de “fundamentação”, e (para além de no art. 87°, n.° 4 do C.P.P.M. se prescrever que “os actos decisórios são sempre fundamentados”), em causa estando um (a “sentença” ou) “acórdão” (do T.J.B.), importa ponderar no estatuído no art. 356° do C.P.P.M.:

“1. A sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada, indicando nomeadamente, se for caso disso, o início do seu cumprimento, outros deveres que ao condenado sejam impostos e a sua duração, bem como o plano individual de readaptação social.
2. Após a leitura da sentença condenatória, o juiz que preside ao julgamento, quando o julgar conveniente, dirige ao arguido breve alocução, exortando-o a corrigir-se.
3. Para efeitos do disposto neste Código, considera-se também sentença condenatória a que tiver decretado dispensa de pena”; (sub. nosso).

Tratando de questão relacionada com este art. 356° do C.P.P.M., teve já este T.S.I oportunidade de consignar que “a falta de fundamentação à escolha e à medida da pena nos termos do artigo 356° n° 1 do Código de Processo Penal não conduz a nulidade da decisão prevista no artigo 360° do Código de Processo Penal”, considerando-se que o vício em questão seria o de mera irregularidade; (cfr., v.g., Ac. de 09.11.2006, Proc. n.° 321/2006).

Mais recentemente, entendeu também o Vdo T.U.I. que “a falta, na sentença condenatória, dos elementos previstos na primeira parte do artigo 356.°, n.° 1 do Código de Processo Penal (fundamentos que presidiram à escolha e à medida da pena), constitui mera irregularidade, sujeita ao regime do artigo 361.°, n.os 1, alínea b) e 2 do mesmo diploma legal”; (cfr., Ac. do T.U.I. de 23.09.2009, Proc. n.° 25/2009).

Nesta conformidade, das duas uma: ou se considera que a “decisão de não suspender a execução de uma pena (objectivamente) passível de tal medida” não está abrangida pela previsão do art. 356°, n.° 1 do C.P.P.M., ou (então), que não deixa de constituir uma “decisão em matéria de «escolha (e medida) da sanção aplicada»”, e então, a se acompanhar o consignado nos atrás referidos arestos deste T.S.I. de 09.11.2006 e do T.U.I. de 23.09.2009, padeceria a decisão recorrida do vício de “irregularidade”, precisamente, por “falta de fundamentação”; (sobre a questão, e como mera referência, pode-se ver também, v.g., o Ac. do S.T.J. de 14.12.2000, Proc. n.° 2769/2000, in S.A.S.T.J., n.° 46, 54, onde se escreveu que “a fundamentação da decisão de suspender ou não a execução da pena, nos casos em que formalmente ela é possível, é uma fundamentação específica, que é como quem diz mais exigente que a decorrente do dever geral de fundamentação das decisões judiciais que não sejam de mero expediente (…). Decorre do exposto o dever de o juiz assentar o incontornável juízo de prognose, favorável ou desfavorável, em bases de facto capazes de o suportarem com alguma firmeza, sem que todavia se exija uma certeza quanto ao desenrolar futuro do comportamento do arguido”, o de 25.05.2005, Proc. n.° 1939/05, in S.A.S.T.J., n.° 91, 154, onde se escreveu “se o tribunal aplica uma pena de prisão não superior a 3 anos, tem sempre de apreciar fundadamente a possibilidade de suspender a respectiva execução, pelo que não pode deixar de indagar a verificação das respectivas condições (prognose e necessidade de prevenção) e exarar o resultado dessa indagação, decidindo em conformidade. Se o não fizer, o tribunal deixa de se pronunciar sobre questão que devia apreciar, pelo que é nula a decisão, que o tribunal superior pode conhecer oficiosamente, designadamente quando vem impugnada a não suspensão da execução da pena e, pela referida omissão, fica prejudicado o reexame pedido de tal questão”, e o Ac. do T. Constitucional português n.° 61/2006, Proc. n.° 492/05, onde se considera igualmente “ilegal” uma interpretação do art. 375° - equivalente ao art. 356° do nosso C.P.P.M. – “no sentido de não impor fundamentação da decisão de não suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a três anos”).

No mesmo sentido pronuncia-se também o Prof. Figueiredo Dias que sobre a mesma questão escreve o que segue:

“Desde logo, num caso como no outro [suspensão simples ou suspensão com imposição de deveres], o tribunal tem de especificar na sentença os fundamentos da suspensão (art. 48.º‑3). O texto deste comando – sugerindo que a fundamentação (específica, é claro, e que em nada contende com o dever geral de fundamentação de toda e qualquer decisão judicial só se torna necessária quando o tribunal se decida pela suspensão – deve ser interpretado em termos amplos e os únicos correctos. O tribunal, perante a determinação de uma medida da pena de prisão não superior a 3 anos, terá sempre de fundamentar especificamente quer a concessão, quer a denegação da suspensão, nomeadamente no que toca ao carácter favorável ou desfavorável da prognose e (eventualmente) às exigências de defesa do ordenamento jurídico. Outro procedimento configuraria um verdadeiro erro de direito, como tal controlável mesmo em revista, por violação, para além do mais, do disposto no art. 71.º. Só assim não terá de proceder o tribunal quando, sendo a medida determinada da pena de prisão inferior a 6 ou a 3 meses, ele se decida logo (fundadamente) por outra pena de substituição aplicável (multa, prestação de trabalho a favor da comunidade, admoestação)”; (in “Direito Penal Português – Parte Geral; II – Consequências Jurídicas do Crime”, Lisboa, 1993, pág. 345).

Aliás, não se pode (ou deve) esquecer que “a fundamentação das decisões judiciais” – e abreviando – tem (também) como finalidade exteriorizar e (assim) permitir aos sujeitos processuais (e público em geral) a cabal compreensão dos motivos da (própria) decisão proferida.

E, dest’arte, se perante uma pena de prisão de medida não superior a 3 anos, e portanto, (objectivamente) passível de suspensão na sua execução, nada diz o Tribunal que a decreta, (limitando-se a condenar o arguido na mesma pena), dificultada está a tarefa daqueles que com ela se não conformam e tenham legitimidade para dela recorrer, visto que, (para além de se poder entender que houve “esquecimento”, e, então “omissão de pronúncia”), desconhecem (por completo) os “motivos” que levaram o Tribunal a não suspender a execução da pena a que chegou, sendo, desta forma, e no mínimo, “mais complexa”, a sua impugnação.

Por fim, devendo ser o processo penal um “processo leal” e “equitativo”, e sendo o “direito ao recurso” um “direito fundamental”, não nos parece que deva o Tribunal dispensar-se (ou abster-se) de esclarecer, (sempre, e cabalmente), os motivos de facto e de direito das suas decisões, (ou “opções”), de forma a permitir uma integral compreensão das razões que o levaram a decidir no sentido que decidiu (e não noutro), desta forma, proporcionando, (também), um pleno exercício do aludido direito ao recurso àqueles a quem assiste legitimidade para tal.

Macau, aos 16 de Outubro de 2014
José Maria Dias Azedo





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